Problematizando as relações entre homoparentalidade e saúde

Romeu Gomes Rosana Machin Marcos Antonio Ferreira do Nascimento Marcia Tereza Couto Sobre os autores

Resumo

Buscando preencher lacunas e/ou aprofundar o debate, o artigo objetiva problematizar aspectos que envolvem as relações entre homoparentalidade e saúde. O desenho metodológico é o de ensaio, ancorado em literatura específica. Ao longo do texto procura-se trabalhar as seguintes questões: (i) Como se esboça historicamente a temática central desta discussão? (ii) Como se afigura a homoparentalidade no campo da produção científica da saúde em geral? (iii) Quais dimensões sociopolíticas emergem em torno das relações homoparentalidade-saúde? e (iv) Quais são os limites e as possibilidades para o exercício dos direitos reprodutivos entre casais homoafetivos? Dentre as conclusões, destaca-se o desafio de se enfrentar o estranhamento da temática homoparentalidade para a ideia da família denominada de “normal”, configurada a partir da lógica heteronormativa. Mesmo nos países em que há algum aparato jurídico que garanta direitos às famílias homoparentais, seus integrantes são alvo de preconceitos, discriminações e violências.

Palavras-chave:
Homoparentalidade; Família; Saúde

Introdução

A homoparentalidade, termo criado em 1997 pela Associação de Pais Gays e Lésbicas11 Gross M. Histoire des revendications homoparentales en France. Bull d'Histoire Politique 2010; 18(2):113-123., na França, designa qualquer situação familiar que abriga pelo menos um adulto que se identifica como homossexual e esteja criando um ou mais filhos11 Gross M. Histoire des revendications homoparentales en France. Bull d'Histoire Politique 2010; 18(2):113-123.. Ribeiro et al.22 Ribeiro CR, Gomes R, Moreira MCN. A paternidade e a parentalidade como questões de saúde frente aos rearranjos de gênero. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3589-3598., com base em Zambrano33 Zambrano E. Parentalidades "impensáveis": pais/mães homossexuais, travestis e transexuais. Horiz Antropol 2006; 12(26):123-147., observam que a homoparentalidade se constitui a partir de, pelo menos, quatro situações:

[...] por filhos havidos em uma ligação heterossexual anterior, pela adoção legal ou informal, através de usos das novas tecnologias reprodutivas que possibilitam o nascimento de filhos biológicos, e pela coparentalidade, na qual os cuidados com a criança são exercidos de forma conjunta e igualitária pelos parceiros22 Ribeiro CR, Gomes R, Moreira MCN. A paternidade e a parentalidade como questões de saúde frente aos rearranjos de gênero. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3589-3598.(p.3592).

Nos anos 1990, na França, a homoparentalidade surgiu na encruzilhada da mudança de atitudes em relação à homossexualidade, do progresso científico na área da reprodução assistida e da transformação das atitudes sociais em relação à família11 Gross M. Histoire des revendications homoparentales en France. Bull d'Histoire Politique 2010; 18(2):113-123..

Ainda que a expressão homoparentalidade seja alvo de críticas, como referem Zambrano33 Zambrano E. Parentalidades "impensáveis": pais/mães homossexuais, travestis e transexuais. Horiz Antropol 2006; 12(26):123-147. e Cecílio et al.44 Cecílio MS, Scorsolini-Comim F, Santos MA. Produção científica sobre adoção por casais homossexuais no contexto brasileiro. Estud Psicol 2013; 3(18):507-516., utilizaremos tal expressão para realçar a parentalidade envolvendo gays ou lésbicas.

A discussão acerca da homoparentalidade encontra-se relativamente em ampla expansão no cenário internacional da área da saúde em geral, ainda que no âmbito nacional essa discussão nessa área ainda seja tímida55 Gomes R, Toma TS, Silva JL, Domene FM, Silva A. A homoparentalidade como questão da saúde coletiva: uma revisão de escopo. Rev Saude Publica 2023; 57:80.. Embora a temática em questão possa ser percebida como recente, Gross11 Gross M. Histoire des revendications homoparentales en France. Bull d'Histoire Politique 2010; 18(2):113-123. observa que pais homossexuais existem desde a existência da homossexualidade. Segundo a autora, pessoas homossexuais casaram ou casam e vivem sua homossexualidade de forma mais ou menos clandestina, ou sua atração por pessoas do mesmo sexo só foi descoberta depois de terem filhos no contexto de uma união heterossexual.

Vecho e Schneider66 Vecho O, Schneider B. Attitudes envers l'homoparentalité: Une comparaison entre psychologues français et québécois. Can J Behav Sci 2015; 47(1):102-112., com base em dados internacionais, observam que as estatísticas que tentam quantificar o número de famílias do mesmo sexo permanecem raras e às vezes imprecisas. A título ilustrativo, os autores apresentam dados de 2007 dos Estados Unidos, em que se registra que a parentalidade do mesmo sexo envolve entre 2 e 14 milhões de crianças. Ainda no sentido ilustrativo, observam que em Quebec, de acordo com dados de um censo de 2011, 1.410 crianças viviam em uma família composta por um casal do mesmo sexo casado ou em união estável.

Mesmo nos países com legislações que protegem os direitos de famílias homoparentais há inúmeros desafios para que essas famílias exerçam os seus direitos. Tais desafios não se circunscrevem apenas nas questões da homoparentalidade, mas também em questões da homossexualidade que as antecedem77 Scali T, D'Amore S. Défis et besoins des intervenants psychosociaux en planning familial face à la thématique de l'homoparentalité. Dans Thérapie Familiale 2016; 2(37):187-204..

