Fatores sociais e técnicos relacionados ao desenvolvimento da gestão municipal da Assistência Farmacêutica: resultados do Qualifica AF

Social and technical factors related to the development of municipal management of Pharmaceutical Services: Qualifica AF results

Samara Jamile Mendes Emília Baierle Faraco Noemia Liege Maria Bernardo de Almeida Rafaela Tavares Peixoto Benilson Beloti Barreto Letícia Mendes Ricardo Ediane de Assis Bastos Silvana Nair Leite Sobre os autores

RESUMO

Estudo diagnóstico realizado no projeto Qualifica AF para identificar os componentes técnicos e sociais que caracterizam a gestão municipal da Assistência Farmacêutica (AF). Estudo realizado com amostra composta por municípios habilitados ao Eixo Estrutura do Programa Qualifar-SUS. A coleta foi realizada com questionário de autopreenchimento. Foram selecionadas oito variáveis, segundo o grau de participação da gestão da AF em atividades da gestão municipal em saúde. A análise foi realizada com o modelo de regressão logística multinominal. Nos municípios estudados, 42,4% têm alta participação nas atividades de gestão municipal. Os aspectos de participação são articulações com outros setores da secretaria municipal de saúde com vínculos estabelecidos com outras coordenações, participação ativa no controle social, atuação nos relatórios de gestão do município, assim como seu planejamento e avaliação, envolvimento e atuação nas capacitações. O aumento da participação da AF na gestão municipal da saúde está associado a resultados positivos em termos de estrutura, organização, utilização de recursos pelos municípios, articulações com outras instâncias de gestão. Ressalta-se a importância da efetivação da gestão da AF como processo técnico, político e social, partícipe da gestão municipal da saúde, ultrapassando os limites de uma atividade isolada do processo de atenção e gestão da saúde.

PALAVRAS-CHAVES
Assistência Farmacêutica; Acesso a medicamentos essenciais e tecnologias em saúde; Pesquisa sobre serviços de saúde; Sistema Único de Saúde

ABSTRACT

Diagnostic study carried out in the Qualifica AF project to identify the technical and social components that characterize the municipal management of the Pharmaceutical Services (PS). Study carried out with a sample composed of municipalities qualified for the Structure Axis of the Qualifar-SUS Program. The collection was performed with a self-completion questionnaire. Eight variables were selected according to the degree of participation of the PS Management in municipal health management activities. The analysis was carried out using the multinomial logistic regression model. In the municipalities studied, 42.4% have high participation in municipal management activities. The aspects of participation are articulations with other sectors of the municipal health department with links established with other coordination’s, active participation in social control, performance in the municipality’s management reports, as well as its planning and evaluation, performance in training for teams. Increased PS participation in municipal health management is associated with positive results in terms of structure, organization, use of resources by the municipalities, articulations with other management instances. Emphasizes the importance of the effectiveness of PS management as a technical, political and social process, a participant of the municipal health management, going beyond the limits of an activity isolated from the health care and management process.

KEYWORDS
Pharmaceutical Services; Access to essential medicines and health technologies; Health services research; Unified Health System

Introdução

A Assistência Farmacêutica (AF) vem se consolidando no Brasil como política pública promotora do acesso a medicamentos. Em estudo com dados coletados entre 2013 e 2014, foi possível observar que o Brasil alcançava uma prevalência de 94,3% de acesso a medicamentos para doenças crônicas, sendo 47% realizado no Sistema Único de Saúde (SUS)11 Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional [Internet]. Rev Saude Publica. 2016 [acesso em 2023 fev 15];50:6s. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/vyNsNwqPkkK8npjNvfFgysk/?lang=en#
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. Porém, já em 2019, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) mostrou que apenas 30,5% das pessoas obtiveram seus medicamentos no SUS22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde: Brasil, grandes regiões e unidades da federação [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2020 [acesso em 2023 fev 15]. 85 p. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=2101748
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, o que pode ser um sinal de alerta para um possível retrocesso na garantia do acesso aos medicamentos como direito à saúde. A experiência da pandemia de covid-19 demonstrou, ainda, maior necessidade do reconhecimento da AF como área estratégica, considerando o impacto financeiro e os resultados em saúde relacionados ao acesso e ao uso racional dos medicamentos33 Bermudez JAZ, Esher A, Osorio-de-Castro CGS, et al. Assistência Farmacêutica nos 30 anos do SUS na perspectiva da integralidade. Ciênc saúde coletiva. 2018;23(6):1937-1949. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.09022018
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,44 Bermudez J. Solidariedade ou apartheid?: Lições aprendidas na pandemia [Internet]. São Paulo: Escola Nacional de Formação e Qualificação Profissional dos Farmacêuticos; 2022 [acesso em 2023 jun 7]. Disponível em: https://escoladosfarmaceuticos.org.br/publicacoes/download-integra-2/
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.

