Saúde da população negra na formação em saúde: perspectivas rumo à equidade racial

Dyana Helena de Souza Dais Gonçalves Rocha Nilza Rogéria de Andrade Nunes Sobre os autores

Resumo

Este artigo objetiva compreender a visão de equidade racial e as motivações para a abordagem da saúde da população negra na formação dos cursos de Saúde Coletiva, Enfermagem e Medicina de uma universidade pública brasileira, orientado na perspectiva negra da decolonialidade. Considerando o Racismo Institucional, é preciso investir nas interfaces entre os setores educação e saúde na formação de profissionais para o Sistema Único de Saúde. Trata-se de estudo de natureza qualitativa com abordagem do tipo pesquisa-intervenção, afirmando um compromisso social e político de transformação da realidade. Para tanto, foram realizadas oficinas com representantes dos Núcleos Docentes Estruturantes dos cursos selecionados. A temática da saúde da população negra tem sido trabalhada de forma pontual e descontextualizada, sem uma reflexão do racismo estrutural, das relações de poder e da formação socio-histórica brasileira, o que se distancia das diretrizes propostas pela Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Ao final, são sinalizadas perspectivas para a reorientação da formação em saúde, visando ao aumento da densidade democrática e da equidade racial.

Palavras-chave:
Saúde da população negra; Racismo institucional; Ensino superior; Formação profissional em saúde

Introdução

Para compreender como o colonialismo e o racismo influenciaram a formação racial brasileira, Lélia Gonzalez11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82. chama a atenção à violência etnocida, intrínseca ao olhar da brancura europeia e da expansão colonial, que até hoje perdura e gera iniquidades nas vidas da população negra e dos povos indígenas. A autora afirma o racismo como uma neurose cultural brasileira e se debruça sobre a configuração ideológica do racismo latino-americano, caracterizado pela ideologia do branqueamento, e de como ela tem sido eficaz e disseminada na formulação do conhecimento científico. Forjou-se uma ideia de relação harmoniosa entre as raças, que justificaria a inexistência de racismo no Brasil. Seus efeitos, por sua vez, assim como aqueles do colonialismo e imperialismo, são ocultados pela noção de uma democracia racial.

Partindo dessa premissa e reconhecendo a necessidade de inclusão da temática do racismo e da saúde da população negra na formação dos profissionais de saúde, este artigo tem como objetivo entender, a partir da pesquisa-intervenção, a visão de equidade racial e as motivações para abordagem do assunto na formação dos cursos de Saúde Coletiva, Enfermagem e Medicina de uma universidade pública brasileira da região Centro-Oeste.

O referencial de análise do estudo é a perspectiva negra da decolonialidade. Uma vez que, historicamente, “a colonialidade do poder, do ser e do saber vem nos ajudando a pensar em estratégias para transformar a realidade”22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54.(p.10), a decolonialidade é entendida como um projeto acadêmico, político e coletivo. Nesse sentido, ela discute categorias-chave para o entendimento da complexidade das relações étnico-raciais: a questão racial e o racismo, o eurocentrismo e os usos epistêmico-políticos da colonização, assim como o epistemicídio do pensamento negro na ciência. Essa perspectiva permite aproximações com práticas e projetos emancipatórios que influenciam em diferentes campos do conhecimento22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54., tornando-se urgente a necessidade da descolonização dos currículos e do conhecimento no Brasil. Entretanto, “não bastam o reconhecimento e a vontade política para descolonizar a mente, a política, a cultura, os currículos e o conhecimento”33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246.(p.226). Para que a descolonização seja concretizada, é preciso que ela ultrapasse a produção do conhecimento e atinja as estruturas sociais de poder, por meio de “uma ruptura epistemológica, política e social que se realiza também pela presença negra nos espaços de poder e decisão; nas estruturas acadêmicas; na cultura; na gestão da educação, da saúde e da justiça”33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246.(p.226).

Tomando como referência a leitura da particularidade brasileira, Gomes33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246. apresenta um dos questionamentos centrais feitos pelo movimento negro em uma perspectiva negra e decolonial: a crítica ao mito da democracia racial ancorado na crença da “existência de relações harmoniosas entre os diferentes grupos étnico-raciais do nosso país, fruto da relação do colonizador português com os povos por ele dominados”44 Gomes NL. O movimento negro no Brasil: ausências, emergências e a produção dos saberes. Pol Soc 2011; 10(18):133-154.(p.138). O mito da democracia racial está presente na forma como as relações raciais foram forjadas e, por isso, o racismo também se manifesta no sistema educacional33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246.,55 Jardim R, Oliveira Júnior MG, Schott M. Percepção de racismo no ensino superior em saúde na perspectiva docente. Rev Bras Polít Adm Educ 2022; 38(1):e113350.,66 Mello L, Resende UP. Concursos públicos federais para docentes e ações afirmativas para candidatos negros. Cad Pesq 2020; 50(175):8-28. e de saúde77 Geraldo RM, Oliveira JC, Alexandre LSC, Aguiar MRA, Vieira AFS, Germani ACCG. Preenchimento do quesito raça/cor na identificação dos pacientes: aspectos da implementação em um hospital universitário. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3871-3880.

8 Anunciação D, Pereira LL, Silva HP, Nunes APN, Soares JO. (Des)caminhos na garantia da saúde da população negra e no enfrentamento ao racismo no Brasil. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3861-3870.
-99 Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS, Barreto JOM. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão de escopo rápida. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3849-3860..

Levando em conta a dimensão do Racismo Institucional99 Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS, Barreto JOM. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão de escopo rápida. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3849-3860.

