Resumos
O presente Ensaio apresenta uma reflexão com base em algumas formas vigentes de promoção de atividade física, propondo visibilidade a atividades de lazer e suas desigualdades. O cenário atual de (aumento das) desigualdades e a importância do seu enfrentamento, destacando a pertinência das políticas públicas, são apresentados e discutidos à luz de duas teorias: a Hipótese da Equidade Inversa e a Lei dos Cuidados Inversos. A Hipótese da Equidade Inversa busca compreender como as desigualdades tendem a se estabelecer em indicadores de saúde, partindo de aumento esperado dessas desigualdades quando surgem inovações em saúde que atingem inicialmente os mais privilegiados social e economicamente. Já a Lei dos Cuidados Inversos destaca que a disponibilidade de uma atenção adequada em saúde tende a variar inversamente à necessidade da população. Nesse sentido, ao relacionar as teorias e a promoção de atividade física de lazer, o presente ensaio defende a ampliação das políticas públicas, buscando evitar o aumento das desigualdades. São as políticas públicas e a vinculação com o Sistema Único de Saúde (SUS) e com seus princípios que precisam ser compreendidas como prioridade. É nessa perspectiva que acreditamos em um avanço de ações de promoção das atividades físicas de lazer contextualizadas socialmente que sejam capazes de priorizar aqueles que mais necessitam.
Palavras-chave:
Iniquidade; Atividades de Lazer; Atividade Motora
Este Ensayo propone una reflexión sobre algunas formas vigentes de promoción de la actividad física, centrándose en las actividades físicas de ocio y sus desigualdades. El escenario actual de (aumento de las) desigualdades y la importancia de su enfrentamiento, destacando la pertinencia de las políticas públicas, se presenta y discute a la luz de dos teorías: la Hipótesis de la Equidad Inversa y la Ley de Cuidados Inversos. La Hipótesis de la Equidad inversa busca comprender cómo las desigualdades tienden a establecerse en indicadores de salud, partiendo de un aumento esperado de las desigualdades, cuando surgen innovaciones en salud que alcanzan inicialmente a los más privilegiados social y económicamente. Ya la Ley de los Cuidados Inversos destaca que la disponibilidad de una atención adecuada en salud tiende a variar inversamente, en función de las necesidades de la población. En este sentido, al relacionar las teorías y la promoción de la actividad física de ocio, este ensayo defiende la ampliación de las políticas públicas, con el fin de no ampliar las desigualdades. Son las políticas públicas, su vinculación con el Sistema Único de la Salud (SUS) y con sus principios los que necesitan ser comprendidos como prioridad. Desde esta perspectiva pensamos que se debe avanzar en la promoción de acciones de actividades físicas durante el ocio, contextualizadas socialmente, y que sean capaces de priorizar a quienes más lo necesitan.
Palabras-clave:
Inequidad; Actividades Recreativas; Actividad Motora
Ritos preliminares
A atividade física, em suas mais diversas manifestações, vem sendo estabelecida como aspecto importante para a saúde em nível individual e populacional 11. World Health Organization. Global action plan on physical activity 2018-2030: more active people for a healthier world. Geneva: World Health Organization; 2018.. Por outro lado, embora importantes avanços existam, não se pode afirmar categoricamente que tenha sido facilitado às populações o acesso pleno às práticas corporais realizadas por interesse e desejo, as quais são aqui identificadas como atividade física de lazer (ou realizadas no tempo livre). Neste sentido, o presente ensaio propõe uma reflexão com base em algumas formas vigentes de promoção de atividade física. Entende-se aqui que esta promoção se dá no âmbito dos discursos e das práticas, especialmente a partir do apelo político, científico e midiático, o qual tem priorizado a ideia de que as pessoas devem realizar atividade física no trabalho, no ambiente doméstico, no lazer e nos deslocamentos, a despeito das peculiaridades que cercam esses contextos de prática. A hipótese sustentada ao longo do ensaio pretende dar visibilidade à promoção das atividades físicas de lazer, e buscou-se apresentar e discutir: (a) a priorização desse domínio e o cenário atual (de aumento) das desigualdades na atividade física de lazer; (b) as razões éticas e práticas para o enfrentamento dessas desigualdades à luz de duas teorias: a Lei dos Cuidados Inversos e a Hipótese da Equidade Inversa, e, por fim; (c) a defesa da pertinência das políticas públicas neste contexto.
