Caracterização dos cursos de graduação em Obstetrícia em países da América do Sul

Nayara Ruiz Cintra Maria Luiza Gonzalez Riesco Sobre os autores

Resumos

A Confederação Internacional de Obstetrizes estabelece diretrizes para a formação desse profissional globalmente. O objetivo da pesquisa foi caracterizar os cursos de Obstetrícia de entrada direta e instituições de ensino superior que os oferecem, na América do Sul. Realizou-se pesquisa documental descritivo-exploratória. Foram identificados 75 cursos, oferecidos em universidades da Argentina, Brasil, Chile, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai. Todos exigem prova ou curso preparatório para ingresso. A carga horária varia de 3.322 a nove mil horas e a duração é de oito a 12 semestres. Majoritariamente, denominam-se Curso de Obstetrícia e outorgam o grau acadêmico de licenciado ou bacharel e o título profissional de obstetriz/obstetra ou matrona / matrón . Há grande heterogeneidade com relação a visão, missão e perfil do egresso. Existe similaridade na estrutura curricular. Os conteúdos curriculares enfatizam as ciências biológicas, os conhecimentos aplicados à Obstetrícia, as atividades práticas e os estágios.

Obstetrícia; Educação; Currículo


Introdução

A contribuição das obstetrizesccA denominação é utilizada no gênero feminino porque a quase totalidade de profissionais é constituída de mulheres. para a melhoria da atenção à saúde da mulher é fundamental. A Organização Mundial da Saúde (OMS), o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e a Confederação Internacional de Obstetrizes (ICM) são algumas das instituições internacionais que ressaltam a importância do fortalecimento dos serviços de Obstetrícia e a necessidade de pessoal qualificado e com destrezas fundamentais na área11. World Health Organization. International Confederation of Midwives. United Nations Population Fund. The state of the world’s midwifery 2014. New York: UNFPA; 2014. . Estudos mostram que a redução da mortalidade e morbidade materna e neonatal, de partos prematuros e natimortos, são alguns dos resultados que podem ser melhorados pela assistência prestada por obstetrizes22. Renfrew MJ, McFadden A, Bastos MH, Campbell J, Channon AA, Cheung NF, et al. Midwifery and quality care: findings from a new evidence-informed framework for maternal and newborn care. Lancet. 2014; 384(9948):1129-45. .

Considerando a relevância e o impacto das obstetrizes para o cenário mundial da assistência obstétrica, é essencial conhecer e refletir sobre a formação dessas profissionais.

No Brasil, a história da formação de obstetrizes é bastante complexa e se mescla com a história da Enfermagem e Medicina. Os antigos cursos foram gradativamente alterados, até que na década de 1970 foram incorporados integralmente às escolas de Enfermagem como especialização e os cursos de graduação, extintos. A crise obstétrica no início dos anos 2000 impulsionou, entre outras medidas, o ressurgimento do curso de graduação em Obstetrícia (ou curso de entrada direta), que é uma modalidade comum na Europa e objeto de crescente interesse em outros países33. Riesco MLG, Tsunechiro MA. Formação profissional de obstetrizes e enfermeiras obstétricas: velhos problemas ou novas possibilidades? Estud Fem. 2002; 10(2):449-59. .

Atualmente, a profissional formada no Brasil é conhecida como obstetriz (para os cursos de entrada direta)ddSão profissionais amparadas pela Lei do Exercício Profissional de Enfermagem e registradas no Conselho Regional de Enfermagem. ou enfermeira obstétrica (para os cursos de especialização). É também usual a denominação de parteira profissional. Midwife é a denominação na língua inglesa (independentemente do tipo de curso).

A definição amplamente adotada para essa profissional é aquela instituída pela ICM, que considera a obstetriz como:

[...] uma pessoa que concluiu com sucesso um programa de educação em Obstetrícia que é reconhecido pelo país onde está localizado e que se baseia nas Competências Essenciais para a Prática Básica da Obstetrícia da ICM e nos fundamentos dos Padrões Globais para a Educação em Obstetrícia da ICM; que adquiriu as qualificações requeridas para ser registrada e/ou legalmente licenciada para exercer a prática da Obstetrícia e usar o título de “obstetriz”; e que demonstra competências para o exercício da Obstétrica44. International Confederation of Midwives. Core document: international definition of a midwife. The Hague: ICM; 2017. . (p. 1)

Apesar do consenso internacional sobre a definição de quem são as obstetrizes, os programas de estudo, legislação e requisitos para a formação dessas profissionais são variados.

As obstetrizes são representadas internacionalmente pela ICM, que considera que, para uma profissão de obstetrícia fortalecida, os três pilares fundamentais são: a educação, para prover força de trabalho qualificada e competente; a regulação das atividades profissionais; e a organização dos membros em uma associação fortalecida. Sendo assim, a Confederação desenvolveu documentos essenciais nessas três esferas de atuação, com o objetivo de promover e desenvolver a profissão e trabalhar para a melhoria da saúde das mulheres em nível global55. International Confederation of Midwives. Triennial report 2014-2017. The Hague: ICM; 2017. , 66. International Confederation of Midwives. ICM strategy 2017-2020. The Hague: ICM; 2017. .

