Riscos, autorizações e pendências: uma reflexão do sistema CEP-CONEP a partir da antropologia da saúde

Martinho Braga Batista e Silva Carlos Guilherme do Valle Waleska Aureliano Sobre os autores

Resumo

Neste artigo, refletimos sobre práticas e concepções normativas colocadas pelo sistema do Comitê de Ética e Pesquisa da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CEP-CONEP) que tem resultado em entraves para as pesquisas das Ciências Humanas e Sociais (CHS), embora essas, em sua maioria, não coloquem em risco a integridade física, psicológica ou social dos participantes. Os impedimentos suscitaram reações por parte de pesquisadoras/res dessas áreas, notadamente aquelas/es da antropologia da saúde, o que culminou, em 2016, na definição de uma resolução específica da CONEP para as pesquisas nessa área. A partir de reflexões, debates e situações suscitadas por nossa prática como pesquisadora/res, orientadora/res, membros de CEP e/ou de grupos de trabalho da CONEP, discutimos como, a partir de compreensões diversas sobre a noção de “risco” e sua tipificação, e de um ideário contratual da relação de pesquisa pautado na ideia de “autorização”, se produz a “pendência”, categoria nodal de avaliação dos comitês de ética. As tentativas de fixação de modelos para essas três categorias esbarram na complexidade envolvida no trabalho de campo, quando este é formado por diferentes atores, com interesses distintos e por vezes conflituosos, comumente observados em instituições atravessadas por relações de poder, especialmente no campo da saúde.

Palavras-chave:
CEP-CONEP; antropologia da saúde; risco; pendência; autoridade

Introdução

As concepções de risco que norteiam as instituições responsáveis pela regulação ética de pesquisas no Brasil, desde a instituição do sistema do Comitê de Ética e Pesquisa da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CEP-CONEP) em 1996, têm sido historicamente informadas pela prática biomédica e pela pesquisa clínica (Falcão, 2019FALCÃO, H. “Burocracia da ética”: uma análise antropológica sobre a regulação na prática da pesquisa científica no Brasil. Tese (Doutorado em Antropologia) – Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2019. ; Bosi, 2015 BOSI, M. Problematizando o conceito de risco em diretrizes éticas para pesquisas em ciências humanas e sociais na Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 9, p. 2675-2682, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232015209.11392015
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; Harayama, 2011HARAYAMA, R. Do ponto de vista do sujeito da pesquisa: evento e cultura material em um Comitê de Ética em Pesquisa. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. ). Essa percepção tem resultado na prática relativamente regular de colocar projetos de pesquisa de cientistas sociais em situação de “pendência”, ainda que a maioria desses estudos envolva metodologias que não são invasivas nem colocam em risco a integridade física, psicológica ou social dos participantes, tais como a observação participante e a realização de entrevistas. Nesse cenário, emergem também tensões sobre o modelo contratual envolvendo os tipos de autorização solicitadas e cedidas por esses órgãos que, sob o argumento de proteger os interesses dos participantes, desconsideram aspectos socioculturais importantes que atravessam a sociedade brasileira como um todo, bem como as particularidades ligadas a certos campos de pesquisa e as estratégias metodológicas da antropologia e das ciências humanas e sociais (CHS) em saúde (Víctora et al., 2004VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004. ; Fleischer; Schuch, 2010FLEISCHER, S.; SCHUCH, P. Ética e regulamentação na pesquisa antropológica. Brasília: Letras Livres, 2010. ; Duarte, 2015 DUARTE, L. F. D. A ética em pesquisa nas ciências humanas e o imperialismo bioética no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 3, n. 5, p. 29-52, 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.20336/rbs.90
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).

Neste artigo discutimos como, a partir de compreensões diversas sobre a noção de “risco” e sua tipificação, e de um ideário contratual da relação de pesquisa pautado na ideia de “autorização”, se produz a “pendência”, categoria nodal de avaliação dos comitês de ética. As tentativas de fixação de modelos para essas três categorias esbarram na complexidade envolvida no trabalho de campo, quando este é formado por diferentes atores, com interesses distintos e por vezes conflituosos, como comumente observado em instituições totais perpassadas por intricadas relações de poder, especialmente no campo da saúde. Nossa intenção não é se opor à avaliação dos aspectos éticos envolvidos na pesquisa com seres humanos, mas sim evidenciar como o argumento da ética pode e vem sendo utilizado como mecanismo de controle da área biomédica sobre outros campos do conhecimento.

Para construir nosso argumento, nos baseamos tanto nos debates sobre a ética em pesquisa, de modo geral, bem como em situações específicas observadas em nossa prática como pesquisadora/res, orientadora/res, membros de CEP e/ou de grupos de trabalho da CONEP. Assim, as reflexões que orientam esse texto se ancoram em material de nossa prática profissional, cuja dispensa de avaliação pelo sistema CEP-CONEP se justifica com base no Artigo 1º da Resolução 510/2016, em seu parágrafo único que trata dos casos de não registro e não avaliação pelo sistema CEP-CONEP, especificamente o item VII que justifica a dispensa para “pesquisa que objetiva o aprofundamento teórico de situações que emergem espontânea e contingencialmente na prática profissional, desde que não revelem dados que possam identificar o sujeito”. Com esse preceito ético em mente, não mencionamos estado ou região onde se localizam as instituições, o nome delas ou dos pesquisadores envolvidos nas situações que analisamos, mantendo com isso o compromisso do anonimato que a resolução prevê.