A promoção de atividade física em suas diferentes manifestações
Sob uma perspectiva histórica recente, científica e ocidental, as primeiras evidências dos benefícios à saúde oriundos da atividade física foram apresentadas no pioneiro estudo de Morris et al. 22. Morris JN, Heady JA, Raffle PA, Roberts CG, Parks JW. Coronary heart-disease and physical activity of work. Lancet 1953; 262:1053-7., o qual comparou taxas de mortalidade por doença cardiovascular entre motoristas e cobradores de ônibus em Londres (Reino Unido). Nesse estudo, a atividade física em avaliação se refere à tradicional definição desse comportamento proposta por Caspersen et al. 33. Caspersen CJ, Powell KE, Christenson GM. Physical activity, exercise, and physical fitness: definitions and distinctions for health-related research. Public Health Rep 1985; 100:126-31. - qualquer movimento corporal com gasto energético acima dos níveis de repouso. Posteriormente, o estabelecimento desse comportamento como relevante na saúde pública contou com a ampliação das evidências de seus benefícios à saúde ao abordar a atividade física mais delimitada em termos de domínios, principalmente lazer e deslocamento 44. World Health Organization. Global recommendations on physical activity for health. Geneva: World Health Organization; 2010.,55. Lee IM, Shiroma EJ, Lobelo F, Puska P, Blair SN, Katzmarzyk PT, et al. Effect of physical inactivity on major non-communicable diseases worldwide: an analysis of burden of disease and life expectancy. Lancet 2012; 380:219-29..
Assim, diante de ações de promoção da atividade física, parece-nos importante a reflexão sobre um possível paradoxo. Embora tenhamos evidências de benefícios à saúde de diferentes atividades físicas já mencionadas, será que no contexto atual - à luz dos determinantes sociais de saúde e realidade brasileira de importantes e persistentes desigualdades - faz sentido promover atividade física considerando todas as suas manifestações, incluindo todos os tipos e domínios de prática? Em caso de resposta positiva, de acordo com abordagens tradicionais da área de atividade física e saúde no Brasil e no mundo 66. Hoehner CM, Soares J, Parra Perez D, Ribeiro IC, Joshu CE, Pratt M, et al. Physical activity interventions in Latin America: a systematic review. Am J Prev Med 2008; 34:224-33., a reflexão seguinte deveria ponderar o quanto é efetivo promover esse tipo de atividade em todos os domínios, sob uma perspectiva populacional.
Abordagens conhecidas de campanhas de promoção de atividade física, no âmbito público ou privado, costumam lançar mensagens populacionais, sugerindo toda e qualquer movimentação dos corpos, independentemente do contexto de vida, domínio ou características individuais, pois daí viriam os efeitos considerados benéficos à saúde, tomando a relação unicamente como biológica. Exemplos nesse sentido se referem à promoção de atividade física no trabalho, em atividades domésticas e, em alguns momentos, também no transporte, como ao sugerir que as pessoas desçam alguns pontos antes de sua parada de ônibus ou prefiram utilizar as escadas em detrimento de escadas rolantes/elevadores 66. Hoehner CM, Soares J, Parra Perez D, Ribeiro IC, Joshu CE, Pratt M, et al. Physical activity interventions in Latin America: a systematic review. Am J Prev Med 2008; 34:224-33.. Sem desconsiderar o potencial benefício fisiológico dessas práticas para alguns desfechos de saúde, a inquietação maior é sobre a efetividade de implementação e manutenção dessas atividades, sem que considerem a cultura e realidade social dos indivíduos. A questão inicial a ser demarcada aqui é se devemos promover em ações de saúde pública a atividade física, abordando-a como todo e qualquer movimento corporal 2. Indivíduos no contexto de países de renda média e baixa, expostos a longas jornadas de trabalhos e vizinhanças pouco seguras e pouco afeitas às manifestações saudáveis, serão capazes de aderir a esse tipo de recomendação? É essa promoção de atividade física que buscamos? Isso é contextualizado socialmente na realidade brasileira? É dessa abordagem que buscamos nos desvencilhar neste ensaio, procurando situar o debate da promoção da atividade física nas condições sociais, nas culturas e no respeito aos interesses das populações, mas especialmente nas situações desigualmente constituídas no Brasil.
