Fatores associados à relação sódio/potássio urinária em participantes do ELSA-Brasil

Factores asociados a la excreción urinaria sodio/potasio en participantes del ELSA-Brasil

Taísa Sabrina Silva Pereira José Geraldo Mill Nagela Valadão Cade Rosane Harter Griep Rosely Sichieri Maria del Carmen Bisi Molina Sobre os autores

Resumo:

Este estudo teve por objetivo identificar os fatores sociodemográficos associados à estimativa de alta relação de consumo de sódio/potássio. Foram avaliados 15.105 participantes, de 35 a 74 anos, de uma coorte de servidores públicos (ELSA-Brasil). Dados socioeconômicos foram coletados por meio de questionário e realizada coleta urinária de 12 horas noturnas para estimar o consumo de sódio e potássio. A relação sódio/potássio foi calculada em mmol/L e dividida em tercis: 1º tercil corresponde à “baixa” relação; 2º à “intermediária” e 3º tercil à “alta” relação sódio/potássio. Foram comparadas as proporções e médias segundo as classificações do tercil da relação sódio/potássio, utilizando-se os testes de qui-quadrado e análise de variância (ANOVA). Foram testados modelos brutos e ajustados de regressão logística multinomial, tendo como referência o 1º tercil. Os fatores associados à alta relação sódio/potássio foram: sexo masculino (OR = 1,78; IC95%: 1,60-1,98); indivíduos de 35 a 44 anos (OR = 1,71; IC95%: 1,33-2,19); Ensino Fundamental incompleto (OR = 2,38; IC95%: 1,78-3,18) e menor renda (OR = 1,47; IC95%: 1,26-1,73). Verificou-se que os homens, indivíduos mais jovens e de menor escolaridade e renda apresentaram médias mais elevadas da relação sódio/potássio.

Palavras-chave:
Sódio; Potássio; Urina

Resumen:

El objetivo de este estudio fue identificar los factores sociodemográficos asociados a la estimación respecto a la alta relación de consumo de sodio/potasio. Se evaluaron a 15.105 participantes, de 35 a 74 años, dentro de una cohorte de servidores públicos (ELSA-Brasil). Se recogieron datos socioeconómicos mediante un cuestionario y se realizó una toma nocturna de orina de 12 horas para estimar el consumo de sodio y potasio. La relación sodio/potasio se calculó en mmol/L y se dividió en terciles: 1er tercil corresponde a la “baja” relación; 2º tercil a la “intermedia” y 3er tercil a la “alta” relación sodio/potasio. Se compararon las proporciones y medias, según las clasificaciones del tercil de la relación sodio/potasio, utilizando los testes de chi-cuadrado y análisis de variancia (ANOVA). Se utilizaron modelos brutos y ajustados de regresión logística multinomial, teniendo como referencia el 1er tercil. Los factores asociados a la alta relación sodio/potasio fueron: sexo masculino (OR = 1,78; IC95%: 1,60-1,98); individuos de 35 a 44 años (OR = 1,71; IC95%: 1,33-2,19); enseñanza fundamental incompleta (OR = 2,38; IC95%: 1,78-3,18) y menor renta (OR = 1,47; IC95%: 1,26-1,73). Se verificó que los hombres, individuos más jóvenes y con menor escolaridad y renta presentaron medias más elevadas en la relación sodio/potasio.