Os documentos essenciais sobre educação de obstetrizes se baseiam nos princípios norteadores da ICM e estabelecem parâmetros básicos para a criação e avaliação dos cursos de Obstetrícia, com base em expectativas globais para a formação de profissionais qualificados tanto na graduação (curso de entrada direta) quanto na pós-graduação (especialização em Enfermagem Obstétrica). Representam a qualidade mínima esperada para um programa de educação de obstetrizes com ênfase na educação baseada em competências e foram elaborados em harmonia com os padrões para a prática e a regulação da Obstetrícia77. International Confederation of Midwives. ICM model curriculum outlines for professional midwifery education (2012). The Hague: ICM; 2012.

8. International Confederation of Midwives. ICM global standards for midwifery education. The Hague: ICM; 2013.
- 99. International Confederation of Midwives. ICM essential competencies for basic midwifery practice. The Hague: ICM; 2018. . São resultado de um esforço conjunto e têm um enfoque baseado na evidência.

Em 2014 foi publicado o “Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da Obstetrícia” pelo Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. , que é uma versão regional atualizada da compilação e complementação de diversos documentos produzidos pela ICM.

Embora muitos países se proponham a seguir os parâmetros propostos pela Confederação, esses padrões podem ser expandidos para incluir outras expectativas e refletir especificidades de condições culturais, sociais e econômicas, entre outros fatores, que podem interferir na maneira como os cursos são construídos88. International Confederation of Midwives. ICM global standards for midwifery education. The Hague: ICM; 2013. . Isso indica que existem diferenças na formação das obstetrizes em diferentes contextos, ainda que os países sejam guiados pelos mesmos padrões e recomendações básicas na formação desse profissional.

Assim, o objetivo do estudo foi caracterizar os cursos de Obstetrícia de entrada direta e as instituições de ensino superior que os oferecem, nos países da América do Sul.

Metodologia

Estudo documental, descritivo-exploratório, sobre a formação de obstetrizes nos países da América do Sul. Os dados relativos à missão, visão e valores dos cursos foram analisados qualitativamente, os demais dados foram quantificados.

O cenário foram os cursos de Obstetrícia oferecidos nos países sul-americanos, nos quais as obstetrizes são representadas nacionalmente por entidades filiadas à ICM. Atualmente, são sete países: Argentina, Brasil, Chile, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai1111. International Confederation of Midwives. Midwife map. The Hague: ICM; 2017. . Os demais países da América do Sul não foram incluídos no estudo, pois não são membros da ICM.

O site da ICM disponibiliza os nomes e o contato das entidades filiadas em cada país, o que possibilitou o acesso inicial às instituições de ensino que oferecem cursos de Obstetrícia de entrada direta.

Como parte da estratégia de localização dos cursos, foi realizada uma busca no site ou portal eletrônico do Ministério da Educação de cada um dos sete países. Foram também utilizadas informações obtidas na rede de cooperação universitária baseada na América Latina (www.universia.net), que oferece portais específicos sobre cursos superiores, com versões para cada um dos sete países buscados neste estudo. As informações coletadas nesses portais foram usadas para complementar os dados encontrados nas outras fontes citadas.

Os critérios de elegibilidade dos cursos de Obstetrícia para inclusão no estudo foram: ensino de nível superior; acesso por entrada direta (sem requisito de formação anterior em Enfermagem); disponibilidade de informações sobre as características do curso; e oferecimento em país da América do Sul que possui associação profissional filiada à ICM em 2017.

Para a coleta dos dados, foi elaborado um instrumento denominado Ficha do Curso, com as seguintes informações: país; nome do curso; localização (cidade); tipo de instituição (universidade/outro); grau acadêmico e título conferidos; requisitos para ingresso; tipo de financiamento; duração do curso; carga horária total, teórica e prática; visão; missão; perfil do egresso; estrutura curricular. A estrutura curricular consiste na denominação das disciplinas oferecidas ao longo do curso.

Inicialmente, a fonte utilizada para o preenchimento da ficha do curso foi o site da instituição de ensino. Para complementar as informações constantes no site, foi enviado um e-mail à instituição ou ao responsável pelo curso solicitando a colaboração.

Os dados foram analisados quantitativamente, de forma descritiva, utilizando-se a frequência absoluta. Para as informações sobre visão, missão e perfil do aluno foi feita análise de conteúdo, extraindo os aspectos considerados relevantes na formação de obstetrizes.

Embora se trate de pesquisa documental, com material considerado de domínio público, o estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (processo no 2.384.495), pois profissionais vinculados aos cursos de Obstetrícia do cenário de estudo participaram para complementar as informações sobre os cursos. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi enviado por e-mail, dado que toda a consulta foi feita por meio eletrônico.