Recentes publicações em nível nacional 77. Cruz MS, Bernal RTI, Claro RM. Tendência da prática de atividade física no lazer entre adultos no Brasil (2006-2016). Cad Saúde Pública 2018; 34:e00114817.,88. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2018: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: Ministério da Saúde; 2019. e internacional 99. Sallis JF, Bull F, Guthold R, Heath GW, Inoue S, Kelly P, et al. Progress in physical activity over the Olympic quadrennium. Lancet 2016; 388:1325-36. demonstraram que são poucos os avanços no aumento dos níveis de atividade física das populações, apesar da evolução do conhecimento na área. São essas evidências também que nos fazem refletir sobre a predominante promoção da atividade física independentemente do tipo e do contexto. A promoção de qualquer movimento corporal tem influência de uma concepção biomédica, a qual também é responsável por uma simplificação da tomada de decisão sobre a prática individual e coletiva de atividade física e consequente aposta no discurso do risco. Em consonância com essa perspectiva, precisamos também considerar que o fardo sobre os indivíduos não se limita à prática de atividade física, mas também a outros comportamentos de saúde, como alimentação inadequada, controle do estresse, sono, cuidados em saúde bucal, consumo excessivo de álcool e tabaco 1010. World Health Organization. Global health risks: mortality and burden of disease attributable to selected major risks. Geneva: World Health Organization; 2009, bem como o emergente comportamento sedentário 1111. Ekelund U, Steene-Johannessen J, Brown WJ, Fagerland MW, Owen N, Powell KE, et al. Does physical activity attenuate, or even eliminate, the detrimental association of sitting time with mortality? A harmonised meta-analysis of data from more than 1 million men and women. Lancet 2016; 388:1302-10., entre tantos outros. O contexto atual é de uma epidemia de doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), mas também de uma epidemia de fatores de risco, na qual o indivíduo é invariavelmente cercado e responsabilizado por toda e qualquer tomada de decisão sobre seus hábitos e consequências 1212. Castiel LD, Guilam MCR, Ferreira MS. Correndo o risco: uma introdução aos riscos em saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2010..
Nesse sentido é que surge a demanda por uma promoção de atividade física mais contextualizada socialmente. Nessa contextualização, está inclusa a promoção do deslocamento ativo, sem, no entanto, a ilusão de que a opção pelo uso da bicicleta, como exemplo, não passe (porque sempre passará) por questões bastante pragmáticas e definidoras, como custo, segurança no trajeto, distância e tempo do transporte. Porém, o domínio que mais contempla a abordagem necessária para uma promoção de atividade física potencialmente contextualizada e que pretendemos aqui defender é o lazer. Há algum tempo, a base conceitual, principalmente ligada à Educação Física, que se situa nas práticas corporais, tem identificado que as atividades que deveriam interessar nesse contexto são aquelas que estamos aqui delimitando como de lazer. As demais atividades já citadas têm outros objetivos, como cuidar da casa ou trabalhar, e não estão vinculadas a aprendizado, experiência, gosto e sentido associados ao movimento humano. É nesse sentido que a terminologia das Práticas Corporais é assumida também neste ensaio, quando pertinente. Em recente relatório proposto pela Organização das Nações Unidas (ONU), as atividades físicas são caracterizadas como aspecto de desenvolvimento humano, tratadas como direito alienável, desde que valorizadas pelas pessoas e tendo o âmbito do lazer como ponto de partida do debate 1313. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Relatório de desenvolvimento humano nacional - movimento é vida: atividades físicas e esportivas para todas as pessoas. Brasília: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; 2017.. Assim, entende-se que as atividades físicas têm o potencial de contribuir com uma vida saudável e podem enriquecer a vida das pessoas para além das horas e do mundo do trabalho. Obviamente, este ensaio não vai se prolongar nessas searas teórico-metodológicas, mas as divergências se encontram em acúmulo conceitual culturalista e biologicista, pouco diálogo e reconhecimento entre os pares acadêmicos e uma fragmentação da construção do saber e apoio às políticas públicas nas áreas que estudam as atividades físicas e práticas corporais. Parece que, infelizmente, a promoção da atividade física tem sido mais evidente do ponto de vista biológico e, novamente, uma das expressões dessa dominância tem sido a tentativa de induzir as pessoas a realizarem qualquer atividade física/movimento corporal, sob o ideário de avanços em termos de indicadores de saúde.
Destaca-se também que o lazer é o domínio de prática de atividade física passível de intervenções públicas, as quais poderiam colaborar para que a opção sobre ser ou não ativo fisicamente estivesse mais ao alcance dos indivíduos. A partir daí, seria possível tratá-lo como escolha e menos como imposição. O lazer é o domínio no qual a cultura local toma força com suas demandas e atenua descontextualizações de cunho técnico/científico. É por meio do lazer que os indivíduos podem se expor a vivências que tenham significados potencialmente experimentados, adotados/adquiridos e mantidos.