Palabras-clave:
Sodio; Potasio; Orina

Introdução

O consumo de sódio e potássio é um importante preditor de morbidade e mortalidade, e a relação entre eles tem se mostrado um preditor ainda melhor do risco de hipertensão e doenças cardiovasculares, sendo esta relação considerada mais importante do que as estimativas isoladas destes dois nutrientes 11. Yang Q, Liu T, Kuklina EV, Flanders WD, Hong Y, Gillespie C, et al. Sodium and potassium intake and mortality among US adults. Arch Intern Med 2011; 171:1183-91.,22. Bailey RL, Parker EA, Rhodes DG, Goldman JD, Clemens JC, Moshfegh AJ, et al. Estimating sodium and potassium intakes and their ratio in the American diet: data from the 2011-2012 NHANES. J Nutr 2016; 146:745-50.,33. Okayama A, Okuda N, Miura K, Okamura T, Hayakawa T, Akasaka H, et al. Dietary sodium-to-potassium ratio as a risk factor for stroke, cardiovascular disease and all-cause mortality in Japan: the NIPPON DATA80 cohort study. BMJ Open 2016; 6:e011632.. As estimativas isoladas permitem avaliar o consumo excessivo de sal e o consumo inadequado de alimentos saudáveis como frutas e verduras, ricos em potássio. A Organização Mundial da Saúde (OMS) 44. World Health Organization. Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Geneva: World Health Organization; 2003. recomenda que a relação de consumo de sódio/potássio seja igual a 1, sendo que o aumento desta relação pode ocorrer tanto por elevação do consumo de sódio, proveniente de alimentos industrializados e o uso de sal de adição, como por diminuição do consumo de potássio, o que pode caracterizar uma alimentação de mais baixa qualidade nutricional 55. Molina MCB, Cunha RS, Herkenhoff LF, Mill JG. Hipertensão arterial e consumo de sal em população urbana. Rev Saúde Pública 2003; 37:743-50.,66. Cordain L, Eaton SB, Sebastian A, Mann N, Lindeberg S, Watkins BA, et al. Origins and evolution of the Western diet: health implications for the 21st century. Am J Clin Nutr 2005; 81:341-54..

Investigar a relação entre consumo alimentar e desfechos de saúde é de fundamental importância para a melhor compreensão dos seus determinantes, bem como para o planejamento de ações de prevenção e promoção. Por sua vez, a avaliação do consumo alimentar em estudos populacionais pode ser realizada por diferentes métodos, dentre os quais os dietéticos que, embora factíveis e de menor custo operacional, são menos precisos e suscetíveis a viés de memória e erro na estimativa do tamanho das porções 77. Beaton GH. Approaches to analysis of dietary data: relationship between planned analyses and choice of methodology. Am J Clin Nutr 1994; 59(1 Suppl):253S-61S.. Já os biomarcadores são independentes de erros aleatórios em relação aos erros inerentes dos inquéritos dietéticos e apresentam maior precisão 88. Bingham SA. Biomarkers in nutritional epidemiology. Public Health Nutr 2002; 5:821-7.. No caso da avaliação do consumo de sódio e potássio, a excreção urinária estima com maior precisão do que os métodos dietéticos 99. Pereira TSS, Cade NV, Mill JG, Sichieri R, Molina MCB. Use of the method of triads in the validation of sodium and potassium intake in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). PLoS One 2016; 11:e0169085., sendo a relação entre eles também mais precisa para identificar uma alimentação com menor teor de sódio e maior de potássio 1010. Iwahori T, Miura K, Ueshima H. Time to consider use of the sodium-to-potassium ratio for practical sodium reduction and potassium increase. Nutrients 2017; 9:E700..

A alimentação é influenciada por diversos fatores, dentre os quais os econômicos, sociais, culturais e até mesmo algumas condições de saúde 1111. Kelly S, Martin S, Kuhn I, Cowan A, Brayne C, Lafortune L. Barriers and facilitators to the uptake and maintenance of healthy behaviours by people at mid-life: a rapid systematic review. PLoS One 2016; 11:e0145074.. Esses fatores interferem diretamente no acesso a alimentos e na qualidade nutricional da alimentação. Há evidências de que maior renda, maior escolaridade, assim como um ambiente favorável aumentam o acesso a alimentos saudáveis 1212. Irala-Estévez J, Groth M, Johansson L, Oltersdorf U, Prättälä R, Martínez-González MA. A systematic review of socio-economic differences in food habits in Europe: consumption of fruit and vegetables. Eur J Clin Nutr 2000; 54:706-14.,1313. Pessoa MC, Mendes LL, Gomes CS, Martins PA, Velasquez-Melendez G. Food environment and fruit and vegetable intake in a urban population: a multilevel analysis. BMC Public Health 2015; 15:1012.. Por outro lado, é possível que a presença de alguma doença interfira na ingestão de alimentos, seja esta relacionada às dificuldades inerentes ao processo patológico ou a partir de alguma restrição alimentar imposta por um plano alimentar/dietoterápico específico 1414. Jomori MM, Proença RPC, Calvo MCM. Determinantes de escolha alimentar. Rev Nutr 2008; 21:63-73.. Levando em consideração que a relação sódio/potássio pode ser utilizada como um bom indicador do consumo desses eletrólitos, este estudo tem por objetivo identificar os fatores sociodemográficos associados à alta relação sódio/potássio em adultos.

