Adaptação transcultural do questionário Patient-Reported Outcomes in Obesity (PROS) para utilização no Brasil

Jefferson Traebert Michael Douglas Rodrigues Manuella Souto Chaves Nicole Morem Pilau Moritz Rodrigo Dias Nunes Gabriel Oscar Cremona-Parma Eliane Traebert Sobre os autores

RESUMO:

Objetivo:

Realizar a adaptação transcultural e a validação, no contexto cultural brasileiro, do instrumento de impacto da obesidade Patient-Reported Outcomes in Obesity (PROS).

Métodos:

O processo de adaptação transcultural contou com a tradução do idioma original, inglês, para o português, executada por dois tradutores qualificados e independentes. A retrotradução foi realizada por dois professores de inglês, nativos, sem qualquer conhecimento médico nem da escala original. Um comitê de especialistas foi composto de pesquisadores para avaliar as equivalências semântica, idiomática, experiencial e conceitual. O pré-teste da versão brasileira, denominada PROS-Br, foi realizado com dez indivíduos adultos com obesidade. Para a avaliação das propriedades psicométricas, foi realizado um estudo epidemiológico de delineamento transversal. A população foi composta de 120 indivíduos adultos com obesidade, brasileiros, presentes para consulta médica em ambulatório-escola. Para análises psicométricas, foram utilizadas a Teoria de Resposta ao Item e análise fatorial com extração de componentes principais. Para aferição da confiabilidade foi utilizado o indicador α-Cronbach.

Resultados:

Na análise de confiabilidade, o PROS-Br apresentou α-Cronbach de 0,82. Dois fatores explicaram 58,3% da variância total na análise de componentes principais, envolvendo aspectos comportamentais e físicos. As curvas da Teoria de Resposta ao Item mostraram que todas as perguntas apresentam características discriminatórias, apontando para a adequação da versão brasileira proposta.

Conclusão:

A versão brasileira mostrou-se válida e confiável para aferir a qualidade de vida de indivíduos com obesidade, possibilitando desenvolver estratégias de intervenção, planejamento e execução de ações nos serviços e na política pública de saúde.

Palavras-chave:
Obesidade; Qualidade de vida; Análise fatorial

INTRODUÇÃO

Considerada pela Organização Mundial da Saúde como uma epidemia mundial, a obesidade é definida como o acúmulo anormal ou excessivo de tecido adiposo11. World Health Organization. Obesity [Internet]. 2022 [acessado em 20 fev. 2022]. Disponível em: Disponível em: https://www.who.int/health-topics/obesity#tab=tab_1
https://www.who.int/health-topics/obesit...
,22. Goossens GH. The metabolic phenotype in obesity: fat mass, body fat distribution, and adipose tissue function. Obes Facts 2017; 10(3): 207-15. https://doi.org/10.1159/000471488
https://doi.org/https://doi.org/10.1159/...
. Essa condição, a desnutrição e alterações climáticas juntamente representam a Sindemia Global e compartilham fatores sociais subjacentes, contribuindo para o aumento de doenças crônicas em todo o mundo33. Swinburn BA, Kraak VI, Allender S, Atkins VJ, Baker PI, Bogard JR, et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: the Lancet commission report. Lancet 2019; 393(10173): 791-846. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32822-8
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. Dessa forma, Jaacks et al.44. Jaacks LM, Vandevijvere S, Pan A, McGowan CJ, Wallace C, Imamura F, et al. The obesity transition: stages of the global epidemic. Lancet Diabetes Endocrinol 2019; 7(3): 231-40. https://doi.org/10.1016/S2213-8587(19)30026-9
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propuseram um modelo conceitual de transição para os estágios da epidemia de obesidade, com o objetivo de fornecer orientação a pesquisadores e formuladores de políticas na identificação do estágio atual, antecipando subpopulações que têm o potencial de desenvolvê-la, para dessa maneira propiciar a adoção de medidas para atenuá-la, levando em consideração fatores locais.