10 Almeida SAL. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen; 2019.
-1111 Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra. Saude Soc 2016; 25(3):535-549., reconhecemos sua manifestação nos serviços de saúde e nas Instituições de Ensino Superior (IES), bem como seus reflexos na formação de profissionais para o Sistema Único de Saúde (SUS), pois o racismo reproduz iniquidades em saúde1111 Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra. Saude Soc 2016; 25(3):535-549.. O Racismo Institucional precisa ser analisado a partir da “dimensão do poder como elemento constitutivo das relações raciais”1010 Almeida SAL. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen; 2019.(p.31) e de como ele é exercido de um grupo sobre outro considerando uma estrutura social. Conforme afirma Almeida, “as instituições são racistas porque a sociedade é racista”1010 Almeida SAL. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen; 2019.(p.31) e essa é a dimensão mais negligenciada do racismo.

É necessário reconhecer outros codeterminantes que atuam ao mesmo tempo na determinação de condições de vida e saúde1111 Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra. Saude Soc 2016; 25(3):535-549., razão pela qual a interseccionalidade88 Anunciação D, Pereira LL, Silva HP, Nunes APN, Soares JO. (Des)caminhos na garantia da saúde da população negra e no enfrentamento ao racismo no Brasil. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3861-3870.,1212 Jones CP. Confronting institutionalized racism. Phylon 2022; 50(1):7-22.

13 Pereira BCJ. Sobre usos e possibilidades da interseccionalidade. Civitas 2021; 21(3):445-454.
-1414 Crenshaw K. Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Rev Estud Fem 2002; 10(1):171-188. pode contribuir significativamente para o entendimento e inter-relação dos sistemas de dominação1111 Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra. Saude Soc 2016; 25(3):535-549.. Por isso, algumas políticas públicas, como a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), assumem estratégias de gestão e implementação de ações no combate do racismo institucional e redução das iniquidades raciais1515 Brasil. Resolução nº 3, de 30 de março de 2017. Dispõe sobre o III Plano Operativo (2017-2019) da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União; 2017..

A PNSIPN entende a equidade racial como um movimento para “reconhecimento do racismo, das desigualdades étnico-raciais e do racismo institucional como determinantes sociais das condições de saúde, com vistas à promoção da equidade em saúde”1515 Brasil. Resolução nº 3, de 30 de março de 2017. Dispõe sobre o III Plano Operativo (2017-2019) da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União; 2017.(p.24). Portanto, a dimensão étnico-racial deve fazer parte de uma agenda nacional de políticas públicas1616 Monteiro MCS. Desafios da inclusão da temática étnico-racial na educação permanente em saúde. In: Batista LE, Wernek J, Lopes F. Saúde da População Negra. 2ª ed. São Paulo: Associação Brasileira de Pesquisadores Negros; 2012. p. 146-159.. As diretrizes da PNSIPN permitiram a elaboração de estratégias em direção à equidade racial, pois propõem a inclusão da temática do racismo e saúde da população negra na formação dos profissionais de saúde, o incentivo à produção de conhecimento, o reconhecimento dos saberes populares, o monitoramento e avaliação das ações de combate ao racismo, entre outras ações1717 Trad L, Mota C, Catellanos M, Farias VN, Brasil SA. Percepção sobre a Política de Saúde da População Negra: perspectivas polifônicas. In: Batista LE, Wernek J, Lopes F. Saúde da População Negra. 2ª ed. São Paulo: Associação Brasileira de Pesquisadores Negros; 2012. p. 182-203..

Apesar de alguns avanços que deram espaço à implementação de políticas de ações afirmativas, a conjuntura brasileira vivenciou um cenário de retrocessos e ataques à democracia, avanço ao conservadorismo, incentivo às diversas formas de violência contra as ditas “minorias” e o acirramento das desigualdades e iniquidades sociais e em saúde. Mais um projeto da elite branca cis-heteronormativa brasileira, que incentivou a construção de projetos como o Programa Escola Sem Partido. Nesse sentido, Gomes33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246. discute acerca da descolonização dos currículos e nos faz pensar sobre as disputas que estão postas por meio de uma “resistência colonial a um currículo decolonial”33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246.(p.229). Em relação à temática étnico-racial nos componentes curriculares das IES, tem sido incipiente a sua inserção na formação em saúde, ao passo que essas instituições não têm contribuído para a implementação da PNSIPN77 Geraldo RM, Oliveira JC, Alexandre LSC, Aguiar MRA, Vieira AFS, Germani ACCG. Preenchimento do quesito raça/cor na identificação dos pacientes: aspectos da implementação em um hospital universitário. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3871-3880..

Por outro lado, tem sido pauta de reivindicação dos movimentos negros a construção e publicização de pesquisas sobre as condições sociais da população negra, como uma das estratégias para impulsionar políticas em direção à equidade racial e denunciar o Racismo Institucional99 Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS, Barreto JOM. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão de escopo rápida. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3849-3860.. A educação enquanto direito para a população negra também é uma pauta que promove mudanças e questionamentos ao currículo escolar no que se refere à discussão do material didático, à “inclusão da temática racial na formação de professores(as), pela atual inclusão da história da África e da cultura afro-brasileira nos currículos escolares e pelas políticas de ação afirmativa nas suas mais diferentes modalidades”44 Gomes NL. O movimento negro no Brasil: ausências, emergências e a produção dos saberes. Pol Soc 2011; 10(18):133-154.(p.137).

No setor saúde, tem sido um desafio a inclusão das temáticas “racismo” e “saúde da população negra” na formação dos profissionais de saúde55 Jardim R, Oliveira Júnior MG, Schott M. Percepção de racismo no ensino superior em saúde na perspectiva docente. Rev Bras Polít Adm Educ 2022; 38(1):e113350.,1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.