Métodos

Delineamento do estudo e população

Estudo transversal realizado com dados da linha de base do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil). Trata-se de um estudo multicêntrico com servidores públicos ativos e aposentados, na faixa etária de 35 a 74 anos, cujo objetivo central é investigar a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, em particular, as cardiovasculares e o diabetes 1515. Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan B, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol 2012; 175:315-24.. O ELSA-Brasil está sendo realizado em seis capitais de três regiões do país (Sul, Sudeste e Nordeste), abrangendo seis centros de investigação sediados em instituições públicas de Ensino Superior [Universidade de São Paulo (USP), São Paulo; Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Minas Gerais; Universidade Federal da Bahia (UFBA), Bahia; Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rio Grande do Sul; Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Espírito Santo] e um em uma instituição de pesquisa do Ministério da Saúde, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, Rio de Janeiro). O ELSA-Brasil obteve aprovação nos comitês de ética em pesquisa das seis instituições e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido.

Critérios de exclusão

Foram excluídos os participantes que não apresentaram urina validada e aqueles em uso de qualquer classe de medicamento anti-hipertensivo, pelo fato das medicações diuréticas relacionar seus efeitos natriuréticos com a diminuição do volume extracelular e, assim, apresentar alterações na excreção de potássio (hipopotassemia) 1616. Malachias MVB, Plavnik FL, Machado CA, Malta D, Scala LCN, Fuchs S. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Capítulo 1 - conceituação, epidemiologia e prevenção primária. Arq Bras Cardiol 2016; 107(3 Suppl 3):1-6..

Coleta de dados

Os exames e questionários foram realizados no período de 2008 a 2010, de forma padronizada nos seis centros de investigação, conforme detalhamento em publicações anteriores 1515. Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan B, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol 2012; 175:315-24.,1717. Mill JG, Pinto K, Griep RH, Goulart A, Foppa M, Lotufo PA, et al. Aferições e exames clínicos realizados nos participantes do ELSA-Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47:54-62..

Excreção de sódio e potássio de 12 horas

O ELSA-Brasil adotou a coleta urinária de 12 horas, no período noturno, como instrumento para estimar a excreção de sódio e potássio e avaliar o clearance de creatinina 1515. Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan B, et al. Brazilian Longitudinal Study of Adult health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol 2012; 175:315-24.. Os participantes receberam orientações verbais e escritas, de pessoal treinado e certificado, sobre a coleta, acondicionamento e transporte da urina. O volume urinário foi aferido com uma proveta graduada com capacidade de 1.000mL e precisão de 10mL. As dosagens de sódio e potássio foram realizadas com o uso de eletrodos seletivos. Foram aceitos os frascos de urina com período de coleta entre 10 e 14 horas, com diurese superior a 250mL e sem relato de perdas completas de micção. A urina foi considerada válida quando a excreção total de creatinina ajustada para 12 horas corrigida pelo peso estava entre 7,2 e 16,8mg/kg em homens e 5,4 e 12,6mg/kg em mulheres 1818. Ljungman S, Granerus G. The evaluation of kidney function in hypertensive patients. In: Laragh JH, Brenner BM, editors. Hypertension: pathophysiology, diagnosis, and management. 2nd Ed. New York: Raven Press Limited; 1995. p. 1987-2004..

Foi utilizada a excreção urinária de sódio e potássio de 12 horas noturna e estimado o consumo para 24 horas em miligramas. A excreção urinária de 12 horas pode ser usada em estudos epidemiológicos porque estima com confiável precisão o consumo/excreção de 24 horas 1919. Mill JG, Silva ABT, Baldo MP, Molina MCB, Rodrigues SL. Correlation between sodium and potassium excretion in 24- and 12-h urine samples. Braz J Med Biol Res 2012; 45:799-805.. A relação sódio/potássio foi calculada em mmol/mmol e posteriormente dividida em tercis, sendo classificada em 1º tercil = baixa, 2º tercil = intermediária e 3º tercil = alta.

Variáveis exploratórias

Foram avaliados indivíduos de ambos os sexos. A idade foi classificada em faixa etária, totalizando 4 grupos, sendo 35 a 44, 45 a 54, 55 a 64 e 65 a 74 anos. A escolaridade foi agrupada em ensino fundamental incompleto e completo, médio e superior completos. A renda per capita foi calculada com base na informação da renda familiar líquida aproximada do mês anterior à entrevista e o número de pessoas que dependem da mesma. Essa variável foi dividida em tercil, sendo que o primeiro tercil indica a menor renda e o último a renda mais elevada. A raça/cor foi autorreferida e agrupada em brancos e não brancos (preto, pardos, amarelos e indígenas).