A obesidade é uma condição cada vez mais prevalente em países desenvolvidos e em desenvolvimento, incluindo o Brasil, onde se observou que, enquanto a prevalência diminuiu entre mulheres de alta renda de 1989 a 1998, ela continuou a aumentar entre mulheres de baixa renda e em todos os grupos de renda entre os homens44. Jaacks LM, Vandevijvere S, Pan A, McGowan CJ, Wallace C, Imamura F, et al. The obesity transition: stages of the global epidemic. Lancet Diabetes Endocrinol 2019; 7(3): 231-40. https://doi.org/10.1016/S2213-8587(19)30026-9
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,55. NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC). Worldwide trends in body-mass index, underweight, overweight, and obesity 1975 to 2016: a pooled analysis of 2416 population-based measurement studies in 128 9 million children, adolescents, and adults. Lancet 2017; 390(10113): 2627-42. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32129-3
https://doi.org/https://doi.org/10.1016/...
. Nas últimas quatro décadas, o número de indivíduos com obesidade entre cinco e 19 anos de idade aumentou em dez vezes no mundo. No ano de 2016, 13% da população adulta, equivalentes a 650 milhões de pessoas, eram portadores de obesidade, e estima-se que, em 2022, o número ultrapasse pela primeira vez o de desnutridos55. NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC). Worldwide trends in body-mass index, underweight, overweight, and obesity 1975 to 2016: a pooled analysis of 2416 population-based measurement studies in 128 9 million children, adolescents, and adults. Lancet 2017; 390(10113): 2627-42. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32129-3
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. No Brasil, no período entre 2006 e 2018, a prevalência de obesidade aumentou em 67,8%, chegando a 19,8% da população brasileira66. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Brasileiros atingem maior índice de obesidade nos últimos treze anos, de acordo com a pesquisa Vigitel [Internet]. 2019 [acessado em 20 abr. 2022]. Disponível em: Disponível em: https://www.inca.gov.br/noticias/brasileiros-atingem-maior-indice-de-obesidade-dos-ultimos-treze-anos-de-acordo-com-pesquisa
https://www.inca.gov.br/noticias/brasile...
.

As mudanças no padrão brasileiro de consumo de alimentos, favorecendo produtos ultraprocessados, ricos em sódio, açúcares e gorduras e pobres em nutrientes, bem como a concomitante diminuição da atividade física e o aumento do tempo de tela, são fatores que contribuem para a atual situação no país77. Popkin BM, Adair LS, Ng SW. Global nutrition transition and the pandemic of obesity in developing countries. Nutr Rev 2012; 70(1): 3-21. https://doi.org/10.1111/j.1753-4887.2011.00456.x
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. Outro aspecto é que o aumento no consumo desses produtos se relaciona com a alta produção de gases de efeito estufa e mudanças climáticas que também pioram a saúde em geral33. Swinburn BA, Kraak VI, Allender S, Atkins VJ, Baker PI, Bogard JR, et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: the Lancet commission report. Lancet 2019; 393(10173): 791-846. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32822-8
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.

O excesso de peso traz prejuízo à qualidade de vida, pois os indivíduos acometidos estão expostos a um risco elevado de desenvolver doença cardiovascular, hipertensão arterial de difícil controle, síndrome da apneia e hipopneia obstrutiva do sono, doença articular degenerativa e diabetes melito tipo 288. Brasil. Ministério da Saúde. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Protocolos de encaminhamento da atenção básica para atenção especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. [Internet]. [acessado em 20 abr. 2022]. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/protocolos_atencao_basica_atencao_especializada_endocrinologia.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...
. Além disso, pessoas com obesidade enfrentam discriminação social e estigmas que também podem ter impacto em seu bem-estar psicológico, podendo levar a depressão, transtornos alimentares, distorção da imagem corporal e baixa autoestima99. Taylor VH, Forhan M, Vigod SN, McIntyre RS, Morrison KM. The impact of obesity on quality of life. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab 2013; 27(2): 139-46. https://doi.org/10.1016/j.beem.2013.04.004
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,1010. National Obesity Observatory. Obesity and mental health. New York: NHS; 2011..

Embora a obesidade e alguns transtornos mentais comuns tenham sintomas similares, como comportamento sedentário, distúrbios de sono e ingestão alimentar mal controlada, essas condições costumam ser tratadas como doenças separadas. No entanto, recomendam-se plena atenção a essa associação e o monitoramento do humor, do bem-estar e da qualidade de vida dos indivíduos com obesidade como medida de prevenção e detecção precoce; isso além de tratamento para aqueles em risco1111. Luppino FS, Wit LM, Bouvy PF, Stijnen T, Cuijpers P, Penninx BWJH, et al. Overweight, obesity, and depression: a systematic review and meta-analysis of longitudinal studies. Arch Gen Psychiatry 2010; 67(3): 220-9. https://doi.org/10.1001/archgenpsychiatry.2010.2
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, uma vez que as alterações psicológicas interferem no tratamento da obesidade e podem se manter após o emagrecimento1212. Payne ME, Porter Starr KN, Orenduff M, Mulder HS, McDonald SR, Spira AP, et al. Quality of life and mental health in older adults with obesity and frailty: associations with a weight loss intervention. J Nutr Health Aging 2018; 22(10): 1259-65. https://doi.org/10.1007/s12603-018-1127-0
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,1313. Mazer LM, Azagury DE, Morton JM. Quality of life after bariatric surgery. Curr Obes Rep 2017; 6(2): 204-10. https://doi.org/10.1007/s13679-017-0266-7
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
.