19 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56.
-2020 Valderama WCP, Varanao AEC. Social justice is a dream: Tensions and contradictions in nursing education. Publix Health Nurs 2019; 36(5):735-743., ainda que as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) e os Projetos Político-pedagógicos dos Cursos (PPC) de Saúde Coletiva, Enfermagem e Medicina sinalizem que a educação para as relações étnico-raciais deve ser inserida na formação desses profissionais. Outro desafio2121 Monteiro RB. Educação permanente em saúde e as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das relações étnico-raciais e para ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Saude Soc 2016; 25(3):524-534., é a implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana (DCNERER) na formação de profissionais para o SUS, articuladas à PNSIPN e à Política Nacional de Educação Permanente.

A partir dessas reflexões iniciais, o presente artigo indaga: como as dimensões do racismo e a sua herança escravocrata impactam na formação em saúde nas universidades públicas brasileiras? Como a inserção da temática da saúde da população negra no ensino superior pode ampliar as perspectivas rumo à equidade racial em saúde?

Metodologia

Buscando responder às questões acima apontadas, este estudo possui natureza qualitativa2222 O'Brien BC, Harris IB, Beckman TJ, Reed DA, Cook DA. Standards for Reporting Qualitative Research: A Synthesis of Recommendations. Acad Med 2014; 89(9):1245.. A abordagem metodológica utilizada foi do tipo pesquisa-intervenção, por entender que a pesquisa, “inevitavelmente, provoca transformações e mobiliza forças no campo investigado, incluindo-se nele o próprio pesquisador”2323 Paulon SM, Romagnoli RC. Pesquisa-intervenção e cartografia: melindres e meandros metodológicos. Est Pesq Psicol 2010; 10(1):85-102.(p.143). A pesquisa-intervenção tem um caráter participativo e necessita de compromisso social e político com a realidade com a qual se está trabalhando, resultando em uma coprodução/transformação tanto daquele que está se propondo a conhecer a realidade, quanto daquele que é conhecido2323 Paulon SM, Romagnoli RC. Pesquisa-intervenção e cartografia: melindres e meandros metodológicos. Est Pesq Psicol 2010; 10(1):85-102..

A produção dos dados2424 Mendes R, Pezzato LM, Sacardo DP. Pesquisa-intervenção em promoção da saúde: desafios metodológicos de pesquisar "com". Cien Saude Colet 2016; 21(6):1737-1745. ocorreu mediante a realização de oficinas2525 Spink MJ, Menegon VM, Medrado B. Oficinas como estratégia de pesquisa: articulações teórico-metodológicas e aplicações ético-políticas. Psicol Soc 2014; 26(1):32-43. com os Núcleos Docentes Estruturantes (NDE) dos cursos de graduação de Saúde Coletiva, Enfermagem e Medicina da universidade selecionada. As oficinas foram adotadas como estratégia metodológica por possibilitarem relações dialógicas entre as/os participantes, tendo em vista a complexidade do racismo na particularidade brasileira e a necessidade de troca de saberes e produção de sentidos2626 Pey MO. Oficina como modalidade educativa. Perspectiva 1997; 15(27):35-63..

O NDE foi selecionado como cenário de estudo pois, segundo o Ministério da Educação, ele constitui “um grupo de docentes com atribuições acadêmicas de acompanhamento, atuante no processo de concepção, consolidação e contínua atualização do projeto pedagógico do curso”(p.1)2727 Brasil. Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (CONAES). Resolução nº 1, de 17 de junho de 2010. Normatiza o Núcleo Docente Estruturante e dá outras providências. Brasília: Ministério da Educação; 2010.. Além disso, o NDE pode incluir, ainda, discentes e técnicos de assuntos educacionais das universidades.

Dentro da Faculdade de Ciências da Saúde e da Faculdade de Medicina dessa universidade, o NDE possui espaço na agenda dos cursos com realização de reunião ordinária mensal. As interlocuções de aproximações com o NDE de cada curso ocorreram por meio do envio de e-mail às coordenações dos núcleos, explicando o objetivo da pesquisa e identificando na agenda das/dos membros a disponibilidade para abordá-la presencialmente nas reuniões ordinárias. No curso de Medicina, foi necessário apresentar o estudo presencialmente à direção da faculdade e à coordenação do curso.

As oficinas ocorreram entre setembro de 2019 e março de 2020. O critério de inclusão das/dos participantes é que fossem membros do NDE. Dos dezesseis participantes, nove se autodeclararam de raça/cor branca; cinco como pessoas pardas; uma como preta, e uma pessoa não se autodeclarou. No total, houve dez participantes do gênero feminino e seis do gênero masculino. No curso de Medicina houve representação de um discente e um técnico em assuntos educacionais. As oficinas foram registradas em áudio mediante a utilização de um tablet e, posteriormente, as gravações foram transcritas e categorizadas com o uso de um editor de texto. Utilizou-se também um diário de campo para registro das observações, diálogos, emoções, tensões e conflitos surgidos ao longo do desenvolvimento das oficinas.

Foram realizadas oficinas nos três cursos de graduação selecionados, que tiveram como objetivo identificar a visão de equidade racial dos NDE e as motivações para abordagem da saúde da população negra na formação das/dos discentes, bem como produzir um plano de ação para implementação da temática do racismo e da saúde da população negra na formação dos profissionais de saúde como resultado da avaliação dos dados produzidos nos encontros.

A categorização atendeu aos critérios de qualidade para pesquisa qualitativa2222 O'Brien BC, Harris IB, Beckman TJ, Reed DA, Cook DA. Standards for Reporting Qualitative Research: A Synthesis of Recommendations. Acad Med 2014; 89(9):1245., com emprego de análise de conteúdo temática2828 Oliveira DC. Análise de Conteúdo Temático-Categorial: uma proposta de sistematização. Rer Enferm 2008; 16(4):569-576.. A partir da compreensão do direcionamento ético-político da equidade e da sua materialização na formação em saúde, os resultados deste artigo serão trazidos pelas categorias “visão de equidade racial” dos NDE e “motivações para o ensino da saúde da população negra”. Foram atendidos os aspectos éticos de pesquisa com seres humanos, tendo esta sido aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP/CONEP) da universidade, conforme número do parecer 3.387.638, de 12 de junho de 2019.

