RESENHAS BOOK REVIEWS

 

 

Henrique Sant'Anna Dias; Fernanda Nunes Marques Alves; Priscilla Caran Contarato

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. hendias@hotmail.com

 

 

ATENÇÃO BÁSICA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE: ABORDAGEM INTERDISCIPLINAR PARA OS SERVIÇOS DE SAÚDE BUCAL. Botazzo C, Oliveira MA. São Paulo: Páginas e Letras Editora e Gráfica; 2008. 292 pp.

ISBN: 978-85-86508-72-1

Este livro organizado por Carlos Botazzo e Maria Aparecida de Oliveira apresenta um compilado de 19 capítulos, fruto de seminários de pesquisa do Observatório de Saúde Bucal Coletiva do Instituto de Saúde de São Paulo. A obra tem como intuito discutir algumas relações entre a clínica odontológica e o Sistema Único de Saúde (SUS). Para tanto, relata experiências e problematiza conteúdos vivenciados no cotidiano de trabalho dos profissionais de saúde bucal, abordando, panoramicamente, assuntos que tratam de dificuldades relacionadas à implantação, gestão, informação em saúde e formação profissional no âmbito da Atenção Básica.

O capítulo 1 traz algumas considerações sobre cuidados primários em saúde e suas implicações. Com base nas conferências internacionais, discute a evolução do conceito de promoção da saúde e faz críticas quanto ao processo de adoecimento como fenômeno natural, além de conceituar e tecer comentários sobre a Atenção Básica no Brasil, no que tange à sua capacidade operativa.

O capítulo 2, por meio de um estudo de caso sobre a assistência às pessoas com lesões de pele numa equipe de saúde da família, demonstra a importância da reorganização da Atenção Básica para a implantação do SUS. Foi evidenciada a necessidade de maior capacitação e atualização dos profissionais de enfermagem, integralidade das ações e serviços, e do envolvimento das famílias por meio de maior participação na tomada de decisões para a garantia de uma maior adesão ao tratamento. Os autores realçam a importância do uso de tecnologias leves na relação profissional/usuário, de modo a atender às suas necessidades de saúde.

Nos capítulos 3, 4 e 5 são levantadas questões relacionadas à saúde bucal nas esferas de gestão do SUS. O capítulo 3 aborda a inserção da saúde bucal no processo de consolidação do SUS. Apresenta algumas considerações sobre o conceito de saúde, o histórico da saúde bucal, reflexões sobre sua forma de organização e a "mudança de modelo assistencial" na consolidação do SUS (modelo biomédico para o modelo da promoção da saúde). Enfatiza ainda, a Política Nacional de Atenção Básica e seus desafios para a gestão, e a necessidade da atenção à saúde bucal voltada para a abordagem integral aos cidadãos com ações direcionadas para promoção à saúde, prevenção de doenças, controle das patologias bucais, planejamento estratégico, levantamento de dados utilizando-se o trabalho interdisciplinar em equipe.

O capítulo 4 descreve o processo de estruturação da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, por meio da organização das ações de saúde bucal através de linhas de cuidado, assegurando o acesso universal e igualitário aos serviços de promoção, prevenção e recuperação como um direito à saúde. Aborda a necessidade de reorganização da Atenção Básica por meio de ações de planejamento das ações, monitoramento e avaliação. No capítulo 5 são descritas as ações em saúde bucal na esfera municipal pelo desenvolvimento de novas tecnologias com base na discussão realizada nos dois capítulos anteriores.

Os capítulos 6 e 7 discutem a importância da informação para a gestão, ressaltando a necessidade de um sistema de informação de qualidade que proporcione dados adequados para viabilizar ações de diagnóstico, programação, avaliação e monitoramento em saúde. Enfatizam ainda a necessidade de prover um sistema de informação sanitária com enfoque epidemiológico, de maneira a melhorar a organização das ações e serviços à saúde no Estado de São Paulo. O capítulo 7 apresenta a experiência do processo de construção, implantação e avaliação do uso do Sistema de Monitoramento e Avaliação da Atenção Básica (SisMasus) no estado. Com base nessa construção, ressalta a importância das gestões estadual e municipal na Atenção Básica, e superação do planejamento fragmentado e baseado na lógica de financiamento.