Melhorar a qualidade de vida deve ser uma meta do tratamento das pessoas com obesidade e, para isso, é necessário conhecer os fatores envolvidos na percepção dos pacientes sobre a doença e o impacto que ela causa em seu bem-estar. Em vista disso, diversos serviços de saúde estão implementando um sistema de feedback dos resultados relatados por pacientes (patient-reported outcome monitoring with a clinical feedback system - PRO/CFS) para registrar sintomas físicos, mentais e qualidade de vida. Esse sistema de dados é delineado para atender a necessidades individuais, guiando terapias e acompanhando a evolução do paciente e impacta, principalmente, doenças crônicas e refratárias como a obesidade. Além disso, proporciona ao prestador de serviço o acesso fácil às informações necessárias para promover melhorias no atendimento1414. Hegland PA, Aasprang A, Hjelle Øygard S, Nordberg S, Kolotkin R, Moltu C, et al. A review of systematic reviews on the effects of patient-reported outcome monitoring with clinical feedback systems on health-related quality of life-implications for a novel technology in obesity treatment. Clin Obes 2018; 8(6): 452-64. https://doi.org/10.1111/cob.12277
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,1515. Hegland PA, Aasprang A, Kolotkin RL, Moltu C, Tell GS, Andersen JR. A novel patient-reported outcome monitoring with clinical feedback system in bariatric surgery care: study protocol, design and plan for evaluation. BMJ Open 2020;10(6): e037685. http://doi.org/10.1136/bmjopen-2020-037685
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. Dessa maneira, questionários válidos e específicos para a população portadora de obesidade contribuem para a padronização desse sistema, cujo objetivo é aumentar a eficiência dos tratamentos e atendimentos e, consequentemente, a qualidade de vida1414. Hegland PA, Aasprang A, Hjelle Øygard S, Nordberg S, Kolotkin R, Moltu C, et al. A review of systematic reviews on the effects of patient-reported outcome monitoring with clinical feedback systems on health-related quality of life-implications for a novel technology in obesity treatment. Clin Obes 2018; 8(6): 452-64. https://doi.org/10.1111/cob.12277
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.

Pensando nisso, Aasprang et al.1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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desenvolveram o questionário Patient-Reported Outcomes in Obesity (PROS), uma ferramenta simples e abrangente que pode ser usada na clínica e em pesquisas científicas. O instrumento contém oito itens, foi desenvolvido originalmente nos idiomas norueguês e inglês e tem por objetivo conhecer até que ponto o indivíduo se sente incomodado por seu peso ou forma corporal, por meio de diferentes categorias como atividades físicas comuns, dor corporal, interação social, autoestima e vida sexual, classificando o desconforto em uma escala de 0 (não incomodado) a 3 (consideravelmente incomodado). Obtém-se a pontuação total somando o valor de cada categoria e dividindo o número obtido por oito. Pontuações totais mais altas indicam maior desconforto1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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.

O PROS é relevante porque, diferentemente de outros questionários criados exclusivamente para uso em pesquisas1717. Kolotkin RL, Crosby RD, Kosloski KD, Williams GR. Development of a brief measure to assess quality of life in obesity. Obes Res 2001; 9(2): 102-11. https://doi.org/10.1038/oby.2001.13
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, não exige a efetuação de cálculos, proporcionando uma maneira objetiva de o clínico avaliar o impacto da obesidade sobre a qualidade de vida do paciente. Sua boa aplicabilidade possibilita realizar melhorias na abordagem terapêutica da doença no intuito de trazer benefícios à qualidade de vida dos indivíduos, constituindo-se o instrumento em uma ferramenta de levantamento de dados para destacar a importância de adoção de políticas públicas efetivas para a prevenção da obesidade. Dessa forma, ele tem o potencial de contribuir para a redução do impacto socioeconômico relacionado à doença, uma vez que muitas de suas causas e consequências são evitáveis e reversíveis, incluindo as alterações psicológicas33. Swinburn BA, Kraak VI, Allender S, Atkins VJ, Baker PI, Bogard JR, et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: the Lancet commission report. Lancet 2019; 393(10173): 791-846. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32822-8
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,1515. Hegland PA, Aasprang A, Kolotkin RL, Moltu C, Tell GS, Andersen JR. A novel patient-reported outcome monitoring with clinical feedback system in bariatric surgery care: study protocol, design and plan for evaluation. BMJ Open 2020;10(6): e037685. http://doi.org/10.1136/bmjopen-2020-037685
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.

