Análise da implantação do Componente Hospitalar na Rede de Atenção às Urgências e Emergências

Marilei Elisangela Radel Helena Eri Shimizu Sobre os autores

RESUMO

Objetivou-se descrever a implantação dos serviços do Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE) e avaliar a efetividade das Linhas de Cuidado prioritárias nos estabelecimentos habilitados como Portas de Entrada, nas regiões/Unidade da Federação do Brasil, entre 2011 e 2019. Estudo descritivo e analítico, cujos dados foram obtidos do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e do Ministério da Saúde, para avaliar diferenças significativas, antes e depois, da implantação das Linhas de Cuidado prioritárias por meio do teste de Wilcoxon. Constatou-se que a região Sudeste foi a que mais evoluiu, inclusive na implantação de pontos de atenção mais densos tecnologicamente, seguida das regiões: Nordeste, Sul, Norte e Centro-Oeste. A região Sul se destacou na implantação das Linhas de Cuidado prioritárias; além de ter abarcado maior número de implantações dessa Linha, também foi a que melhor evidenciou o crescimento no número de atendimentos e a diminuição no Tempo Médio de Permanência. Verificou-se que a Linha de Cuidado do Trauma foi a que apresentou maior efetividade ao se verificar o número de atendimentos com o crescimento populacional. Concluiuse que o Componente Hospitalar da RUE teve considerável avanço, contudo, as desigualdades regionais são ainda expressivas.

PALAVRAS-CHAVE
Atenção à saúde; Serviço hospitalar de emergência; Emergências; Cuidados críticos

Introdução

A criação e a execução de políticas públicas que impulsionem a busca pela efetivação de princípios básicos, a exemplo da integralidade, são entendidas como um dispositivo importante para o alcance da qualidade nos serviços de saúde11 Shimizu HE. Percepção dos gestores do Sistema Único de Saúde acerca dos desafios da formação das Redes de Atenção à Saúde no Brasil. Physis. 2013 [acesso em 2021 fev 5]; 23(4):1101-22. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/5PvTNwTTfRSXwXRtJFXTwCd/.
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É fato que ainda existem desigualdades de distribuição do Componente Hospitalar nas diferentes regiões, inclusive de cunho tecnológico, o que dificulta o acesso da população aos serviços de saúde22 Shimizu HE, Carvalho ALB, Bretas Junior N, et al. Regionalização da saúde no Brasil na perspectiva dos gestores municipais: avanços e desafios. Ciênc. saúde coletiva. 2021 [acesso em 2021 set 10]; (262):3385-3396. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/PcGfvXTSWTxWWKdMbkNNQmw/?format=pdf.
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,33 Viana ALD, Bousquat A, Pereira APCM, et al. Tipologia das regiões de saúde: condicionantes estruturais para a regionalização no Brasil. Saúde Soc. 2015 [acesso em 2020 mar 2]; 24(2):413-422. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sausoc/a/5zVsFNHY6HFYBrc9KfPDJzg/?format=pdf.
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Nas ocorrências de urgência e emergência, essa necessidade ganha ainda mais destaque, pois as situações ali envolvidas dependem de resposta ágil e oportuna. Além disso, as rupturas na falta da integralidade da atenção se tornam mais visíveis, tendo em vista o risco de vida iminente44 Padilha ARS, Amaral MA, Oliveira DC, et al. Fragilidade na governança regional durante implementação da Rede de Urgência e Emergência em Região Metropolitana. Saúde debate. 2018 [acesso em 2021 out 16]; 42(118):579-93. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/VSm7zn7r5nYbPWNzWj9kGdk/.
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Operar de forma episódica e reativa prejudica sobremaneira o funcionamento do Sistema. Nessa perspectiva, a implantação das redes é percebida como importante instrumento de efetivação de garantia essencial do indivíduo: a do direito à saúde11 Shimizu HE. Percepção dos gestores do Sistema Único de Saúde acerca dos desafios da formação das Redes de Atenção à Saúde no Brasil. Physis. 2013 [acesso em 2021 fev 5]; 23(4):1101-22. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/5PvTNwTTfRSXwXRtJFXTwCd/.
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,44 Padilha ARS, Amaral MA, Oliveira DC, et al. Fragilidade na governança regional durante implementação da Rede de Urgência e Emergência em Região Metropolitana. Saúde debate. 2018 [acesso em 2021 out 16]; 42(118):579-93. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/VSm7zn7r5nYbPWNzWj9kGdk/.
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A necessidade superação de um sistema de saúde fragmentado, com enfoque nas ações curativas e não preventivas, fez com que o Ministério da Saúde, em 2010, instituísse a Rede de Atenção à Saúde (RAS), compreendida como uma malha que integra os diversos pontos de atenção em determinado território, organizados de maneira que esses pontos, mesmo que de diferentes níveis e densidades tecnológicas, estejam articulados e apropriados para o atendimento ao usuário55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279/GM/ MS, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 31 Dez 2010.,66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011..

