Associação entre fatores de risco cardiovascular e indicadores antropométricos de obesidade em universitários de São Luís, Maranhão, Brasil

Carolina Abreu de Carvalho Poliana Cristina de Almeida Fonseca José Bonifácio Barbosa Soraia Pinheiro Machado Alcione Miranda dos Santos Antonio Augusto Moura da Silva Sobre os autores

Resumos

O presente artigo tem por objetivo avaliar associação entre fatores de risco cardiovascular (FRCV) e indicadores antropométricos em amostra de base populacional de universitários de São Luís/MA. Estudo transversal com 968 universitários, mediana de 22 anos. Glicemia, triglicerídeos (TGL), HDL-c, tabagismo, consumo de álcool, sedentarismo, síndrome metabólica (SM–critérios do Joint Interim Statement) e resistência insulínica (RI), foram associados e correlacionados com os indicadores antropométricos Índice de Massa Corporal (IMC), Circunferência da Cintura (CC), Relação Cintura Quadril (RCQ) e Relação Cintura Altura (RCA). Encontraram-se associações entre TGL, HAS, SM e maiores valores de todas as variáveis antropométricas. RI associou-se a maiores valores IMC e RCA em homens e mulheres. Baixo HDL-c foi associado a maiores valores de todas as variáveis antropométricas em mulheres. Consumo de álcool associou-se a valores mais elevados de IMC e CC em mulheres e RCQ e RCA em homens. Fumo associou-se a maiores valores de RCA em ambos os sexos. Sedentarismo foi associado a maiores valores de RCQ apenas em homens. As correlações mais altas foram estabelecidas para mulheres entre TGL e IMC, CC, RCQ e RCA. Os indicadores que mais se associaram aos FRCV foram IMC, CC e RCA em mulheres e RCQ e RCA em homens.

Fatores de risco cardiovascular; Obesidade; Obesidade abdominal


Introdução

As doenças cardiovasculares representam a principal causa de morbimortalidade no Brasil e no mundo11 Bozza R, Neto AS, Ulbrich AZ, Vasconcelos IQA, Mascarenhas LPG, Brito LMS, Campos W. Circunferência da cintura, índice de massa corporal e fatores de risco cardiovascular na adolescência. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum 2009; 11(3):286-291.,22 Carnelosso ML, Barbosa MA, Porto CC, Silva SA, Carvalho MM, Oliveira ALI. Prevalência de fatores de risco para doenças cardiovasculares na região leste de Goiânia (GO). Cien Saude Colet 2010; 15(Supl. 1):1073-1080.. Este cenário epidemiológico preocupa por implicar em diminuição da qualidade de vida das populações, além de custos elevados e crescentes para governo, sociedade, família e indivíduos33 Ferreira JS, Aydos RD. Prevalência de hipertensão arterial em crianças e adolescentes obesos. Cien Saude Colet 2010; 15(1):97-104..

Está bem estabelecida a relação entre o desenvolvimento das doenças cardiovasculares e os fatores de risco como dislipidemia, tabagismo, sedentarismo e obesidade, particularmente a distribuição central de gordura11 Bozza R, Neto AS, Ulbrich AZ, Vasconcelos IQA, Mascarenhas LPG, Brito LMS, Campos W. Circunferência da cintura, índice de massa corporal e fatores de risco cardiovascular na adolescência. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum 2009; 11(3):286-291.,44 Oliveira MAM, Fagundes RLM, Moreira EAM, Trindade EBSM, Carvalho T. Relação de Indicadores Antropométricos com Fatores de Risco para Doença Cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. 2010; 94(4):478-485.. Por muito tempo estes fatores de risco cardiovascular foram considerados importantes apenas em populações com idade avançada. Entretanto, ultimamente, os estudos têm demonstrado que já são uma realidade entre adultos jovens e até mesmo entre crianças e adolescentes55 Fonseca FL, Brandão AA, Pozzan R, Campana EMG, Pizzi OL, Magalhães MEC, Freitas EV, Brandão AP. A relação entre a pressão arterial e indices antropométricos na infância/adolescência e o comportamento das variáveis de risco cardiovascular na fase adulta jovem em seguimento de 17 anos: Estudo do Rio de Janeiro. Rev SOCERJ 2008; 21(5):281-290.

6 Silva DAS, Lima LRA, Dellagrana RA, Bacil EDA, Rech CR. Pressão arterial elevada em adolescentes: prevalência e fatores associados. Cien Saude Colet 2013; 18(11): 3391-3400.
-77 Moreira TMM, Gomes EB, Santos JC. Fatores de risco cardiovasculares em adultos jovens com hipertensão arterial e/ou diabetes mellitus. Rev Gaúcha Enferm. 2010; 31(4):662-669..

A utilização dos indicadores antropométricos tem crescido como forma simples e eficaz para a avaliação do risco cardiovascular. O principal indicador utilizado para a detecção de obesidade geral é o índice de massa corporal (IMC) e para obesidade abdominal, a circunferência da cintura (CC), a relação cintura-quadril (RCQ) e a relação cintura-altura (RCA)88 Haun DR, Pitanga FJG, Lessa I. Razão cintura/estatura comparado a outros indicadores antropométricos de obesidade como preditor de risco coronariano elevado. Rev Assoc Med Bras 2009; 55(6):705-711.,99 Beck CC, Lopes AS, Pitanga FJG. Indicadores antropométricos de sobrepeso e obesidade como preditores de alterações lipídicas em adolescentes. Rev. paul. pediatr. 2011; 29(1):46-53..