Resultados

A seguir são apresentados os dados relativos à quantidade, localização e nome dos cursos oferecidos; tipo de instituição na qual ocorrem; grau acadêmico e título conferidos; requisitos para ingresso e tipo de financiamento; duração do curso; carga horária; visão; missão; perfil do egresso; e estrutura curricular.

O número total de cursos identificados foi 75, distribuídos na Argentina (n=9), Brasil (n=1), Chile (n=20), Equador (n=1), Paraguai (n=6), Peru (n=36) e Uruguai (n=1); e binacional Argentina e Uruguai (n=1). Nos países onde funcionam dois ou mais cursos, observa-se que há uma concentração geográfica na região metropolitana da capital (Buenos Aires, Santiago, Asunción e Lima). Todos os cursos são oferecidos em universidades.

Com relação à denominação do curso, predominam Obstetrícia (n=56) e Obstetrícia e Puericultura (n=17). O grau acadêmico conferido é de licenciado (licenciado em Obstetrícia, n=41; Obstetrícia e Puericultura, n=1; Obstetrícia e Neonatologia, n=1; Gineco-Obstetrícia e Neonatologia, n=1; e Matronería , n=1) ou bacharel (bacharel em Obstetrícia, n=25; Obstetrícia e Puericultura, n=2; Ciências com menção em Obstetrícia, n=1). Em alguns países, o bacharelado (ou bachillerato ) se refere a uma formação intermediária entre o ensino médio e a graduação.

O título profissional de matrona/matrón é conferido majoritariamente no Chile e por um curso no Paraguai. O título de obstetriz/obstetra é conferido no Peru e o de obstetra-parteira, no Uruguai. Obstetriz é a denominação profissional adotada no Brasil e no Equador, independentemente do gênero.

Quanto aos requisitos para a entrada e o tipo de financiamento, observam-se diferenças de acordo com o país em que os cursos se inserem.

Na Argentina, para o ingresso é necessária a aprovação em um curso inicial ( Ciclo Básico Común ou Curso de Ingreso ). Os diversos cursos funcionam em universidades públicas e gratuitas e em universidades privadas, com custos sob responsabilidade do aluno. No Brasil, é necessária a classificação no exame vestibular ou a seleção pelo Sistema de Seleção Unificada do Ministério da Educação quando o curso funciona em uma universidade pública e gratuita. No Chile, a seleção dos alunos para o ingresso e o oferecimento de bolsas de estudo ocorrem por meio da Prueba de Selección Universitaria (PSU). Os diversos cursos funcionam em universidades públicas e privadas; em ambas, os custos são de responsabilidade do aluno. No Equador, é necessário cumprir os requisitos do Sistema de Nivelación y Admisión e o curso funciona em uma universidade pública e gratuita. No Paraguai, é necessária a aprovação no Examen de Admisión e os custos do curso são de responsabilidade do aluno. Os diversos cursos funcionam em universidades públicas e privadas; em ambas, os custos são de responsabilidade do aluno. No Peru, é necessária a aprovação no Examen de Admisión . Os diversos cursos funcionam em universidades públicas e gratuitas e em universidades privadas, com custos sob responsabilidade do aluno. No Uruguai, é necessária a aprovação em um curso inicial ( Bachillerato opción Medicina orientación Biológico ou Bachillerato Tecnológico Deporte y Recreación ) e o curso funciona em uma universidade pública e gratuita.

Com relação à duração dos cursos, esta varia de oito a 12 semestres, sendo que dez semestres a duração da maioria (n=43). Há grande variação no número total de horas dos cursos: de 3.322 a nove mil. Dos 21 cursos com informações sobre a carga horária total, cinco têm o número total de horas calculado a partir do número total de créditos do curso multiplicado pela média de horas atribuídas a cada crédito, de acordo com o estabelecido pelos respectivos países. Entre os sete cursos que apresentam a distribuição teórica e prática da carga horária, o brasileiro tem mais horas teóricas do que práticas; o curso da Universidad Católica Los Ángeles Chimbote tem a mesma quantidade de horas teóricas e práticas e nos outros cinco, o volume de horas práticas é maior do que o teórico.

Também foram analisadas características dos cursos que se referem à visão (24 textos localizados) e missão (trinta textos localizados).

A visão aparece nas informações sobre três cursos do Chile, um do Equador, três do Paraguai e 17 do Peru. A maioria dos enunciados é genérica e ampla e pode refletir a visão da universidade em que o curso está inserido. Os principais termos citados que se referem à visão são: excelência; referência; liderança ou vanguarda (regional, nacional e internacional); reconhecimento formal ou acreditação; e vinculação com a sociedade. Uma das instituições destaca o aspecto econômico da inclusão como parte da visão.