A RAS foi subdividida em Redes Temáticas, que foram sendo construídas e efetivadas, ao longo dos anos, para responder a condições específicas de saúde. Essas Redes trabalham em um ciclo completo, que implica, também, a integralidade da atenção (incluindo sua continuidade), nos diversos níveis (primário, secundário e terciário)55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279/GM/ MS, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 31 Dez 2010.,66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011..

A Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE) é uma dessas Redes Temáticas. Instituída pela Portaria GM/MS nº 1.600, de 7 de julho de 201177 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1600/GM/MS, de 7 de julho de 2011. Reformula a Política Nacional de Atenção às Urgências e institui a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 8 Jul 2011., posteriormente inserida nas Portarias de Consolidação GM/MS nº 3 e nº 6, ambas de 28 de setembro de 201788 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria de Consolidação nº 3/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Consolida as normas sobre as redes do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 3 Out 2017.,99 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria de Consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Consolida as normas sobre o financiamento e a transferência dos recursos federais para as ações e os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 3 Out 2017., foi organizada por componentes, entre eles, o Componente Hospitalar, que foi regulamentado pela Portaria GM/MS nº 2.395, de 11 de outubro de 20111010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011..

Ainda de acordo com a Portaria GM/MS nº 2.395/20111010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011. (igualmente inserida nas Portarias de Consolidação GM/MS nº 3 e nº 6, ambas de 28 de setembro de 2017)88 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria de Consolidação nº 3/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Consolida as normas sobre as redes do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 3 Out 2017.,99 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria de Consolidação nº 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Consolida as normas sobre o financiamento e a transferência dos recursos federais para as ações e os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 3 Out 2017., o Componente Hospitalar da RUE é um serviço qualificado, organizado por meio da ampliação de serviço prestado pelas Portas de Entrada Hospitalares de Urgência, das enfermarias clínicas de retaguarda, dos leitos de cuidados prolongados, das Linhas de Cuidado (LC) prioritárias e dos leitos de terapia intensiva, com o objetivo de prover o cuidado integral e qualificado aos pacientes em situação de urgência e emergência; e traz como diretrizes1010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011.,1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013.: universalidade, equidade e integralidade no atendimento às urgências; humanização da atenção, centrado no cuidado integral do usuário; atendimento priorizado, mediante a Classificação de Risco segundo grau de sofrimento, urgência e gravidade do caso; regionalização do atendimento às urgências, com articulação dos diversos pontos de atenção e acesso regulado aos serviços de saúde; e atenção multiprofissional, instituída por meio de práticas clínicas cuidadoras e baseada em gestão de LC1010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011.,1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013..

Essas diretrizes têm por finalidade qualificar o atendimento à demanda espontânea ou referenciada de outros pontos de atenção de menor complexidade, garantindo retaguarda no acolhimento de média a alta complexidade, ofertando procedimentos diagnósticos, leitos clínicos de retaguarda, leitos de cuidados prolongados e leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), reforçando a garantia do cuidado hospitalar nas linhas prioritárias: traumatologia, cardiovascular e cerebrovascular1010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011.. Esses pontos de atenção, estruturados, orientados e articulados, permitiriam a integralidade no atendimento. Contudo, mesmo com a ênfase dada ao princípio da regionalização desde a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), ainda existem desigualdades de distribuição desses pontos de atenção1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013..

Assim, conhecer o estado da arte de uma política é essencial para se analisar a evolução de sua implantação. Um estudo que demonstre onde se encontram os menores e maiores quantitativos e os que detêm maior ou menor capacidade tecnológica, bem como do funcionamento das LC prioritárias, pode servir como base para a tomada de decisão dos gestores para adequações/adaptações e redesenhos dessa Rede.