O controle ético nas (ou das?) pesquisas com seres humanos: breve histórico

A discussão sobre os limites éticos da pesquisa científica e sua ação sobre outros seres, humanos ou não humanos, é antiga. Os dilemas morais sobre a dissecação de cadáveres para fins de pesquisa sobre o funcionamento do corpo humano se estendem até o século XVI quando passa a ser autorizada pela Igreja. Quanto às pesquisas com não humanos, já no século XIX surgem associações protetoras dos animais questionando o uso desses em pesquisas (Kottow, 2008 KOTTOW, M. História da ética em pesquisa com seres humanos. RECIIS, Manguinhos, v. 2, Supl. 1, p. 7-18, 2008. DOI: https://doi.org/10.3395/reciis.v2i0.863
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). No entanto, será apenas em meados do século XX que emerge de forma contundente a necessidade de formulação de normas e códigos de conduta para pesquisa científica, especialmente envolvendo seres humanos.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, foram revelados os experimentos médicos realizados com humanos em universidades alemãs, institutos de pesquisa e nos campos de concentração nazistas, a partir de pesquisas nas áreas da eugenia e “higiene racial”, da antropologia física e da genética (Proctor, 1988PROCTOR, R. Racial hygiene. Medicine under the Nazis. Cambridge: Harvard University Press, 1988. ). Experimentos como injeções de tinta em olhos de crianças para mudar sua cor, inseminação de mulheres com sêmen de animais, infecção proposital de doenças em pessoas de diferentes “raças”, impuseram um imperativo ético sobre a comunidade científica da época, no intuito de impedir que essas ações se repetissem (Kottow, 2008 KOTTOW, M. História da ética em pesquisa com seres humanos. RECIIS, Manguinhos, v. 2, Supl. 1, p. 7-18, 2008. DOI: https://doi.org/10.3395/reciis.v2i0.863
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). Em 1947, uma corte formada por juízes dos Estados Unidos (EUA) reuniu-se para julgar os crimes dos médicos nazistas. Ao trazer a público as atrocidades cometidas em nome da ciência, o julgamento resultou na elaboração do Código de Nuremberg (CN), um conjunto de preceitos éticos para a pesquisa clínica.

Ainda mapeando os marcos regulatórios da ética em pesquisa com seres humanos temos a Declaração de Helsinki (DH), lançada em 1964 pela Associação Médica Mundial. Diferente do CN, que estava direcionado para julgar ações de médicos realizadas durante o regime nazista, a DH foi apresentada como guia ético para o futuro das pesquisas envolvendo seres humanos. Dois anos após a DH, o médico Henry Beecher publicou o artigo “Ethics and Clinical Research” no qual analisou 22 ensaios clínicos realizados nos EUA que utilizaram como cobaias presidiários, pessoas idosas internadas em asilos, crianças com deficiência intelectual e recém-nascidos, ou seja, pessoas que estavam impossibilitadas de se opor a um experimento de pesquisa (Diniz; Correa, 2001DINIZ, D; CORREA, M. Declaração de Helsinki: relativismo e vulnerabilidade. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 17, n. 3, p. 679-688, 2001. ).

A existência do CN, da DH e as evidências trazidas pelo artigo de Beecher, no entanto, não impediram que pesquisas com sérios problemas éticos continuassem a ser realizadas nos EUA. Um exemplo marcante foi o Estudo Tuskegee, realizado entre os anos 1930-1970, que investigou os efeitos da sífilis em homens negros, sendo deliberadamente negado a eles o uso da penicilina. A partir do escândalo público, o governo e o congresso norte-americano constituíram, em 1974, uma comissão nacional para identificar os princípios éticos básicos que deveriam conduzir a experimentação em seres humanos, o que ficou conhecido como Relatório Belmont (RB), lançado em 1978. Os princípios definidos foram: (a) o princípio do respeito às pessoas; (b) o princípio da beneficência; e (c) o princípio da justiça, que posteriormente formaram a base para o desenvolvimento da Teoria Principialista (TP) na bioética.

A TP está baseada em quatro princípios. O primeiro é o da autonomia que diz que todo ser humano deve ser livre para decidir sobre o que é melhor para si, não podendo ser coagido a tomar decisões que firam seus interesses; o segundo princípio é o da beneficência, que define que a finalidade do desenvolvimento da ciência deve estar em promover o conforto e o bem-estar dos seres humanos; o terceiro princípio é o da justiça, segundo o qual os seres humanos são iguais desde seu nascimento, não lhes podendo ser negado qualquer tratamento ou assistência em função de discriminação oriunda de seu status social, raça ou qualquer outro fator subjacente à sua identidade; e o quarto princípio, que se desdobra do segundo, seria o da não maleficência, que determina a obrigação de não infligir dano intencionalmente a alguém.

No entanto, Diniz e Guilhem ( 2002DINIZ, D; GUILHEM, D. O que é bioética? São Paulo: Braziliense, 2002. ) destacaram a impossibilidade do estabelecimento de princípios éticos universais legítimos que comportem o pluralismo entre pessoas com culturas e moralidades distintas. As autoras propuseram o reconhecimento de diferentes bioéticas que abarcassem as diferenças e promovessem a tolerância como requisito à mediação dos conflitos sobre os quais a bioética se debruça. Tais críticas, levantadas contra o potencial essencializante que permeia a bioética, não pretendeu defender a inexistência de princípios éticos que possam ser compartilhados universalmente em relação à pesquisa com seres humanos, mas sim sua transposição sem mediações para diferentes contextos culturais e áreas de conhecimento. Nesse sentido, pesquisadores sociais têm se posicionado criticamente com relação às constantes tentativas da indústria farmacêutica de flexibilizar as declarações e normativas éticas com objetivo último de explorar as vulnerabilidades das populações investigadas, e não fortalecer sua proteção (Diniz; Correa, 2001DINIZ, D; CORREA, M. Declaração de Helsinki: relativismo e vulnerabilidade. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 17, n. 3, p. 679-688, 2001. ).

Como é possível depreender desse breve panorama histórico sobre a construção de normativas e reflexões sobre a ética em pesquisa com seres humanos, todas resultaram de preocupações suscitadas diante de abusos cometidos na prática de pesquisas biomédicas, das quais algumas causaram danos irreversíveis e mesmo fatais aos participantes.

No Brasil, a primeira normativa nacional sobre ética em pesquisa se dá com a entrada em vigor da Resolução 196, de 1996, elaborada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), que instituiu a CONEP, principal instância reguladora responsável pela gestão dos CEPs em todo Brasil. Atualmente, há mais de 850 CEPs espalhados pelos 26 estados da federação e o Distrito Federal, concentrados particularmente em São Paulo.

A Resolução 196/1996 pretendeu cobrir toda a pesquisa envolvendo seres humanos, embora fosse dirigida, em sua essência, às pesquisas clínicas e experimentais na área biomédica. Inicialmente a resolução foi ignorada pela maioria das/os pesquisadoras/res das CHS, postura motivada, em parte, pela falta de diálogo com a comunidade científica durante sua elaboração. Contudo, em pouco tempo, foi possível sentir os impactos de sua imposição aos nossos projetos de pesquisa.