No entanto, a ferramenta foi desenvolvida na Noruega e adequa-se àquele cenário sociocultural. Por isso, para que possa ser utilizada no Brasil, torna-se necessário realizar sua adaptação transcultural de acordo com as características socioculturais brasileiras. Assim, os objetivos deste estudo foram realizar a adaptação transcultural, para o contexto cultural brasileiro, do instrumento de impacto da obesidade PROS e aferir as propriedades psicométricas da versão proposta.

MÉTODOS

O percurso metodológico deste estudo teve momentos distintos. O primeiro abrangeu um estudo de adaptação transcultural do instrumento PROS1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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em sua versão original em inglês. Posteriormente, foi desenvolvido um estudo epidemiológico para a aferição das propriedades psicométricas da versão brasileira proposta.

ADAPTAÇÃO TRANSCULTURAL

A adaptação transcultural do PROS para utilização no Brasil (PROS-Br) atendeu aos critérios metodológicos propostos pela The Professional Society for Health Economics and Outcomes Research (ISPOR)1818. Wild D, Grove A, Martin M, Eremenco S, McElroy S, Verjee-Lorenz A, et al. Principles of good practice for the translation and cultural adaptation process for patient-reported outcomes (PRO) measures: report of the ISPOR task force for translation and cultural adaptation. Value Health 2005; 8(2): 94-104. https://doi.org/10.1111/j.1524-4733.2005.04054.x
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. Envolveu as etapas de tradução, retrotradução, análise por comitê de especialistas, pré-teste e proposta da versão brasileira denominada de PROS-Br.

TRADUÇÕES E SÍNTESE

A tradução foi executada por dois tradutores qualificados e independentes, um de nacionalidade brasileira e outro com idioma nativo inglês. Com base nas duas traduções, os pesquisadores sintetizaram uma versão em português.

RETROTRADUÇÃO

A versão sintetizada em português foi retrotraduzida para o inglês por um terceiro tradutor independente com idioma nativo inglês e domínio do português.

COMITÊ DE ESPECIALISTAS

Um comitê de especialistas, composto de pesquisadores e profissionais de saúde com experiência na área da obesidade, analisou o processo de tradução e retrotradução e as equivalências linguísticas, formulando uma versão pré-final.

TESTE DA VERSÃO PRÉ-FINAL

A versão pré-final foi testada em dez indivíduos adultos cujo índice de massa corpórea (IMC) era igual ou superior a 30 kg/m2, atendidos no Ambulatório Médico de Especialidades da Universidade do Sul de Santa Catarina. Solicitou-se aos participantes que opinassem sobre a compreensão das perguntas e a adequabilidade da forma de redação. Os pesquisadores avaliaram possíveis dificuldades de interpretação ou compreensão, quaisquer constrangimentos causados pelas perguntas e inadequações às respostas determinadas. Sem a necessidade de ajustes, a versão brasileira foi proposta (PROS-Br).

DELINEAMENTO DO ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO

Foi desenvolvido um estudo transversal para aferir as propriedades psicométricas do PROS-Br.

AMOSTRA E COLETA DOS DADOS

A amostra foi composta de 120 indivíduos com obesidade, o que corresponde à proporção adequada em função dos itens da escala1919. Anthoine E, Moret L, Regnault A, Sébille V, Hardouin JB. Sample size used to validate a scale: a review of publications on newly-developed patient reported outcomes measures. Health Qual Life Outcomes 2014; 12: 176. https://doi.org/10.1186/s12955-014-0176-2
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,2020. Laros JA. O uso da análise fatorial: algumas diretrizes para pesquisadores. In: Pasquali L, ed. Análise fatorial para pesquisadores. Brasília: LabPAM; 2012. p. 163-93..

A seleção da amostra deu-se pelo método consecutivo, nos dias de ambulatório de Saúde do Adulto. Assim, a seleção foi não probabilística entre todos os pacientes em atendimento e que eram elegíveis para o estudo. Os critérios de inclusão foram: indivíduos adultos com pelo menos 20 anos de idade, brasileiros, que sabiam ler e escrever em português, com IMC igual ou superior a 30 kg/m², em atendimento no Ambulatório Médico de Especialidades da Universidade do Sul de Santa Catarina. Além da aplicação do PROS-Br, houve a coleta dos dados idade e escolaridade.

ANÁLISE DOS DADOS

Os dados foram inseridos no software Excel e exportados para o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) for Windows (SPSS) 18.0, no qual foram analisados. Para a aferição da confiabilidade da escala, avaliou-se sua estabilidade pelo indicador α-Cronbach, calculado para a análise geral e por cada pergunta da escala. A validade de face foi avaliada pela opinião dos especialistas envolvidos no estudo. Para o teste-reteste, uma segunda aplicação do instrumento foi realizada em 25% do total da amostra (n=30) após uma semana de intervalo, para a análise de estabilidade pelo coeficiente de correlação de Spearman. Além disso, a correlação entre as diferenças entre ambas as aplicações e as médias dos resultados foram observadas pelo gráfico de Bland-Altman.