Análise estatística

Foi realizada análise descritiva das variáveis sociodemográficas segundo os tercis de relação sódio/potássio por meio do teste qui-quadrado. As médias de sódio, potássio e relação sódio/potássio foram comparadas utilizando-se a análise de variância (ANOVA) seguida do post hoc de Tukey e teste t de Student. Foi testado o modelo de regressão logística multinomial bruto e ajustado, tendo como variável dependente a relação sódio/potássio em tercil e adotada como referência a baixa relação (1º tercil). As variáveis independentes usadas no modelo foram sexo, faixa etária, escolaridade, raça/cor e renda. Os dados foram analisados por meio do programa estatístico SPSS versão 18.0 (https://www.ibm.com/).

Resultados

Dos 15.105 participantes, foram excluídos 2.292 indivíduos por não apresentarem coleta de urina validada e 3.734 participantes que relataram uso de medicação anti-hipertensiva, compondo a amostra final de 9.079 indivíduos.

Indivíduos classificados na alta relação sódio/potássio apresentaram maior média de sódio e menor potássio (Tabela 1). Os participantes que foram classificados com alta relação sódio/potássio são em maior proporção homens, indivíduos mais jovens (35 a 44 anos), menor escolaridade, etnia não branca e com menor renda (Tabela 2).

Tabela 1
Médias e desvios padrão (DP) de variáveis da relação sódio/potássio. ELSA-Brasil (2008-2010).

Tabela 2
Características sociodemográficas segundo tercis da relação sódio/potássio. ELSA-Brasil (2008-2010).

O consumo estimado de sódio e potássio apresentou diferença significativa entre sexo e escolaridade (Tabela 3). As maiores relações sódio/potássio foram observadas em homens, menor faixa etária e indivíduos com menor escolaridade e renda (Tabela 3). Os modelos de regressão logística multinomial bruto e ajustado são observados na Tabela 4. No modelo ajustado, os homens apresentaram chance 78% mais elevada de ter uma alta relação sódio/potássio quando comparados às mulheres. Entre os mais jovens (35 a 44 anos: OR = 1,71; IC95%: 1,33-2,19) e entre aqueles com menor escolaridade (OR = 2,38; IC95%: 1,78-3,18) e renda (OR = 1,47; IC95%: 1,26-1,73) foram observadas chances mais elevadas de apresentarem alta relação sódio/potássio.

Tabela 3
Médias e desvios padrão de sódio, potássio e relação sódio/potássio segundo fatores associados. ELSA-Brasil (2008-2010).

Tabela 4
Modelos de regressão logística multinomial bruto e ajustado, tendo como referência a baixa relação sódio/potássio. ELSA-Brasil (2008-2010).

Discussão

Entre os fatores associados à alta relação sódio/potássio estão os homens, indivíduos mais jovens e com menor escolaridade e renda. Essas características apresentaram maior chance de consumir uma dieta com maior teor de sódio e menor de potássio. A relação sódio/potássio mais elevada se deve ao consumo de alimentos com alto teor de sódio, como é o caso dos produtos processados e ultraprocessados, e o uso de adição de sal e condimentos industrializados no preparo das refeições 2020. Louzada MLC, Martins APB, Canella DS, Baraldi LG, Levy RB, Claro RM, et al. Ultra-processed foods and the nutritional dietary profile in Brazil. Rev Saúde Pública 2015; 49:38.. Por sua vez, uma menor relação indica maior consumo de frutas e hortaliças, consideradas importantes fontes de potássio 2121. Weaver CM. Potassium and health. Adv Nutr 2013; 4:368S-77S..

Neste estudo, as mulheres apresentaram menor relação sódio/potássio quando comparadas aos homens. Isso pode ter ocorrido pelo fato de as mulheres se preocuparem mais com a saúde 2222. Deeks A, Lombard C, Michelmore J, Teede H. The effects of gender and age on health related behaviors. BMC Public Health 2009; 9:213. e por conta disto, provavelmente, apresentam uma alimentação de melhor qualidade, incluindo frutas e vegetais no dia a dia. Em um estudo realizado por Assumpção et al. 2323. Assumpção D, Domene SMA, Fisberg RM, Canesqui AM, Barros MBA. Diferenças entre homens e mulheres na qualidade da dieta: estudo de base populacional em Campinas, São Paulo. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:347-58., foi observado que as mulheres consomem maior quantidade de frutas e vegetais quando comparadas aos homens. O mesmo resultado foi encontrado na Pesquisa Nacional de Saúde2424. Malta DC, Andrade SSCA, Stopa SR, Pereira CS, Szwarcwald CL, Silva Júnior JB, et al. Estilos de vida da população brasileira: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24:217-26..