De certa forma, a discussão retoma o ponto inicial desta seção sobre que tipo de promoção de atividade física buscamos. E, nesse sentido, ao buscar maiores ações no domínio de lazer, busca-se também a reflexão sobre o cenário atual, o qual é caracterizado por uma atividade física que apresenta fortes desigualdades sociais. Estudos realizados a partir de inquéritos nacionais têm denunciado as demarcadas desigualdades de gênero e de nível socioeconômico no acesso à atividade física de lazer 1414. Mielke GI, Hallal PC, Malta DC, Lee IM. Time trends of physical activity and television viewing time in Brazil: 2006-2012. Int J Behav Nutr Phys Act 2014; 11:101.,1515. Silva ICM, Mielke GI, Bertoldi AD, Arrais PSD, Luiza VL, Mengue SS, et al. Overall and leisure-time physical activity among Brazilian adults: national survey based on the Global Physical Activity Questionnaire. J Phys Act Health 2018; 15:212-8.. Aspectos culturais 1616. Mielke GI, Silva ICM, Kolbe-Alexander TL, Brown WJ. Shifting the physical inactivity curve worldwide by closing the gender gap. Sports Med 2018; 48:481-9., desigualdades ambientais 1717. Silva ICM, Mielke GI, Nunes BP, Bohm AW, Blanke AO, Nachtigall MS, et al. Espaços públicos de lazer: distribuição, qualidade e adequação à prática de atividade física. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2015; 20:82-92. e de acesso aos serviços de Educação Física 1818. Oliz MM, Dumith SC, Knuth AG. Utilização de serviços de educação física por adultos e idosos no extremo sul do Brasil: estudo de base populacional. Ciênc Saúde Colet 2020; 25:541-52. são questões que tornaram as práticas corporais/atividade física de lazer um privilégio em vez de um direito humano 1818. Oliz MM, Dumith SC, Knuth AG. Utilização de serviços de educação física por adultos e idosos no extremo sul do Brasil: estudo de base populacional. Ciênc Saúde Colet 2020; 25:541-52..
Razões éticas e práticas para o enfrentamento destas desigualdades
Certamente uma das principais questões de debate em diferentes áreas do conhecimento, nestas primeiras décadas do século XXI, diz respeito à questão das desigualdades, sendo a desigualdade econômica talvez a mais debatida. Na área da saúde, evidências apontam o impacto das desigualdades até mesmo em países de renda alta 1919. Barreto ML. Desigualdades em saúde: uma perspectiva global. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:2097-108.,2020. Chomsky N. Réquiem para o sonho americano: os 10 princípios de concentração de riqueza e poder. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil; 2017.,2121. Piketty T. O capital no século XXI. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca; 2014.. Nesses contextos, em análises de nível agregado, o Produto Interno Bruto (PIB) do país não se associa a indicadores de saúde como expectativa de vida, obesidade e violência. Porém, esses e outros indicadores de saúde estão associados a indicadores nacionais de desigualdade de renda (como o índice de Gini) 2222. Wilsinson R, Pickett K. O nível: por que uma sociedade mais igualitária é melhor para todos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2015..
Já no contexto brasileiro, diversas produções importantes poderiam ser mencionadas pelo destaque fornecido às consequências das desigualdades sociais na saúde 2323. Barata RB. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012., tornando-as uma questão-chave para discussão de qualquer cenário da saúde coletiva 2424. Campos GWS, Lopes C. Entrevista: desigualdade é o conceito-chave para a discussão da saúde no contexto internacional. Ciênc Saúde Colet 2017; 22:2315-7.,2525. Comissão Nacional para os Determinantes Sociais da Saúde. As causas sociais das iniquidades em saúde no Brasil. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/causas_sociais_iniquidades.pdf (acessado em 09/Ago/2019).
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe... . A apropriação dessas e de outras referências e discussões certamente é fundamental para apropriação teórica e compreensão do tema “desigualdade” para além dos números, buscando-se um melhor entendimento, inclusive, dos mecanismos que fazem com que as desigualdades sejam prejudiciais em diversos desfechos de saúde 2323. Barata RB. Como e por que as desigualdades sociais fazem mal à saúde? Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012..
Neste ensaio, para se refletir de forma mais pragmática a relevância de abordagens sobre as desigualdades na prática de atividade física, serão utilizadas duas teorias: a Hipótese da Equidade Inversa 2626. Victora CG, Vaughan JP, Barros FC, Silva AC, Tomasi E. Explaining trends in inequities: evidence from Brazilian child health studies. Lancet 2000; 356:1093-8.,2727. Victora CG, Joseph G, Silva ICM, Maia FS, Vaughan JP, Barros FC, et al. The inverse equity hypothesis: analyses of institutional deliveries in 286 national surveys. Am J Public Health 2018; 108:464-71. e a Lei dos Cuidados Inversos 2828. Hart JT. The inverse care law. Lancet 1971; 297:405-12..