Para verificar a validade de constructo, foram realizadas a análise da Teoria de Resposta ao Item (TRI)2121. Alexandre JWC, Andrade DF, Vasconcelos AP, Araújo AMS. Uma proposta de análise de um construto para medição dos fatores críticos da gestão pela qualidade por intermédio da teoria da resposta ao item. Gest Prod 2002; 9(2): 129-41. https://doi.org/10.1590/S0104-530X2002000200003
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e a análise fatorial exploratória (AFE)2222. Hair JF, Black WC, Babin BJ, Anderson RE, Tatham RL. Análise multivariada de dados. 6a ed. Porto Alegre: Bookman; 2009.. A TRI, conduzida por meio do modelo Rasch2323. Chachamovic E. Teoria de resposta ao item: aplicação do modelo Rasch em desenvolvimento e validação de instrumentos em saúde mental [tese de doutorado]. Porto Alegre: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Rio Grande do Sul; 2007. com o uso da linguagem de programação R no software JAMOVI 2.0 (https://www.jamovi.org/), permitiu análises dos gráficos de probabilidade de resposta, erro padrão e informação do teste. Foram ainda examinados os gráficos de cada item por meio das características de discriminação e dificuldade.

A AFE foi efetuada após a observância da adequabilidade do conjunto dos dados obtidos na coleta, por meio da matriz de correlação linear, pelo teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e de esfericidade de Bartlett. O critério de Kaiser para autovalores maiores ou próximos a um e o gráfico de escarpa foram utilizados para a definição do número de fatores extraídos. Para minimizar o número de perguntas com cargas elevadas em cada fator, foi realizada a extração de fatores por meio dos componentes principais rotacionados pelo método Varimax e foram analisadas suas comunalidades.

QUESTÕES ÉTICAS

O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade do Sul de Santa Catarina, sob parecer no 4132363. Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após serem convidados para participar do estudo.

RESULTADOS

Realizadas as traduções, retrotradução e síntese, foram discutidas no comitê de especialistas as equivalências semântica, idiomática, experiencial e conceitual. Formou-se assim a versão pré-final, aplicada em dez pacientes com obesidade, os quais realizaram devolutiva acerca de não terem encontrado dificuldades para respondê-la. Após esse processo, os pesquisadores aprovaram a versão brasileira proposta (PROS-Br), cujas perguntas são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1.
Matriz de componente rotativa da PROS-Br (n=121).

O total de 120 pessoas responderam ao PROS-Br. A idade dos participantes variou de 20 a 90 anos, com média de 54,3±16,0. A escolaridade variou de zero a 17 anos, com média de 8,5±4,8. Entre os participantes, 99 (82,5%) eram mulheres e 21 (17,5%) eram homens.

Os resultados do teste-reteste incluíram 30 respondentes. O menor coeficiente de correlação de Spearman encontrado foi 0,56 no item 1, enquanto o maior foi 0,86 no item 4. Em todos os itens, observaram-se correlações com significância estatística p<0,001. O gráfico de Bland-Altman com a dispersão das médias de respostas pode ser observado na Figura 1. O índice α-Cronbach geral foi de 0,82. Os valores da correlação de item-total corrigida e do α-Cronbach se o item fosse excluído não alterou significativamente o índice geral.

Figura 1.
Correlação entre diferenças e médias dos resultados entre as aplicações. Escala PROS-Br. Teste-reteste (n=30).

Com relação à TRI, o teste de confiabilidade de Pearson, de 0,71 (p=0,08), e o nível de correlação entre os itens menor que 0,40, mostraram que os dados se ajustavam ao modelo Rasch empregado na análise. O menor grau de dificuldade foi observado no item 2, seguido pelo item 1. Por sua vez, foram os itens 5 e 6 que apresentaram as maiores dificuldades para serem respondidos.

As curvas características dos itens são apresentadas na Figura 2. As referentes ao item 1 apontam um escore z de 2,5, o que representa 99% de probabilidade normal gaussiana de responder “concordo totalmente”. As curvas dos demais itens estão apresentadas na sequência.

Figura 2.
Curvas características de cada pergunta do PROS-Br (n=121).

A distribuição das curvas para as possíveis respostas às perguntas é mostrada na Figura 3. Observa-se que todas as perguntas apresentam características discriminatórias.

Figura 3.
Curvas de distribuição para as possíveis respostas para as perguntas do PROS-Br (n=121).