A seguir, são apresentados exemplos da visão dos cursos:

Ser la Escuela Profesional de Obstetricia más inclusiva por ofrecer calidad de educación superior a costos accesibles formando capital humano para el bien común, contribuyendo a consolidar el capital intelectual de las organizaciones del sector público y privado. Asimismo, produce y difunde conocimiento relevante para el país y el mundo. (Universidad Católica Los Ángeles de Chimbote, 2017)

Ser una facultad líder, altamente competitiva en la formación de profesionales obstetras de calidad, reconocidos a nivel nacional e internacional por su pluralismo ideológico, rigor científico, compromiso social y fortalecimiento institucional. (Universidad Nacional Hermilio Valdizán, 2017)

Ser una escuela acreditada y referente en la formación de obstetras quienes con su liderazgo, profesionalismo e investigación contribuirán al desarrollo de la sociedad peruana generando conocimiento, mejorando la salud sexual y reproductiva de la población con alto sentido de responsabilidad y sensibilidad social, enmarcado en valores humanos. (Universidad Privada Arzobispo Loayza, 2017)

Quanto à missão, as informações se referem a cursos da Argentina (n=1), Brasil (n=1), Chile (n=5), Equador (n=1), Paraguai (n=4) e Peru (n=18). A principal missão é a formação de profissionais, de acordo com grau e o título conferidos pelo curso. Aparece em destaque a formação desse recurso humano para atender demandas do sistema de saúde, da docência e da pesquisa na área da Saúde Sexual e Reprodutiva. Alguns cursos, além da formação inicial na graduação, mencionam a educação continuada dos profissionais como parte da missão. Diversos cursos referem como missão formar profissionais para a atenção integral à saúde, dirigida à família e comunidade. Outros direcionam a missão para formar profissionais mais especializados na atenção à mulher, mãe e recém-nascido. Merece destaque um dos cursos que refere como missão

[…] formar recursos humanos para intervenir en el área de las Ciencias de la salud, realizando actividades auxiliares, de colaboración y complementarias a las del médico, para la atención primaria, profilaxis, preparación del parto mediante controles de evaluación, ejercitación psico-física y la asistencia en el parto, alumbramiento y puerperio. (Universidad Nacional de Villa Mercedes)

Por sua vez, em alguns enunciados, a missão se amplia para a formação de profissionais visando à transformação social e ao desenvolvimento sustentável, à inovação do cuidado, ao trabalho interdisciplinar e à melhoria da qualidade de vida da população.

A seguir, são apresentados outros exemplos de missão dos cursos:

La carrera de Obstetricia y Puericultura de la Universidad de Talca tiene como propósito formar profesionales que se distingan por ser competentes en atender integralmente al recién nacido, la mujer, su pareja y familia con enfoque biopsicosocial en los diferentes niveles de atención. Proporcionarán atención oportuna según las evidencias disponibles y normas vigentes. Estarán preparados para integrar y liderar equipos de trabajo y adaptarse a las demandas de salud de la población a nivel regional y nacional. (Universidad de Talca, 2017)

Formar Obstetras altamente capacitados/as para desempeñarse en el ámbito de la Salud Sexual Reproductiva y Neonatal en los distintos niveles de atención del Sistema Nacional de Salud, en el campo de la investigación, docencia, gestión y extensión, gran capacidad resolutiva y con integración al cambio, espíritu de servicio colaborativo y compromiso con las personas, familia y comunidad. (Universidad Nacional De Asunción, 2017)

Formar profesionales en obstetricia y puericultura competentes en la atención integral de salud de la madre, recién nacido inmediato - niño y en todo el proceso de la salud sexual y reproductiva de la persona, familia y comunidad; con vocación de servicio, proyección social y espíritu de investigación; respetando la vida, medio ambiente, cultivando valores éticos, humanísticos e impulsando la creatividad que contribuya a la solución de los problemas sanitarios. Desarrollar estudios de segundas especialidades, diplomados y cursos de alta especialización, acordes a los avances tecnológicos y científicos vinculados a la demanda del mercado. (Universidad Católica de Santa María, 2017)

Além disso, em vários textos da visão e missão podem-se identificar os valores do curso. Os valores que aparecem são, principalmente: ética; princípios morais; valores humanos; pluralismo ideológico; valores andinos; valores cristãos, pensamento o´higginiano; e inviolabilidade da vida humana.

Os enunciados da missão, em geral, incluem também informações sobre o perfil do profissional. Os termos relacionados ao perfil são: humanização, compromisso e sensibilidade social; consciência cidadã; pensamento crítico; autonomia; liderança; empreendedorismo; e competividade.

Os itens perfil e competências do egresso estão descritos na caracterização de 57 cursos (Argentina=6, Brasil=1, Chile=15, Equador=1, Paraguai=4, Peru=28 e Uruguai=1; e binacional Argentina e Uruguai=1) e 12 cursos (Brasil=1, Chile=4, Equador=1, Paraguai=1 e Peru=4; e binacional Argentina e Uruguai=1), respectivamente. Para os demais, essas informações não foram obtidas, pois não constam no site das instituições.