Outro aspecto diz respeito às mudanças que ocorrem com o envelhecimento, pois indivíduos mais velhos podem apresentar maior consciência em relação aos cuidados com a saúde, como demonstrado por Deeks et al. 2222. Deeks A, Lombard C, Michelmore J, Teede H. The effects of gender and age on health related behaviors. BMC Public Health 2009; 9:213.. Entretanto, observa-se que os participantes com maiores idades apresentaram relação sódio/potássio mais baixa, provavelmente devido ao consumo maior de frutas e hortaliças. Indivíduos mais jovens costumam realizar refeições fora de casa de forma mais constante, resultando muitas das vezes na substituição de refeições por lanches rápidos como fast foods, o que contribui para a redução da qualidade da alimentação 2525. Bezerra IN, Souza AM, Pereira RA, Sichieri R. Consumo de alimentos fora do domicílio no Brasil. Rev Saúde Pública 2013;47 Suppl 1:200S-11S..

Atualmente, informações sobre os benefícios da alimentação saudável, que contenha menor quantidade de sódio e de alimentos processados, são disponibilizadas para toda população, entretanto, o acesso a este tipo de alimentação pode ser limitado a indivíduos que possuem maior grau de escolaridade. O maior conhecimento sobre os benefícios de uma alimentação adequada ou de maior qualidade nutricional auxilia nas escolhas alimentares. Dados do VIGITEL (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) 2626. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. VIGITEL Brasil 2016: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: Ministério da Saúde; 2017. mostram que 44,3% dos adultos com escolaridade igual ou superior a 12 anos referiram consumir frutas e hortaliças em cinco ou mais dias da semana, já aqueles com escolaridade abaixo de nove anos consumiam 29,9%.

A renda também é um fator determinante e de grande influência no momento da escolha alimentar. Faleiro et al. 2727. Faleiro JC, Giatti L, Barreto SM, Camelo LV, Griep RH, Guimarães JMN, et al. Posição socioeconômica no curso de vida e comportamentos de risco relacionados à saúde: ELSA-Brasil. Cad Saúde Pública 2017; 33:e00017916. demonstraram que quanto menor a posição socioeconômica, maior é a prevalência de baixo consumo de frutas e hortaliças. Alimentos saudáveis, de um modo geral, apresentam preços mais elevados, quando comparados aos industrializados 2828. Claro RM, Maia EG, Costa BVL, Diniz DP. Preço dos alimentos no Brasil: prefira preparações culinárias a alimentos ultraprocessados. Cad Saúde Pública 2016; 32:e00104715., sendo este um dos motivos que favorece a opção daqueles com menor poder aquisitivo 1212. Irala-Estévez J, Groth M, Johansson L, Oltersdorf U, Prättälä R, Martínez-González MA. A systematic review of socio-economic differences in food habits in Europe: consumption of fruit and vegetables. Eur J Clin Nutr 2000; 54:706-14.. Apesar de menor custo e maior praticidade, esses alimentos são altamente energéticos e ricos em gordura, sal e açúcar 2020. Louzada MLC, Martins APB, Canella DS, Baraldi LG, Levy RB, Claro RM, et al. Ultra-processed foods and the nutritional dietary profile in Brazil. Rev Saúde Pública 2015; 49:38.. Um estudo realizado por Simões et al. 2929. Simões BS, Cardoso LO, Benseñor IJM, Schmidt MI, Duncan BB, Luft VC, et al. Consumption of ultra-processed foods and socioeconomic position: a cross-sectional analysis of the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health. Cad Saúde Pública 2018; 34:e00019717. com participantes ELSA-Brasil demonstrou que a maior contribuição da densidade energética foi proveniente dos alimentos ultraprocessados, entre os que apresentavam menor escolaridade. A variável raça/cor não permaneceu no modelo final. Embora os participantes do ELSA-Brasil sejam servidores públicos, com renda e escolaridade superiores à média do país, a relação sódio/potássio foi mais alta do que a observada na população americana 22. Bailey RL, Parker EA, Rhodes DG, Goldman JD, Clemens JC, Moshfegh AJ, et al. Estimating sodium and potassium intakes and their ratio in the American diet: data from the 2011-2012 NHANES. J Nutr 2016; 146:745-50..