Para a AFE, foi realizada uma matriz de correlação com oito itens, demonstrando valor de p<0,001 entre a maioria das perguntas. A medida KMO de adequação da amostragem foi de 0,84. O teste de esfericidade de Bartlett mostrou valor de p<0,001. Tais resultados permitiram prosseguir matematicamente com a análise das comunalidades. Esta revelou que todos os itens possuíam variância acima de 0,30 com os fatores definidos. A extração dos componentes principais baseou-se nos fatores correspondentes a autovalores maiores que 1 (λ≥1) ou muito próximos a 1, o que fez com que nenhuma das perguntas do instrumento fosse suprimida da versão brasileira. Assim, os fatores distribuídos de maneira muito próxima explicaram 58,3% da variância. O mesmo comportamento foi observado no gráfico de escarpa (Figura 4).

Figura 4.
Valores dos fatores latentes. Escala PROS-Br (n=121).

A rotação dos fatores pelo método Varimax minimizou o número de variáveis com altas cargas em um fator e maximizou a variação entre os pesos de cada componente principal, apresentados na Tabela 1.

DISCUSSÃO

O presente trabalho buscou realizar a adaptação transcultural do PROS para ser utilizado no Brasil, propondo assim o PROS-Br. Empregou, para tanto, metodologia internacionalmente aceita1818. Wild D, Grove A, Martin M, Eremenco S, McElroy S, Verjee-Lorenz A, et al. Principles of good practice for the translation and cultural adaptation process for patient-reported outcomes (PRO) measures: report of the ISPOR task force for translation and cultural adaptation. Value Health 2005; 8(2): 94-104. https://doi.org/10.1111/j.1524-4733.2005.04054.x
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e aplicou a versão proposta em 120 pacientes, o que representa um número amostral adequado1919. Anthoine E, Moret L, Regnault A, Sébille V, Hardouin JB. Sample size used to validate a scale: a review of publications on newly-developed patient reported outcomes measures. Health Qual Life Outcomes 2014; 12: 176. https://doi.org/10.1186/s12955-014-0176-2
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,2020. Laros JA. O uso da análise fatorial: algumas diretrizes para pesquisadores. In: Pasquali L, ed. Análise fatorial para pesquisadores. Brasília: LabPAM; 2012. p. 163-93.. Os resultados mostraram se tratar de uma ferramenta válida e confiável para o contexto cultural brasileiro.

É relevante mencionar que o questionário PROS, desenvolvido por uma equipe de pesquisadores noruegueses e validado em duas versões, em inglês e em norueguês, mostrou-se confiável para avaliar a qualidade de vida específica relacionada à obesidade na prática clínica e em pesquisas. Além disso, demonstrou alto grau de validade comparado ao Impact of Weight on Quality of Life - Lite (IWQOL-Lite)1717. Kolotkin RL, Crosby RD, Kosloski KD, Williams GR. Development of a brief measure to assess quality of life in obesity. Obes Res 2001; 9(2): 102-11. https://doi.org/10.1038/oby.2001.13
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, considerado padrão ouro para a avaliação da qualidade de vida em pessoas com obesidade1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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. O questionário foi criado com o envolvimento de 204 indivíduos com obesidade, em resposta à falta de uma ferramenta que permitisse ao médico obter informações precisas sobre a qualidade de vida do indivíduo com essa condição durante a consulta, sem a necessidade dos cálculos comumente exigidos por questionários similares. A iniciativa visou proporcionar ao portador de obesidade e seu médico uma forma simples e objetiva de acessar as necessidades individuais, de forma que elas pudessem ser abordadas no plano de tratamento1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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.

Em relação às características da amostra, no desenvolvimento do questionário original foram incluídos pacientes do serviço de cirurgia bariátrica em pré-operatório ou após a cirurgia em até cinco anos. Diferentemente, o presente estudo incluiu pacientes com obesidade atendidos por diferentes motivos no ambulatório de Saúde do Adulto com foco na saúde integral do indivíduo. Também foi identificada prevalência maior do sexo feminino na população avaliada, o que vai ao encontro de dados epidemiológicos do IBGE, em que as mulheres adultas com obesidade predominaram em todas as faixas etárias2424. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saúde, 2019: informações sobre domicílios, acesso e utilização dos serviços de saúde: Brasil, grandes regiões e unidades da federação. Rio de Janeiro: IBGE; 2020. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101748.pdf
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.

Na análise da propriedade psicométrica de confiabilidade, o PROS-Br apresentou α-Cronbach geral de 0,82, similar ao da escala original, que foi de 0,901616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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. Os valores do α-Cronbach se cada uma das questões do PROS-Br fosse excluída revelou que todas contribuem para a homogeneidade e a estabilidade do indicador.