No Canadá, país que implementou grandes mudanças legislativas para pôr fim a toda discriminação legal contra casais do mesmo sexo e famílias homoparentais, estudos apontam que ainda há discriminações contra pais e filhos dessas famílias, fazendo com que sintam estresses que podem afetar a sua saúde e seu bem-estar88 Lavoie K, Greenbaum M. Regards sur les familles homoparentales: s'ouvrir à leurs réalités pour mieux répondre aux besoins des enfants. Nouvelles Pratiques Soc 2012; 24(2):140-150.. Além dos preconceitos e das discriminações, a invisibilidade e o silêncio são os obstáculos mais frequentes enfrentados pelos membros de uma família homoparental nesse país.

No sentido de preencher lacunas e/ou aprofundar o debate relacionado ao assunto em questão, nossa discussão objetiva problematizar aspectos que envolvem as relações entre homoparentalidade e saúde. Para isso, ancorados em literatura específica, seguiremos um caminho ensaístico, aqui entendido como um exercício exploratório acerca de um tema ou objeto de discussão, buscando uma nova forma de olhar o assunto99 Tobar F, Yalour MR. Como fazer teses em saúde pública: conselhos e ideias para formular projetos e redigir teses e informes de pesquisas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2002.. Nesse caminho, destacamos principalmente questões relacionadas à parentesco e família, bem como a ressonância dessas questões na área da saúde.

No caminho da problematização das relações entre homoparentalidade e saúde, adotamos a estratégia de formular as seguintes questões: (i) Como se esboça historicamente a temática central desta discussão? (ii) Como se afigura a homoparentalidade no campo da produção científica da saúde em geral? (iii) Quais dimensões sociopolíticas emergem em torno das relações homoparentalidade-saúde? e (iv) Quais são os limites e as possibilidades para o exercício dos direitos reprodutivos entre casais homoafetivos?

Historicizando a temática no campo da saúde

A homoparentalidade pode ser lida como ressignificação de uma lógica naturalizada e naturalizante da procriação e filiação biogenética em famílias compostas pelo par homem-mulher, sobretudo quando lembramos que as uniões informais entre pessoas de mesmo sexo e a criação de crianças por gays e lésbicas há muito estão presentes na sociedade, mesmo que não lhes fossem dadas visibilidade e amparo jurídico.

A busca por compreender a homoparentalidade em sua complexidade contemporânea - como desdobramento da crescente visibilidade da homossexualidade e do questionamento dos conceitos e normas tradicionais da família -, levou os pesquisadores a, inicialmente, se debruçarem sobre as nomenclaturas empregadas na abordagem do fenômeno. A relativa falta de consenso resulta de ênfases políticas, orientações teóricas de campos disciplinares distintos e contextos sociais e geográficos onde se investiga o fenômeno. Assim, enquanto os estudos ingleses, norte-americanos e canadenses utilizam terminologias como gay families, lesbian families, same sex couples, gay parenthood and lesbian motherhood1010 Imrie S, Golombok S. Impact of new family forms on parenting and child development. Annual Rev Develop Psychol 2020; 2:295-316.,1111 Luce J. Beyond expectation: lesbian/Bi/queer women and assisted reproduction. Toronto: University of Toronto Press; 2010., no Brasil, particularmente nas áreas do direito e medicina, no início da década de 2000, o termo homoafetividade foi utilizado de modo a suavizar debates políticos de busca de afirmação de direitos1212 Machin R. Homoparentalidade e adoção:(re) afirmando seu lugar como família. Psicol Soc 2016; 28:350-359.. Com o passar do tempo, e sobretudo a partir da vertente de estudos socioantropológicos, o termo homoparentalidade é tomado do francês homoparentalité de modo a tornar estratégica a visibilidade do tema. Somado a isto, a utilização dessa denominação tem por fundamento reposicionar o debate frente a ideologias arraigadas à família heteronormativa socialmente prevalente.

A historização do campo de pesquisa em homoparentalidade explicita como distintos campos disciplinares, como medicina, psicologia e psicanálise, antropologia, sociologia e direito elegeram questões norteadoras às investigações e referenciais conceituais. Comumente, dado o caráter interdisciplinar das pesquisas e as tênues fronteiras entre estes campos, os temas e objetos de pesquisa tendem a confluir para grandes grupos. Para Gato e Fontaine1313 Gato J, Fontaine AM. Homoparentalidade no masculino: uma revisão da literatura. Psicol Soc 2014; 26:312-322., os estudos iniciais, a partir da década de 1970, se voltaram ao comportamento e práticas parentais de mães lésbicas e pais gays, o desenvolvimento psicológico dos seus filhos e as atitudes da comunidade heterossexual face à homoparentalidade.

No tocante ao comportamento parental, a revisão de Gato e Fontaine1313 Gato J, Fontaine AM. Homoparentalidade no masculino: uma revisão da literatura. Psicol Soc 2014; 26:312-322. aponta para a concordância entre a hetero e a homoparentalidade, sendo que alguns dos estudos indicam o favorecimento de famílias homoparentais em aspectos como divisão do trabalho doméstico, qualidade das relações com os filhos e vida conjugal. O desenvolvimento psicológico de filhos pertencentes a tais famílias foi tema bastante explorado na literatura anglo-saxã, particularmente a partir das contribuições das pesquisas longitudinais de crianças em famílias com pais de mesmo sexo de Susan Golombok1414 Golombok S. Parenting in new family forms. Current Opinion Psychol 2017; 15:76-80.. Estes estudos representaram avanços importantes na reconfiguração de medos sociais relacionados a tais famílias, na medida em que explicitam que as crianças nestas “novas formas familiares” vivenciam uma parentalidade positiva, estão bem ajustadas às fases de desenvolvimento e que a estrutura familiar é menos importante para a adaptação das crianças do que os processos familiares1010 Imrie S, Golombok S. Impact of new family forms on parenting and child development. Annual Rev Develop Psychol 2020; 2:295-316.,1414 Golombok S. Parenting in new family forms. Current Opinion Psychol 2017; 15:76-80..