Até o momento, os estudos que se tem conhecimento acerca do Componente Hospitalar da RUE não tratam do panorama evolutivo em âmbito nacional. Vislumbra-se que tal escassez se deve ao fato de ser uma política relativamente nova, cujas regulamentações acerca dos pontos de atenção que a compõem foram sendo construídos, posteriormente, de forma individualizada1212 Lima LL, D’Ascenzi. Implementação de políticas públicas: perspectivas analíticas. Rev. Sociol. Polit. 2013; 21(48).

Diante desse contexto, este estudo objetiva descrever a implantação dos serviços do Componente Hospitalar da RUE e avaliar a efetividade das LC prioritárias nos estabelecimentos habilitados como Portas de Entrada, nas regiões/Unidades da Federação (UF) do Brasil, 2011 a 2019.

Para tanto, tem-se as seguintes definições para os pontos de atenção que integram o Componente Hospitalar da RUE:

Portas de Entrada Hospitalares

É o agrupamento de serviços instalados em uma unidade hospitalar para prestar atendimento ininterrupto ao conjunto de demandas espontâneas e referenciadas de urgências clínicas, pediátricas, cirúrgicas e/ou traumatológicas, obstétricas e de saúde mental1010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011..

Leitos de retaguarda

Uma das estratégias para a melhoria da atenção hospitalar é a ampliação e a qualificação dos leitos1010 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 2395, de 11 de outubro de 2011. Organiza o Componente Hospitalar da Rede de Atenção às Urgências no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 13 Out 2011.. Os leitos de retaguarda podem ser criados ou qualificados em hospitais estratégicos ou em hospitais de menor porte, porém, precisam dar suporte aos prontos-socorros e às unidades de pronto atendimento, sendo exclusivos para retaguarda às urgências, e estar disponíveis nas Centrais de Regulação.

Linhas de Cuidados prioritárias

As LC são uma forma de articulação dos recursos e as práticas de produção de saúde entre as unidades de atenção de uma dada região de saúde, com o intuito de uma condução ágil, oportuna e singular aos diagnósticos e terapias, respondendo às necessidades epidemiológicas de maior relevância. No Componente Hospitalar da RUE, foi definido que as LC prioritárias são as relacionadas com o cuidado cardiovascular, cerebrovascular e com o trauma1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013..

Unidades de Internação em Cuidados Prolongados e Hospitais Especializados em Cuidados Prolongados

As Unidades de Internação em Cuidados Prolongados (UCP) e os Hospitais de Cuidados Prolongados (HCP) são unidades intermediárias entre os cuidados hospitalares de caráter agudo e crônico reagudizado e a atenção básica. Os cuidados prolongados incluem, ainda, a atenção domiciliar necessária antes do retorno do usuário ao domicílio1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013..

Atenção ao paciente crítico: Unidades de Terapia Intensiva

As UTI são ambientes permeados por tecnologia de ponta, com situações iminentes de emergência e necessidade constante de agilidade e habilidade no atendimento. São locais destinados à prestação de assistência especializada a pacientes em estado crítico. Para os pacientes aí internados, há necessidade de controle rigoroso dos seus parâmetros vitais e assistência de enfermagem contínua e intensiva1313 Bolela F, Carvalho Jericó M. Unidades de Terapia Intensiva: considerações da literatura acerca das dificuldades e estratégias para sua humanização. Esc Anna Nery. 2006 [acesso em 2020 jul 25]; 10(2):301-308. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ean/a/bzWqL4GBZhk74wJn637bbjB/?lang=pt.
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Material e métodos

Estudo descritivo e analítico da implantação do Componente Hospitalar da RUE, baseando-se nas habilitações definidas entre os seus respectivos gestores estaduais e municipais, aprovados no âmbito da Comissão Intergestores Bipartite (CIB), e publicadas pelo Ministério da Saúde, no período compreendido entre 2011 e 2019. Este período é justificado pela data de início da implantação do Componente Hospitalar (com a publicação da Portaria nº 2.395/2011) e o ano imediatamente anterior à instituição da atual situação de Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPIIN), que fez com que o sistema trabalhasse, em 2020 e 2021, de forma mais direcionada à resolução dos problemas relacionados com a Covid-19.

Os dados foram extraídos de planilhas de controle (em arquivos Excel®) elaboradas pela Coordenação-Geral de Urgência (CGURG) do Departamento de Atenção Hospitalar, Domiciliar e de Urgência, da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde, do Ministério da Saúde – cujo acesso foi solicitado via Lei de Acesso à Informação (LAI), demanda 40343237, NUP/SEI nº 25072.00899/2021-61 – e do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).