Resultados e discussão

Visão de equidade racial dos NDE

A apreensão da visão de equidade racial emergiu na primeira etapa da oficina, por meio do aquecimento proposto, que tinha como objetivo conhecer as/os participantes, partindo das experiências dos membros dos NDE e das análises coletivas proporcionadas pela grupalidade.

No curso de Saúde Coletiva, predominou a visão de equidade racial associada à intencionalidade das políticas, pois, segundo as participantes, elas podem modificar o grau das desigualdades sociais. Predominou, ainda, sua compreensão a partir do desdobramento do conceito de equidade, presente nos princípios do SUS, direcionada à justiça social. Na particularidade brasileira, como afirmou uma das professoras, a questão racial está relacionada a uma dívida histórica presente no país. No curso de Medicina, predominaram três visões sobre equidade racial: a de que ela existiria quando não há diferença entre as pessoas; a de que ela seria uma forma de promover justiça social e, por fim, a noção de equidade relacionada à ideia de que todos são iguais. Embora consideradas a dívida histórica e a justiça social, não se aprofundaram os reflexos de uma herança colonial, escravocrata, ao passo que o debate racial segue sendo secundarizado.

No curso de Enfermagem, uma das visões associou equidade racial à igualdade, citando a Constituição Federal de 19882929 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1988; 5 out., que estabelece o tratamento a todos sem distinção de raça, e, também, que equidade racial seria ter alunos negros matriculados no curso. Uma professora explicou que seria importante compreender o contexto brasileiro, devido à existência de uma dívida histórica de pelo menos quinhentos anos. Ao encontro do que foi colocado, outros dois docentes destacaram a importância de se garantirem oportunidades para as pessoas que mais precisam e que essa questão deve ser pensada na perspectiva racial.

Destaca-se a visão de equidade relacionada ao grau de intencionalidade das políticas públicas e à capacidade de modificação das desigualdades sociais, como mencionado no curso de Saúde Coletiva. Existem aspectos, de natureza injusta e desnecessária1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017., que irão influenciar em como determinados grupos étnico-raciais têm acesso às políticas sociais. Para analisá-los, é preciso apreender a forma como as estruturas sociais e os processos políticos sem a dimensão da equidade são perversos e, assim, geram desigualdades3030 Almeida Filho N. A problemática teórica da determinação social da saúde. In: Roberto PN, organizador. Determinação social da saúde e reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. p. 13-36. que se entrecruzam de forma interseccional e podem ser relacionadas a renda, educação, raça/etnia e classe social3131 Heard E, Fitzgerald L, Wigginton B, Mutch A. Applying intersectionality theory in health promotion research and practice. Health Promot Int 2020; 35(4):866-876.. A perspectiva negra da decolonialidade pode orientar trabalhos nessa direção, uma vez que ela contribui para análises das estruturas sociais e políticas22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54..

A equidade racial também foi relacionada nos cursos de Medicina e Saúde Coletiva como forma de promover justiça social3232 Braveman P. What is Health Equity: And How Does a Life-Course Approach Take Us Further Toward It? Matern Child Health J 2014; 18(2):366-372.. Buscar a equidade em saúde significa reduzir as disparidades de grupos caracterizados pelo pertencimento racial/étnico, levando em conta as discriminações que vivenciam na sociedade3232 Braveman P. What is Health Equity: And How Does a Life-Course Approach Take Us Further Toward It? Matern Child Health J 2014; 18(2):366-372..

Nos três cursos foi mencionada a equidade racial relacionada à dívida histórica existente no Brasil e à determinação social da população negra. Essa visão converge com o estudo de Rinehart3333 Rinehart D. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra: discursos da gestão municipal do SUS [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2013., que compreende o contexto histórico brasileiro e o racismo institucional como dificultadores do acesso às ações e serviços de saúde e na implementação da PNSIPN. A autora identificou um fator crítico referente ao sequestro semântico da palavra equidade, pois ela é utilizada sem o seu entendimento teórico e político3333 Rinehart D. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra: discursos da gestão municipal do SUS [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2013.. Na oficina de medicina algumas disciplinas têm abordado a equidade de forma conceitual, mas a saúde da população negra é mencionada superficialmente, sem reflexões profundas sobre raça e racismo, o que demonstra o desafio de transformar a cultura política institucional de universidades historicamente brancas, elitizadas, com currículos colonizados, e estruturadas pela colonialidade do poder, do ser e do saber22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54..

No curso de Enfermagem, foi mencionado que a equidade racial está relacionada à garantia de oportunidades para quem mais precisa e ao acesso a serviços como saúde e educação. A igualdade de oportunidades é mencionada como objetivo das ações afirmativas3434 Mattos WR. Ubuntu: por uma outra interpretação de ações afirmativas na universidade. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. e, a equidade é um caminho a ser trilhado para a conquista da igualdade1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.. Rinehart3333 Rinehart D. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra: discursos da gestão municipal do SUS [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2013. discorre sobre o problema existente no Estado brasileiro de negação de oportunidades, bens e serviços à população negra, mesmo com evidências sobre as discriminações vivenciadas por esse grupo77 Geraldo RM, Oliveira JC, Alexandre LSC, Aguiar MRA, Vieira AFS, Germani ACCG. Preenchimento do quesito raça/cor na identificação dos pacientes: aspectos da implementação em um hospital universitário. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3871-3880.