Comitês de Ética em Pesquisa no Brasil: reações da antropologia ao imperialismo bioético

Os entraves impostos às pesquisas em CHS foram sentidos quase imediatamente pelas/os pesquisadoras/res com temáticas de investigação social ligadas ao campo da saúde, especialmente quando essas exigiam trabalho de campo em instituições hospitalares. Nesse contexto, as/os pesquisadoras/res da antropologia da saúde foram o grupo mais impactado, e também o mais reativo às normativas do sistema CEP-CONEP, questionando sua orientação biocêntrica e a percepção protocolar sobre a ética em pesquisa (Víctora et al. 2004VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004. ). Em outra ponta, as/os pesquisadoras/res da etnologia indígena também foram afetados, uma vez que a Resolução 196 previa que qualquer pesquisa com populações indígenas deveria ser submetida à avaliação da própria CONEP.

Na década de 1980, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) elaborou seu Código de Ética e criou internamente uma Comissão de Ética, embora a discussão sobre o tema já fosse notada décadas antes. Acostumados por seu ofício a lidar com populações vulnerabilizadas e estigmatizadas, as/os antropólogas/os estavam habituadas/os a discutir a ética em suas pesquisas e a colaborar com instâncias governamentais para proteção dos direitos de povos indígenas, trabalhadores urbanos, camponeses e minorias sociais. O tema escolhido pela ABA para o biênio 2000-2002 foi Antropologia e Ética, quando a questão foi abordada em diversas atividades na 23a. Reunião Brasileira de Antropologia, realizada em 2002. Como resultado, foi publicado livro da ABA trazendo uma série de reflexões críticas sobre o modo como a ética em pesquisa estava sendo controlada pela visão normativa da biomedicina, em detrimento das demais áreas (Víctora et al., 2004VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004. ).

Desde então, junto a pesquisadores de outras áreas, membros da ABA têm atuado para promover mudanças no sistema CEP-CONEP que considerem as especificidades da pesquisa socioantropológica. Em 2011, a ABA apresentou uma moção durante o 35º Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), na qual reconhecia a importância da avaliação sobre os aspectos éticos que a Resolução 196 promovia, mas chamava a atenção para que sua abrangência estivesse restrita às pesquisas no campo biomédico. A moção trazia duas proposições: a primeira voltada para a denúncia da “situação anômala, injustificável e insustentável da subordinação das pesquisas de ciências sociais e humanas à referida Resolução”; e a segunda solicitava a elaboração de regulamentação específica para as CHS, contando com a participação de pesquisadores dessas áreas a partir do Ministério da Ciência e Tecnologia, e não do Ministério da Saúde (Sarti; Duarte, 2013SARTI, C; DUARTE, L. F. D. Antropologia e ética: desafios para a regulamentação. Brasília, DF: ABA Publicações, 2013. ). A moção foi encaminhada à consulta pública aberta pelo CNS para revisão da Resolução 196/1996.

Em 2012, a Resolução 196 foi substituída pela Resolução 466. Embora o novo documento não atendesse nossas demandas, sendo dirigida a todas as pesquisas com seres humanos e continuando a operar com a lógica das pesquisas biomédicas, previa, ao menos, a construção de uma resolução específica para as CHS, o que parecia finalmente acenar para o reconhecimento das especificidades e da autonomia desse campo de conhecimento. Em 2013, foi criado um Grupo de Trabalho (GT) para elaborar essa resolução, formado por pesquisadores de várias disciplinas das CHS, o que resultou na Resolução 510, publicada em 2016.

Como bem notado por Duarte ( 2015 DUARTE, L. F. D. A ética em pesquisa nas ciências humanas e o imperialismo bioética no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 3, n. 5, p. 29-52, 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.20336/rbs.90
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), um dos antropólogos envolvidos no GT que elaborou a nova resolução, a conquista desta não foi fácil. A primeira minuta apresentada pelo GT, ainda em 2014, foi amplamente criticada pela plenária da CONEP. Apropriando-se da ideia de um “imperialismo ético”, Duarte desloca o termo para:

a denúncia do etnocentrismo intercultural na direção do etnocentrismo interdisciplinar: as CHS são tratadas como áreas de colonização, onde qualquer resistência à nova ordem bioética parece dar apenas testemunho de uma suposta ignorância e inconsciência – ou seja, um ‘imperialismo bioético’

(Duarte, 2015 DUARTE, L. F. D. A ética em pesquisa nas ciências humanas e o imperialismo bioética no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 3, n. 5, p. 29-52, 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.20336/rbs.90
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, p.42).

Nesse sentido, pensamos ser oportuno considerar a categoria do risco que norteia as avaliações dos projetos submetidos ao sistema CEP-CONEP pelas lentes das ciências sociais, uma vez que esse conceito situa-se em relação aos contextos socioculturais onde é definido e é parte central das avaliações dos protocolos de pesquisa pelos CEPs.

O risco como categoria sociológica

Bosi ( 2015 BOSI, M. Problematizando o conceito de risco em diretrizes éticas para pesquisas em ciências humanas e sociais na Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 9, p. 2675-2682, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232015209.11392015
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) mostra que o conceito de risco pode ser abordado por duas perspectivas distintas no campo da saúde coletiva: uma quantificável, ligada à probabilidade e a modelos bioestatíscos, própria da área de epidemiologia; e outra qualitativa, dizendo respeito à incerteza na qual fatores subjetivos e dinâmicas sociais são considerados na definição do risco e de como ele é percebido socialmente. Bosi sublinha como a valorização da precisão, da exatidão e da previsibilidade, que orienta a definição de risco na epidemiologia, obscurece as complexidades presentes nos fenômenos de saúde e doença, pois estes envolvem experiências individuais e interações sociais, marcadas por imprevisibilidade e processos impossíveis de serem totalmente mensurados. Nesse sentido, é necessário colocar o conceito de risco em perspectiva, questionando o caráter rígido e fixado que lhe foi dado pela perspectiva matemática da epidemiologia, para entendê-lo como categoria sociológica, polissêmica e historicamente situada.