Mais recentemente, no campo da saúde no Brasil, a expressividade dos estudos e debates em torno da homoparentalidade refletem a ampliação do debate público a partir dos anos iniciais da década de 2010. Em 2011, decisão do Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo permitindo a esses casais a adoção juridicamente oficializada com registro de dupla maternidade ou paternidade1515 Supremo Tribunal Federal (STF). Supremo reconhece união homoafetiva [Internet]. 2011 [acessado 2015 dez 14]. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178931.
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoti...
. Em 2013, a norma médica que regulamenta o funcionamento da prática no país faculta o acesso de casais de mulheres e homens às tecnologias reprodutivas (TR)1616 Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução nº 2.013/2013 [Internet]. [acessado 2015 abr 9]. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2013/2013_2013.pdf.
http://www.portalmedico.org.br/resolucoe...
.

Nesta década, estudos nacionais se voltam a questão de como esses casais de gays e lésbicas constroem um projeto de parentalidade, quais os caminhos para sua viabilização e como manejam o processo de tornarem-se pais/mães diante das implicações em termos legais no campo médico e no campo do direito de família1212 Machin R. Homoparentalidade e adoção:(re) afirmando seu lugar como família. Psicol Soc 2016; 28:350-359.,1717 Vitule C, Couto MT, Machin R. Casais de mesmo sexo e parentalidade: um olhar sobre o uso das tecnologias reprodutivas. Interface (Botucatu) 2015; 19:1169-1180.

18 Costa PA. Homoparentalidade: que famílias, que experiências? In: Leal I, Pimenta F, Marques M, coordenadoras. Intervenção em Psicologia clínica e da saúde: modelos e práticas. Lisboa: Placebo; 2012. p. 115-128.
-1919 Vilhena J, Souza ACB, Uziel AP, Zamora MH, Novaes JV Que família? Provocações a partir da homoparentalidade. Rev Mal-Estar Subjetividade 2011; 11(4):1639-1658.. Estes estudos sinalizam uma mudança cultural sobre os caminhos que estão sendo trilhados para se construir uma família, seja por meio do acesso à biomedicina e tecnologias reprodutivas (TR), seja pelos processos de adoção. Ademais, os caminhos para o exercício da parentalidade estão envoltos em distintas (in)possibilidades institucionais (operadas pelo direito e pela saúde). Neste sentido, as investigações deste período buscam estabelecer quais correlações de força influem na concretização da experiência destes casais em constituírem famílias com filhos.

A produção científica da saúde em foco

No sentido de mapear a produção científica acerca da homoparentalidade no campo da saúde em geral, tomamos como estratégia a busca de artigos-revisão acerca do assunto por entendermos que essa modalidade de artigo pode nos fornecer um mapeamento sobre o assunto. Nesse sentido, realizamos dois breves levantamentos. O primeiro deles foi no Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br), no dia 10 de agosto de 2023. Nesse levantamento, definindo o período de 2020 a 2023, foram identificadas seis revisões2020 Biasutti CM, Nascimento CRR, Gato J, Bortolozzo ML. Same-sex parenting in Brazil and Portugal: An integrative review. Res Soc Develop 2022; 11(16):e357111638227.

21 Ferreira EPP, Fernandes MFSF, Bragança RAP, Maceiras M. Midwife's interventions to promote positive experiences for female homosexual couples during pregnancy: a scoping review. J Nurs Edu Practice 2022; 12(9):54-62.

22 Leal D, Gato J, Coimbra S, Freitas D, Tasker F. Social support in the transition to parenthood among Lesbian, gay, and bisexual persons: a systematic review. Sexuality Res Soc Policy 2021; 18:1165-1179.

23 Mata JJ, Santos MA, Scorsolini-Comin F. Conjugalidade e parentalidade em casais homossexuais e heterossexuais: revisão integrativa da literatura. Pensando Famílias 2020: 24(2):32-45.

24 Santos AB, Bossi TJ. A Vivência da parentalidade por casais homossexuais: revisão sistemática de teses e dissertações. Pensando Famílias 2022: 26(1):152-166.

25 Santos YGS, Scorsolini-Cominb F, Santos MA. Homoparentalidade masculina: revisando a produção científica. Psicol Reflex Crítica 2013; 26(3):572-582.
-2626 Viana FDC, Leite CB, Torres CMG, Martins VF, Barbosa GS, Diniz JA, Ramos FS. Considerações sobre a homoparentalidade adotiva: uma revisão integrativa da literatura. Rev Casos Consultoria 2022; 13(1):e13129319.. O segundo levantamento foi realizado no Portal Regional da BVS (https://bvsalud.org), no dia 18 de agosto de 2023, sem filtro de ano para a busca. Nele foram identificadas quatro outras revisões44 Cecílio MS, Scorsolini-Comim F, Santos MA. Produção científica sobre adoção por casais homossexuais no contexto brasileiro. Estud Psicol 2013; 3(18):507-516.,2626 Viana FDC, Leite CB, Torres CMG, Martins VF, Barbosa GS, Diniz JA, Ramos FS. Considerações sobre a homoparentalidade adotiva: uma revisão integrativa da literatura. Rev Casos Consultoria 2022; 13(1):e13129319.

27 Lucio FPS, Araújo EC. A maternidade de mães lésbicas na perspectiva da enfermagem: revisão integrativa. Rev Eletr Enf 2017; 19:a08.
-2828 Ruiz JM, Borges CAP, Hueb MFD, Tilio R, Scorsolini-Comin F. Gender and adoption in the brazilian context: an integrative review of the scientific literature. Trends Psychol 2019; 27(2):293-308. e uma já localizada no primeiro levantamento2424 Santos AB, Bossi TJ. A Vivência da parentalidade por casais homossexuais: revisão sistemática de teses e dissertações. Pensando Famílias 2022: 26(1):152-166..