O campo da gestão da AF se desenvolveu no Brasil a partir da descentralização do financiamento e de responsabilidades, sendo prioritariamente estruturado por seu caráter técnico-operacional de cuidado do medicamento, e não como parte integrante e intrínseca do processo de atenção à saúde55 Costa KS, Tavares NUL, Nascimento Júnior JM, et al. Pharmaceutical services in the primary health care of the Brazilian Unified Health System: advances and challenges. Rev Saúde Pública. 2017 [acesso em 2023 fev 14];51(supl2):3s. DOI: https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2017051007146
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. Nesse contexto, o setor responsável pela AF nas organizações se caracterizou por se posicionar de forma isolada, em seu ciclo de operações técnicas, com pouco ou nenhum relacionamento com o contexto da gestão da atenção à saúde66 Leite SN, Guimarães MCL, Rover MRM, et al. Gestão da Assistência Farmacêutica. In: Leite SN, Soares L, Mendes SJ, et al., organizadores. Gestão da Assistência Farmacêutica. Florianópolis: EDUFSC; 2016. p. 33-46. (Assistência Farmacêutica no Brasil: Política, Gestão e Clínica; v. 2).,77 Gerlack LF, Karnikowski MGO, Areda CA, et al. Gestão da assistência farmacêutica na atenção primária no Brasil. Rev Saúde Pública. 2017;51(supl2):15s. DOI: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051007063
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,88 Barreto JL, Guimarães MCL. Avaliação da gestão descentralizada da assistência farmacêutica básica em municípios baianos, Brasil. Cad Saude Publica. 2010;26(6):1207-1220. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-311X2010000600014
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Na gestão municipal da saúde, a implementação de projetos e ações ocorre numa arena política permeada por interesses diversos e, muitas vezes, conflitantes. Sofrem, ainda, a influência de disponibilidade financeira, condições legais e organização administrativa local99 Silva SF. Municipalização da saúde e poder local, sujeitos, atores e políticas São Paulo: Hucitec; 2001., tudo isso em um ambiente altamente permeável a questões relativas à cultura política e à realidade social específicas de cada local1010 Pimenta AL. A construção de colegiados de gestão: a experiência de gestão da Secretaria Municipal de Saúde analisada por um ator político implicado. Saude Soc. 2012;21:29-45. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902012000500003
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,1111 Matus C. Política, planejamento e governo. Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1993.. Por essa razão, o fazer gestão exige ações que vão além de operações técnico-operacionais: necessita de participação, comunicação, negociação, estabelecimento de parcerias estratégicas.

Na concepção de ‘governar’, de Carlos Matus1111 Matus C. Política, planejamento e governo. Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1993., é preciso construir a governabilidade. Para tanto, é necessário compreender a gestão da AF como “um processo técnico, político e social”8(1208), o que requer uma dinâmica de caráter sistêmico, multidisciplinar, de gestão integrada com os demais setores do município1212 Leite SN, Farias MR, Manzini F, et al. organizadores. Gestão da Assistência Farmacêutica: proposta para avaliação no contexto municipal, a experiência em Santa Catarina. Florianópolis: UFSC; 2015. v. 300. 17 p..