Quando mencionam o perfil do egresso, em geral, os cursos se referem às características essenciais do profissional, sua “marca” ou distinção, ou seja, quem é esse profissional. Nesse sentido, na maioria dos cursos são qualidades esperadas dos egressos: responsabilidade profissional e social; ética; respeito à vida, à diversidade e ao próximo; liderança; eficiência; capacidade de trabalhar em equipe; e comprometimento. Outras qualidades mencionadas com menor frequência são: autonomia, iniciativa, crítica, sensibilidade e criatividade.

Ainda como perfil do egresso, são descritos aspectos da prática profissional e os cenários de atuação. De modo geral, o profissional se distingue por prestar assistência a mulheres, gestantes, mães, recém-nascidos, crianças, casais, famílias e comunidades. Essa assistência, prestada nos diferentes níveis de atenção, inclui educar; orientar; oferecer apoio e cuidado; promover a saúde e prevenir o adoecimento; diagnosticar; e prescrever. A prática profissional também inclui a gestão, a docência e a pesquisa. Essas atividades se referem às áreas da Saúde Sexual e Reprodutiva, Ginecologia, Obstetrícia, Neonatologia e Puericultura. Como cenários de atuação no setor público ou privado são citados: centros de saúde, institutos especializados e hospitais. Diversos cursos referem a prática como profissional liberal.

Em suma, o egresso dos cursos é descrito como obstetriz ou matrona (às vezes referido também no gênero masculino – matrón ) com formação humanista, científica, ética e tecnológica.

A seguir, são apresentados outros exemplos de perfil do egresso:

El Licenciado en Obstetricia es un profesional responsable que trabaja junto a las mujeres en la atención integral del proceso reproductivo, ofreciendo apoyo, cuidado y asesoramiento necesario durante el embarazo, el trabajo de parto, el nacimiento y el período puerperal, conduciendo los partos bajo su propia responsabilidad y brindando cuidados al recién nacido y lactante. Este cuidado incluye las medidas preventivas, la promoción del nacimiento normal, la detección de complicaciones en la madre y el niño, el acceso al cuidado médico u otra asistencia adecuada y la ejecución de medidas de emergencia. Realiza tareas de asesoramiento y educación sobre temas de salud, no sólo de las mujeres sino también de la familia y la sociedad. Especialmente en áreas como la preparación de las parejas para ser padres, salud general de la mujer, salud sexual y reproductiva y cuidados del niño. (Universidad del Aconcagua, 2017)

El titulado de la carrera de Obstetricia y Puericultura de la Universidad Bernardo O´Higgins, está habilitado para proporcionar una atención de salud integral a la mujer durante todo su curso de vida y al recién nacido, desde un enfoque de salud familiar y comunitaria; con énfasis en la generación y ejecución de acciones de prevención, promoción de la salud sexual y reproductiva de las mujeres, familia y comunidad. Evidencia en su quehacer profesional pensamiento crítico, trabajo en equipo, comunicación efectiva, habilidades de gestión, emprendimiento e investigación, caracterizándose en su actuar por el compromiso social, sentido ético y responsabilidad. Se espera que incorpore el aprendizaje continuo, la búsqueda, generación y transferencia de nuevos conocimientos disciplinares y profesionales en su formación profesional. (Universidad de Antofagasta, 2017)

Outro item da ficha utilizada para a caracterização dos cursos se refere à estrutura curricular, que está disponível em 67 dos 75 cursos e conta com o nome das disciplinas oferecidas e sua distribuição ao longo dos anos ou semestres do curso. No total, foram encontrados 3.501 nomes de disciplinas, resultando em uma média de 52,2 disciplinas para os 67 cursos. O quadro 1 mostra os termos mais frequentes (mais de 100 repetições) nos títulos das disciplinas das estruturas curriculares.

Quadro 1
Termos mais frequentes nos títulos das disciplinas – América do Sul, 2018

Discussão

Conhecer os cursos de entrada direta em Obstetrícia e dimensionar a oferta de formação de obstetrizes é relevante para as políticas nacionais de educação e regulação do exercício profissional. Essas são informações também importantes para as associações profissionais, para pessoas envolvidas na formação de obstetrizes e aquelas interessadas na disponibilidade dessas profissionais no mercado de trabalho, bem como para aqueles que têm interesse em ingressar na carreira, especialmente quando essas ofertas são escassas como no Brasil, Equador e Uruguai. O papel dos profissionais que trabalham na assistência à mulher e ao parto, em especial as obstetrizes, tem sido destacado como fundamental na construção de um cuidado de qualidade.