A análise da validade mostrou que, de forma análoga ao instrumento original, os fatores do PROS-Br mostraram-se distribuídos de maneira muito próxima e explicaram 58,3% da variância, ante 58,4% do original em inglês1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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. A matriz de componentes, após a rotação ortogonal, objetivou extremar as cargas para que cada variável estivesse associada a apenas um fator, simplificando a interpretação. A avaliação das cargas fatoriais demonstrou que todos os itens do PROS-Br devem ser considerados por apresentarem boas cargas fatoriais. Dois fatores resultaram da rotação ortogonal. O primeiro congregou as perguntas 3, 4, 5, 6 e 8, que apontaram para um fator relacionado a aspectos comportamentais. Já o segundo congregou as perguntas 1, 2 e 7, que apontaram para um fator relacionado a aspectos físicos.

A TRI ajudou a observar o comportamento do construto do PROS-Br. Pôde-se observar, por exemplo, que na pergunta 1, em theta zero, os respondentes apresentaram a mesma probabilidade de responder a quaisquer categorias, o que confere à questão baixo nível de informação; ou, então, ela poderia ser interpretada como uma pergunta muito fácil de responder, com resposta muito evidente. Isso também ocorreu com a pergunta 8. Já na pergunta 6, o comportamento das curvas apontou para uma questão mais complexa, porém com bom aporte de informação - do ponto de vista teórico, quanto maior a habilidade de compreensão dos respondentes, maior a probabilidade de eles responderem à categoria 4. Por sua vez, a forma de curvas da pergunta 7 apontaria uma questão com maior poder discriminatório, pois elas encontram-se mais separadas, não havendo um ponto específico de habilidade do respondente para responder a quaisquer categorias.

Em geral, os polígonos estão ajustados, o que identifica que a pergunta contribui para a capacidade de aferição do instrumento. As curvas dos itens apresentam características discriminatórias, contribuindo assim para a adequação da versão brasileira proposta, fornecendo informação relevante.

Embora alguns estudos utilizem instrumentos genéricos de medida de qualidade de vida, como o SF-361212. Payne ME, Porter Starr KN, Orenduff M, Mulder HS, McDonald SR, Spira AP, et al. Quality of life and mental health in older adults with obesity and frailty: associations with a weight loss intervention. J Nutr Health Aging 2018; 22(10): 1259-65. https://doi.org/10.1007/s12603-018-1127-0
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, para avaliar intervenções em indivíduos com obesidade, eles não são desenvolvidos para medir condições de saúde específicas associadas à obesidade2525. Duval K, Marceau P, Pérusse L, Lacasse Y. An overview of obesity-specific quality of life questionnaires. Obes Rev 2006; 7(4): 347-60. https://doi.org/10.1111/j.1467-789x.2006.00244.x
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. Em razão disso, muitos questionários destinados a essa doença foram elaborados e validados. O instrumento apresentado por Kolotkin et al.1717. Kolotkin RL, Crosby RD, Kosloski KD, Williams GR. Development of a brief measure to assess quality of life in obesity. Obes Res 2001; 9(2): 102-11. https://doi.org/10.1038/oby.2001.13
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, IWQOL-Lite, aplica-se em ensaios clínicos2525. Duval K, Marceau P, Pérusse L, Lacasse Y. An overview of obesity-specific quality of life questionnaires. Obes Rev 2006; 7(4): 347-60. https://doi.org/10.1111/j.1467-789x.2006.00244.x
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, porém a quantidade de itens e seu escore tornam difícil sua utilização durante uma consulta. Por outro lado, o questionário The Moorehead-Ardelt Quality of Life Questionnaire II2626. Moorehead MK, Ardelt-Gattinger E, Lechner H, Oria HE. The validation of the Moorehead-Ardelt Quality of Life Questionnaire II. Obes Surg 2003; 13(5): 684-92. https://doi.org/10.1381/096089203322509237
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é sucinto, mas restringe-se à prática clínica.