Nessa perspectiva, a AF municipal se caracteriza como um sistema com componentes técnicos, mas, também, sociais/políticos, inserido no sistema municipal de saúde. Com essa premissa, Bernardo et al.1313 Bernardo NLM, Soares L, Leite SN. A Sociotechnical approach to analyze pharmaceutical policy and services management in Primary Health Care in a Brazilian municipality. Pharmacy (Basel). 2021;9(1):39. DOI: https://doi.org/10.3390/pharmacy9010039
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propuseram o redirecionamento do olhar sobre a AF municipal, baseado na teoria dos sistemas sociotécnicos1414 Botla L, Kondur H. Socio technical systems of a company: the dimensionality of socio technical systems. Purshartha J Manag Ethics Spiritual [Internet]. 2018 [acesso em 2023 fev 14];11(1):24-38. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/327775884_Socio_Technical_Systems_of_a_Company_The_Dimensionaality_of_Socio_Technical_Systems
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A qualificação da gestão da AF nos municípios tem sido incentivada por estratégias, como o Programa Nacional de Qualificação da Assistência Farmacêutica (Qualifar-SUS), que está estruturado em quatro Eixos: Educação, Informação, Cuidado e Estrutura. Neste último, são repassados recursos financeiros para municípios, condicionados ao fornecimento regular de informações sobre entradas, saídas, dispensação e posição de estoque de medicamentos pelos municípios ao Ministério da Saúde (MS)1515 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Assistência Insumos Estratégicos. QUALIFARSUS Programa Nacional de Qualificação da Assistência Farmacêutica no Âmbito do Sistema Único de Saúde [Internet]. Eixo Estrutura: Atenção Básica. Instruções Técnicas. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2016 [acesso em 2023 fev 14]. 72 p. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/qualifarsus_programa_nacional_qualificacao_farmaceutica.pdf
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. Rodrigues e colaboradores1616 Rodrigues PS, Cruz MS, Tavares NUL. Avaliação da implantação do Eixo Estrutura do Programa Nacional de Qualificação da Assistência Farmacêutica no SUS. Saúde debate. 2017;41(esp):192-208. DOI: https://doi.org/10.1590/0103-11042017S15
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identificaram, no entanto, que os municípios habilitados no programa, até 2015, apresentaram, em sua maioria, grau de implantação insatisfatório (44%) ou crítico (21%), inferindo que o repasse de recursos, como medida isolada, não é capaz de superar as barreiras para o desenvolvimento da capacidade de gestão. No contexto atual, com necessidades emergentes e possibilidades de reorientações das políticas públicas a partir das necessidades em saúde, este estudo tem por objetivo identificar os componentes técnicos e sociais que caracterizam a gestão municipal da AF. A partir de tal caracterização, o estudo indica as possíveis estratégias de fortalecimento da AF municipal visando à superação das barreiras organizacionais, operacionais e de sustentabilidade que a gestão da AF vem apresentando.

Material e métodos

Estudo diagnóstico realizado no escopo do projeto Qualifica AF. A amostra foi composta por municípios habilitados ao Eixo Estrutura do programa Qualifar-SUS, do universo de 3.508 municípios habilitados no programa.

Para construção e validação do questionário de autopreenchimento, foram realizadas oficinas com especialistas representantes de todos os níveis de gestão do SUS, de universidades e do controle social do SUS. Profissionais de todas as 5 regiões brasileiras foram engajados nesse processo. A validação aconteceu por meio de consenso, utilizando o método Delphi, adaptado para formato on-line1717 Souza LEPF, Vieira-Da-Silva LM, Hartz ZMA. Conferência de consenso sobre a imagem-objetivo da descentralização da Atenção à Saúde no Brasil. In: Hartz ZMA, Vieira-Da-Silva LM, organizadores. Avaliação em saúde: dos modelos teóricos à prática na avaliação dos programas e sistemas de saúde. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2005. p. 65-102.. O questionário aplicado contém questões relativas a: estrutura, sistema informatizado, atividades da gestão da AF, força de trabalho e gerenciamento dos recursos do Qualifar-SUS no município.

A coleta de dados aconteceu por meio do software SurveyMonkey, que permite o controle dos respondentes por meio dos IPs, e aconteceu entre setembro e novembro de 2021. O questionário foi enviado por e-mail para todos os 3.508 municípios. As informações de contato foram de cadastrados anteriores do MS e complementadas por busca ativa em contato direto dos pesquisadores com os profissionais dos municípios. A equipe de pesquisa foi composta por pesquisadores e auxiliares em nível locorregional que acompanharam o processo para capilarizar a divulgação do estudo e a coleta de dados. Dados secundários utilizados foram o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), de 20161818 Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil [Internet]. [Local desconhecido]: UNDP Brasil; 2016 [acesso em 2023 fev 16]. Disponível em: http://www.atlas-brasil.org.br/
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, e o porte populacional dos municípios, com base no IBGE 20101919 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Métricas sociais municipais: análise dos resultados do censo demográfico 2010 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2011 [acesso em 2023 fev 14]. 72 p. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/pt/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=254598
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Foram selecionados indicadores do estudo, segundo o grau de participação da gestão da AF (ou do gestor da AF) em atividades da gestão municipal em saúde, sendo definido como critério de análise das características do sistema de gestão municipal de AF, indicando aspectos sociais e políticos verificáveis. Oito variáveis foram selecionadas como marcadores para essa finalidade, sendo elas a participação em: I) reuniões regulares de planejamento e avaliação; II) planejamento e organização de novos serviços ou unidades de saúde para o município; III) organização das conferências municipais de saúde; IV) discussão e definição do orçamento anual; V) elaboração do relatório anual de gestão; VI) reuniões regulares de coordenadores de unidades de saúde; VII) reuniões regulares de departamentos/setores da secretaria de saúde; VIII) Treinamentos e capacitações em saúde. Os municípios foram classificados de acordo com o grau de participação em: Alta participação (4 a 8 itens com respostas Sim); Participação pontual (1 a 3 itens); Não participativos (0 itens). A partir dessa classificação, foram analisados os resultados obtidos pela aplicação do questionário para as demais questões que caracterizam os aspectos técnicos e sociais, internos e externos.