Renfrew et al.22. Renfrew MJ, McFadden A, Bastos MH, Campbell J, Channon AA, Cheung NF, et al. Midwifery and quality care: findings from a new evidence-informed framework for maternal and newborn care. Lancet. 2014; 384(9948):1129-45. referem que a obstetriz:

[...] tem contribuições específicas a fazer com relação a um cuidado preventivo e de qualidade, que oferece apoio para todos, promoção de processos reprodutivos normais, primeiras condutas em complicações, e atendimento qualificado de emergência; todos no contexto de cuidado respeitoso que é adaptado às necessidades e trabalha para fortalecer as capacidades das mulheres, e é integrado através dos cenários dos serviços e comunidades. (p. 12)

Em publicação sobre o estado global da Obstetrícia, UNFPA, OMS e ICM afirmam que obstetrizes qualificadas e reguladas de acordo com os padrões mínimos internacionais têm competência para atender 87% das necessidades em saúde sexual, reprodutiva, materna, neonatal e infantil. No entanto, essas profissionais representam apenas 36% da força de trabalho em Obstetrícia, e nem todos os países contam com profissionais dedicados exclusivamente ao cuidado de mulheres e recém-nascidos11. World Health Organization. International Confederation of Midwives. United Nations Population Fund. The state of the world’s midwifery 2014. New York: UNFPA; 2014. .

Quanto à instituição educacional na qual os cursos são oferecidos e o grau acadêmico que conferem, o Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva (CLAP/SMR)1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. considera que:

Os programas de educação em obstetrícia podem ser acreditados ou oferecidos a nível de certificado, diploma ou título, dependendo das estruturas locais de educação superior. Seja qual for o nível escolhido, deve-se garantir que as parteiras, após completarem o programa, possam integrar-se plenamente ao sistema de saúde, e o ideal é que estejam no mesmo nível que outros profissionais de saúde em seu respectivo país. Portanto, uma instituição de ensino com credenciais para acreditação acadêmica deveria estar envolvida tanto no desenvolvimento do currículo como na oferta da educação em obstetrícia. (p. 108)

Todos os cursos identificados são oferecidos em universidades e a maioria confere o grau acadêmico de licenciado e/ou bacharel. Todos preparam as alunas para a prática profissional, como o recomendado, embora existam diferenças com relação à acreditação.

Existe diversidade também entre os títulos profissionais concedidos pelos cursos, embora os egressos se enquadrem na definição internacional de obstetrizes.

Com relação aos requisitos para ingresso nos programas, as recomendações internacionais consistem, primeiramente, na idade: a egressa deve ter maturidade e confiança em si mesma; o habitual que o mínimo seja 18 anos, que é geralmente quando já foi concluído o ensino médio e, em alguns países, atinge-se a maioridade. O segundo item refere-se à educação: os padrões exigem que a estudante tenha concluído o ensino médio formal (geralmente 12 anos de duração). Há também leitura, escrita e aritmética como requisitos: pode-se exigir prova para avaliar destrezas nessas áreas. Finalmente, a boa saúde é o último requisito, que visa evitar que estudantes que tenham doenças que possam contagiar uma mãe com seu recém-nascido durante atendimento habitual ao parto, o que seria conflitante com os princípios éticos da Obstetrícia1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. .

Os resultados encontrados no presente estudo são parcialmente congruentes com as recomendações, pois há exigência de conclusão do ensino médio ou equivalente, que geralmente se dá por volta dos 17 ou 18 anos; é necessária uma prova ou curso nos quais se demonstre conhecimentos básicos de leitura, escrita e matemática, entre outros temas; e, em alguns casos, há menção às condições de saúde das futuras alunas, como a solicitação de carteira de vacinação para o processo de admissão.

Sobre a duração do curso, a ICM diz que enquanto os programas e os processos anteriores à admissão das estudantes podem variar, “os resultados baseados nas competências da educação da obstetrícia”1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. (p. 103) devem ser equivalentes. O foco principal é que o processo de aprendizagem atinja uma formação que contemple um conjunto de competências comuns. Também se reconhece a necessidade de uma variabilidade de tempo que acomode as necessidades individuais para alcançar esses resultados. O padrão estabelecido para a duração do curso é de no mínimo três anos em um programa de entrada direta, que é considerado como necessário para o domínio das destrezas essenciais. Qualquer tempo adicional a esses três anos não foi estabelecido como regra geral e, portanto, varia de acordo com o local ou instituição que oferece o curso. Os programas devem seguir as convenções acadêmicas e as exigências locais para a entrega de títulos e considerar as demandas específicas da região. Os resultados encontrados neste estudo mostram uma variabilidade de até quatro semestres na duração dos programas, embora a maioria (n=43) dure cinco anos, ou seja, dois anos além do mínimo necessário1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. .