No que se refere ao contexto da análise, a maioria das revisões leva em conta tanto a produção nacional quanto a internacional. Como exceção, identificamos uma revisão que focaliza o contexto brasileiro2828 Ruiz JM, Borges CAP, Hueb MFD, Tilio R, Scorsolini-Comin F. Gender and adoption in the brazilian context: an integrative review of the scientific literature. Trends Psychol 2019; 27(2):293-308. e outra estabelece comparações entre os contextos brasileiro e português2020 Biasutti CM, Nascimento CRR, Gato J, Bortolozzo ML. Same-sex parenting in Brazil and Portugal: An integrative review. Res Soc Develop 2022; 11(16):e357111638227..

A maioria dos estudos aborda famílias de gays e lésbicas conjuntamente. Dois estudos delimitam a análise a questões sobre lésbicas, enfocando a área da enfermagem no trato da gravidez e cuidados pré-natais2121 Ferreira EPP, Fernandes MFSF, Bragança RAP, Maceiras M. Midwife's interventions to promote positive experiences for female homosexual couples during pregnancy: a scoping review. J Nurs Edu Practice 2022; 12(9):54-62., bem como maternidade lésbica2727 Lucio FPS, Araújo EC. A maternidade de mães lésbicas na perspectiva da enfermagem: revisão integrativa. Rev Eletr Enf 2017; 19:a08.. Um estudo focaliza as questões familiares de gays2525 Santos YGS, Scorsolini-Cominb F, Santos MA. Homoparentalidade masculina: revisando a produção científica. Psicol Reflex Crítica 2013; 26(3):572-582.. Quando a comunidade LGBT é mencionada nos textos, figuram principalmente como apoio às famílias homoparental2020 Biasutti CM, Nascimento CRR, Gato J, Bortolozzo ML. Same-sex parenting in Brazil and Portugal: An integrative review. Res Soc Develop 2022; 11(16):e357111638227.

21 Ferreira EPP, Fernandes MFSF, Bragança RAP, Maceiras M. Midwife's interventions to promote positive experiences for female homosexual couples during pregnancy: a scoping review. J Nurs Edu Practice 2022; 12(9):54-62.
-2222 Leal D, Gato J, Coimbra S, Freitas D, Tasker F. Social support in the transition to parenthood among Lesbian, gay, and bisexual persons: a systematic review. Sexuality Res Soc Policy 2021; 18:1165-1179..

Em termos de abordagem teórico-conceitual, duas revisões destacam que suas fontes primárias se ancoraram na Psicanálise, Antropologia e Direito2525 Santos YGS, Scorsolini-Cominb F, Santos MA. Homoparentalidade masculina: revisando a produção científica. Psicol Reflex Crítica 2013; 26(3):572-582.,2727 Lucio FPS, Araújo EC. A maternidade de mães lésbicas na perspectiva da enfermagem: revisão integrativa. Rev Eletr Enf 2017; 19:a08., enquanto duas revisões baseiam suas análises em aspectos psicológicos44 Cecílio MS, Scorsolini-Comim F, Santos MA. Produção científica sobre adoção por casais homossexuais no contexto brasileiro. Estud Psicol 2013; 3(18):507-516.,2424 Santos AB, Bossi TJ. A Vivência da parentalidade por casais homossexuais: revisão sistemática de teses e dissertações. Pensando Famílias 2022: 26(1):152-166..

Dentre as principais conclusões das revisões, destacamos as seguintes: (a) sentimentos relacionados à família de casais do mesmo sexo e a pertença a ela não se relaciona à orientação sexual2424 Santos AB, Bossi TJ. A Vivência da parentalidade por casais homossexuais: revisão sistemática de teses e dissertações. Pensando Famílias 2022: 26(1):152-166.; (b) avanços no campo jurídico promoveram avanços nos direitos de famílias homossexuais2424 Santos AB, Bossi TJ. A Vivência da parentalidade por casais homossexuais: revisão sistemática de teses e dissertações. Pensando Famílias 2022: 26(1):152-166.; (c) a criação de filhos em famílias em lares homoafetivos não difere da criação em famílias ditas convencionais2828 Ruiz JM, Borges CAP, Hueb MFD, Tilio R, Scorsolini-Comin F. Gender and adoption in the brazilian context: an integrative review of the scientific literature. Trends Psychol 2019; 27(2):293-308.; (d) na constituição da família, gays recebem menos apoio da família do que lésbicas e estas recebem menos apoio do que as mulheres heterossexuais2222 Leal D, Gato J, Coimbra S, Freitas D, Tasker F. Social support in the transition to parenthood among Lesbian, gay, and bisexual persons: a systematic review. Sexuality Res Soc Policy 2021; 18:1165-1179.; (e) gays às vezes são vistos como incapazes de serem pais por conta dos estereótipos de sua identidade gay2222 Leal D, Gato J, Coimbra S, Freitas D, Tasker F. Social support in the transition to parenthood among Lesbian, gay, and bisexual persons: a systematic review. Sexuality Res Soc Policy 2021; 18:1165-1179.; (f) a adoção pode ser uma via de se constituir a parentalidade por parte de casais homossexuais2323 Mata JJ, Santos MA, Scorsolini-Comin F. Conjugalidade e parentalidade em casais homossexuais e heterossexuais: revisão integrativa da literatura. Pensando Famílias 2020: 24(2):32-45.,2626 Viana FDC, Leite CB, Torres CMG, Martins VF, Barbosa GS, Diniz JA, Ramos FS. Considerações sobre a homoparentalidade adotiva: uma revisão integrativa da literatura. Rev Casos Consultoria 2022; 13(1):e13129319. e (g) profissionais de saúde devem ser mais preparados para uma assistência pré-natal de lésbicas2121 Ferreira EPP, Fernandes MFSF, Bragança RAP, Maceiras M. Midwife's interventions to promote positive experiences for female homosexual couples during pregnancy: a scoping review. J Nurs Edu Practice 2022; 12(9):54-62.,2727 Lucio FPS, Araújo EC. A maternidade de mães lésbicas na perspectiva da enfermagem: revisão integrativa. Rev Eletr Enf 2017; 19:a08..