Na formação das ciências sociais nas décadas finais do século XIX, o que entendemos atualmente como “risco” não se constituía como questão teórica evidente. Em geral, risco parecia subentendido na discussão das interdições de práticas sociais e rituais que envolveriam “tabu”, portanto, perigo e medo diante do inesperado, do sobrenatural ou do incontrolável. No século XX, podemos citar o livro de Mary Douglas ( 1990DOUGLAS, M. Pureza e Perigo. São Paulo: Perspectiva, 1990. ) como seminal para discussões mais recentes sobre risco. Douglas tinha como preocupação teórica entender as ideias de poluição, sujeira, impureza, perigo, doença, descontrole e desordem como elementos de um sistema simbólico mais abrangente, que articula outras ideias-força, em termos opostos e complementares, tais como pureza, segurança, saúde, controle e ordem. Todo povo tem ideias e significados próprios para pensar tais categorias e modos de classificação. As ritualizações mais variadas de limpeza e sujeira, pureza e impureza se caracterizam também por sua “carga simbólica” e sua dimensão moral, no sentido de gerar pressão societária sobre as pessoas, garantindo a manutenção de uma ordem social. Por isso, caracteriza-se também por estabelecer controles sobre os limites, as separações entre aquilo (seres, pessoas, objetos, ações, pensamentos) entendido como limpo, puro, saudável, seguro e ordenado e o seu oposto.

Mas o que dizer em relação à ciência e, em particular, da ética no fazer científico? Visões do que é perigoso e arriscado não são uniformes nem homogêneas, nem mesmo em grupos de especialistas (cientistas, profissionais e gestores de políticas públicas). Há uma relação complexa entre conhecimento e desconhecimento sobre riscos, pois eles podem ser potencializados em searas e esferas que alguém desconhece. Há todo um conjunto de teorias sobre “avaliação de riscos” ( risk evaluation , risk assessment ). Todavia, certos modos de prevenção de risco para uns podem também causar riscos para outros. Assim, “aceitabilidade de risco é sempre uma questão política” (Douglas; Wildavsky, 1982DOUGLAS, M.; WILDAVSKY, A. Risk and Culture. Berkeley: University of California Press, 1982. , p. 4). Douglas propõe uma abordagem cultural do risco e da visão coletiva que produz conhecimento e consenso sobre ele, ou seja, como as pessoas chegam a um consenso cultural de que se deve evitar alguns riscos e não outros?

Lupton ( 1999LUPTON, Deborah. Risk. Londres: Routledge, 1999. ) sugere que o modo como entendemos os riscos nas sociedades ocidentais contemporâneas seria bastante particular devido à constituição da modernidade, o que teria provocado significados específicos do que seria risco, sobretudo com a preocupação com a técnica e o controle do mundo físico. A modernidade se baseia na premissa de que a humanidade é capaz de adquirir o conhecimento objetivo do mundo através do pensamento racional e da ciência. Isso implicou que risco passasse a ser entendido por significados de objetividade e tecnicalidade, ligado às probabilidades de eclosão de um evento. Assim, é por meio do conhecimento científico que a possibilidade de risco pode ser controlada, pois a racionalidade é determinante no entendimento do risco. O risco não será apenas definido como uma causa natural per se , mas sim apresentado e detectado por meio de procedimentos de base científica que podem ser controlados.

Pautada pela visão de instituições governamentais e científicas, a distinção entre conhecimento especializado e leigo sobre o risco sugere que há diferença entre critérios objetivos e subjetivos de se entender o risco. Assim, o conhecimento técnico-científico é validado por uma posição cultural e socialmente dominante e pela autoridade que lhe é conferida nos circuitos de produção técnico-científica. As teorias e explicações mantidas por pessoas e grupos sociais que estão à parte das esferas de produção dessa forma de conhecimento acabam por serem caracterizadas como senso comum, ou simplesmente como ignorância ou “falta de informação”. Segundo Lupton ( 1999LUPTON, Deborah. Risk. Londres: Routledge, 1999. ), tal perspectiva assume que a pessoa não informada pode tomar decisões corretas, desde que ela possua conhecimento racional sobre o que lhe causa risco. Assim, impõe-se um modelo unilinear entre a etapa de falta de conhecimento e a fase em que conhecimento é adquirido.

Contudo, as perspectivas socioculturais do risco (Douglas; Wildavsky, 1982DOUGLAS, M.; WILDAVSKY, A. Risk and Culture. Berkeley: University of California Press, 1982. ) não diferenciam senso comum, conhecimento leigo e conhecimento técnico-científico, pois todos são constituídos historicamente e definidos por fatores sociais e simbólicos. Pode-se pensar que o risco passa a ser considerado em termos de uma maior ou menor mediação cultural, isto é, se o que é entendido como risco tem ou não tem a natureza, ou a objetividade, de um risco ou ameaça real.

É preciso salientar que a problemática do risco coexiste com o tema das “vulnerabilidades” e passaram a compor um idioma específico que contempla as mais diversas questões, o que mostra os dilemas das sociedades contemporâneas em relação aos projetos individuais e às mobilizações coletivas. A ideia de vulnerabilidade passou a ser empregada de modo mais corrente a partir de 1990. Com ela, há uma maior preocupação com os aspectos e desigualdades socioeconômicas, em especial, mas não exclusivamente, pois deve-se considerar marcadores sociais da diferença, tais como gênero/sexualidade, etnia/raça, geração/idade. Há, assim, um distanciamento da ideia abstrata de risco em prol de uma visão das vulnerabilidades resultantes de condições sociais e econômicas. As vulnerabilidades são, portanto, mais frequentemente diferenciadas, desiguais e acumulativas (Acosta, 2005ACOSTA, V. El riesgo como construcción social y la construcción social de riesgos. Desacatos, [s. l.], n. 19, p. 11-24, 2005. ), sem cair na armadilha que uma ideia individualista da percepção de risco pode acarretar. Neste sentido, no campo da saúde, o conceito emerge como alternativa analítica que tensiona a percepção mais rígida do conceito de risco, presente na abordagem epidemiológica, embora também possa, na prática, ser mobilizado para reforçar essa perspectiva, como veremos adiante.