8 Anunciação D, Pereira LL, Silva HP, Nunes APN, Soares JO. (Des)caminhos na garantia da saúde da população negra e no enfrentamento ao racismo no Brasil. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3861-3870.
-99 Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS, Barreto JOM. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão de escopo rápida. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3849-3860..

Foi possível perceber que, nos cursos de Medicina e Enfermagem, algumas das visões de equidade compartilhadas são as de inexistência de diferença entre as pessoas e que o termo seria um sinônimo da igualdade prevista na Constituição Federal de 1988. Almeida Filho3030 Almeida Filho N. A problemática teórica da determinação social da saúde. In: Roberto PN, organizador. Determinação social da saúde e reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. p. 13-36. nos ajuda a compreender alguns conceitos que emergiram no diálogo das oficinas. O primeiro é o de diversidade, que se externa na variação em características de uma população, pois a “variação natural ou genética, expressa em diferenças individuais, advindas da interação de processos sociais e biológicos, produz diversidade nos espaços coletivos sociais e desigualdades nas populações humanas”3030 Almeida Filho N. A problemática teórica da determinação social da saúde. In: Roberto PN, organizador. Determinação social da saúde e reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. p. 13-36.(p.30). O segundo é o de diferença, que se assoma de forma individual pelos efeitos da diversidade ou das desigualdades em sujeitos e “manifestam-se mediante complexas relações entre processos sociais e biológicos nos sujeitos individuais”3030 Almeida Filho N. A problemática teórica da determinação social da saúde. In: Roberto PN, organizador. Determinação social da saúde e reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. p. 13-36.(p.30). Equidade não é sinônimo de diferença e está relacionada às estruturas sociais e aos processos políticos. Quando esses não têm equidade, geram a desigualdade, que “pode ser expressa por indicadores demográficos ou epidemiológicos (no campo da saúde), como evidência empírica de diferenças”3030 Almeida Filho N. A problemática teórica da determinação social da saúde. In: Roberto PN, organizador. Determinação social da saúde e reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes; 2010. p. 13-36.(p.30).

No tocante à ideia disseminada de que todos são iguais11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82., Barros e Sousa3535 Barros CPF, Sousa MF. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Rev Saude Soc 2016; 25(1):9-18. teorizam o princípio da igualdade como orientadora da cidadania e, consequentemente, dos direitos civis, políticos e sociais, relacionados ao estado de bem-estar social e descritos na Constituição Federal2929 Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União 1988; 5 out.. Gonzalez11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82. sempre alertou que a afirmação de igualdade perante a lei é meramente formalista, dada a sofisticação ideológica do racismo. Barros e Sousa3535 Barros CPF, Sousa MF. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Rev Saude Soc 2016; 25(1):9-18. reforçam que, enquanto a igualdade tem uma lógica de “distribuição homogênea: a cada pessoa uma mesma quantidade de bens ou serviços”3535 Barros CPF, Sousa MF. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Rev Saude Soc 2016; 25(1):9-18., a equidade considera “que as pessoas são diferentes e que têm necessidades diversas”3535 Barros CPF, Sousa MF. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Rev Saude Soc 2016; 25(1):9-18.(p.13), necessitando de políticas públicas equânimes.

Pensando na reorientação da formação em saúde, Gouveia et al.3636 Gouveia EAH, Silva RO, Pessoa BHS. Competência Cultural: uma Resposta Necessária para Superar as Barreiras de Acesso à Saúde para Populações Minorizadas. Rev Bras Educ Med 2019; 43(1):82-90. contextualizam um cenário em que estereótipos, privilégios e racismo são percebidos na relação dos profissionais com usuárias/usuários dos serviços de saúde. Segundo os autores, o percurso de aprendizagem é complexo e os profissionais negam as relações de poder e reprodução de racismo11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82. existentes em suas práticas. A urgente reorientação da formação em saúde1919 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56.,3737 Rizzo TPR, Fonseca ABC. Concepções e práticas de educação e saúde da população negra: uma revisão integrativa da literatura brasileira. Reciis 2019; 13(4):896-910.

38 Freitas Junior RAO, Santos CAD, Lisboa LL, Freitas AKMSO, Garcia VL, Azevedo GD. Incorporando a Competência Cultural para Atenção à Saúde Materna em População Quilombola na Educação das Profissões da Saúde. Rev Bras Edu Med 2018; 42(2):100-109.
-3939 Figueiredo GO, Orrillo YA. Currículo, política e ideologia: estudos críticos na educação superior em saúde. Trab Educ Saude 2020; 18(11):1-29. necessita de um processo de “ensino-serviço-aprendizagem no mundo real [...] por meio da interação pessoal do aprendiz com populações étnica e culturalmente diversas”3838 Freitas Junior RAO, Santos CAD, Lisboa LL, Freitas AKMSO, Garcia VL, Azevedo GD. Incorporando a Competência Cultural para Atenção à Saúde Materna em População Quilombola na Educação das Profissões da Saúde. Rev Bras Edu Med 2018; 42(2):100-109.(p.106), que possibilite movimentos decoloniais.

Motivações para a abordagem da saúde da população negra na formação em saúde

No curso de Saúde Coletiva, foram descritas algumas motivações para que a saúde da população negra seja inserida na formação em saúde. Uma das motivações é a importância da análise dos indicadores sociais de violência11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82. e de como eles mostram a relação do racismo e da saúde. Uma participante da oficina comentou sobre a situação do trabalhado doméstico e a questão das mulheres negras, sinalizando que o cenário contemporâneo tem sido uma escravidão moderna11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82.,4040 Ribeiro D. Quem tem medo do feminismo negro? São Paulo: Companhia das Letras; 2018.. A história de inserção das professoras em movimentos sociais e as aproximações teóricas com a questão de gênero e raça, durante a formação docente, foram mencionadas como motivações para a promoção dos temas nos cursos de graduação em saúde.

