Papini S. Vigilância em Saúde Ambiental - Uma Nova Área da Ecologia. 2ª ed. revista e ampliada. Rio de Janeiro: Editora Atheneu; 2012

Claudia Cristina de Aguiar Pereira Carla Jorge Machado Sobre os autores

Ambiente e saúde são inseparáveis: as relações humanas ocorrem em ambientes que favorecem ou não a saúde. Com base nessa premissa, a obra Vigilância em Saúde Ambiental - Uma Nova Área da Ecologia aborda esta temática. Este livro destina-se àqueles que desejam uma aproximação com o tema da vigilância em saúde ambiental, tanto docentes que necessitam contextualizar as mudanças no ambiente e sua relação com a saúde quanto a discentes que desejem, tendo base em saúde coletiva consolidada, adentrar o universo do ambiente. Pode ser útil, assim, em cursos de graduação e de pós-graduação nas áreas de saúde coletiva e meio ambiente, ecologia, entre outros.

O livro é dividido em partes gerais, com pequenos capítulos. Na Parte 1 - Noções gerais de Ecologia - vale destacar: Introdução, que estabelece o que é a ecologia indicando que os bens produzidos e consumidos pelo homem possuem necessariamente origem nos recursos naturais; Transferência Trópicas e Energéticas nos Ecossistemas, que explicita a magnificação trófica, referente à bioacumulação por etapas ao longo da cadeia alimentar com aumento da concentração à medida que é transferida pelos diferentes níveis tróficos, conceito este importante para a saúde. A concentração de poluentes em organismos aquáticos acima dos níveis circulantes no ambiente é, de fato, responsável pela dinâmica destes poluentes no ambiente1Kehrig HA, Fernandes KWG, Malm OS, Tércia G, Di Beneditto APM, Souza CMM. Transferência trófica de mercúrio e selênio na costa norte do Rio de Janeiro. Química Nova 2009;32(7):1822-1828.. Circulação de Materiais nos Ecossistemas trata do ciclo da água e de sua qualidade para consumo humano, dentre outros temas. Neste item algumas críticas podem ser feitas: a autora se utiliza do termo 'subdesenvolvimento' na denominação de países e menciona o 'crescimento populacional' como um problema, embora países grandes geradores de atividades tecnológicas - os desenvolvidos - já apresentam taxas de crescimento populacional muito baixas ou negativas.

Em Fatores Ecológicos, o parasitismo é um subitem que chama a atenção, e traz à tona o que é o vírus da dengue - um parasita tecidual - que necessita de um organismo vetor, podendo ser de diferentes espécies, explicando assim o aumento das chances de sobrevivência de um vírus como este. A autora estabelece, então, um elo com o saneamento básico e com a educação sanitária na prevenção de viroses decorrentes de parasitas teciduais, e alerta acerca do controle dos agentes vetores e dos bancos de sangue e para o papel da vacinação no desenvolvimento da imunidade adaptativa.

Em Dinâmica de Populações - Demoecologia, focada em populações não humanas, a autora apresenta conceitos de curva de sobrevivência, capacidade biológica de crescimento das espécies e de resistência ambiental. Finalmente, os itens Desenvolvimento e Qualidade Ambiental e Desequilíbrio Ecológico trazem à tona a mensagem de que as cidades, ambiente criado pelo homem, oferecem abrigo não apenas aos humanos, mas também às espécies sinantrópicas como os ratos e as baratas. De fato, o problema é de magnitude crescente, tendo em vista que as redes de esgotos são moradias também de escorpiões. Escorpiões são predadores de insetos, como as baratas, altamente letais e cada vez mais frequentes nas cidades2Kotviski BM, Barbola IF. Aspectos espaciais do escorpionismo em Ponta Grossa, Paraná, Brasil. Cad Saude Publica 2013;29(9):1843-1858..

A Parte II, Ecossistemas Rurais e Urbanos mostra a situação do meio rural. Os itens Qualidade de Vida Rural e Política Ambiental Rural discutem que a política ambiental rural esbarra em dois entraves: a maior parte da alocação dos recursos financeiros estar centrada em áreas urbanas; o fato dos municípios rurais investirem pouco em políticas ambientais saudáveis. Também trata das cidades em Métropole e Expansão das Cidades e Processos Espaciais Urbanos - Descentralização. Contudo, as figuras dizem mais que as palavras nos itens que se referem às cidades e retratam residências em áreas urbanas, mostrando a segregação do espaço urbano. Já no item Reinvenção das Cidades, a autora retoma os aspectos saúde e epidemia: enquanto nas primeiras cidades pouco se sabia sobre saneamento e propagação de epidemias, o desafio atual é o aproveitamento adequado do espaço para a instalação de infraestrutura e consequente controle dos animais sinantrópicos.