Além da duração, outra característica importante dos cursos é a carga horária. Nem todos são oferecidos em período integral e, entre os 21 cursos que apresentavam informação sobre o número total de horas, houve grande variação (entre 3.322 e nove mil horas de duração). Cabe dizer que a maneira como essas horas são calculadas pode ser diferente entre as instituições – tanto para a carga horária total quanto para as horas práticas e teóricas. Em alguns programas ou sites, a carga está declarada como número de horas; em outros, elas são fornecidas em formato de créditos cumpridos ao longo do curso. Esses créditos podem ter um valor flexível de horas atribuídos a eles. No Chile, por exemplo, é utilizado um Sistema de Créditos Transferibles (STC) no qual a quantidade de horas de trabalho acadêmico conferidas a cada crédito pode variar de 24 a 31 horas1212. Consejo de Rectores de las Universidades Chilenas. Manual para la implementación del sistema de créditos académicos transferibles SCT-Chile. Santiago: Consejo de Rectores de las Universidades Chilenas; 2013. .

Apenas sete cursos disponibilizaram informações quanto à divisão de horas práticas e teóricas, sendo que desses, cinco apresentam maior número de horas práticas. Os padrões da ICM “exigem uma relação mínima de 40% de teoria e 50% de prática” e consideram ainda que existem recomendações de educadores para uma proporção de até 60% de prática1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. . Entre os resultados obtidos, apenas o curso brasileiro tem uma quantidade menor de horas práticas do que teóricas. Segundo Narchi et al1313. Narchi NZ, Silva LCFP, Gualda DM, Bastos MH. Reclaiming direct-entry midwifery training in Brazil: context, challenges and perspectives. Midwifery. 2010; 26(4):385-8. , algumas das maiores dificuldades enfrentadas para que se alcance o mínimo de 50% de treinamento prático das estudantes são: problemas em encontrar serviços que sejam abertos ao modelo de cuidado recomendado pela OMS e adotado por obstetrizes; a necessidade de apoio dos serviços e de alocação de um maior número de docentes ou tutores clínicos; e a oposição e relutância de outros profissionais (como médicos e enfermeiras obstetras) em reconhecer a necessidade de mudança do modelo e da criação de outra categoria profissional. As autoras descrevem algumas estratégias que estão sendo adotadas na tentativa de superar esses obstáculos, embora reconheçam que, devido a limitações relacionadas a aspectos administrativos da universidade e à natureza das dificuldades, será desafiador alcançar uma mudança em curto prazo. O artigo é finalizado ressaltando a relevância do fortalecimento da identidade profissional de obstetrizes e enfermeiras obstetras e a importância do trabalho harmonioso e em parceria entre as duas categorias profissionais. Embora o Brasil ainda enfrente o predomínio do modelo de atenção medicalizado, vale ressaltar que as mudanças políticas e sociais dos últimos anos têm contribuído para o reconhecimento das obstetrizes e construção de parcerias com outros profissionais, em especial de enfermagem. A ICM diz que os locais que recebem as alunas devem dispor de obstetrizes ou profissionais qualificados para supervisionar e avaliar as estudantes durante as atividades práticas1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. . Porém, no Brasil, diferentemente do que acontece em outros países, o acompanhamento das estudantes é feito exclusivamente pelos docentes ou tutores vinculados à universidade e ao curso, sem participação direta profissionais dos serviços1313. Narchi NZ, Silva LCFP, Gualda DM, Bastos MH. Reclaiming direct-entry midwifery training in Brazil: context, challenges and perspectives. Midwifery. 2010; 26(4):385-8. .

Quanto às características de visão, missão e competências, Sidhu1414. Sidhu J. Mission statements: is it time to shelve them? EMJ. 2003; 21(4):439-46. apresenta definições do conceito de missão por diversos autores que são referência na literatura sobre o tema e identifica a presença de quatro elementos como parte da missão: visão, competências, valores e domínio do negócio. Ressalta que, embora distintos, os quatro elementos estão conectados e que ter uma missão declarada pode conduzir a melhores performances .

Os conceitos de missão, visão e competência vêm do campo empresarial e são hoje utilizados pelas instituições de ensino como parte do planejamento estratégico. Autores como Colombo et al1515. Colombo SS, Ariza AC, Fernandes CC, Fernandes D, Barão F, Barbosa JV, et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed; 2007. , diferentemente de Sidhu, apresentam a visão separadamente da missão, embora relacionadas, definidas como:

Missão é o norte! É a razão de ser da instituição de ensino no seu negócio – Core Competence . Contempla as necessidades sociais a que ela atende, as suas habilidades essenciais e o seu foco de atuação. Ao definir a missão, cabe o questionamento: Quem somos como instituição de ensino? Por que existimos? Quais são as necessidades que satisfazemos na sociedade? [...]1515. Colombo SS, Ariza AC, Fernandes CC, Fernandes D, Barão F, Barbosa JV, et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed; 2007. . (p. 20)

Visão é a explicitação do que se visualiza para a instituição de ensino em seu futuro. É o desejo e a intenção do direcionamento da empresa. [...]1515. Colombo SS, Ariza AC, Fernandes CC, Fernandes D, Barão F, Barbosa JV, et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed; 2007. . (p. 25)

Já os valores ou princípios são considerados pontos de partida que orientam e compõem a visão e a missão da empresa1515. Colombo SS, Ariza AC, Fernandes CC, Fernandes D, Barão F, Barbosa JV, et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed; 2007. .