O curso de Medicina manifestou a relevância da oficina para promover o debate a respeito da equidade racial no NDE. O membro do corpo técnico disse que, no atendimento aos alunos negros e negras do curso, é possível perceber que eles e elas estão ocupando o espaço universitário. Também foi enfatizado que é preciso a representatividade de docentes e discentes negras e negros na comunidade acadêmica66 Mello L, Resende UP. Concursos públicos federais para docentes e ações afirmativas para candidatos negros. Cad Pesq 2020; 50(175):8-28.. Outra motivação levantada no curso de Medicina é o reconhecimento da dívida histórica existente para com a população negra e o emprego das políticas de ações afirmativas33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246.,66 Mello L, Resende UP. Concursos públicos federais para docentes e ações afirmativas para candidatos negros. Cad Pesq 2020; 50(175):8-28.,88 Anunciação D, Pereira LL, Silva HP, Nunes APN, Soares JO. (Des)caminhos na garantia da saúde da população negra e no enfrentamento ao racismo no Brasil. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3861-3870. para reverter essa situação. Também foi mencionada a realização estudos sobre a situação de saúde desse segmento, novamente sendo destacados indicadores de violência.

No curso de Enfermagem, uma professora considerou importante a abordagem dos fatores de risco, da epidemiologia e da prevalência de doenças em determinada população, pois, segundo ela, é possível, dessa maneira, pensar a construção de políticas específicas. A docente enfatizou a formação de pensamento crítico para que ele se reflita na prática profissional. Emergiu, como motivação, a abordagem da saúde da população negra como direito social, da determinação social da saúde e de indicadores que revelam iniquidades.

Apesar do sentido de equidade aparecer na oficina do curso de Medicina e Enfermagem associado ao conceito das políticas de saúde, emergiram falas apontando que a saúde da população negra não precisaria aparecer de forma explícita nos currículos dos cursos. No entanto, há evidências que comprovam a necessidade de se abordar as suas especificidades, como, por exemplo, a prevalência do câncer de colo de útero em mulheres negras4141 Paulista JS, Assunção MPG, Lima FLT. Acessibilidade da População Negra ao Cuidado Oncológico no Brasil: Revisão Integrativa. Rev Bras Cancerol 2019; 65(4):e-06453.. O representante do Centro Acadêmico de Medicina acrescentou que o conhecimento sobre a equidade racial deve estar relacionado às questões socioeconômicas e epidemiológicas, permitindo maior visualização dos problemas de saúde.

As motivações para que a saúde da população negra seja inserida na formação em saúde podem ainda ser observadas em trabalhos voltados ao combate às desigualdades sociais, tendo destaque aquelas ocasionadas por cor ou raça4242 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e Pesquisas Informação Demográfica e Socioeconômica Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Brasília: IBGE; 2019.. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresentou indicadores que demonstram desigualdades étnico-raciais referentes a mercado de trabalho, educação, violência, sub-representação política e condições de moradia, cujas consequências implicam maiores níveis de vulnerabilidade econômica e social4242 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e Pesquisas Informação Demográfica e Socioeconômica Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Brasília: IBGE; 2019.. A formação em saúde pautada na lente da equidade tem os seus desafios discutidos em literatura recente1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.

19 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56.
-2020 Valderama WCP, Varanao AEC. Social justice is a dream: Tensions and contradictions in nursing education. Publix Health Nurs 2019; 36(5):735-743., que aponta o diferencial para o novo perfil dos profissionais desse setor e as complexidades existentes no cotidiano77 Geraldo RM, Oliveira JC, Alexandre LSC, Aguiar MRA, Vieira AFS, Germani ACCG. Preenchimento do quesito raça/cor na identificação dos pacientes: aspectos da implementação em um hospital universitário. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3871-3880.

8 Anunciação D, Pereira LL, Silva HP, Nunes APN, Soares JO. (Des)caminhos na garantia da saúde da população negra e no enfrentamento ao racismo no Brasil. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3861-3870.
-99 Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS, Barreto JOM. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão de escopo rápida. Cien Saude Colet 2022; 27(10):3849-3860..

De acordo com Rocha et al.1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017., “reconhecer a centralidade do debate sobre equidade constitui possibilidade de mudanças no ensino-aprendizagem como se conhece atualmente”1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.(p.10) e, para sua efetivação, é necessário o diálogo constante e a troca de saberes com diversos atores. Assim, quando a equidade em saúde é colocada no centro do debate, enfatizam-se as questões que demarcam fronteiras estruturais que acometem distintamente negros e brancos, homens e mulheres11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82., explicitando-se interações sinérgicas entre desigualdades sociais, raciais e de gênero4343 Silveiro ACL, Dias NG. Abordagem da saúde da população negra nos cursos da área de saúde. Temas Educ Saude 2019; 15(1):24-37..

Embora, no contexto da sociedade brasileira22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54.,1010 Almeida SAL. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen; 2019., declare-se que os direitos são iguais, o racismo é uma realidade desumana e segregacionista que repercute no cotidiano de todas as classes sociais e chega a assumir uma face genocida quando manifesto nas classes populares, notadamente nas favelas e periferias. No campo da saúde, o viés racial pode ser percebido por meio de práticas e atitudes alusivas à discriminação e ao preconceito, considerados como alicerces pelos quais o racismo institucional se constrói e sedimenta, determinando desigualdades no acesso aos serviços, na provisão dos atendimentos4444 Johnson TJ. Racial Bias and Its Impact on Children and Adolescents. Pediatr Clin North Am 2020; 61(2):425-436.

45 Gatewood E, Broholm CC, Herman J, Yingling C. Making the invisible visible: Implementing an implicit bias activity in nursing education. J Prof Nurs 2019; 35(6):447-451.