Em termos de foco de discussão, seja de forma central ou secundária, a produção acerca do assunto põe em questionamento a hegemonia da família heteronormativa para que se possa considerar a homoparentalidade. Tal questionamento ocorre principalmente com argumentos de que não há diferenças nas formas de cuidar dos filhos entre casais heterossexuais e homossexuais. Também é atestado, por meio de estudos longitudinais de crianças criadas por casais homossexuais, que não há comprometimentos psicológicos dessas crianças.

Para que se avance na problematização de se tomar como referência a família heteronormativa, como algumas revisões afirmam, faz-se necessário investigar mais as famílias homoafetivas e abrir espaço para suas opiniões no debate científico. Como observa Bourdieu2929 Bourdieu P. Des familles sans nom. Actes Recherche Sci Soc 1996; 113:3-5., as configurações inusitadas de família, por meio de questionamentos que promovem, podem revelar princípios de visão até agora não vistos, “como os óculos que procuramos quando os temos no nariz e que, instituídos tanto nas coisas quanto nos corpos, assegurou um status inquestionavelmente óbvio aos modos de ser ou fazer, os da chamada família normal, assim constituídas como normas absolutas”2929 Bourdieu P. Des familles sans nom. Actes Recherche Sci Soc 1996; 113:3-5.(p.3).

Na busca da compreensão da constituição da família de casais homossexuais, assim como em outros arranjos familiares que fogem da norma hegemônica, é preciso que a produção avance na problematização dos conceitos família e parentesco. Weston3030 Weston K. Families we choose: lesbians, gays, kinship. New York/Oxford: Columbia University Press; 1997. observa que famílias não devem ser confundidas com relacionamentos genealogicamente definidos. Segundo a autora, nos Estados Unidos, gays e lésbicas consideram a família como a que foi escolhida, envolvendo pessoas que você pode contar emocional e materialmente. Nessa escolha de quem é parente, podem ser incluídos amigos, amantes, coparentes, filhos adotivos, filhos de relacionamentos heterossexuais anteriores e filhos concebidos por inseminação alternativa3030 Weston K. Families we choose: lesbians, gays, kinship. New York/Oxford: Columbia University Press; 1997.. Por outro lado, “os parentes biológicos ou adotivos de um amante podem não ser classificados como parentes, dependendo de suas atitudes de ‘rejeição’ ou ‘aceitação’”3030 Weston K. Families we choose: lesbians, gays, kinship. New York/Oxford: Columbia University Press; 1997.(p.112).

No avanço da problematização dos conceitos de família e parentesco, também podemos incluir as análises de Sahlins3131 Sahlins M. What Kinship Is-And Is Not. Chicago: The University of Chicago Press; 2013. que concebe parentesco como uma questão de “mutualidade do ser”, em que - numa lógica de pertencimento intersubjetivo - são pessoas que são intrínsecas à existência uma da outra. O autor observa que várias formas de constituição de parentesco se afiguram na lógica de “mutualidade”, seja por via “consanguínea” ou “afim”, bem como arranjos grupais de descendência.

Além das relações entre família e parentesco não serem aprofundadas nas revisões analisadas, também observamos que as questões relacionadas ao método de reprodução assistida não são discutidas. Tal método, quando aparece, é mencionado apenas como uma forma de constituir a parentalidade, junto à adoção, sem que haja um aprofundamento. No sentido de contribuir para preencher essa lacuna, discutiremos a seguir tais questões.

Dimensões sociopolíticas em torno das relações homoparentalidade-saúde

Os movimentos sociais (MS), concebidos como ações sociopolíticas construídas por atores coletivos de diferentes classes e estratos sociais, podem contribuir para o desenvolvimento e a transformação da sociedade civil, envolvendo diversas áreas, como a educação e a saúde3232 Gohn MG. Teorias dos Movimentos Sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Loyola; 1997.,3333 Gomes R. Participação dos movimentos sociais na saúde de gays e lésbicas. Cien Saude Colet 2021; 26(6):2291-2300.. Adam3434 Adam BD. Epistemic fault lines in biomedical and social approaches to HIV prevention. J Int AIDS Soc 2011; 14(Supl. 2):S2. observa que os sucessos dos movimentos sociais podem ter como consequência agendas robustas no âmbito das reivindicações políticas.

Com a epidemia de Aids, surgiram os chamados “novos movimentos sociais” com formas distintas de envolvimento com a ciência3333 Gomes R. Participação dos movimentos sociais na saúde de gays e lésbicas. Cien Saude Colet 2021; 26(6):2291-2300.. Um exemplo de alianças entre a biomedicina e movimentos sociais que resultou na transformação da prática médica no tratamento da Aids é o extenso estudo de Epstein3535 Epstein S. The Construction of Lay Expertise: AIDS Activism and the Forging of Credibility in the Reform of Clinical Trials. Sci Techn Human Values 1995; 20(4):408-437..