A Hipótese da Equidade Inversa, teorizada em 2000 por Victora et al. 2626. Victora CG, Vaughan JP, Barros FC, Silva AC, Tomasi E. Explaining trends in inequities: evidence from Brazilian child health studies. Lancet 2000; 356:1093-8., busca compreender como as desigualdades tendem a se estabelecer em indicadores de saúde. Nessa hipótese, os autores destacam que inovações em saúde (medicamentos, técnicas e serviços) tendem a ser adotadas inicialmente pelos mais privilegiados social e economicamente, ou seja, por aqueles que já apresentam menor morbimortalidade. Em um curto prazo, essas novas intervenções, se efetivas, irão gerar aumento das desigualdades em saúde. Esse aumento será tanto na cobertura atingida pelos serviços, técnicas ou medicamentos, quanto nos desfechos de saúde que elas influenciam. Logo, se a cobertura dessa inovação em saúde continua crescendo, em um certo tempo, apenas os mais desfavorecidos serão deixados para trás. O limite do aumento das desigualdades ocorre quando os mais privilegiados se aproximam dos 100% de cobertura, momento em que as intervenções começam a chegar aos mais pobres e a desigualdade passa a ser reduzida.
A Hipótese da Equidade Inversa foi recentemente testada com dados de 286 inquéritos de países de renda média e baixa, avaliando a cobertura de parto institucional 2727. Victora CG, Joseph G, Silva ICM, Maia FS, Vaughan JP, Barros FC, et al. The inverse equity hypothesis: analyses of institutional deliveries in 286 national surveys. Am J Public Health 2018; 108:464-71.. Além da comprovação da hipótese sobre a tendência das desigualdades, essa nova publicação também se debruçou sobre padrões de desigualdade e sua repercussão no planejamento de políticas públicas. A primeira etapa esperada nesse processo mencionado anteriormente é um padrão de privação generalizada (top inequality) - em que apenas os mais favorecidos apresentam melhores coberturas. Depois de um processo de aumento das diferenças entre os grupos extremos e uma melhora parcial dos mais desfavorecidos, chegamos a um padrão de exclusão marginal (bottom inequality) - em que apenas/principalmente uma pequena parcela da população é deixada para trás, com baixa cobertura 2727. Victora CG, Joseph G, Silva ICM, Maia FS, Vaughan JP, Barros FC, et al. The inverse equity hypothesis: analyses of institutional deliveries in 286 national surveys. Am J Public Health 2018; 108:464-71..
Retomando o tema central do presente ensaio, cabe ressaltar que, ao contrário de uma vacina, medicamento ou inovação em saúde bem consolidada em termos de efetividade, como atendimento especializado ao parto que se espera cobertura universal (100%) ou o mais próximo possível disso, na prática de atividade física de lazer, não se espera que a prevalência chegue a 100% em nenhum grupo populacional. Essa característica não inviabiliza a reflexão e aplicação desta teoria no contexto da atividade física. Como descrito a seguir, apenas torna menor a amplitude das desigualdades em comparação ao teorizado pela Hipótese da Equidade Inversa.
O conhecimento sobre atividade física e saúde vem se estabelecendo de forma mais consistente nos últimos trinta anos, como apresentado na abertura do texto. No entanto, o que pode ser considerado novo é a projeção desse conhecimento, o apelo social/midiático em busca de um estilo de vida saudável. Nesse sentido, relacionando a Hipótese da Equidade Inversa, verificam-se inicialmente aspectos como a proliferação das academias de ginástica do setor privado, a busca por atendimento personalizado, associação a clubes de esporte e lazer e, posteriormente, mesmo em um cenário de crise, a expansão do mercado imobiliário, vendendo a imagem/ideia de ambiente saudável e adequado à prática de atividade física. Essa expansão do número de academias e empreendimentos imobiliários atingiu inicialmente as classes mais abastadas da sociedade, mas posteriormente contemplou também uma classe intermediária em termos de nível socioeconômico. Esses aspectos favoreceram o aumento da desigualdade na prática de atividade física de lazer no Brasil. Em estudo realizado a partir de um inquérito de monitoramento das capitais brasileiras, evidenciou-se que a prática de atividade física de lazer aumentou na última década, exatamente entre a parcela da população que já apresentava maior prevalência, portanto os homens, as pessoas mais jovens e aqueles com maior escolaridade 1414. Mielke GI, Hallal PC, Malta DC, Lee IM. Time trends of physical activity and television viewing time in Brazil: 2006-2012. Int J Behav Nutr Phys Act 2014; 11:101..