46 Gonzalez CM, Deno ML, Kintzer E, Marantz PR, Lypson ML, McKee MD. Patient perspectives on racial and ethnic implicit bias in clinical encounters: Implications for curriculum development. Patient Educ Couns 2018; 101(9):1669-1675.
-4747 Assis JF. Interseccionalidade, racismo institucional e direitos humanos: compreensões à violência obstétrica. Serv Soc Soc 2018; 133:547-565..

Além de o viés racial ser percebido no acesso aos serviços de saúde, o racismo se reflete negativamente no diagnóstico e tratamento clínico de pacientes negros4444 Johnson TJ. Racial Bias and Its Impact on Children and Adolescents. Pediatr Clin North Am 2020; 61(2):425-436.,4646 Gonzalez CM, Deno ML, Kintzer E, Marantz PR, Lypson ML, McKee MD. Patient perspectives on racial and ethnic implicit bias in clinical encounters: Implications for curriculum development. Patient Educ Couns 2018; 101(9):1669-1675.. Ampliar o debate e produzir transformações efetivas nesses cenários requer alterações na formação profissional, através dos currículos33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246. de graduação. Embora, no Brasil, a temática seja encontrada expressa nas DCN e nos PPC de cursos como Saúde Coletiva, Enfermagem e Medicina, são incipientes na produção científica evidências sobre como implementá-la no cotidiano dos cursos de graduação1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.,4242 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e Pesquisas Informação Demográfica e Socioeconômica Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Brasília: IBGE; 2019.. Merece destaque a importância da dimensão da equidade para a formação acadêmica e sua capacidade de mobilizar sujeitos protagonistas33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246. na garantia dos princípios do SUS e de formar profissionais comprometidos com a justiça social. Contudo, apesar dos avanços legais, é visível a crise no sistema de formação universitária4848 Almeida Filho N, Nunes TCM. Inovações curriculares para Formação em Saúde inspiradas na obra de Anísio Teixeira. Trab Educ Saude 2020; 18(1):1-24..

O contexto para implementar mudanças no ensino tem sido um desafio33 Gomes NL. O Movimento Negro e a intelectualidade negra descolonizando os currículos. In: Bernardino CJ, Maldonado TN, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 223-246., pois a formação se alicerça em um currículo obsoleto e fragmentado, inadequado para o enfrentamento das iniquidades4949 Rozendo CA, Salas AS, Cameron B. A critical review of social and health inequalities in the nursing curriculum. Nurse Educ Today 2017; 50:62-71.

50 Furlanetto DLC. Políticas indutoras (pró-saúde) e a reorientação da formação de profissionais da área da saúde para o fortalecimento do SUS [tese]. Brasília: Universidade de Brasília; 2015.
-5151 Conterno SFR, Lopes RE. Pressupostos pedagógicos das atuais propostas de formação superior em saúde no Brasil: origens históricas e fundamentos teóricos. Avaliacao 2016; 21(3):993-1016.. A explicitação destas na saúde é relacionada à questão de raça/etnia e tem sido documentada no sentido de evidenciar como elas contribuem para piores resultados no processo saúde-doença desses grupos em comparação à população branca4949 Rozendo CA, Salas AS, Cameron B. A critical review of social and health inequalities in the nursing curriculum. Nurse Educ Today 2017; 50:62-71.. Essa tendência, também observada no caso brasileiro, precisa de uma formação que possibilite a compreensão da PNSIPN, “suas razões e emergência, bem como as especificidades, compreensão e visão críticas antirracistas quanto aos fatores desencadeadores e determinantes do racismo na atenção à saúde”1919 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56.(p.47).

A abordagem da saúde da população negra não deve se limitar às condições genéticas e à prevalência de doenças, sem haver contextualização de fatores que estão associados a essas condições com visão crítica e antirracista1010 Almeida SAL. Racismo Estrutural. São Paulo: Pólen; 2019.. Conceição et al.1919 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56. defendem que “abordagens que estimulem a tomada de decisão acerca de diagnósticos e tratamentos, na evolução clínica dos pacientes, são necessárias, evitando negligências e consequências negativas na qualidade da atenção”1919 Conceição CC, Riscado LS, Vilela RQ. Relações étnico-raciais na perspectiva da saúde da população negra no curso de medicina: análise curricular. Rev Bras Ens Sup 2018; 4(3):34-56.(p.52).

Existem confusões conceituais no entendimento de equidade1818 Rocha DG, Souza DH, Cavadinha E. Equidade nos cursos de graduação em Saúde: marco legal, desafios políticos e metodológicos. Interface (Botucatu) 2019; 232(1):e180017.,5252 Santana RAR, Akerman M, Faustino DM, Spiassi AL, Guerriero IACZ. A equidade racial e a educação das relações étnico-raciais nos cursos de Saúde. Interface (Botucatu) 2019; 23:e170039. e, apesar do acesso universal e igualitário preconizado pelo SUS, persistentes iniquidades estão presentes na sociedade brasileira. Daí a relevância de se investigar a visão de equidade racial dos NDE, pois há forte negação do racismo no Brasil11 Gonzalez L. A categoria político-cultural de amefricanidade. Rev Tempo 1998; 92(93):69-82. dificultando o seu entendimento e influência no processo saúde-doença55 Jardim R, Oliveira Júnior MG, Schott M. Percepção de racismo no ensino superior em saúde na perspectiva docente. Rev Bras Polít Adm Educ 2022; 38(1):e113350.. Como exemplo, Walderama e Varano2020 Valderama WCP, Varanao AEC. Social justice is a dream: Tensions and contradictions in nursing education. Publix Health Nurs 2019; 36(5):735-743. entrevistaram professores de cursos de Enfermagem nos Estados Unidos e perceberam que a maioria das/dos docentes brancos conceituaram equidade como igualdade, logo, essa visão pode ignorar a associação de sistemas múltiplos de subordinação. As autoras identificaram os conceitos de igualdade e individualismo como dois pilares do privilégio branco e do racismo, situando o imperialismo europeu que foi beneficiado pela colonização perversa e genocida dos povos indígenas e da escravização de povos africanos e seus descendentes. Essas percepções promovem o mito da meritocracia e servem para a manutenção do modelo biomédico focado na doença e no indivíduo sem conexão com a determinação social da saúde2020 Valderama WCP, Varanao AEC. Social justice is a dream: Tensions and contradictions in nursing education. Publix Health Nurs 2019; 36(5):735-743.. Portanto, a perspectiva da decolonialidade, ao debruçar-se sobre esses reflexos históricos, culturais e políticos, também permite revertê-los22 Maldonado-Torres N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: Bernardino-Costa J, Maldonado-Torres N, Grosfoguel R, organizadores. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica; 2018. p. 27-54..