Em alguns países, as conquistas de gays e lésbicas no campo da saúde podem ser tributadas às alianças estabelecidas entre os movimentos desses atores com outros movimentos, a exemplo do ativismo da Aids e o feminismo3333 Gomes R. Participação dos movimentos sociais na saúde de gays e lésbicas. Cien Saude Colet 2021; 26(6):2291-2300.. Segundo Green et al.3636 Green JN, Quinalha R, Caetano, Fernandes M. Apresentação. 40 anos do movimento LGBT brasileiro. In: Green JN, Quinalha R, Caetano, Fernandes M, organizadores. História do Movimento LGBT no Brasil. São Paulo: Alameda; 2018. p. 9-13., o movimento homossexual surgiu em alguns países no final da década de 1960 e no Brasil, o atual movimento LGBTI+, já tem quatro décadas.

Gomes3333 Gomes R. Participação dos movimentos sociais na saúde de gays e lésbicas. Cien Saude Colet 2021; 26(6):2291-2300. observa que - embora a participação dos MS em lutas pela saúde de gays e lésbicas tenha se iniciado nos primeiros anos do século passado - em pleno século XXI, em alguns países, reivindicações políticas se configuraram em agendas sociais, enquanto, em outros, só foram conseguidas precárias concessões de direitos. Nesse sentido, segundo o mencionado autor, faz- se necessário o contínuo empreendimento de ações políticas por parte de MS no sentido de garantir direitos à saúde para todas as identidades de gênero e orientações sexuais.

Maior potencial de mobilização voltados para os direitos sexuais não hegemônicos, em alguns países, foi possível na medida em que os movimentos gays e lésbicos foram se alinhando às reivindicações de outras identidades de gênero, como as de bissexuais e transgêneros3232 Gohn MG. Teorias dos Movimentos Sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Loyola; 1997..

No que se refere ao reconhecimento do tema homoparentalidade, a sociedade francesa é um exemplo a ser citado. Desde 1980, tal tema vem se afigurando como objeto das ciências sociais e humanas e a Association des Parents Gays et Lesbiens (APGL) teve um papel político importante nesse reconhecimento11 Gross M. Histoire des revendications homoparentales en France. Bull d'Histoire Politique 2010; 18(2):113-123.. A APGL, desde 1986, vem focalizando gays e lésbicas que tenham ou pretendam ter e criar filhos (APGL, 2013).

No Brasil, o movimento LGBT conta com mais de quatro décadas de atuação, incidindo politicamente em diferentes âmbitos, incluindo o da saúde3737 Quinalha R. Movimento LGBTI+: Uma breve história do século XIX aos nossos dias. Belo Horizonte: Autêntica; 2018.,3838 Ferreira BO, Nascimento M. A construção de políticas de saúde para as populações LGBT no Brasil: perspectivas históricas e desafios contemporâneos. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3825-3834.. Ao longo desse período obteve algumas conquistas importantes como a Política Nacional Integral de Saúde LGBT, lançada em 2011; o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo, estabelecido pela resolução 175, do Conselho Nacional de Justiça, em 2013; e a criminalização da homofobia, equiparando-se ao crime de racismo, em 2019, pelo Supremo Tribunal Federal.

De igual maneira, os Princípios de Yogyakarta3939 Princípios de Yogyakarta mais 10. Princípios e obrigações estatais adicionais sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual, identidade de gênero, expressão de gênero e às características sexuais que complementam os Princípios de Yogyakarta. 2017., documento internacional que reconhece as violações de direitos por motivos de orientação sexual ou identidade de gênero como violações de direitos humanos, inclui no princípio 24, as obrigações estatais relativas ao direito de formar uma família4040 Bandeira K. Comissão da Câmara pauta projeto que proíbe casamento homoafetivo [Internet]. O Globo; 2023. [acessado 2023 set 24]. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2023/09/19/comissao-da-camara-pauta-projeto-que-proibe-casamento-homoafetivo.ghtml.
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, independentemente da orientação sexual e/ou identidade de gênero. Isso significa, no cenário internacional dos direitos humanos, reconhecer a multiplicidade de famílias e as possibilidades de arranjos parentais.

O reconhecimento de famílias homoparentais tem sido uma pauta do movimento LGBT e de coletivos específicos como a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas. No entanto, é preciso ressaltar que embora haja conquistas importantes nas últimas décadas, convivemos também com tentativas de retrocesso em curso, como o Projeto de Lei nº 5.167, de 2009, contrário ao casamento homoafetivo, a ser votado no Congresso Nacional, com a justificativa de que “aprovar o casamento homossexual é negar a maneira pela qual todos os homens nascem neste mundo, e, também, é atentar contra a existência da própria espécie humana”4040 Bandeira K. Comissão da Câmara pauta projeto que proíbe casamento homoafetivo [Internet]. O Globo; 2023. [acessado 2023 set 24]. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2023/09/19/comissao-da-camara-pauta-projeto-que-proibe-casamento-homoafetivo.ghtml.
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. Vale frisar que, diferentemente de outros países em que o casamento entre pessoas do mesmo sexo foi fruto de lei específica, no caso brasileiro, não há lei que permita e regularize o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Contudo, tanto a decisão do STF em reconhecer a união estável desde 2011, e a decisão do CNJ que determinou aos cartórios a obrigatoriedade de realizar o casamento homoafetivo, em 2013, conferem direitos aos casais perante a lei e à justiça brasileira.

Dessa maneira, o debate sobre casamento homoafetivo, a homoparentalidade e outros arranjos possíveis de famílias, diz respeito não somente a questões jurídicas, mas como Grossi4141 Grossi M. Parceria civil: realidade ou utopia? In: Mello L. Novas famílias: conjugalidade homossexual no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Garamond; 2005. já nos chamava a atenção, a um “embate político” em que diferentes “concepções de cidadania” está em jogo.