A outra teoria relevante na abordagem das desigualdades é a Lei dos Cuidados Inversos, a qual destaca que a disponibilidade de uma atenção adequada em saúde tende a variar inversamente à necessidade da população 2828. Hart JT. The inverse care law. Lancet 1971; 297:405-12.. Como exemplo, crianças de locais mais vulneráveis socialmente tendem a apresentar problemas de saúde, como diarreia e pneumonia, com maior frequência, devido a suas condições de vida. No entanto, são essas mesmas crianças que apresentam maior dificuldade de acessar os sistemas de saúde. Observa-se, em geral, que quem mais necessita de um medicamento, de um serviço de saúde ou da possibilidade de aderir a um comportamento de saúde é quem menos os acessa por inúmeros fatores (questões econômicas, sociodemográficas, culturais, geográficas, entre outras). Assim, retomando a atividade física como centro da reflexão, considerando que a maior carga de morte devido a DCNTs é observada nas parcelas menos favorecidas da população, observamos também nesse mesmo grupo populacional as menores prevalências de atividade física de lazer. Os menos privilegiados social e economicamente são aqueles que potencialmente apresentam maior necessidade dos benefícios de atividade física na perspectiva dos indicadores de saúde e são exatamente aqueles que desfrutariam de um maior benefício na prevenção das DCNTs. Outro exemplo da Lei dos Cuidados Inversos em nossa área se refere ao ambiente público favorável à prática de atividade física (qualidade das ruas, disponibilidade de parques e praças), o qual é de forma sistemática majoritariamente disponível em locais de maior nível socioeconômico, exatamente para a população que menos necessitaria por poder optar, e geralmente opta, por espaços privados com ofertas diversas de atividades físicas.
Assim, com base nessas duas teorias apresentadas é que se retoma a relevância do enfrentamento dessas desigualdades. Demarca-se que a abordagem sobre as desigualdades se justifica por questões éticas, ligadas a perspectivas ideológicas, vieses políticos e sociais, mas também a questões práticas/pragmáticas, de direcionamento de políticas públicas e resposta aos gestores 2929. Victora CG, Barros FC, Vaughan JP. Epidemiologia da desigualdade. 3ª Ed. São Paulo: Editora Hucitec; 1998..
Refletindo sobre o componente ético, político e social, cabe distinguir os conceitos de desigualdade e iniquidade. Desigualdades referem-se simplesmente a diferenças observadas entre grupos. A desigualdade costuma ser considerada como o componente mensurável/tangível das iniquidades. Já a noção de iniquidade amplia esse escopo. Ao considerar que os indivíduos são distintos entre si e que se espera que existam diferenças biológicas em muitas ocasiões, as iniquidades são específicas àquelas diferenças injustas e sistemáticas (permanentes e sempre na mesma direção). É nesse momento que se demanda um juízo de valor e uma diferenciação entre tais conceitos quando analisamos, por exemplo, as diferenças de gênero e nível econômico em termos da prevalência de atividade física. Essas diferenças são injustas ou se espera que existam realmente essas diferenças entre homens e mulheres, pobres e ricos?
Destaca-se que diferenças na prática de atividade física no lazer provavelmente irão existir, o que pode não ser necessariamente um problema, desde que tal diferença não seja produto de desvantagem. Em uma abordagem de equidade, é fundamental que sejam reconhecidos os limites da promoção de atividade física, sem que haja mudanças estruturais na nossa sociedade e criação de oportunidades para grupos que historicamente enfrentam mais barreiras para a prática desse atividade de lazer (p.ex.: pobres enfrentam mais falta de acesso a espaços de lazer que ricos; jornada dupla de trabalho e maior vulnerabilidade a insegurança são mais comuns em mulheres do que em homens). Nesse sentido, como destacado por Williams et al. 3030. Williams O, Coen SE, Gibson K. Comment on: "equity in physical activity: a misguided goal". Sports Med 2019; 49:637-9., iniquidades irão sempre existir se nos mantivermos ignorantes quanto aos seus significados ou se justificarmos a injustiça como algo natural.