Para análise da efetividade da implantação das LC, foi esperado que o número de atendimentos aumentasse após a implantação da Linha, visto que, a partir daquele momento, além de receber as demandas espontâneas, esses serviços passam agora a receber as referenciadas pela Central de Regulação, conforme sinalizado no próprio ‘Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS)’1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013. e que o Tempo Médio de Permanência (TMP) diminuísse, visto que é um indicador da qualidade hospitalar, medindo a eficiência e a efetividade da assistência com boas práticas clínicas, resultando em um fluxo maior de pacientes, otimização da capacidade instalada e melhora no atendimento ao usuário1111 Brasil. Ministério da Saúde. Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF: Editora do Ministério da Saúde; 2013..

Foram extraídos, das Autorizações de Internação Hospitalar (AIH), dados do TMP de internação e da soma do número de pacientes atendidos/internados nos estabelecimentos de saúde que implantaram as LC prioritárias. Esses dados foram analisados considerando população residente (estimativa populacional, segmentada por sexo e faixa etária) dos municípios onde esses estabelecimentos estão sediados.

As variáveis – número de atendimentos e TMP – e a delimitação da faixa etária (0-19, 20-39, 40-59 e 60 ou mais) foram consideradas baseando-se nas diretrizes do ‘Manual Instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS)’, na Resolução nº 7, de 24 de fevereiro de 2010, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)1414 Brasil. Ministério da Saúde, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº 7, de 24 de fevereiro de 2010. Dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de Unidades de Terapia Intensiva e dá outras providências. Diário Oficial da União. 11 Jan 2010., que dispõe sobre critérios de utilização de leitos de UTI, com ajuste para 19 anos, em função da delimitação feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que estima o crescimento populacional fragmentando-o em idades de cinco em cinco anos, e no Estatuto do Idoso1515 Brasil. Ministério da Saúde. Estatuto do Idoso. 3. ed., 2. reimpr. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2013. 70 p..

Os dados foram analisados por LC (Acidente Vascular Cerebral – AVC, Infarto Agudo do Miocárdio – IAM e Trauma), e região, ano a ano, subdivididos em análise descritiva e de associação. As análises dos dados foram realizadas no programa IBM SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) 23, 2015. O nível de significância utilizado em todo estudo foi de 5%, com testes bicaudais.

Para avaliar os dados do total de atendimentos/produção (número de AIH) e número do TMP, foram calculadas as médias de dois anos imediatamente anteriores e dois anos imediatamente posteriores ao ano de implantação. Quando não houve a possibilidade de estabelecer uma média (quando, dentro do período estudado, havia dados de somente um ano imediatamente anterior e imediatamente posterior a implantação da LC) apenas esses dados foram considerados no cálculo. O ano da implantação da LC também não foi considerado.

Os dados por população foram calculados dividindo a produção pela população do município e multiplicando por mil, ou seja, o valor por população retira o viés do crescimento populacional, por meio da avaliação da taxa de produção (número de AIH) por mil habitantes1616 Ramos AL P, Seta MHD. Atenção primária à saúde e Organizações Sociais nas capitais da Região Sudeste do Brasil: 2009 e 2014. Cad. Saúde Pública. 2019 [acesso em 2021 jan 30]; 35(4). Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00089118.
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Inicialmente, as variáveis quantitativas foram testadas em relação à normalidade da distribuição de dados, sendo que, para todas as variáveis quantitativas, houve rejeição da hipótese nula de normalidade dos dados (teste Kolmogorov-Smirnov)1717 Berger VW, Zhou Y. Kolmogorov-Smirnov test: Overview. Wiley Statsref: Statistics Reference Online. 2014. [acesso em 2021 jan 30]. Disponível em: https://doi.org/10.1002/9781118445112.stat06558.
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. Portanto, foram utilizados testes não paramétricos para avaliar diferenças significativas antes e depois da implantação das LC prioritárias por meio do teste de Wilcoxon1818 Rey D, Neuhäuser M. Wilcoxon-Signed-Rank Test. Berlin: Springer; Heidelberg; 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1007/978-3-642-04898-2_616.
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de amostras relacionadas. As variáveis serão apresentadas por meio das medidas descritivas média, mediana, desvio-padrão, mínimo, máximo e amplitude interquartil.