A tipificação da pesquisa: da gradação de risco aos fatores de modulação

Como dito acima, o debate sobre as especificidades das pesquisas em CHS, e seus desdobramentos no processo de avaliação ética desse tipo de investigação, culminou na elaboração da Resolução 510/2016. O artigo 21 da resolução indica a necessidade de outra resolução específica para regular os riscos previstos nas pesquisas sociais com seres humanos, que “será graduado nos níveis mínimo, baixo, moderado ou elevado, considerando sua magnitude em função de características e circunstâncias do projeto, conforme definição de Resolução específica sobre tipificação e gradação de risco e sobre tramitação dos protocolos” (Brasil, 2016 BRASIL. MINISTERIO DA SAÚDE-CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais. Brasília, DF, Diário Oficial da União, 2016. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/images/comissoes/conep/documentos/NORMAS-RESOLUCOES/Resoluo_n_510_-_2016_-_Cincias_Humanas_e_Sociais.pdf . Acesso em: 28 abr. 2024.
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).

Seis anos depois, após trinta reuniões em GT da CONEP, formado por mais de dez pesquisadores/ras que se reuniram regularmente entre 2017 e 2021, a mencionada resolução sobre gradação de risco foi promulgada. Os integrantes do GT eram graduados em farmácia, biologia, medicina, engenharia, direito, psicologia e ciências sociais, com pós-graduações variadas também, embora a maior parte deles fosse da área biomédica.

A Resolução 674/2022 estabelece a tramitação dos protocolos de pesquisa científica envolvendo seres humanos no sistema CEP-CONEP, conforme a tipificação da pesquisa, definida na resolução como o “processo pelo qual se define o tipo da pesquisa, baseando-se no delineamento do estudo e nos procedimentos da pesquisa”, e os fatores de modulação, definidos como as “características do processo de consentimento, da confidencialidade e/ou dos métodos da pesquisa que possam modificar o tipo de tramitação do protocolo no Sistema CEP-Conep” (Brasil, 2022 BRASIL. MINISTERIO DA SAÚDE-CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE. Resolução nº 674, de 6 de maio de 2022. Dispõe sobre a tipificação da pesquisa e a tramitação dos protocolos de pesquisa no Sistema CEP/Conep. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2022. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/images/Resolucao_674_2022.pdf . Acesso em: 28 abr. 2024.
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).

A Resolução 674/2022 prevê quatro formas de avaliação de projetos de pesquisa, três tipos de pesquisa e duas maneiras de definir “fatores de modulação”, segundo Silva ( 2023 SILVA, M. Relato de experiência sobre a participação em um Grupo de Trabalho da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Práxis Educativa, Ponta Grossa, v. 18, e21425, 2023. DOI: https://doi.org/10.5212/PraxEduc.v.18.21425.039
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), um eufemismo de gradação de risco. Além da avaliação em colegiados, forma tradicional de avaliar projetos de pesquisa, foram acrescentadas três outras novas formas de avaliação: (1) colegiada especial, em CEPs específicos, com autorização da CONEP para tramitar projetos de pesquisa que antes eram direcionados exclusivamente à CONEP; e (2) simplificada, sem passar pelo colegiado do CEP e com parecer elaborado por integrante das CHS e (3) expressa, também sem passar pelo colegiado do CEP, envolvendo checagem do preenchimento de formulário específico. As pesquisas foram classificadas em três tipos: A, B e C, para que possam tramitar nessas quatro modalidades acima descritas, sendo definidos como: (A) pesquisas que visam descrever ou compreender fenômenos que aconteceram ou acontecem no cotidiano, não havendo intervenção no corpo humano; (B) pesquisas que visam descrever ou compreender fenômenos que acontecem no cotidiano, havendo intervenção física no corpo humano; e (C) pesquisas que visam verificar o efeito de produto ou técnica em investigação, deliberadamente aplicado no participante em virtude da pesquisa, de forma prospectiva, com grupo controle ou não. Finalmente, quinze fatores de modulação de risco são definidos na resolução de acordo com as características do processo de consentimento e confidencialidade, e dos métodos da pesquisa. Nota-se que a Resolução 674/2022 não gradua risco explicitamente.

O GT da CONEP criou novas categorias para graduar os riscos – os fatores de modulação – e instalou princípios de visão e divisão do mundo social (Bourdieu, 1989BOURDIEU, P. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. ) – os tipos de pesquisa, com base em seu objetivo, ou seja, no que os estudos “visam”. Um dos debates mais acalorados no processo de tipificação se deu em torno do tema “vulnerabilidade”, já que um dos fatores de modulação apresentados no primeiro esboço da resolução dizia respeito não só às características dos métodos de pesquisa, do processo de consentimento e confidencialidade, como também dos próprios participantes da pesquisa, muitas vezes considerados “populações vulneráveis”.

Um dos integrantes do GT, diante da proposta de gradação de risco presente na Resolução 510/2016, rejeitou essa classificação dizendo que seria inviável considerar qualquer estudo conduzido na Favela da Rocinha como de risco mínimo, pois nesta comunidade carioca a violência é cotidiana. Outros integrantes preocuparam-se com as pesquisa nas ditas “áreas sensíveis”, como as que tematizam suicídio, depressão e práticas ilegais bem como envolvendo povos indígenas aldeados. Passaram a transformar suas preocupações em fatores de modulação, ou seja, toda vez que um elemento do projeto de pesquisa suscitasse a necessidade de proteger o participante, atribuía-se a ele um fator de modulação, fenômeno convergente com a proposta “no sentido de identificar novas modalidades de danos, por vezes invisíveis, sutis, mas não menos nociva” (Bosi, 2015 BOSI, M. Problematizando o conceito de risco em diretrizes éticas para pesquisas em ciências humanas e sociais na Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 9, p. 2675-2682, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232015209.11392015
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, p. 2680). Quando um deles apresentou um projeto de pesquisa sobre aleitamento materno, consideraram o fato do estudo ser conduzido em uma unidade de saúde um fator de modulação para definição do risco. Diante da pergunta “e se ele fosse desenvolvido fora da unidade?”, a resposta foi: “Depende [silêncio]. Se for uma comunidade pobre também é um fator de modulação”. Ou seja, o local em que o participante de pesquisa reside, seu diagnóstico, etnia e renda, são considerados fundamentais para avaliar um projeto de pesquisa de uma perspectiva ética, apontando para a necessidade de protegê-lo, de maneira que os estudos com pessoas consideradas parte das chamadas “populações vulneráveis” preocupavam os integrantes do GT.