Assim como na literatura, os resultados do presente estudo refletem uma relação próxima entre os conceitos de visão, missão, valores e competência, que são difíceis de delimitar de maneira independente e muitas vezes são apresentados como complementares.

O foco no mercado, inerente aos conceitos, também é representado nos resultados, em especial nos enunciados que se referem à excelência, liderança, e formação de recurso humano para atender às demandas do sistema de saúde.

Ainda com relação à missão, um enunciado em particular, destacado nos resultados, menciona a formação de recursos humanos que “realize[m] atividades auxiliares, de colaboração e complementárias às do médico”. Embora seja importante considerar os diferentes contextos nos quais os cursos estão inseridos, o texto está em desacordo com as definições e pressupostos da ICM, que defende a formação da obstetriz como profissional autônoma, independente e competente, ainda que seja parte de equipes multiprofissionais1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. .

Com relação aos valores descritos pelos cursos, ética e pluralismo ideológico são os que demonstram maior proximidade ao que é preconizado pela ICM como filosofia da formação de obstetrizes. Valores que foram descritos como “cristãos” merecem cuidado, considerando que a Confederação sugere que a formação “deve promover a igualdade de direitos, independentemente do sexo, raça, religião, idade e nacionalidade”1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. (p. 98).

O perfil do aluno encontrado nos resultados ressalta responsabilidade profissional e social; ética; respeito à vida, à diversidade e ao próximo; liderança; eficiência; capacidade de trabalhar em equipe; e comprometimento. Esse conjunto de características condiz com o que é preconizado pela Confederação, principalmente no que se refere à ética, ao respeito, ao comprometimento e à capacidade de trabalhar em equipe.

Sobre a estrutura curricular, foi possível identificar similaridade entre os cursos. O quadro 1 , apresentado nos resultados, mostra a presença de uma proporção grande de títulos de disciplinas que se referem à Obstetrícia especificamente. Essa presença forte dos termos da área é encontrada também no modelo de currículo proposto pela ICM1010. Centro Latino-Americano de Perinatologia, Saúde da Mulher e Reprodutiva. Conjunto de ferramentas para o fortalecimento da obstetrícia. Montevideo: CLAP/SMR; 2014. .

As ciências biológicas também são bastante evidentes entre as disciplinas das estruturas curriculares, como exemplificado por termos como anatomia, fisiologia, neonatologia, pediatria, biologia, parasitologia, ginecologia, entre vários outros que aparecem no quadro, com grande número de repetições.

As atividades práticas, estágios e oficinas são outra área que tem ênfase nas estruturas curriculares. Supõe-se que o resultado possa estar relacionado à exigência da Confederação de que os cursos tenham, no mínimo, 50% de horas práticas.

Conclusão

Quando analisados à luz das recomendações internacionais da ICM, os cursos identificados nos países estudados têm características diversas, em especial com relação à duração, carga horária, visão, missão e perfil do egresso. Todos os cursos têm duração mínima acima da recomendada de três anos, sendo frequente dez semestres. A carga horária total variou de 3.322 a nove mil horas, com distribuição muito heterogênea entre teoria e prática.

Quanto às semelhanças entre os cursos, destacam-se a concentração geográfica em regiões metropolitanas; o oferecimento em universidades; os requisitos para ingresso; a denominação – Obstetrícia –; e o grau e título conferidos.

Entre as limitações do estudo estão a dificuldade de solicitar esclarecimento ou aprofundamento por tratar-se de pesquisa documental, o uso de documentos eletrônicos passíveis de alterações ou desativação, o idioma estrangeiro na maior parte dos documentos possibilitando desvios de tradução e a dificuldade no contato com representantes dos cursos para complemento dos dados.

É de fundamental importância que sejam conduzidos mais estudos que contribuam para uma melhor compreensão do panorama da educação de obstetrizes na América do Sul e no mundo, para que se possa auxiliar a qualificação e fortalecimento dessa categoria profissional.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro durante a realização do estudo, mediante bolsa de mestrado.

Referências

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    Colombo SS, Ariza AC, Fernandes CC, Fernandes D, Barão F, Barbosa JV, et al. Gestão educacional: uma nova visão. Porto Alegre: Artmed; 2007.

  • c
    A denominação é utilizada no gênero feminino porque a quase totalidade de profissionais é constituída de mulheres.
  • d
    São profissionais amparadas pela Lei do Exercício Profissional de Enfermagem e registradas no Conselho Regional de Enfermagem.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    19 Set 2018
  • Aceito
    12 Abr 2019
UNESP Botucatu - SP - Brazil
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