Foi aplicado o teste qui-quadrado para comparar as frequências entre os três grupos de municípios. Os testes com significância estatística (p < 0,05) foram usados para eleger as variáveis que foram incluídas no modelo de regressão logística multinominal, e foi adotado o método backward para se chegar ao modelo final, em que permaneceram as variáveis com p menor que 0,05. As análises foram realizadas no software SPSS, v.25.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina, com Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) nº 35856920.6.0000.0121 e

Parecer nº 5.147.939, cumprindo os princípios éticos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Saúde2020 Ministério da Saúde (BR); Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos e revoga as Resoluções CNS nos. 196/96, 303/2000 e 404/2008. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 2013 jun 13; Seção I:549.,2121 Ministério da Saúde (BR); Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais cujos procedimentos metodológicos envolvam a utilização de dados diretamente obtidos com os participantes ou de informações identificáveis ou que possam acarretar riscos maiores do que os existentes na vida cotidiana. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 2016 maio 24; Seção I:44..

Resultados

No total, 2.576 formulários preenchidos foram recebidos pela equipe de pesquisa. No tratamento de dados, foram excluídos 28% deles, sendo 574 respostas incompletas, 87 com respondentes duplicados e 56 de municípios duplicados. Os dados apresentados referem-se a 1.859 municípios (53% da amostra de municípios habilitados no programa Qualifar-SUS), sendo que a amostra abrangeu todos os estados brasileiros e, de forma homogênea, municípios com todos os perfis de aderência ao programa Qualifar-SUS. Dados de caracterização da amostra são apresentados nos gráficos 1 e 2.

Gráfico 1
Representatividade da amostra distribuída por estados

Gráfico 2
Número de municípios distribuídos em faixas de regularidade de recebimento dos recursos trimestrais de custeio do Programa Qualifar-SUS

Com relação ao recebimento dos recursos trimestrais de custeio, referente ao cumprimento do requisito do envio de dados municipais para a Base Nacional de Dados de Ações e Serviços da Assistência Farmacêutica (BNAFAR) no SUS, os municípios da amostra apresentaram diferentes perfis de regularidade, conforme a distribuição apresentada no gráfico 2. Os municípios habilitados no Programa e respondentes da pesquisa estão distribuídos em 5 faixas de regularidade de pagamento. Um padrão semelhante de distribuição nas faixas de pagamento também é encontrado no total de 3.508 municípios. Os municípios que receberam mais de 90% dos recursos de custeio foram os que mais aderiram à pesquisa.

Sobre características gerais da gestão da AF dos municípios, apresenta-se uma descrição dos dados. Os municípios da amostra têm, em sua maioria, porte pequeno (88%) e IDHM médio (47%). Em 95% dos municípios, o responsável ou gestor da AF é um farmacêutico. A taxa média de farmacêuticos por 10 mil habitantes é de 0,98. Entre os responsáveis pelo preenchimento do questionário, 92% eram farmacêuticos, dos quais, 46% estão na função há mais de 5 anos.

Com relação à estrutura dos serviços, em 82% dos municípios, há um sistema informatizado para registros dos dados. Desses, 48% utilizam o Hórus (sistema disponibilizado pelo MS), porém, em apenas 34% esse sistema é integrado à rede municipal de saúde. Na amostra, 57% dos municípios afirmam que as geladeiras disponíveis para armazenamento de insulinas NPH/regular atendem à necessidade; 50% afirmam possuir procedimento operacional padrão para o controle da temperatura das geladeiras de insulina; e 59% afirmam que há um profissional responsável por essa verificação. Para 63% dos respondentes, a gestão estadual contribui com ações de organização e distribuição das insulinas.