Ademais, sugeriu-se acrescentar a vulnerabilidade do pesquisador como fator de modulação, utilizando como exemplo os estudos em penitenciárias. Um dos integrantes, por outro lado, chamou atenção para o fato de que “não se deve cristalizar as coisas”, que não é porque se encontra em situação de encarceramento que sempre a pessoa estará em situação de vulnerabilidade. Na proposta constam os termos “pessoa em desvantagem social” para se referir às ditas “populações vulneráveis”, bem como “pessoas com capacidade de consentimento diminuída” ou, ainda, com autonomia “ausente ou prejudicada”. A TP guiava grande parte dessa discussão sobre a vulnerabilidade do participante de pesquisa como fator de modulação, essencializando o fenômeno com base no princípio da autonomia. Um fantasma rondava esse conjunto de avaliadores de projetos de pesquisa: a possibilidade de um pesquisador ocultar que os sujeitos se encontram em condição de vulnerabilidade. Ao mesmo tempo, se um estudo vai exclusivamente observar crianças em sala de aula, o procedimento – observação – suspenderia a preocupação com o tipo de participante de pesquisa – criança – da perspectiva de um dos integrantes do GT.

Os integrantes do GT estavam caindo na cilada denunciada pelos principais especialistas no tema da vulnerabilidade no país, segundo os quais “a vulnerabilidade é sempre relacional. Então, na verdade, seria mais adequado a gente pensar em relações de vulnerabilização do que em populações vulneráveis” (Castellanos & Baptista, 2018 CASTELLANOS, M.; BAPTISTA, T. Entrevista com José Ricardo Ayres. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 27, n. 1, p. 51-60, 2018. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902018000002
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, p. 58). Nesse sentido, a Resolução 674/2022 aponta para uma saída desse beco em seu artigo 12 ao afirmar, enfim, que “as características do participante de pesquisa, em si, não constituem fator de modulação”.

Autorização, autoritarismo e a produção da pendência

Ao considerarmos as pesquisas antropológicas sobre saúde e doença, sobretudo aquelas realizadas em instituições e serviços de saúde, deve-se concordar com Heilborn ( 2004HEILBORN, M. L. Antropologia e saúde: considerações éticas e conciliação multidisciplinar. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004, p. 57-64. ) de que o fato de antropólogos atuarem em um campo multidisciplinar agrega mais um aspecto aos dilemas éticos em suas pesquisas. Assim, o campo da saúde conforma certas injunções ao trabalho antropológico. Elas derivam tanto das regulações estabelecidas pela CONEP/Ministério da Saúde como também das condições esperadas por agências financiadoras internacionais, revistas acadêmicas, por exemplo, que exigem que o “protocolo de pesquisa” passe por um CEP e contemplem um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Antropólogos/as como Duarte ( 2004DUARTE, L. F. D. Ética de pesquisa e ‘correção política’ em Antropologia. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004. p. 125-130. , 2015 DUARTE, L. F. D. A ética em pesquisa nas ciências humanas e o imperialismo bioética no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, Porto Alegre, v. 3, n. 5, p. 29-52, 2015. DOI: http://dx.doi.org/10.20336/rbs.90
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) e Heilborn ( 2004HEILBORN, M. L. Antropologia e saúde: considerações éticas e conciliação multidisciplinar. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004, p. 57-64. ), apesar de concordarem com o estabelecimento de diretrizes e regulamentação em pesquisa, salientam que seus parâmetros seguem crucialmente o modelo biomédico. Há, então, relações de força no âmbito do campo disciplinar e científico que institui o saber biomédico como parâmetro geral a ser acompanhado. Assim, o conhecimento das CHS pode ser estranho e duvidoso aos praticantes que atuam nessa área. Como estabelecer diálogo e acordo entre “lógicas e éticas distintas”? (Heilborn, 2004HEILBORN, M. L. Antropologia e saúde: considerações éticas e conciliação multidisciplinar. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004, p. 57-64. , p. 58). Há, portanto, impasses ao se articular características processuais da pesquisa etnográfica e as “determinações político-burocráticas” da CONEP, em particular porque há a “pretensão de normativizar sobre campos disciplinares a partir de uma única visão”, pautada no “universalismo (preocupante) da área da saúde” (Heilborn, 2004HEILBORN, M. L. Antropologia e saúde: considerações éticas e conciliação multidisciplinar. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004, p. 57-64. , p. 61).

Estas questões críticas apareceram nitidamente no processo de avaliação de uma pesquisa de doutorado defendida recentemente. A fim de controlar o anonimato dos atores envolvidos, não daremos detalhes sobre o local e tema da pesquisa. Para o propósito de nossa análise cabe apenas destacar que se tratava de uma pesquisa de abordagem socioantropológica, na qual a coleta de dados se daria por meio de entrevistas e observação participante em contexto hospitalar e em uma associação de pacientes.

A pessoa que estava conduzindo o estudo enfrentou uma série de impasses, por um lado, característicos do processo burocrático para a realização de sua pesquisa e, por outro, originados na dinâmica societária que envolve o próprio processo, que não é simplesmente técnico, mas também político-moral no que tange às disputas de definição e compreensão do que seja efetivamente “ético”, e no que se refere às hierarquias entre os saberes acadêmicos no campo científico. Em relação à ética, deve-se reconhecer, portanto, que não se trata de um significado e valor consensual, pois há relatividade histórica e social quanto à sua definição e no que consiste sua esfera moral, cujos limites ao invés de abstratos, na verdade expõem diversidade de perspectivas e heterogeneidade conceitual (Figueiredo, 2004FIGUEIREDO, V. Ética e ciência: comissões de ética em pesquisa científica. In: VÍCTORA, C.; OLIVEN, R. G.; MACIEL, M. E.; ORO, A. P. (org.). Antropologia e Ética. O debate atual no Brasil. Niterói: EdUFF, 2004. p. 113-118. ) e, assim, tensões, antagonismos e decisões políticas do que pode ou não pode ser feito em pesquisa, conforme as ciências em questão.