Assim, ao evidenciarmos que as diferenças tradicionalmente verificadas são importantes iniquidades, precisamos reconsiderar as abordagens hegemônicas e simplistas de promoção da atividade física, na qual se espera que as mulheres e os grupos mais desfavorecidos economicamente deveriam apresentar o mesmo nível de atividade física de lazer que seus pares de comparação. Compreendendo as diferenças nos níveis de atividade física de lazer como iniquidades, em uma perspectiva ética, ideológica e social, políticas públicas com foco em equidade precisam passar a ser demandas de todos os atores envolvidos na promoção da atividade física. Além disso, cabe ainda pontuar que a promoção de autonomia, a preservação da dignidade humana, o acesso ao lazer e a melhores condições de vida é anterior, básico, óbvio e implicaria maior integridade de vida. Certamente uma das consequências seria uma maior produção de saúde e, nesse sentido, de visualizar a atividade física de lazer como algo acessível e saudável.
Por outro lado, além dessa perspectiva que tratamos como ética, as abordagens sobre a desigualdade também se justificam com questões pragmáticas. A identificação dos grupos prioritários e dos padrões de desigualdade é uma importante informação para desenhar ações específicas para os grupos mais necessitados. Não obstante, tais evidências são importantes ferramentas também para avaliar políticas que podem estar em implementação. Nessa perspectiva mais pragmática, Mielke et al. 1616. Mielke GI, Silva ICM, Kolbe-Alexander TL, Brown WJ. Shifting the physical inactivity curve worldwide by closing the gender gap. Sports Med 2018; 48:481-9., ao descreverem as desigualdades de gênero na inatividade física em 142 países, evidenciaram que a meta proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que objetiva uma redução de 10% na prevalência de inatividade física mundial, poderia ser atingida, se conseguíssemos diminuir as diferenças de gênero, por meio do aumento da atividade física em mulheres.
Relevância das políticas públicas para promoção de atividade física de lazer
Os últimos anos foram marcados pela inclusão da atividade física na agenda das políticas públicas de saúde no Brasil 3131. Loch MR, Lemos EC, Siqueira FV, Facchini LA. A revisão da Política Nacional de Atenção Básica e a promoção da atividade física. Rev Bras Ativ Fís Saúde 2017; 22:315-8.. A atividade física foi inserida nos sistemas vigentes de monitoramento da saúde da população brasileira (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico - VIGITEL; Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar - PeNSE; Pesquisa Nacional de Saúde - PNS) e teve como principal avanço sua inclusão na Política Nacional de Promoção da Saúde e Política Nacional de Atenção Básica. Nesse contexto, diversas políticas/ações específicas para promoção de práticas corporais e atividade física podem ser destacadas, como a participação da Educação Física nas equipes do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (recentemente denominado de Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica), Consultório na Rua, Academia da Saúde, Centros de Atenção Psicossocial, atuação na atenção terciária em diversos hospitais, além de iniciativas locais, como os programas que envolvem as práticas corporais e atividade física nas secretarias estaduais e municipais de saúde.
O presente ensaio não tem como objetivo detalhar as ações desenvolvidas, abordar seus importantes avanços bem como suas mais diversas limitações. A intenção aqui é destacar que grande parte dessas políticas possui um potencial na promoção da equidade na prática de atividade física de lazer. Se, de alguma forma, elas ainda atingem um reduzido montante da população brasileira 1818. Oliz MM, Dumith SC, Knuth AG. Utilização de serviços de educação física por adultos e idosos no extremo sul do Brasil: estudo de base populacional. Ciênc Saúde Colet 2020; 25:541-52.,3232. Simoes EJ, Hallal PC, Siqueira FV, Schmaltz C, Menor D, Malta DC, et al. Effectiveness of a scaled up physical activity intervention in Brazil: a natural experiment. Prev Med 2017; 103S:S66-S72.,3333. Ferreira RW, Caputo EL, Häfele CA, Jerônimo JS, Florindo AA, Knuth AG, et al. Acesso aos programas públicos de atividade física no Brasil: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cad Saúde Pública 2019; 35:e00008618., essas iniciativas tendem a atingir exatamente aqueles que mais necessitam, ou, dito de outra forma, sua exclusão ou redução contribuiria para um avanço nas iniquidades.
Além disso, ações de promoção de práticas corporais e atividade física vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) tendem a se estabelecer com outros princípios importantes desse sistema, além da equidade, que não necessariamente são comuns na Educação Física, como a demanda pela universalidade e integralidade na abordagem à população. Considerar o princípio da integralidade, como exemplo, no sentido de compreender as demandas e as necessidades dos indivíduos é exatamente algo criticado no início deste ensaio sobre as formas vigentes de promoção de atividade física como qualquer movimento corporal, descontextualizada socialmente. Tal abordagem pode ser defendida também na perspectiva das práticas corporais e atividade física como ferramenta com capacidade de oposição à dominância do modelo biomédico.