Na organização da AF municipal, o cargo de gestor está instituído formalmente em 46% dos municípios, e 20% dos respondentes não souberam responder. Quando perguntados sobre o Plano Municipal de Saúde vigente, 73% afirmam que a AF consta no plano, mas 23% não souberam responder, assim como 21% não souberam responder se o gestor ou a equipe da AF estava participando da elaboração do Plano Plurianual de Saúde. Em 48% dos municípios, os recursos oriundos do Qualifar-SUS são considerados no planejamento do setor. Para 52% dos municípios, o Qualifar-SUS colaborou para a melhoria da estrutura física dos serviços de AF e para as unidades com dispensação de medicamentos e informatização. A capacitação técnica dos profissionais e a gratificação salarial foram identificadas pelos respondentes como necessidades locais em 80% e 75% dos municípios, respectivamente.

Com relação ao grau de participação da gestão da AF nas atividades da gestão municipal da saúde, 345 (18) municípios apresentaram nenhuma forma de participação, enquanto 789 (42%) afirmam haver participação em 4 ou mais das 8 atividades de gestão municipal indicadas. Essas variáveis foram consideradas para a análise de resultados de organização, estrutura, processos e indicadores socioeconômicos, apresentados na tabela 1. A análise univariada indica que os municípios do Nordeste têm maior participação na gestão municipal, assim como os de menores IDHM e maiores portes populacionais.

Tabela 1
Caracterização da AF municipal de acordo com o grau de participação da gestão da Assistência Farmacêutica em atividades da gestão municipal em saúde

A formalização do cargo de gestor da AF e a inserção da AF no Plano Municipal de Saúde e no Plano Plurianual estão positivamente associadas ao maior grau de participação da AF na gestão municipal. Os municípios com maior grau de participação também apresentaram uma rede de informatização mais abrangente (Central de Abastecimento e unidades dispensadoras), se comparada com a dos demais, e são os que apresentam melhores condições técnicas de armazenamento e controle de medicamentos (procedimentos operacionais padrão e profissional responsável). Entre esses municípios, é maior a porcentagem daqueles que relatam não haver problemas de envio de dados para a BNAFAR e ter melhor gestão dos recursos do Qualifar-SUS. Também é notável que esses municípios reportam, em maior proporção, avaliações positivas sobre a relação com as Secretarias Estaduais de Saúde e o MS. O grau de participação da AF na gestão municipal foi maior entre os municípios com taxas menores de farmacêuticos atuando na rede municipal de saúde. Os dados estão apresentados na tabela 1.

Os municípios em que foi relatado não haver acompanhamento da utilização dos recursos do Qualifar-SUS ou em que não souberam dar essa informação também são os que apresentam nenhuma participação e/ou baixa participação na gestão municipal. Os dados estão apresentados na tabela 1.

Os resultados da Regressão Logística Multinominal, tomando como referência a Categoria sem participação, estão apresentados na tabela 2. Para a maioria das variáveis analisadas, os resultados positivos em termos de estrutura, organização, utilização de recursos pelos municípios, articulações com outras instâncias de gestão, estão associados com o aumento do grau de participação da AF na gestão municipal da saúde.

Tabela 2
Fatores associados (odds ratio) ao grau de participação da gestão da Assistência Farmacêutica em atividades da gestão municipal em saúde

Com relação aos municípios que não tiveram participação na gestão municipal, a região Nordeste (OR = 2,32) teve uma chance de 132% de participação pontual maior quando comparada com a região Sul; já a região Sudeste (OR = 1,60), uma chance de 60% de participação pontual em relação a região Sul. Já nas regiões Nordeste (OR = 3,92) e Norte (OR = 2,39), houve uma maior chance de alta participação em relação à região Sul. Os dados estão apresentados na tabela 2.

Ter o cargo de responsável/coordenador/ gestor da AF significa ter 3,65 vezes mais chance de o município ter alta participação e 1,7 vez mais chance de ter participação média quando comparado a não ter esse profissional na liderança da gestão da AF. Os dados estão apresentados na tabela 2.