Resultados

Constatou-se que a implantação do Componente Hospitalar nas UF totalizou, no período de 2011 a 2019, 21.388 pontos, distribuídos da seguinte forma: Minas Gerais, 3.269; São Paulo, 2.679; Pernambuco, 1.898; Paraná, 1.736; Rio de Janeiro, 1.409; Santa Catarina, 1.266; Rio Grande do Sul, 1.263; Ceará, 978; Bahia, 881; Pará, 783; Goiás, 649; Espirito Santo, 587; Mato Grosso do Sul, 572; Alagoas, 454; Mato Grosso, 396; Roraima, 356; Maranhão, 316; Paraíba, 301; Rio Grande do Norte, 283; Piauí, 273; Amazonas, 231; Sergipe, 219; Amapá, 190; Distrito Federal, 135; Roraima, 127; Tocantins, 105; e Acre, 31.

Na tabela 1, pode-se verificar a evolução quantitativa das Portas de Entrada Hospitalares. Observa-se que os estados da região Sudeste tiveram maior crescimento se somados os números de Hospitais Especializados (HE) Tipo I, HE Tipo II e Hospitais Gerais (HG), com destaque para São Paulo, seguidos da região Nordeste, sendo o Ceará o estado com maior número de habilitações. No quantitativo geral, a região Nordeste foi a que mais habilitou HG no período estudado. Na região Sul, que ocupa a terceira posição em termos quantitativos, foi identificado que todos os estados habilitaram mais HE Tipo II do que Tipo I e HG. Na quarta posição, encontra-se a região Norte, com destaque para a grande parte dos pontos implantados serem HG. Maiores quantidades de pontos foram implantadas nos estados do Pará e do Amazonas. Por último, está a região Centro-Oeste, na qual se destacaram os estados de Mato Grosso do Sul e Goiás.

Tabela 1
Número de habilitações de Portas de Entrada Hospitalares, segundo o tipo, por região e por UF, no período 2011-2019

Para os leitos de Enfermaria Clínica de Retaguarda (tabela 2), assim como as Portas de Entrada, o maior número de habilitações também aconteceu na região Sudeste, sendo Minas Gerais o estado de destaque, com 1.737 habilitações de leitos, seguido do Rio de Janeiro, com 931 habilitações. A região Nordeste foi a segunda em termos quantitativos, cujo estado que mais habilitou leitos foi Pernambuco (1.283 habilitações). A região Sul ficou em terceiro lugar, com 2.071 leitos, seguida pela região Norte, com 1.171 leitos; e, por último, a região Centro-Oeste, com 764 leitos. Apesar de a região Centro-Oeste ser a que menos evoluiu na quantidade de leitos, o estado que menos implantou foi Tocantins, que pertence à região Norte. No Distrito Federal e no Acre, não foram implantados leitos de Enfermaria Clínica de Retaguarda no período estudado.

Tabela 2
Número de habilitações de leitos de Enfermaria Clínica de Retaguarda, segundo o tipo, por região e por UF, no período 2011-2019

Constatou-se que, durante o período estudado, houve a habilitação de 8.193 de leitos (tabela 3) de UTI Tipo II e Tipo III (Adulto e Pediátrico), sendo que o maior quantitativo se deu novamente na região Sudeste com 3.306 leitos de UTI, somando-se as tipologias Tipo II e Tipo III. A UF que mais evoluiu em quantitativos foi São Paulo, seguida por Minas Gerais. Já Roraima foi a UF que menos habilitou leitos integrando a RUE.

Tabela 3
Número de habilitações de leitos de UTI, segundo o tipo, por região e por UF, no período 2011-2019

São Paulo também se destaca quando da soma do número de leitos de UTI Tipo III, Adulto e Pediátrico, com 451 leitos.

Quanto aos pontos UCP ou HCP, observa-se na tabela 4 que, apesar do estado do Espírito Santo não ter habilitado nenhuma unidade, mesmo assim, o maior quantitativo de habilitações desses pontos de atenção ocorreu na região Sudeste, com destaque para o estado de Minas Gerais, que habilitou 265 leitos de UCP e 1 HCP dos 1.172 implantados no período. Já a região que menos habilitou UCP foi a Norte, com somente 15 leitos no estado de Rondônia e nenhum HCP em toda a região.

Tabela 4
Número de habilitações de leitos de pontos de atenção de cuidados prolongados, por região e por UF, no período 2011-2019

Em relação à implantação das LC prioritárias, o destaque se deu novamente para a região Sudeste, com 136 pontos de atenção, se somados os Centros de Atendimento de Urgência aos Pacientes com AVC, os Centros de Trauma e as Unidades Coronarianas.