Com o intuito de suprir essa necessidade, o questionário PROS1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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foi proposto para ser utilizado tanto em consultório quanto em pesquisa e inspirou-se na Obesity-Related Problem Scale2727. Karlsson J, Taft C, Sjöström L, Torgerson JS, Sullivan M. Psychosocial functioning in the obese before and after weight reduction: construct validity and responsiveness of the obesity-related problems scale. Int J Obes Relat Metab Disord 2003; 27(5): 617-30. https://doi.org/10.1038/sj.ijo.0802272
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. Os autores adicionaram questões relacionadas a atividade física, dor, sono, discriminação e autoestima, características também relacionadas à qualidade de vida desses pacientes1616. Aasprang A, Våge V, Flølo TN, Hegland PA, Kolotkin R, Natvig GK, et al. Patient-reported quality of life with obesity - development of a new measurement scale. Tidsskr Nor Legeforen 2019; 139(11). https://doi.org/10.4045/tidsskr.18.0493
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. Esse mesmo instrumento foi utilizado em estudo recente1515. Hegland PA, Aasprang A, Kolotkin RL, Moltu C, Tell GS, Andersen JR. A novel patient-reported outcome monitoring with clinical feedback system in bariatric surgery care: study protocol, design and plan for evaluation. BMJ Open 2020;10(6): e037685. http://doi.org/10.1136/bmjopen-2020-037685
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, que aplicou um PRO/CFS com a proposta de introduzir, nas consultas de antes e depois das cirurgias bariátricas, uma avaliação estruturada de qualidade de vida relacionada à saúde física e mental.

Entre as principais limitações do presente estudo está a seleção não probabilística da amostra, que poderia introduzir viés de seleção ao não se utilizar uma amostra de base populacional. Todavia, todos os critérios de elegibilidade foram rigorosamente seguidos e todos os esforços foram empreendidos para alcançar a representatividade da população atendida no serviço onde os pacientes foram recrutados. Outra limitação do estudo foi a não aplicação, por uma questão logística, de um instrumento que contivesse um construto análogo, impedindo a aferição da validade externa do instrumento. Tais limitações impõem cautela na análise dos resultados aqui apresentados e implicam a recomendação de realização de novos estudos com tais atributos.

A praticidade e a simplicidade do PROS-Br pode estimular profissionais de saúde a aplicá-lo, resultando em melhor avaliação dos indivíduos com obesidade. Essa ferramenta também traz o envolvimento do paciente no processo, e isso permite reconhecer e achar soluções para sua própria realidade, impactando as chances de mudanças significativas33. Swinburn BA, Kraak VI, Allender S, Atkins VJ, Baker PI, Bogard JR, et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: the Lancet commission report. Lancet 2019; 393(10173): 791-846. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32822-8
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. Outra vantagem é que o instrumento pode ser aplicado em diferentes momentos do tratamento, ajudando na percepção dos resultados, fazendo um reforço positivo e contribuindo para o engajamento e o sucesso do tratamento1515. Hegland PA, Aasprang A, Kolotkin RL, Moltu C, Tell GS, Andersen JR. A novel patient-reported outcome monitoring with clinical feedback system in bariatric surgery care: study protocol, design and plan for evaluation. BMJ Open 2020;10(6): e037685. http://doi.org/10.1136/bmjopen-2020-037685
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.

Trabalhos da natureza do presente estudo ampliam as opções dos profissionais de saúde para utilizarem diferentes instrumentos que busquem, de forma rápida e fácil, mensurar construtos subjetivos mais difíceis de serem avaliados na história do paciente e na anamnese tradicional.

Além disso, questionários como o PROS-Br têm potencial de fazer parte de pesquisas futuras que busquem implementar nova visão tecnológica de monitoramento clínico, como os PRO/CFS, que possibilitam não somente avaliar os efeitos no tratamento como também desenvolver estratégias de intervenção, planejamento e execução de ações nos serviços e na política pública de saúde1414. Hegland PA, Aasprang A, Hjelle Øygard S, Nordberg S, Kolotkin R, Moltu C, et al. A review of systematic reviews on the effects of patient-reported outcome monitoring with clinical feedback systems on health-related quality of life-implications for a novel technology in obesity treatment. Clin Obes 2018; 8(6): 452-64. https://doi.org/10.1111/cob.12277
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.

Com base nos resultados alcançados, pode-se sugerir que a versão brasileira tenha-se mostrado válida e confiável para aferir o impacto da obesidade sob a perspectiva do paciente. Consequentemente, a disponibilidade de um instrumento como o PROS-Br pode facilitar o manejo de indivíduos com obesidade, uma vez que os prejuízos à saúde mental e à qualidade de vida devem ser considerados no tratamento. É importante também salientar que a obesidade não deve ser vista como uma alteração na qual o indivíduo é responsável por sua condição, porém deve ser compreendida a influência do meio em que esse indivíduo se encontra, o que ajuda a perpetuar e piorar sua relação com o peso33. Swinburn BA, Kraak VI, Allender S, Atkins VJ, Baker PI, Bogard JR, et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: the Lancet commission report. Lancet 2019; 393(10173): 791-846. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32822-8
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. Sendo assim, ferramentas para a adequada avaliação são fundamentais para atingir metas efetivas no combate à obesidade.

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  • Fonte de financiamento: Instituto Ânima, Universidade do Sul de Santa Catarina

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Mar 2022
  • Aceito
    29 Mar 2022
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br