O uso de instrumentos de gestão pública, como o plano plurianual e o plano municipal de saúde, aumenta as chances de os municípios terem participações média (OR = 1,7 e OR = 4,6) e melhora significativamente as chances de alta participação da AF nas atividades de gestão municipal (OR = 3,65 e OR = 18,6). Além dos instrumentos, o planejamento anual da AF, considerando os recursos do programa Qualifar-SUS, permitiu uma chance 100% maior de os municípios serem altamente participativos. Os dados estão apresentados na tabela 2.

A percepção sobre o recebimento de apoio do MS aumentou em 159% as chances de o município estar com alta participação quando comparado aos municípios que não possuem conhecimento sobre esse apoio. Da mesma forma, o recebimento do apoio da instância estadual de gestão possibilitou 4,6 vezes mais chances de os municípios serem altamente participativos.

Discussão

Os resultados apresentados neste estudo demonstram um quadro com grandes assimetrias na organização e estruturação da AF municipal, em seus aspectos técnico-operacionais, organizacionais e políticos. Apresentam, também, uma nova abordagem para a gestão da AF, que permite avançar na compreensão dos resultados da organização político-institucional da AF no sistema municipal de saúde e indicar estratégias para o desenvolvimento do setor.

A descentralização da gestão da AF foi acompanhada de instrumentos normativos que buscaram garantir padrões de organização capazes de dar suporte ao desenvolvimento de uma gestão municipal do setor, que só se consolidou nos anos 20002222 Organização Pan-Americana da Saúde; Organização Mundial da Saúde; Ministério da Saúde (BR). Avaliação da Assistência Farmacêutica no Brasil [Internet]. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde; Ministério da Saúde; 2005 [acesso em 2023 fev 16]. 260 p. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/avaliacao_assistencia_farmaceutica_estrutura_resultados.pdf
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. No entanto, os resultados identificam que o desenvolvimento tem sido desigual entre os municípios, o que indica diferentes condições para o acesso e o uso de medicamentos entre os brasileiros. Resultados de estudos anteriores já sinalizavam para esse problema, em termos de estrutura, força de trabalho, atividades de gestão2323 Carvalho MN, Álvares J, Costa KS, et al. Força de trabalho na assistência farmacêutica da atenção básica do SUS, Brasil. Rev Saúde Pública. 2017;51:16s. DOI: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051007110
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,2424 Leite SN, Manzini F, Álvares J, et al. Infraestrutura das farmácias da atenção básica no Sistema Único de Saúde: Análise dos dados da PNAUM-Serviços. Rev Saude Publica. 2017;51:13s. DOI: https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051007120
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,2525 Faraco EB, Guimarães L, Anderson C, et al. The pharmacy workforce in public primary healthcare centers: promoting access and information on medicines. Pharm Pract. 2020;18(4):2048. DOI: https://doi.org/10.18549/pharmpract.2020.4.2048
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,2626 Peixoto RT, Campos MR, Luiza VL, et al. O farmacêutico na Atenção Primária à Saúde no Brasil: análise comparativa 2014-2017. Saúde debate. 2022;46(133):358-375. DOI: https://doi.org/10.1590/0103-1104202213308
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e de recursos aplicados na compra de medicamentos entre os municípios2727 Silva WRO, Santana RS, Eduardo AMLN, et al. Equidade ameaçada: Assimetrias regionais nos investimentos em medicamentos no Brasil. Res Soc Dev. 2021;10(13):e179101320896. DOI: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i13.20896
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Tais deficiências de estrutura e organização na AF municipal são reconhecidas, já há alguns anos, como barreiras para o adequado acesso e uso dos medicamentos na atenção básica, e demandaram investimentos do governo federal com estratégias como a ponderação dos valores de repasse para o Componente Básico da AF pelo IDHM, a partir de 20192828 Ministério da Saúde (BR), Gabinete do Ministro. Portaria nº 3.193, de 9 de dezembro de 2019. Altera a Portaria de Consolidação no6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017, para dispor sobre o financiamento do Componente Básico da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União, Brasília, DF. 2019 dez 10; Edição 238; Seção I:112-116., e o Qualifar-SUS, desde 2012. Entre os municípios habilitados para receber os recursos de estruturação previstos no programa (3.508 vigentes em 2022), menos de 20% receberam regularmente os recursos, fato que pode ser explicado pelo constante não envio dos dados para o BNAFAR (gráfico 2). Entre os participantes do estudo, 37% não souberam responder sobre o uso ou monitoramento desses recursos no seu município. Tais resultados indicam sérias deficiências organizacionais nesses municípios, que o repasse de recursos, isoladamente, não tem sido capaz de superar. Limitações no desenvolvimento e na consolidação da gestão da AF municipal parecem estar diretamente relacionadas a essas deficiências.