A evolução do quantitativo de implantações de AVC foi maior na região Sul (32), seguida pela região Sudeste (24). Os dois estados que mais evoluíram foram, respectivamente, Rio Grande do Sul, com 21 Centros, e São Paulo, com 18. Na região Norte, só houve a habilitação de dois Centros de AVC no estado do Pará.

Já na implantação dos Centros de Trauma, o destaque se deu para a região Centro-Oeste. Dos 27 Centros, 9 ocorreram nessa região, e, destes, 7 no Distrito Federal. Os outros 18 Centros foram implantados em outras 9 UF. A região Nordeste não implantou nenhum Centro de Trauma ao longo do período estudado.

Quando somados os leitos de Unidades Coronarianas implantados, verifica-se que a região Nordeste foi a que mais evoluiu em quantitativo. Dos 302 leitos implantados, 112 foram nessa região, e outros 108 foram na região Sudeste. Se a avaliação for feita por UF, Minas Gerais se destaca com a habilitação de 45 leitos. O estado que menos habilitou leitos de Unidade Coronariana foi Tocantins (1). Já Acre, Amapá, Ceará, Distrito Federal, Maranhão, Piauí, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e Sergipe não habilitaram nenhuma Unidade Coronariana.

Na região Sul, houve aumento significativo da produção (número de AIH) para ambos os sexos e para o sexo masculino e feminino, mesmo considerando os valores por população (tabela 5). Ou seja, houve aumento significativo do número de AIH após a implantação da LC, retirando o viés do crescimento populacional. Em contrapartida, houve diminuição significativa do TMP após a implantação da LC nessa região do País.

Tabela 5
Análise comparativa (AIH, TMP e População) Linhas de Cuidado (IAM, AVC e Trauma) – Região Sul

A produção por faixas etárias também foi avaliada para cada LC (Trauma, AVC e IAM) individualmente. Assim, visualiza-se, conforme tabela 5, que, para a LC Trauma, houve aumento significativo da produção (número de AIH) para o sexo masculino (0-19 anos), mesmo considerando os valores por população. Para as mulheres, houve aumento significativo da produção (número de AIH) apenas considerando o crescimento populacional na faixa etária de 20 a 39 anos. Para os idosos (> 60 anos) houve aumento significativo da produção (número de AIH) considerando o valor total, mas, ao avaliar por população (retirando os efeitos do crescimento populacional), esse crescimento de produção já não é mais estatisticamente significativo.

Discussão

Mesmo ocorrendo particularidades temporais nos ciclos de implantação dos pontos de atenção do Componente Hospitalar, os resultados do estudo evidenciaram que, ao longo do período estudado, houve um crescimento importante do número de pontos de atenção do Componente Hospitalar da RUE em todo o País, demonstrando uma clara resposta do efeito indutor das políticas de Urgência e Emergência, especialmente a que instituiu a RUE e a que criou o Componente Hospitalar, que atuaram sinergicamente, sobretudo possibilitando aumento dos recursos financeiros aos estados e municípios para essa finalidade.

Contudo, observou-se que as desigualdades regionais foram mantidas. A região que mais evoluiu na implantação do Componente Hospitalar da RUE foi a Sudeste (7.945 pontos de atenção habilitados), que historicamente apresentou maior avanço nesse aspecto, mas que também convive com um sistema fragmentado66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011., seguida pela região Nordeste, com 5.603 pontos de atenção habilitados. A região Sul habilitou 4.267 pontos de atenção, a Norte, no período estudado, demonstrou mais dificuldade e, mesmo assim, ainda habilitou mais pontos de atenção do que a região Centro-Oeste (Norte, 1.823 pontos de atenção; e Centro-Oeste, 1.753). Esses dados indicam que as regiões Nordeste e Norte têm feito um esforço para melhorar a RAS1919 Sousa ABL, Garnelo L, Mota PHS, et al. Regional health network in the Amazonian context: the case in Manaus, Entorno and Alto Rio Negro. Rev. Bras. Saude Mater. Infant. 2017 [acesso em 2021 mar 30]; (supl1):239-248. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1806-9304201700S100011.
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, sobretudo caminhando, ainda que lentamente, em direção a suprimento de hospitais em regiões remotas, necessários para reduzir as desigualdades no acesso2020 Rechel B, Džakula A, Duran A, et al. Hospitals in rural or remote areas: An exploratory review of policies in 8 high-income countries. Health Policy. 2016 [acesso em 2021 ago 18]; 120(7):758-69. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.healthpol.2016.05.011.
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Com relação às Portas de Entrada Hospitalares, a região Sudeste se destacou não só em quantitativo, mas também nas implantações de pontos de atenção de tipologias que são mais densas tecnologicamente66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011., a exemplo dos HE Tipo II.