A excreção urinária é um método padrão-ouro para estimar o consumo de sódio e potássio 99. Pereira TSS, Cade NV, Mill JG, Sichieri R, Molina MCB. Use of the method of triads in the validation of sodium and potassium intake in the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). PLoS One 2016; 11:e0169085.. Sendo assim, a relação sódio/potássio pode ser utilizada como um indicador de consumo desses eletrólitos por não apresentar vieses como os encontrados nos métodos dietéticos. Todavia, esse indicador não é capaz de identificar os alimentos consumidos pela população, sendo considerado uma limitação. Entretanto, no estudo realizado por Oliveira et al. 3030. Oliveira LS, Coelho JS, Siqueira JH, Santana NMT, Pereira TSS, Molina MCB. Relación sodio/potasio urinario y consumo de condimentos industrializados y alimentos ultraprocesados. Nutr Hosp 2019; 36:125-32. foi identificado que o consumo frequente de condimentos industrializados está associado às mais altas excreções urinárias de sódio e relação sódio/potássio. O maior consumo de alimentos ultraprocessados também esteve associado à maior relação sódio/potássio 3030. Oliveira LS, Coelho JS, Siqueira JH, Santana NMT, Pereira TSS, Molina MCB. Relación sodio/potasio urinario y consumo de condimentos industrializados y alimentos ultraprocesados. Nutr Hosp 2019; 36:125-32.. Assim sendo, quanto mais elevada a relação sódio/potássio, maior é a ingestão de sódio e menor a de potássio.

Muito embora o sódio seja um mineral amplamente distribuído em pequenas quantidades nos alimentos in natura, sua principal fonte nas dietas contemporâneas é o sal de cozinha. Dentre os grupos alimentares que apresentam maiores quantidades de sódio estão os embutidos, biscoitos, refeições prontas, temperos prontos, dentre outros. Uma vez que esse nutriente está presente nos alimentos que fazem parte da variedade alimentar global da atualidade, é previsível que indivíduos consumam uma quantidade de sódio muito superior à recomendada, o que possivelmente eleva a relação sódio/potássio. Além disso, a adição de sal em refeições prontas é mais frequente em homens do que em mulheres 3131. Castro RSA, Giatti L, Barreto SM. Fatores associados à adição de sal a refeição pronta. Ciênc Saúde Colet 2014; 10:1503-12..

Sendo assim, por mais que a relação sódio/potássio urinária não permita identificar as fontes alimentares, tampouco o que contribui para elevá-la, podemos afirmar que quanto maior for esta relação, mais frequente é o consumo de condimentos industrializados e alimentos processados 3030. Oliveira LS, Coelho JS, Siqueira JH, Santana NMT, Pereira TSS, Molina MCB. Relación sodio/potasio urinario y consumo de condimentos industrializados y alimentos ultraprocesados. Nutr Hosp 2019; 36:125-32.. Portanto, os resultados encontrados neste estudo corroboram o fato de que fatores demográficos e socioeconômicos são determinantes importantes das escolhas alimentares 2323. Assumpção D, Domene SMA, Fisberg RM, Canesqui AM, Barros MBA. Diferenças entre homens e mulheres na qualidade da dieta: estudo de base populacional em Campinas, São Paulo. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:347-58.,3232. Sichieri R, Castro JFG, Moura AS. Fatores associados ao padrão de consumo alimentar da população brasileira urbana. Cad Saúde Pública 2003; 19 Suppl 1:S47-53., e que a relação sódio/potássio poderia ser utilizada como um indicador resumo da qualidade da dieta, contribuindo para o monitoramento das políticas de promoção da alimentação saudável.

Conclusão

A relação sódio/potássio mais alta foi encontrada em indivíduos do sexo masculino, jovens e de menor escolaridade e renda. Além disso, os indivíduos no primeiro tercil da relação sódio/potássio apresentaram valores superiores à recomendação.

Agradecimentos

Os autores agradecem à equipe e participantes do estudo ELSA-Brasil, por suas importantes contribuições, ao Ministério da Saúde, Financiadora de Inovação e Pesquisa (Finep)e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo financiamento.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    01 Mar 2018
  • Revisado
    14 Dez 2018
  • Aceito
    11 Jan 2019
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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