O capítulo 8, intitulado Informação em Saúde e Cidadania, problematiza a questão da informação em saúde e seu papel na sociedade para o exercício da cidadania. O autor levanta questões relacionadas à utilização da informação como recurso essencial para educação e para o estabelecimento de uma política de saúde consistente e coerente com os princípios do SUS, de modo a gerar ações transformadoras e mobilizadoras para o cuidado em saúde. Reflete sobre o uso da informação nos serviços de saúde para a conquista dos direitos sociais e construção coletiva dos processos comunicativos que favoreçam a cidadania.

No capítulo 9 são apresentados os indicadores recentemente utilizados para caracterizar a experiência de cárie e as limitações do seu uso. Por se originar de discussões de seminários, os índices são tratados de forma resumida em relação à sua construção e significado. No capítulo 10, tomando como referência o indicador CPO - que trata da contagem de dentes cariados, perdidos e obturados - é abordada a crescente melhora nos delineamentos amostrais, utilização e aprimoramento de índices e indicadores baseando-se na proposta da Organização Mundial da Saúde. A leitura desse capítulo é indicada para quem busca análise crítica e reflexão sobre o índice CPO.

A discussão acerca da cidadania e democracia, tendo como foco a participação popular, é retomada no capítulo 11 por meio da apresentação da trajetória de conformação do Programa Estadual de DST/AIDS de São Paulo. Nesse contexto, são demonstradas as mudanças ocorridas na atenção em saúde bucal com base nas transformações no quadro epidemiológico da AIDS no Brasil.

Ainda nessa temática, os capítulos 12 e 13 abordam conceitualmente as questões acerca do controle social, desde a origem do Movimento da Reforma Sanitária até o debate atual sobre as organizações sociais. Evidenciam o empoderamento e participação na gestão das políticas públicas dentro do cenário de desigualdades e precariedade no acesso à informação no país.

Os capítulos 14, 15 e 16 contemplam a temática a respeito da profissão odontológica, o mercado de trabalho, a formação profissional e o ensino em odontologia. Reafirmam a necessidade de adequação do aparelho formador em saúde à realidade do SUS, apresentando as parcerias entre o setor Saúde e a Educação como forma de consolidar as mudanças demandadas. O capítulo 15 relata ainda a experiência do Internato em Saúde Coletiva da Universidade Federal de Minas Gerais, tendo como tema central a questão do trabalho enquanto espaço fundamental na produção do saber em odontologia. Já no capítulo 16, as Diretrizes Curriculares Nacionais são objeto de discussão no âmbito da reforma curricular do ensino superior brasileiro.

Os capítulos seguintes trazem a discussão a respeito de cárie dental. O capítulo 17 aborda os fatores etiológicos da cárie e a fragilidade teórica para compreensão do objeto. Apresenta a necessidade de se buscar dentro dos modelos explicativos as lacunas existentes, com o olhar mais crítico para os resultados, e de se ultrapassar o estágio atual de uso de técnicas de mensuração. Já no capítulo 18, são discutidas as correlações do imaginário odontológico e social acerca do dentista e da profissão, por meio de uma reflexão sobre a formação científica e técnica da concepção dentária do indivíduo, que se contradiz frente ao atual formato requerido que exige a formação do profissional generalista. Ainda, é realizada uma discussão acerca da atuação do dentista pautada em incongruências das teorias odontológicas da cárie dentária, influenciada pela indústria para o biocontrole dos homens e da sociedade.

As discussões realizadas no Observatório estão presentes no relatório científico, apresentado no último capítulo, explanando os projetos e produtos desenvolvidos. Como parte dessa produção, este livro representa uma contribuição para a efetivação do papel da odontologia na Atenção Básica como pilar importante na construção do SUS. Sua leitura é recomendada para todos aqueles que participam desse processo de construção.

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br