Apesar da urgência da equidade racial ser pautada na formação, Santana et al.5252 Santana RAR, Akerman M, Faustino DM, Spiassi AL, Guerriero IACZ. A equidade racial e a educação das relações étnico-raciais nos cursos de Saúde. Interface (Botucatu) 2019; 23:e170039. constataram que a saúde da população negra se apresenta de forma incipiente em alguns cursos e a sua inclusão tem sido feita para atender à obrigatoriedade do marco legal, sem, entretanto, haver o “reconhecimento da [sua] importância, como justificativa para a inserção do tema no currículo prescrito nos cursos”5252 Santana RAR, Akerman M, Faustino DM, Spiassi AL, Guerriero IACZ. A equidade racial e a educação das relações étnico-raciais nos cursos de Saúde. Interface (Botucatu) 2019; 23:e170039.(p.12). Os autores identificaram, na prática docente, um desconhecimento da produção bibliográfica voltada à análise das relações de equidade/iniquidade racial, o que pode contribuir para a invisibilização do racismo como Determinante Social de Saúde.

Jardim et al.55 Jardim R, Oliveira Júnior MG, Schott M. Percepção de racismo no ensino superior em saúde na perspectiva docente. Rev Bras Polít Adm Educ 2022; 38(1):e113350. analisaram a percepção de docentes sobre o racismo no ensino superior. Verificou-se a predominância de docentes brancas/brancos e uma tendência à negação do racismo no campus e que “esses dados são um reflexo do universo acadêmico no qual aprendemos a adotar um discurso meritocrático e universalista, entendendo o racismo e a discriminação racial como fenômenos que ocorrem foram do espaço universitário”55 Jardim R, Oliveira Júnior MG, Schott M. Percepção de racismo no ensino superior em saúde na perspectiva docente. Rev Bras Polít Adm Educ 2022; 38(1):e113350.(p.9). O estudo citado evidenciou como o racismo é velado nas universidades e há a urgente necessidade de implementação das DCNERER.

Considerações finais

A visão de equidade racial dos NDE gerou reflexões a respeito da intencionalidade das políticas públicas e promoção à justiça social, da existência de uma dívida histórica no Brasil e da importância de se compreender a determinação social da população negra. Foi emergente, porém, o debate de que no Brasil todos são iguais perante a lei, discurso bastante difundido por meio de uma falsa ideia de democracia racial e exaltação da miscigenação.

As principais motivações para a abordagem da saúde da população negra na formação dos cursos de graduação em saúde foram: o conhecimento de estudos e de indicadores relacionados ao racismo e saúde; a necessidade de estudos que denunciem a violência institucional e sua reprodução no sistema de saúde; a relevância do percurso formativo das/dos docentes e aproximações com a questão de raça e gênero; o reconhecimento da dívida histórica existente no Brasil e a necessidade de reverter esse quadro a partir das políticas de ações afirmativas; a abordagem da temática como um direito social; e, finalmente, o compromisso ético-político das instituições de ensino com uma formação de pensamento crítico.

Foi possível constatar que, apesar das motivações para abordagem da temática, a saúde da população negra, quando mencionada, ainda tem sido trabalhada de forma pontual e descontextualizada, sem uma reflexão do racismo estrutural, das relações de poder e da formação socio-histórica brasileira. Sinalizamos, diante disso, a necessidade de investigações sobre a branquitude docente na área da saúde, considerando a neurose cultural brasileira e a ocultação do racismo nos espaços de formação acadêmica.

Como potencialidade, destacamos a pertinência da pesquisa-intervenção e da perspectiva negra da decolonialidade, tendo em vista a recusa de uma neutralidade científica e a necessidade de justiça epistêmica. Reconhecemos o desvelamento da colonialidade do poder, do saber e do ser expressos na questão racial brasileira e nos sistemas de saúde e educação.

A reorientação da formação em saúde demanda profissionais críticos que mobilizem e reivindiquem mudanças em prol da equidade e da democracia, implicando o estudo da PNSIPN e da efetiva implementação das DCNERER. Finalmente, sinalizamos a potência de espaços de fortalecimento, construção dialógica, comunitária e extramuros, e manifestações para afirmação desse debate nas universidades, mediante a inclusão de diferentes segmentos do movimento negro; usuárias/usuários e profissionais do SUS; fóruns de graduação em saúde; grupo temático de racismo e saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva; representação discentes de estudantes negras/negros, como o “Negrex”; a Associação Brasileira de Pesquisadoras e Pesquisadores Negros; Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, entre outros.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), mediante pagamento de bolsa de estudos de mestrado a uma das autoras.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    Jul 2024

Histórico

  • Recebido
    04 Mar 2023
  • Aceito
    01 Fev 2024
  • Publicado
    26 Fev 2024
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br