Em adição, destaca-se que vivenciamos atualmente, no cenário brasileiro e mundial, um grande avanço das políticas de austeridade fiscal, as quais potencializam o aumento das desigualdades sociais e seu papel nocivo nos mais diversos indicadores de saúde 3434. Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Souza Noronha KVM, et al. Brazil's unified health system: the first 30 years and prospects for the future. Lancet 2019; 394:345-56.,3535. Naciones Unidas. Derecho de toda persona al disfrute del más alto nivel posible de salud física y mental. https://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/HRC/41/34&Lang=S (acessado em 09/Ago/2019).
https://www.un.org/en/ga/search/view_doc... . O relatório das ONU, ao reforçar que todas as pessoas têm o direito de desfrutar do mais alto nível possível de saúde física e mental, destaca a piora no quadro de saúde mediante implementação de políticas de austeridade 3535. Naciones Unidas. Derecho de toda persona al disfrute del más alto nivel posible de salud física y mental. https://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/HRC/41/34&Lang=S (acessado em 09/Ago/2019).
https://www.un.org/en/ga/search/view_doc... . Especificamente no Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, o relatório recente da Fundação Getúlio Vargas apontou aumento da pobreza e da desigualdade no final de 2018. No relatório, ainda é destacado que a pobreza voltou aos níveis do começo da década (2011) e que a desigualdade no país vem aumentando nos três últimos anos de avaliação 3636. Neri M. Qual foi o impacto da crise sobre a pobreza e a distribuição de renda? https://cps.fgv.br/Pobreza_Desigualdade (acessado em 09/Ago/2019).
https://cps.fgv.br/Pobreza_Desigualdade... . Em termos de saúde, no contexto brasileiro, o congelamento de investimentos em saúde e educação durante vinte anos, previsto pela Emenda Constitucional nº 953737. Brasil. Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016. Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências. Diário Oficial da União 2016; 15 dez., e os indícios de desmonte de inúmeras políticas públicas, incluindo sucateamento do SUS, são preocupantes sinais de retrocesso. Após 15 anos de diminuição da mortalidade infantil, um indicador básico de saúde e de desenvolvimento humano, um acréscimo foi observado em 2016 e 2017 3838. Colucci C. Brazil's child and maternal mortality have increased against background of public spending cuts. BMJ 2018; 362:k3583.. Em termos de taxa de mortalidade padronizada por idade devido a todas as causas, a redução observada nos últimos 25 anos na carga atribuída a DCNTs foi estabilizada entre 2015 e 2016 3939. Malta DC, Duncan BB, Barros MBA, Katikireddi SV, Souza FM, Silva AGD, et al. Fiscal austerity measures hamper noncommunicable disease control goals in Brazil. Ciênc Saúde Colet 2018; 23:3115-22.. Da mesma forma, após sete anos de pequeno e constante crescimento na prevalência de atividade física de lazer (embora também com aumento das desigualdades, como já mencionado), foi observada uma desaceleração nesses indicadores nos últimos anos 88. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2018: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: Ministério da Saúde; 2019.. Sem minimizar a multi e macro determinação desses indicadores, interpretam-se esses desfechos de saúde como sinais latentes de retrocesso. Embora esses sinais obviamente sejam reflexos mais amplos do que especificamente os relacionados ao setor saúde, cabe aos pesquisadores, professores e profissionais de saúde entender o contexto e, mais do que nunca, lutar pelo que é público e voltado aos que mais necessitam de atenção.
Considerações finais
O contexto atual demanda a defesa e a ampliação das políticas e iniciativas públicas de promoção das práticas corporais e atividade física. O setor privado apresentará sempre suas demandas prioritárias vinculadas às relações de mercado que tendem a favorecer o aumento das desigualdades. Retomando a Hipótese da Equidade Inversa e sua tendência de aumento das desigualdades, cabe quase que exclusivamente às políticas públicas evitar ou amenizar tal ocorrência. Precisam ser compreendidas como prioridades as políticas públicas e a vinculação com o SUS e a outros setores, como os de infraestrutura das cidades e esporte e lazer, incorporando os princípios do SUS de universalidade, equidade e integralidade. É nesse sentido que acreditamos em um avanço de ações de promoção das práticas corporais e atividade física contextualizada socialmente que sejam capazes de priorizar aqueles que mais necessitam, combatendo o estabelecimento do que é previsto na Lei dos Cuidados Inversos.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
08 Jun 2020 - Data do Fascículo
2020
Histórico
- Recebido
11 Ago 2019 - Revisado
02 Mar 2020 - Aceito
02 Abr 2020