Antes de cadastrar sua pesquisa na Plataforma Brasil (PB), a pessoa que conduziu o estudo buscou orientação sobre os documentos a serem anexados e as informações que seriam necessárias para subsidiar o aceite de seu projeto. Em paralelo, conversou também com docentes, incluindo quem a estava orientando, mas igualmente colegas discentes do seu programa de pós-graduação, com experiência prévia nesse processo. Além disso, buscou também o CEP que subsidia os pesquisadores nesses processos em sua universidade, do qual recebeu esclarecimentos cuidadosos sobre a documentação e o preenchimento dos formulários a fim de evitar que seu projeto fosse “colocado em pendência”. A pessoa que estava conduzindo o estudo obteve com sucesso, após razoável negociação prévia do que pretendia fazer, o Termo de Anuência das duas instituições nas quais seriam captados participantes para a pesquisa e realizada a observação participante.

Cumprindo rigorosamente com a solicitação dos documentos, o projeto foi aprovado pelo CEP da universidade em sua primeira submissão e encaminhando eletronicamente para o CEP do hospital. A pessoa que estava conduzindo o estudo encaminhou também o Termo de Autorização para Uso de Documentos dos Pacientes para o CEP, o que lhe permitiria o acesso às fichas e prontuários dos pacientes, embora esse termo fosse opcional para o pesquisador, caso ele tivesse intenção de fazer um estudo dos documentos. Uma primeira resposta ocorreu por parte do gerente de ensino e pesquisa do hospital que aprovou a realização da pesquisa documental, mas ainda seria necessária a aprovação final do seu Comitê de Ética.

Outro documento também foi enviado, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que para o funcionário do CEP central da universidade era o principal motivo de “pendências éticas”. A partir de um modelo característico das pesquisas biomédicas, foi preciso considerar e apontar nesse documento sobre a “previsão de riscos”, os “procedimentos que poderão causar desconforto ao participante”, e as “medidas que o pesquisador fará para amenizá-lo”. A pessoa que estava conduzindo o estudo especificou que o interlocutor da pesquisa poderia passar por algum “desconforto emocional durante as entrevistas” e, assim, ele seria orientado a buscar o serviço de assistência psicológica da universidade.

Ao analisar pareceres elaborados sobre projetos de pesquisa de um CEP de uma universidade, Ferreira ( 2022 FERREIRA, J. Comitê de ética em pesquisa com seres humanos do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da UFRJ: reflexões antropológicas sobre as principais pendências. Revista de Gestão e Avaliação Educacional, Santa Maria, v. 11, n. especial, e72324, 2022. DOI: https://doi.org/10.5902/2318133872324
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) mostrou o grande número de pendências apresentadas que impediam o início das pesquisas. No caso do estudo no qual estamos nos detendo, o parecer do CEP do hospital justificava duas pendências no projeto de pesquisa que a pessoa que estava conduzindo o estudo deveria resolver em trinta dias para que ele fosse finalmente aceito, uma delas relacionada à redação do TCLE. A segunda pendência, sobre a qual desejamos refletir, demandava que o projeto incluísse um membro do ambulatório do hospital universitário como participante da equipe de pesquisadores. O médico que conduzia esse ambulatório havia sinalizado anteriormente o interesse em ser coautor de artigos que fossem eventualmente publicados. A “pendência” causou estranheza, pois supunha a inclusão de um médico em uma pesquisa antropológica de uma pessoa candidata ao doutoramento, cujo produto final seria uma tese e não envolvia um projeto mútuo de investigação científica.

A pessoa que estava conduzindo o estudo respondeu dentro do prazo às solicitações do CEP do hospital, salientando que a inclusão de um médico como membro da equipe da pesquisa criava um paradoxo para o projeto, pois havia diferenças nos objetivos e metodologias das pesquisas sociais e culturais em saúde em relação às pesquisas biomédicas voltadas a resultados clínicos em humanos. Além disso, destacava que o médico em questão fazia parte do conjunto de interlocutores a serem entrevistados por conta, sobretudo, de sua posição singular e socialmente relevante nas dinâmicas societárias entre médico e paciente em um serviço de saúde, o que iria comprometer o sentido de objetivação metodológica nas ciências sociais. Havia também um grave dilema ético ao se ter na equipe como pesquisador o próprio médico que atende a usuários de um ambulatório em que ele próprio seria o profissional de saúde responsável por seu tratamento. Desse modo, a “pendência” era especialmente complexa, pois significava a necessidade da supervisão por um médico, em posição chave nas relações de autoridade e poder em um espaço hospitalar, de uma pessoa candidata ao doutoramento em uma área distinta da sua, a das ciências sociais, o que evidencia a hierarquização de saberes científicos, mesmo dentro da mesma universidade, legitimando uma área e subordinando outra. A pessoa que estava conduzindo o estudo complementou, em sua resposta, que não pretendia mais fazer pesquisa documental nos prontuários dos usuários do serviço, restringindo sua pesquisa à observação das consultas.

O parecer final do CEP informou que o TCLE fora aceito após as modificações solicitadas, mas o projeto foi rejeitado em definitivo, sugerindo a sua resubmissão às comissões de ética. Segundo a justificativa do parecer, a desaprovação foi causada pelo fato de não se ter a presença de um médico do serviço responsável pelo acesso, guarda e zelo ético dos dados contidos no prontuário do paciente, ainda que na resposta ao primeiro parecer já houvesse sido enfatizado que não mais se pretendia consultar os prontuários.

Em paralelo, houve igualmente uma reviravolta nos contatos feitos antes pela pessoa que estava conduzindo o estudo com o médico que exigiu sua participação como “membro da equipe de pesquisa”. De uma relação amistosa, na etapa preliminar de investigação, o contato se deteriorou ao ponto do médico se afastar dela, afetando e comprometendo diretamente a sua pesquisa pelo receio de uma possível interferência deste profissional junto aos pacientes que seriam entrevistados e que mantinham relações de longa data com esse médico, em função de sua condição de saúde. A pesquisa foi redefinida, levando em conta o longo prazo despendido na elaboração e trâmite do projeto nos CEPs, deixando de lado a etnografia no serviço de saúde, o que seria ideal para entender as interações e significados das pessoas ali atendidas, seus familiares e os profissionais de saúde.