Limites e possibilidades para o exercício dos direitos reprodutivos entre casais homoparentais

O processo de transformações políticas, culturais e legislativas em torno da descriminalização da homossexualidade, da igualdade de casais homoafetivos para o casamento civil, a reivindicação pelo reconhecimento da adoção de crianças e acesso a tecnologias reprodutivas em diferentes sociedades nas últimas décadas, foi gerado por mudanças de paradigmas e de mentalidades, que têm como importante referência a luta pelo reconhecimento da igualdade de direitos dos grupos LGBT. Neste contexto, sobressai a referência ao princípio da igualdade de direitos dos cidadãos, sendo este mais relevante do que os supostos elogios à “diferença”4242 Almeida MV. A chave do armário. Homossexualidade, casamento, família. Florianópolis: Ed. UFSC; 2010..

Apesar de termos verificado na última década, em diferentes sociedades, importantes avanços no reconhecimento dos direitos dos homossexuais na constituição da parentalidade e no direito à não discriminação com base na orientação sexual prevalece ainda a centralidade do casal heterossexual em diversos domínios. Ademais, tem crescido o surgimento de posições políticas conservadoras e de extrema direita em diferentes países, que questionam esses direitos e tem buscado constituir uma agenda de revogação dessas conquistas.

Nesse sentido, o acesso aos direitos de parentalidade ainda pode envolver incertezas legais e sociais para muitos casais homoafetivos, que pretendam exercer seu direito ou mesmo aqueles que já tenham constituído uma família4343 Park N, Schmitz RM, Slauson-Blevins K. "It Takes a Lot of Planning": Sexual Minority Young Adult Perceptions of Gay and Lesbian Parenthood. J Family Issues 2020; 41(10):1785-1809.. Esses direitos compreendidos no âmbito dos direitos humanos como direitos reprodutivos se ancoram no reconhecimento do direito básico à autonomia necessária para o exercício da capacidade reprodutiva de todo casal e todo indivíduo. Ou seja, de decidir livre e responsavelmente sobre ter ou não ter filhos e em que número, com a eleição do momento adequado para a reprodução e a forma em que ela se dará4444 Manifesto da Campanha por uma Convenção Interamericana dos Direitos Sexuais e dos Direitos. Rev Estud Feministas 2007; 15(1):1-24..

A construção da parentalidade por esses grupos envolve processos diferentes daqueles presentes em casais heterossexuais. Ela pode ser vista igualmente como produto das distintas possibilidades institucionais da reprodução nesses contextos e assim se configuram como coprodutores dessas formas familiares, tais como, acesso a políticas públicas, que facultam a adoção ou acesso às tecnologias reprodutivas e sistemas nacionais de saúde1717 Vitule C, Couto MT, Machin R. Casais de mesmo sexo e parentalidade: um olhar sobre o uso das tecnologias reprodutivas. Interface (Botucatu) 2015; 19:1169-1180.. A literatura sobre o tema tem destacado que os projetos de parentalidade de minorias sexuais se constituem a partir de uma decisão madura e refletida e, portanto, com um compromisso com a parentalidade, na medida em que precisam buscar formas de viabilizar uma família que não decorre diretamente do exercício da sexualidade4343 Park N, Schmitz RM, Slauson-Blevins K. "It Takes a Lot of Planning": Sexual Minority Young Adult Perceptions of Gay and Lesbian Parenthood. J Family Issues 2020; 41(10):1785-1809.,4545 R, Maria M, López GF. Meeting-Abstract: Families with Lesbian Mothers and Gay Fathers in Spain after the Legislative Change: From Legal to Real Equality. Culture Health Sexuality 2011; 13(Supl. 1):S1-S179.,4646 Riskind R, Patterson C. Parenting intentions and desires among childless lesbian, gay, and heterosexual individuals. J Family Psychol 2010; 24(1):78-81.. Nesse sentido, esses grupos ao se afastarem da discussão das formas de procriação sexuada e filiação biogenética trazem novos aportes para o debate social.

Algumas perguntas que envolvem a construção desse projeto podem ser expressas em como gostariam de ter um filho; se gostariam de adotar; quem participaria desse processo (realizar sozinha(o) ou com parceria); se gostariam de estar implicadas(os) geneticamente/biologicamente na filiação4747 Carvalho PGC. Homoparentalidade feminina: nuances da assistência à saúde durante concepção, gravidez, parto e pós-parto [tese]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 2018.,4848 Fonseca C. Homoparentalidade: novas luzes sobre o parentesco. Estud Fem 2008; 16(3):769-783.. As respostas a estas indagações podem estabelecer distintas trajetórias para sua efetivação e envolver maiores limitações ou possibilidades.

A literatura tem revelado que o acesso às tecnologias reprodutivas para a construção da homoparentalidade entre mulheres tem sido crescente na maioria dos países que reconhecem esse direito, caso do Reino Unido, Estados Unidos, Brasil, Canadá, Austrália, entre outros4949 Mamo L. Queering reproduction: achieving pregnancy in the age of technoscience. Durham & London: Duke University Press; 2007.,5050 Luce J. Beyond expectation: lesbian/Bi/queer women and assisted reproduction. Toronto: University of Toronto Press; 2010.. Em alguns países esse acesso ocorre inclusive através dos sistemas nacionais de saúde como no Reino Unido e Canadá ou por meio do setor privado como nos Estados Unidos. No caso do Brasil, a resolução do Conselho Federal de Medicina de 2013, menciona explicitamente o acesso às tecnologias reprodutivas para casais homoafetivos. Contudo, a prática já era realizada anteriormente em algumas clínicas, como alguns estudos registraram1717 Vitule C, Couto MT, Machin R. Casais de mesmo sexo e parentalidade: um olhar sobre o uso das tecnologias reprodutivas. Interface (Botucatu) 2015; 19:1169-1180.,5151 Correa MEC. Duas mães? Mulheres lésbicas e maternidade [tese]. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo; 2012.. Outro elemento importante nessa situação foi a permissão para a realização da técnica conhecida como ROPA (Recepção de Óvulos pela Parceira) pelo Conselho Federal de Medicina. Por meio dessa técnica, na fertilização in vitro, ambas mulheres participam do processo, com uma delas doando o óvulo para a outra gestar. A técnica permite a vinculação biológica de ambas com a criança a ser gerada1717 Vitule C, Couto MT, Machin R. Casais de mesmo sexo e parentalidade: um olhar sobre o uso das tecnologias reprodutivas. Interface (Botucatu) 2015; 19:1169-1180..