No SUS, a gestão em saúde é entendida como um conjunto de práticas que contemplam a liderança, a estratégia e o controle, de forma a viabilizar a implementação de políticas e serviços para a sociedade. É, pois, uma ação humana que reflete essa sociedade e a modifica, de forma dinâmica e constante66 Leite SN, Guimarães MCL, Rover MRM, et al. Gestão da Assistência Farmacêutica. In: Leite SN, Soares L, Mendes SJ, et al., organizadores. Gestão da Assistência Farmacêutica. Florianópolis: EDUFSC; 2016. p. 33-46. (Assistência Farmacêutica no Brasil: Política, Gestão e Clínica; v. 2).. Pressupõe contato e diálogo entre os atores sociais, o que torna as relações humanas parte constitutiva do processo. A governabilidade de um sistema é construída a partir da identificação de aliados, de resistência, de parcerias1111 Matus C. Política, planejamento e governo. Brasília, DF: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; 1993..

Os resultados aqui apresentados indicam a aplicação direta desse conceito à caracterização da AF nos municípios, associando indicativos de condições para a governabilidade (indicados pelo grau de participação na gestão municipal da saúde) com as características de organização, estrutura e processos da AF. Os estilos de liderança são estudados e discutidos frequentemente na literatura, e destacam-se os resultados positivos para os estilos que conceituam a gestão como um processo colaborativo, multifacetado e dinâmico2929 Sfantou DF, Laliotis A, Patelarou AE, et al. Importance of leadership style towards quality of care measures in healthcare settings: A systematic review. Healthcare. 2017;5(4):73. DOI: https://doi.org/10.3390/healthcare5040073
https://doi.org/10.3390/healthcare504007...
.

Na tabela 1, é possível visualizar que municípios que participam de atividades e processos decisórios da gestão municipal apresentam melhores resultados em condições de estrutura e processos: em maior proporção, a AF está contemplada no Plano municipal e Plurianual de saúde; melhores condições estruturais, de planejamento e processos de trabalho, de uso dos recursos do Qualifar-SUS. Também demonstram maior domínio sobre as informações do setor, indicado por maior proporção de participantes aptos a responder às questões do questionário de pesquisa. Esses resultados, de forma conjunta, indicam uma maior capacidade de gestão da AF entre aqueles que estão engajados cotidianamente na gestão municipal da saúde. Os aspectos de participação considerados neste estudo dizem respeito a articulações com outros setores da secretaria municipal de saúde com vínculos estabelecidos com outras coordenações, participação ativa nos movimentos do controle social, atuação nos relatórios de gestão do município, assim como seu planejamento e avaliação, envolvimento e atuação nas capacitações da SMS. Indicam, portanto, a construção cotidiana da governabilidade para a AF municipal. Esses indicativos são, em grande parte, reiterados na análise por Regressão Logística Multinominal (tabela 2), revelando que o maior grau de participação do setor de AF impacta em melhores resultados em sua organização e estruturação.

A gestão da AF tem sido realizada por profissionais farmacêuticos, dado já identificado em 2015 quando mais de 90% dos municípios brasileiros possuíam farmacêuticos na coordenação da AF22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde: Brasil, grandes regiões e unidades da federação [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2020 [acesso em 2023 fev 15]. 85 p. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=2101748
https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php...
. A farmácia é uma profissão historicamente caracterizada por sua formação técnica e tecnicista, focada em produtos farmacêuticos e técnicas laboratoriais. O desenvolvimento de competências relacionadas à liderança, colaboração interprofissional, comunicação, capacidade de negociação, gestão de conflitos, advocacy e tomada de decisão está ainda em formação nas universidades e nos órgãos de classe3030 Manzini F, Lorenzoni AA, Soares L, et al. Impact of a management course for pharmacists on their behaviors and the health systems capacity. Am J Pharm Educ. 2021;85(7):8506. DOI: https://doi.org/10.5688/ajpe8506
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. As necessidades de formação de lideranças para serviços de farmácia são reconhecidas internacionalmente e explicitam as deficiências dos farmacêuticos para atividades de gestão3131 Ikhile I, Gülpınar G, Iqbal A, et al. Scoping of pharmacists’ health leadership training needs for effective antimicrobial stewardship in Africa. J Pharm Policy Pract. 2023;16(1):33. DOI: https://doi.org/10.1186/s40545-023-00543-2
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.