É possível suspeitar da dificuldade que os pesquisadores das ciências da saúde têm de compartilhar o espaço social de um hospital ou serviço de saúde com pesquisadores das ciências sociais. Mostra-se, assim, também como a razoabilidade das pendências e da averiguação dos riscos de uma pesquisa que é submetida a um CEP expõem mais o incômodo e as disputas em credibilidade e legitimidade das pesquisas qualitativas das ciências sociais, tal como a antropologia, do que, de fato, uma preocupação com a segurança dos participantes ou os aspectos éticos do estudo. No caso específico, que infelizmente não é um caso isolado, a não aprovação do projeto se deu pelo abuso de poder institucional, por meio da figura de um profissional que demandava ser inserido como parte da equipe de pesquisa de um doutorado, em área completamente diferente da sua e para a qual ele não iria contribuir com a captura dos dados, sua análise e menos ainda com a escrita da tese. Segundo Haraway ( 1995HARAWAY, D. Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, São Paulo, n. 5, p. 7-41. 1995. ), a objetividade defendida por pesquisadores de certas áreas de conhecimento serve, sobretudo, para esconder os efeitos das relações de poder e hierarquias que diferenciam certos saberes diante de outros.

Infelizmente, nossa experiência como pesquisadora/res, orientadora/res e membros de CEPs tem nos mostrado que esse não foi um evento isolado. O que esteve em jogo no caso que analisamos é a autoridade e a hierarquia de poder que se faz no CEP de um hospital (onde não há nenhum cientista social) em relação à aceitação e as cobranças feitas às pesquisas das CHS. Porém, há também uma quantidade significativa de pendências produzidas sobre os projetos de nossa área que refletem a fraca interpretação das próprias resoluções criadas pela CONEP, a baixa diversidade das áreas de formação e a falta de treinamento adequado dos membros dos CEPs, especialmente os dos serviços de saúde, sem falar no modelo atual de autorização que esbarra nas relações de poder dentro das instituições de saúde, mas também em instituições de segurança pública e empresas privadas que são resistentes a terem suas práticas investigadas.

A visão protocolar do sistema CEP-CONEP tem aberto margem para que pesquisas das CHS sejam colocadas em pendência pelos motivos mais banais, que nada têm a ver com os aspectos éticos das pesquisas. Para citar alguns exemplos pessoais nos quais nossas pesquisas foram colocadas em pendência, temos desde a ausência do número de celular da orientadora no TCLE (sendo que esta não era a pesquisadora responsável pelo estudo cadastrado na PB) até a exigência de que um estudo que seria voltado para pessoas com doenças crônicas hereditárias fosse limitado à “uma doença específica” em evidente interferência nos objetivos da pesquisa, passando ainda pela exigência equivocada de assinatura na folha de rosto da agência de fomento que fornecia uma bolsa de pós-doutorado, entendida pelo relator do projeto como financiamento de pesquisa e não do pesquisador. Nesse último caso foi necessário a intervenção da CONEP para que o projeto fosse liberado, o que resultou em quatro meses de atraso para o início da pesquisa em uma instituição de saúde. Em nenhum desses exemplos, a situação em si (ausência de um telefone, delimitação a uma doença, bolsa de estudo) estava relacionada aos aspectos éticos da pesquisa e, menos ainda, oferecia risco aos participantes.

Considerações Finais

Ao apontar para a necessidade de reformular a regulação ética de pesquisas em CHS, Bosi ( 2015 BOSI, M. Problematizando o conceito de risco em diretrizes éticas para pesquisas em ciências humanas e sociais na Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 9, p. 2675-2682, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232015209.11392015
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) propôs a ideia de “nocividade potencial” ao invés de “potencial de risco”. A autora argumenta que nocividade indica para uma “qualidade” e não para uma probabilidade, aproximando a ideia de risco de uma perspectiva qualitativa, sem perda semântica por ainda apontar para o dano potencial que pesquisas com seres humanos pode produzir, mas que nem sempre poderá ser mensurado e quantificado. Ao propor uma nomenclatura alternativa para definir risco na pesquisa social em saúde, Bosi ( 2015 BOSI, M. Problematizando o conceito de risco em diretrizes éticas para pesquisas em ciências humanas e sociais na Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 20, n. 9, p. 2675-2682, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-81232015209.11392015
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) aponta para o desafio que as/os pesquisadoras/res ainda precisam enfrentar na construção de um arcabouço sobre a ética que considere a diversidade teórica e metodológica do campo das CHS. A recente aprovação e sanção do projeto de lei 6007/2023, que fragiliza a proteção dos participantes de pesquisa e foi criticado pela própria CONEP, nos mostra que os desafios continuam e novas respostas precisam ser construídas coletivamente 11Para mais detalhes sobre a criação e aprovação desse projeto de lei, ver artigo de Castro e Falcão neste dossiê. .

A antropologia, pela natureza de sua prática de pesquisa, sempre se pautou pela negociação com os sujeitos investigados. Ser aceito pelo grupo, e com ele construir relações de confiança, é condição fundamental para o sucesso do trabalho etnográfico. Nesse processo, somos convocados a estabelecer acordos, assumir deveres e compromissos éticos com nossos interlocutores. Obviamente, não estamos alheios ao passado colonial da disciplina e suas implicações, nem ao fato de que pesquisas inicialmente bem intencionadas podem resultar em escritos que exponham os participantes a situações constrangedoras frente ao seu próprio grupo, se a reflexão ética não for constantemente exercitada. No entanto, é preciso dar melhor contorno ao que significa a proteção efetiva dos direitos dos participantes da pesquisa, uma vez que esse argumento legítimo pode ser usado para práticas de abuso de poder e controle sobre as nossas pesquisas, especialmente em ambientes oficiais de saúde, como nos casos aqui analisados.

Assim, entendemos que a avaliação ética das pesquisas com seres humanos deve ser um parâmetro constante em todas as áreas de conhecimento. Porém, ela não pode ser transformada em mecanismo de controle de uma determinada área sobre as outras sob a desculpa de proteger participantes de riscos cuja definição se pretende objetiva e universal, quando, na verdade, está ancorada em pressupostos que orientam a biomedicina, ela própria um sistema cultural que conforma certa visão de mundo na qual, infelizmente, o reconhecimento da diversidade humana e da pluralidade de saberes parece não estar devidamente contemplado.

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    Para mais detalhes sobre a criação e aprovação desse projeto de lei, ver artigo de Castro e Falcão neste dossiê.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2024
  • Aceito
    08 Ago 2024
  • Revisado
    20 Ago 2024
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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