Como essa tipologia de Porta de Entrada precisa, para sua implantação, ser referência em, no mínimo, dois serviços de alta complexidade (neurocirurgia, traumato-ortopedia, cardiologia/cardiovascular) ou ser referência em pediatria, consequentemente, a implantação das LC prioritárias também seguiu a mesma direção, sendo a região Sudeste a que mais habilitou pontos de atenção das LC (AVC, IAM e Trauma).

Se somados os pontos de atenção da Tipologia ‘III’ dessas LC, o destaque se dá, também, para a região Sul. Dos 92 pontos de atenção dessa tipologia habilitados ao longo do período, 71 deles estão localizados nas regiões Sudeste e Sul. Essas instituições de alto volume – ou seja, esses pontos de atenção mais especializados e capacitados – ainda proporcionam, quando da sua implantação, economia de escala, uma maior curva de aprendizagem dos profissionais e uma melhor qualidade do serviço prestado2121 Ramos MC, Barreto JOM, Shimizu HE, et al. Regionalization for health improvement: A systematic review. PLoS ONE. 2020 [acesso em 2021 out 2]; 15(12):e0244078. Disponível em: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0244078.
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Já a região Nordeste, que se destacou quando somados todos os pontos de atenção que integram o Componente Hospitalar, foi a que habilitou o maior número de Portas de Entrada como HG. Do total de habilitações de Portas de Entrada nessa região, mais de 50% são dessa tipologia (do total de 91 Portas habilitadas na região Nordeste, 49 são do tipo HG).

Essa tipologia detém estrutura para atendimentos de média complexidade. Esses serviços visam atender aos principais problemas de saúde e agravos da população, cujo nível de complexidade da prática clínica demande a disponibilidade de profissionais especializados e a utilização de recursos tecnológicos de apoio diagnóstico e terapêutico2222 Solla J, Chioro A. Atenção Ambulatorial Especializada. In: Giovanella L, Lobato LVC, organizadoras. Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro; 2012. p. 1-35.. A instalação dessa tipologia de Porta de Entrada está amplamente condicionada à oferta de serviços, e não à demanda dos usuários2222 Solla J, Chioro A. Atenção Ambulatorial Especializada. In: Giovanella L, Lobato LVC, organizadoras. Políticas e Sistemas de Saúde no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro; 2012. p. 1-35.,2323 Borsato FG, Carvalho BG. Hospitais gerais: inserção nas redes de atenção à saúde e fatores condicionantes de sua atuação. Ciênc. saúde coletiva. 2021; 26(4):1275-88., diferentemente dos serviços de alta complexidade, ou seja, os pontos de atenção terciários, que estão mais concentrados espacialmente66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011..

De qualquer forma, mesmo sendo inábeis para a dispensação de terapias adequadas para diversas especialidades2424 Lavras C. Atenção Primária à Saúde e a Organização de Redes Regionais de Atenção à Saúde no Brasil. Saúde Soc. 2011 [acesso em 2021 out 2]; 20(4):867-874. Disponível em https://www.scielo.br/pdf/sausoc/v20n4/05.pdf.
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, esses hospitais desempenham um papel importante no alcance dos serviços em rede, visto que, usualmente, são a única opção de internação no município-sede do estabelecimento e são segmento estratégico para a efetivação do acesso à saúde2525 Silva JFM, Carvalho BG, Domingos CM. Health governance and the public-private relationship in small municipalities. Ciênc. saúde coletiva. 2018; 23(10):3179-88.. Ainda, sob a ótica de redes poliárquicas, não há entre os pontos de atenção primários, secundários ou terciários relação de principalidade ou subordinação. Todos são importantes para o atingimento dos objetivos comuns das RAS66 Mendes EV. As Redes de Atenção à Saúde. Brasília, DF: Organização Pan-Americana de Saúde; 2011..