O programa Qualifar-SUS também já promoveu atividades educacionais para farmacêuticos, reconhecendo a necessidade de formação para atuação na gestão da AF. Até 2015, 2.500 farmacêuticos de 1.068 municípios realizaram pós-graduação em gestão da AF, e estudos posteriores demonstram que houve impactos positivos e perenes para os seus locais de atuação3030 Manzini F, Lorenzoni AA, Soares L, et al. Impact of a management course for pharmacists on their behaviors and the health systems capacity. Am J Pharm Educ. 2021;85(7):8506. DOI: https://doi.org/10.5688/ajpe8506
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,3232 Lorenzoni A, Manzini F, Storb B, et al. Attending a blended in-service management training in a public health system: Constraints and opportunities for pharmacists and health services. Pharmacy. 2021;9(1):12. DOI: https://doi.org/10.3390/pharmacy9010012
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. No entanto, os participantes do presente estudo apontaram capacitação profissional como uma necessidade atual, acompanhada de melhorias de remuneração. Tal cenário aponta, portanto, para a necessidade de uma ação integrada entre apoio de formação/qualificação profissional, valorização das atividades de gestão e apoio financeiro para a estruturação da AF municipal, em especial, para os municípios com maior grau de vulnerabilidades sociais, econômicas e estruturais.

Considerando abordagem sociotécnica, é possível identificar que os componentes técnicos que tradicionalmente caracterizam o que se convencionou chamar de gestão da AF são fortemente interdependentes de seus componentes sociais e políticos: das pessoas, das relações, da cultura nas organizações. Portanto, intervenções em partes do sistema afetam as demais, implicando eficácia e eficiência dos sistemas como um todo1313 Bernardo NLM, Soares L, Leite SN. A Sociotechnical approach to analyze pharmaceutical policy and services management in Primary Health Care in a Brazilian municipality. Pharmacy (Basel). 2021;9(1):39. DOI: https://doi.org/10.3390/pharmacy9010039
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. Por esse motivo, é preciso desenvolver as intervenções dentro de um plano estratégico de mudança para o desenvolvimento organizacional, tendo a premissa de que os componentes sociais e políticos são fundamentais ao sistema sociotécnico da AF, além dos componentes técnicos já bem estabelecidos no chamado ciclo da AF. As limitações do estudo referem-se à amostragem por conveniência, não podendo, portanto, representar estatisticamente a população dos 3.508 municípios. Essa escolha se baseou na limitação de informações sobre os profissionais responsáveis pela AF nos municípios. A primeira ação do projeto foi uma divulgação do estudo através de mídias sociais, grupos e entidades farmacêuticas de todo o País. Houve a participação, como membros do grupo de pesquisadores, de farmacêuticos sediados em cada estado, divulgando o projeto e fazendo busca ativa nos municípios habilitados ao Qualifar-SUS. Dessa forma, foi possível criar um banco com contatos atualizados de profissionais e gestores da AF dos 3.508 municípios, e estes foram, então, convidados a participar do estudo.

Conclusões

Os resultados aqui apresentados evidenciam, de forma inédita, a importância do reconhecimento e da efetivação da gestão da AF como processo técnico, político e social, partícipe da gestão municipal da saúde, entendendo a AF municipal como sistema sociotécnico, para o seu desenvolvimento e consolidação.

Foi preciso evoluir no entendimento da gestão da AF, caracterizando-a como uma prática social, e avançar nas análises diagnósticas de seus componentes técnicos, para associações entre a participação da gestão da AF nas atividades da gestão municipal e fatores que demonstram boas condições de gestão. Assim, foi possível compreender que gestão da AF mais participativa apresenta melhores resultados para questões reivindicadas pelos farmacêuticos e pela sociedade, para melhores condições de acesso aos medicamentos e aos serviços farmacêuticos.

Esses resultados apontam para uma nova abordagem na formação dos profissionais responsáveis pelo setor e, ainda, para a necessidade de estratégias robustas e integradas de suporte aos municípios, ultrapassando os limites até então colocados na definição de gestão da AF como atividade técnica e isolada do processo de atenção e gestão da saúde nos municípios.

  • Suporte financeiro:

    Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) via Carta Acordo Scon2021-00317. Bolsa de pesquisa do CNPq (151549/2022-2)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2023
  • Aceito
    15 Jul 2024
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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