Articulações Cidade-Campo explica que a população da cidade cresceu muito rápido, não havendo tempo para o crescimento de postos de trabalho em atividades urbanas. Os habitantes vindos do campo continuaram a exercer aquilo que faziam: atividades essencialmente rurais. Os itens Paisagens e Uso do Solo Urbano e Rural e Consequências da Degradação Ambiental tratam da modificação da paisagem e da consequente degradação do ambiente, pelo uso excessivo dos recursos naturais; pela geração rápida de resíduos em velocidades acima da capacidade de incorporação ao ecossistema; e pela produção e liberação de material sintético e não biodegradável ao ambiente. O item População Rural e Urbana discute a necessidade de vigilância em saúde ambiental neste panorama e apresenta aspectos demográficos e de crescimento da população rural e urbana.

Na parte III, Vigilância Em Saúde Ambiental destaca-se a Introdução - Impactos Ambientais, nos quais a autora analisa as fontes energéticas - crescente necessidade na matriz de consumo. Destaca ainda o aumento do conhecimento ecológico e o surgimento do conceito de vigilância em saúde ambiental. Modelos Assistenciais de Saúde e Vigilância Ambiental tratam da implantação da vigilância no Brasil nos anos 1990, distinguindo as vigilâncias: sanitária, ambiental, e epidemiológica. Provê o conceito de vigilância em saúde, cujo surgimento ocorreu a partir de um modelo assistencial que articulava a vigilância epidemiológica, as ciências sociais em saúde e metodologias de estudo na área de ecologia. Destaca ainda a proximidade do conceito de vigilância em saúde do de vigilância em saúde ambiental.

No item Estruturação da Vigilância em Saúde Ambiental - Âmbito de Atuação, com base na definição de vigilância em saúde ambiental dada pelo Ministério da Saúde, a autora mostra como o modelo de desenvolvimento econômico e social atua nos ecossistemas. Destaca que o desmatamento indiscriminado e a perda de solo fértil agricultável, a migração da população rural para as cidades e a formação da periferia dos centros urbanos afetam o bem-estar das populações. Trata das zoonoses mais impactantes. Mereceu atenção a qualidade da água para consumo humano e a qualidade do ar nas cidades e área rurais.

A Parte IV, final, Alguns Aspectos a Serem Abordados em Estudos Relacionados à Vigilância em Saúde Ambiental, contém o item Avaliação Ambiental, no qual a autora indica que o estudo das condições atuais do ecossistema é o ponto de partida em uma avaliação ambiental. Nos itens Atendimento a Acidentes Envolvendo Produtos Perigosos e Alguns Procedimentos de Segurança no Controle de Vetores destaca-se a importância de se prevenir, manejar e atender tanto os acidentes advindos de produtos perigosos, como os vetores, transmissores de doenças e pragas urbanas. A relação da temática abordada nesta parte do livro com a biossegurança, a proteção do ambiente e a saúde, aspectos estudados de forma integrada cada vez mais frequentemente3Rocha SS, Bessa TCB, Almeida AMP. Biossegurança, Proteção Ambiental e Saúde: compondo o mosaico. Cien Saude Colet 2012;17(2):287-292., é evidente.

O livro mostra que mudanças ambientais, associadas a mudanças climáticas, alteram os padrões de distribuição de populações de vetores e reservatórios de doenças, favorecendo a replicação de agentes patogênicos. Pesquisas nacionais discutem as perversas implicações desta realidade: além do aumento das ocorrências de certas doenças, há ainda a diminuição do suporte social que leva ao desemprego e à marginalização econômica desta população não saudável, que, por sua vez, tende a ser mais empobrecida. Tornando-se incapaz de assegurar condições mínimas de qualidade de vida, amplia-se o risco de problemas de saúde devido às condições sanitárias precárias de suas residências, estando mais sujeita à desnutrição e às doenças, o que é agravado pela deficiência no acesso aos serviços de saúde pública. Assim, a obra de Papini é pertinente e atual, sendo uma adição à compreensão das iniquidades em saúde, possibilitando, assim, seu correto enfrentamento.

Referências

  • 1
    Kehrig HA, Fernandes KWG, Malm OS, Tércia G, Di Beneditto APM, Souza CMM. Transferência trófica de mercúrio e selênio na costa norte do Rio de Janeiro. Química Nova 2009;32(7):1822-1828.
  • 2
    Kotviski BM, Barbola IF. Aspectos espaciais do escorpionismo em Ponta Grossa, Paraná, Brasil. Cad Saude Publica 2013;29(9):1843-1858.
  • 3
    Rocha SS, Bessa TCB, Almeida AMP. Biossegurança, Proteção Ambiental e Saúde: compondo o mosaico. Cien Saude Colet 2012;17(2):287-292.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2014
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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