No caso da constituição da homoparentalidade masculina pelo acesso às tecnologias reprodutivas identifica-se maiores restrições por esta envolver a prática da gestação por substituição (ou cessão temporária do útero), que encontra restrições legais em diversos países. Alguns deles permitem a prática para casais heterossexuais, mas restringem a participação de homoafetivos como, por exemplo, Rússia e Ucrânia. Em outros países ela é regulada e liberada para realização em casais heterossexuais, homoafetivos e mesmo pessoas solo, como em alguns estados dos Estados Unidos e do México, Bélgica, África do Sul, Colômbia. Há países onde a remuneração por esta prática é proibida, como na Austrália, Reino Unido e Canadá5252 Olavarría ME. La gestación para otros en México. Parentesco, tecnología y poder. Ciudad de México: Gedisa-Universidad Autónoma Metropolitana; 2018.,5353 Parry B. Surrogate Labour: Exceptional for Whom? Economy Soc 2018; 47(2):214-233.. No Brasil, a regulação é definida pelo Conselho Federal de Medicina (resolução CFM nº 2.320/2022). Desde a primeira resolução, de 1992, só se permite a gestação de substituição intrafamiliar, com exceções devendo passar pelo crivo do CFM, vedada a comercialização da prática.

Esse contexto diverso de regulações internacionais e limitação de acesso à prática para casais gays conduz a que muitos precisam sair do seu país de residência para realizar o procedimento. Esse aumento de viagens em busca de serviços reprodutivos tem sido vinculado à internacionalização de serviços de saúde, com o estabelecimento de redes de conectividade reprodutiva capazes de se adaptar às leis nacionais e regionais, ao desenvolvimento tecnológico e mobilidade de pessoas trazendo novas questões e desafios no âmbito do exercício dos direitos.

Ademais, é importante considerar que algumas dessas possibilidades de acesso aos direitos reprodutivos para homoafetivos podem significar barreiras econômicas, reforçando desigualdades sociais e iniquidades em saúde, na medida em que envolvem custos a serem realizados por meio de serviços privados por não estarem disponíveis em sistemas nacionais de saúde4343 Park N, Schmitz RM, Slauson-Blevins K. "It Takes a Lot of Planning": Sexual Minority Young Adult Perceptions of Gay and Lesbian Parenthood. J Family Issues 2020; 41(10):1785-1809..

No caso das adoções estudos têm demonstrado, que mesmo em contextos em que a adoção é legalizada para casais e pessoas gays e/ou lésbicas, preconceitos e homofobia relativos à sua habilidade em exercer a parentalidade, por profissionais da área de justiça e assistência social, podem significar efetivos obstáculos para o exercício de seus direitos4343 Park N, Schmitz RM, Slauson-Blevins K. "It Takes a Lot of Planning": Sexual Minority Young Adult Perceptions of Gay and Lesbian Parenthood. J Family Issues 2020; 41(10):1785-1809.,5454 Farr D, Goldberg A. Sexual orientation, gender identity, and adoption law. Family Court Rev 2018; 56(3):374-383..

Considerações finais

A inserção do debate sobre a homoparentalidade no campo da saúde em geral pode trazer inúmeras questões para que ações sejam planejadas e implementadas. Um desafio é o enfrentamento do estranhamento que tal temática se afigura para a ideia da família denominada de “normal”, configurada a partir da lógica heteronormativa. Mesmo nos países em que há algum aparato jurídico que garanta direitos às famílias homoparentais, seus integrantes são alvo de preconceitos, discriminações e violências.

Uma das estratégias para esse enfrentamento vem por meio do desenvolvimento de investigações que mostram, por exemplo, que os filhos criados no interior dessas famílias não apresentam diferenças em termos de desenvolvimento comparados aos que integram as famílias heterossexuais. Essa resposta de investigadores da área da saúde que, de certa forma, busca - por meio da disseminação do conhecimento - alcançar a longo prazo um certo êxito para que se pense a família na lógica da diversidade.

Outra estratégia que pode trazer avanços sobre o reconhecimento da homoparentalidade na ordem social é o alinhamento que pode ser estabelecido entre ações do setor da saúde e as promovidas pelos movimentos sociais ou pelo ativismo social. Em alguns países, como no Brasil, historicamente esse alinhamento em torno da Aids, por exemplo, produziu oportunidades para que direitos fossem assegurados aos infectados pelo HIV. No caso da homoparentalidade, se os profissionais de saúde desejam empreender alinhamentos com outros setores sociais, se faz necessário - antes de tudo - mapear os potenciais atores políticos que possam ingressar na discussão sobre os direitos das famílias homoparentais a uma atenção integral à saúde de seus integrantes.

Independentemente dessas estratégias, a área da saúde enfrenta um desafio interno de refletir acerca da formação de seus profissionais para lidarem com a temática em questão. Que competências são necessárias para que esses profissionais reconheçam as necessidades de saúde de famílias homoparentais? Como acolher as demandas dessas famílias? Como customizar os protocolos de saúde para essas famílias?

Essas questões, dentre outras, servem de mote para que continuemos a problematização das relações possíveis entre homoparentalidade e saúde em geral.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    Abr 2024

Histórico

  • Recebido
    21 Nov 2023
  • Aceito
    30 Nov 2023
  • Publicado
    30 Nov 2023
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br