Não obstante, um grande número de habilitações de leitos de Enfermaria Clínica de Retaguarda também aconteceu nessa região. Esses leitos, que desempenham um papel de retaguarda às Portas de Entrada, precisam ser habilitados em estabelecimentos que possuem um quantitativo acima de 50 leitos, sendo esses estabelecimentos estratégicos ou de menor adensamento tecnológico. Minas Gerais, estado integrante da região Sudeste, que se destacou ao se somar o quantitativo total de implantação do Componente Hospitalar, também foi o estado com maior número de habilitações de leitos de Enfermaria Clínica.

Novamente, com relação aos leitos de UTI, a região Sudeste se destaca na habilitação de leitos de UTI Tipo III que são mais densos tecnologicamente. Não díspar aos pontos anteriores, a região Sul ocupa o segundo lugar, e a região Nordeste, agora, ocupa o quarto lugar, ficando à frente somente da região Norte, que não habilitou nenhum leito dessa tipologia. A habilitação de leitos de densidades tecnológicas maiores, além de favorecerem o paciente, contribui para a economia de escala, visto que, com equipamentos próprios e equipe mais especializada, ocorre uma diminuição de tempo de permanência no leito e declínio funciona2626 Reis GR, Pires A, Rossone DF, et al. A importância da mobilização precoce na redução de custos e na melhoria da qualidade das Unidades de Terapia Intensiva. Rev Aten Saude. 2018; 16(56):94-100..

Destarte, considerando que as UCP e os HCP se constituem em unidades intermediárias entre os cuidados hospitalares de urgência/emergência e a atenção básica, e que esse tipo de atendimento está relacionado com a continuidade da atenção aos pacientes, esses resultados foram congruentes aos obtidos quando analisados os dados dos pontos de atenção mais densos tecnologicamente.

Assim, a região Sudeste foi a que mais evoluiu em quantitativo, tendo destaque o estado de Minas Gerais, seguida pela região Sul. Outro fator relevante e importante a ser destacado com relação à importância desse ponto de atenção é que a transferência dos pacientes dos outros pontos de atenção para os HCP e para as UCP aumenta consideravelmente as vagas oferecidas no setor terciário2727 Pazin-Filho A, Almeida E, Cirilo LP, et al. Impacto de leitos de longa permanência no desempenho de hospital terciário em emergências. Rev Saude Publica. 2015; (49):83..

A LC que se destacou durante o período estudado, com um aumento significativo na produção de AIH, foi a do Trauma. As demais (IAM e AVC) tiveram um acréscimo no número de AIH, porém, ao se avaliar o crescimento populacional, não houve um aumento significativo.

Observa-se, também, quando da análise dos dados obtidos, que, com exceção da região Sul, as demais macrorregiões não apresentaram mudança significativa da produção (número de AIH), retirando-se o viés do crescimento populacional, nem do TMP após a implantação da LC.

No entanto, a região Sul, que obteve o maior número de implantações de LC, também se destacou em efetividade. Mesmo retirando o viés do crescimento populacional, houve um aumento significativo no número de AIH no período pós-implantação da LC. O TMP, nessa região, também diminuiu após a implantação da Linha.

Uma das limitações do estudo diz respeito à falta de um modelo lógico e de dados mais organizados para avaliação do Programa; todavia, buscou-se com os dados disponíveis demonstrar o estado da arte após a implantação do Componente Hospitalar da RUE, que tem mostrado avanços2828 Jorge AO, Coutinho AAP, Fagundes AMS, et al. Entendendo os desafios para a implementação da rede de atenção às Urgências e Emergências no Brasil: uma análise crítica. Divulg. Saúde debate. 2014 [acesso em 2021 out 2]; (52):125-45. Disponível em: https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lil-774074.
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Conclusões

Constatou-se que houve crescimento substancial do número de pontos de atenção do Componente Hospitalar da RUE em todo o País, todavia, que está concentrado na região Sudeste, particularmente de pontos de atenção de tipologias com maior densidade tecnológica. A região Sul obteve o maior número de implantações de LC e, também, se destacou em aumento de AIH e menor TMP. A LC Trauma mostrou aumento na produção das AIH.

A RUE, na sua amplitude, com todos os seus componentes, precisa ser continuamente pensada e adaptada de modo a reduzir as desigualdades regionais persistentes, assim como cumprir as diretrizes preconizadas e o atendimento integral ao usuário do SUS.

  • Suporte financeiro: não houve
  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2022
  • Aceito
    23 Nov 2022
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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