DEBATE DEBATE
Dalva A. Mello Departamento de Saúde Comunitária, Centro de Ciência da Saúde, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, Brasil. | Debate sobre el articulo de Briceño-León Debate on the paper by Briceño-León |
O texto de Briceño-León, "Siete Tesis sobre la Educación Sanitaria para la Participación Comunitaria", que vem a debate, aponta, a partir da visão dos três elos básicos da cadeia epidemiológica de doenças metaxênicas, dois postulados ("A - Es necesario conocer al ser humano; B - Es necesario contar con el ser humano") como básicos ao desenvolvimento da ação comunitária pautada em teorias da Ação ou Não-Ação dos indivíduos em risco de serem infectados. De posse dessas teorias, Briceño-León se adentra na temática de Educação, elaborando teses sobre "la relación entre educación sanitaria y participación comunitaria". Analisando essas teses, verifica-se que seus conteúdos não são novos, parecendo existir certo desconhecimento do autor da extensa literatura científica publicada sobre o assunto, inclusive na América Latina. Tanto Educação quanto Saúde são dois temas que se definem tendo por base uma matriz histórica, política, econômica, social e cultural, e de acordo com a visão que cada sociedade percebe e adota. Considero que trabalhar com Educação e/ou Saúde é fazer intervenção social na direção de uma praxis que só se torna verdadeira quando "a unidade entre pensamento e ação permite que cada homem assuma o papel histórico que está chamado a exercer" (Hurtado, 1993) como cidadão participante.
Assim a tese I do autor seria refutada nos seus explicativos e conclusões, considerando-se que a questão central não é a de integrar a Educação em toda a ação comunitária, e sim de como se decide o fazer Educação e/ou Saúde. Para isso, projetos e/ou programas deveriam ser compartilhados horizontalmente - técnicos e população juntos como sujeitos, cidadãos conscientes - em um processo de engajamento participativo real desde a concepção e decisão desse fazer, ao planejamento, à execução, até a avaliação. As teses II, III, IV, V e VII, não obstante os seus enunciados, pecam por falta de conhecimento da obra de Paulo Freire (1976, 1980, 1987, 1992 a,b).
Somente na II encontra-se a menção de um trabalho desse autor; nela, os comentários são superficiais e confusos. A abordagem de Paulo Freire, como bem salienta Hubley (1988), tem sido incorporada em países industrializados onde o conceito de "empowerment has become common in discussions of health education responses to inequalities in health". São de autoria de Paulo Freire expressões como Educação Libertadora, Educação Dialógica, Método Dialógico, Diálogo Libertador, Processo Dialógico, Pedagogia Problematizadora, Leitura de Mundo, Via de Mão Dupla, etc. Como bem destacam Macdonald & Warren (1992), Paulo Freire é "one of the most influencial educacionists in global terms over last two decades... His impact is perceptible on the work of educators, community developers and promoters of community health".
A tese VI traz um enunciado que mais traduz uma visão particular do autor em relação à Venezuela. Porém cunhar a América Latina de "conformista" é negar sua história de tantas e duras lutas por libertação de colonialismos, imperialismos, caudilhismos, populismos e tantos outros "ismos". As considerações finais ao texto de Briceño-León voltam-se para a definição sobre Educação como sendo "La Educación es el arte de usar los conocimientos" (A. N. Whitehead) e que retoma em suas conclusões. Para refutar este conceito eu tomaria emprestado o que foi elaborado por Pinto (1982) que diz que "A Educação é o processo pelo qual a Sociedade forma seus membros à sua imagem e em função de de seus interesses". Portanto, a Educação é revelada e relevada, como fator histórico, no sentido que é o decorrer de um fenômeno no tempo; como fato existencial, pois refere-se ao modo como o homem se faz ser homem; e como fato social, pois refere-se à sociedade como um todo. Assim só um povo que tem acesso à educação e se apropria dela, que contribui para a formação de cidadãos conscientes, pode transformar realidades, tornando possível realizar o sonho justo, de Saúde para Todos.
FREIRE, P., 1976. Ação Cultural para a Liberdade e Outros Escritos. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
FREIRE, P., 1980. Conscientização e Prática. Uma Introdução ao Pensamento de Paulo Freire. Rio de Janeiro: Editora Moraes.
FREIRE, P., 1987. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
FREIRE, P., 1992a. Pedagogia da Esperança. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
FREIRE, P., 1992b. Medo e Ousadia. O Cotidiano do Professor. Rio de Janeiro: Paz e Terra.
HUBLEY, J., 1988. Health education in developing countries. The need for an appropriate technology. Health Education Research, 3: 387.
HURTADO, C. N., 1993 - Comunicação e Educação Popular: Educar para Transformar, Transformar para Educar. Rio de Janeiro: Vozes.
MACDONALD, J. J. & WARREN, W. G., 1992 - 1992. Primary health care as an aducational process; a model and a Freirean perspective. International Quarterly of Community Health Education, 12:35.
PINTO, A. V., 1982. Sete Lições sobre Educação de Adultos. Editora Autores Associados & Cortez Editora.