Embora não sejam os métodos mais precisos para a avaliação da composição corporal, os indicadores antropométricos apresentam boa confiabilidade e são os mais baratos e aplicáveis em larga escala99 Beck CC, Lopes AS, Pitanga FJG. Indicadores antropométricos de sobrepeso e obesidade como preditores de alterações lipídicas em adolescentes. Rev. paul. pediatr. 2011; 29(1):46-53.,1010 Meller FO, Ciochetto CR, Santos LP, Duval PA, Vieira MFA, Schafer AA. Associação entre circunferência da cintura e índice de massa corporal de mulheres brasileiras: PNDS 2006. Cien Saude Colet 2014; 19(1):75-82.. Estudos demonstram a capacidade de alguns indicadores antropométricos na predição do risco cardiovascular. De acordo com o estudo de Haun et al.88 Haun DR, Pitanga FJG, Lessa I. Razão cintura/estatura comparado a outros indicadores antropométricos de obesidade como preditor de risco coronariano elevado. Rev Assoc Med Bras 2009; 55(6):705-711., os indicadores antropométricos IMC, CC, RCQ, RCA e índice de conicidade apresentam boa capacidade preditora do risco coronariano elevado. Oliveira et al.44 Oliveira MAM, Fagundes RLM, Moreira EAM, Trindade EBSM, Carvalho T. Relação de Indicadores Antropométricos com Fatores de Risco para Doença Cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. 2010; 94(4):478-485., em estudo com adultos de Florianópolis/SC, encontraram alta correlação entre o IMC e a RCQ e fatores de risco cardiovascular, especialmente, a dislipidemia.

A resistência insulínica é um dos principais fatores de risco cardiovascular e está associada à gordura visceral, hipertensão, diabetes, dislipidemias e outras alterações metabólicas1111 Vasques ACJ, Rosado LEFPL, Rosado GP, Ribeiro RCL, Franceschini SCC, Geloneze B, Priore SE, Oliveira DR. Habilidade de indicadores antropométricos e de composição corporal em identificar a resistência à insulin. Arq Bras Endocrinol Metab 2009; 53(1):72-79.. Apesar disso, o diagnóstico da resistência insulínica ainda não faz parte da rotina dos exames médicos no Brasil, pois os métodos de determinação apresentam custos elevados. A resistência insulínica parece estar associada aos indicadores antropométricos de obesidade, sobretudo, de distribuição central1111 Vasques ACJ, Rosado LEFPL, Rosado GP, Ribeiro RCL, Franceschini SCC, Geloneze B, Priore SE, Oliveira DR. Habilidade de indicadores antropométricos e de composição corporal em identificar a resistência à insulin. Arq Bras Endocrinol Metab 2009; 53(1):72-79.,1212 Matos LM, Giorelli GV, Dias CB. Correlation of anthropometric indicators for identifying insulin sensitivity and resistance. Sao Paulo Med J2011; 129(1):30-35..

Os estudantes universitários representam um público cujo estilo de vida e situações próprias do meio acadêmico podem resultar na omissão de refeições, consumo elevado de lanches rápidos e nutricionalmente inadequados1313 Petribú MMV, Cabral PC, Arruda IKG. Estado nutricional, consumo alimentar e risco cardiovascular: um estudo em universitários. Rev. Nutr. 2009; 22(6):837-846.. Além disso, são elevadas as taxas de sedentarismo, excesso de peso e outros fatores de risco cardiovascular nesse grupo. No Brasil, existem relatos de alta prevalência destes fatores de risco em população universitária. Moreira et al.77 Moreira TMM, Gomes EB, Santos JC. Fatores de risco cardiovasculares em adultos jovens com hipertensão arterial e/ou diabetes mellitus. Rev Gaúcha Enferm. 2010; 31(4):662-669. observaram prevalências de 38,1% de excesso de peso, 34,8% de sedentarismo, 27,5% de hipercolesterolemia, 14,6% de tabagismo e 8,4% de HAS em universitários.

A identificação dos fatores de risco cardiovascular permite o desenvolvimento de um planejamento preventivo contra as doenças cardiovasculares, além de subsidiar programas de saúde pública contra esses agravos. Considerando que o aparecimento das doenças cardiovasculares tem se manifestado cada vez mais precocemente, torna-se importante estudar como se dá a correlação entre estas doenças e os indicadores antropométricos em indivíduos jovens. Diante disso, este artigo buscou avaliar a associação entre fatores de risco cardiovascular e indicadores antropométricos em uma amostra de universitários da cidade de São Luís/MA, Brasil.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, realizado na cidade de São Luís, com estudantes de universidades públicas e privadas. A coleta de dados foi realizada no período de agosto/2011 a outubro/2012 por um grupo de estudantes selecionados e treinados.

A amostragem foi composta por nove universidades de São Luís que juntas representavam 95% dos universitários da cidade. A amostragem foi realizada por conglomerados em dois estágios. No primeiro, foram selecionadas as disciplinas e no segundo os alunos. A amostra foi estratificada em universidades públicas e privadas. Cada universidade forneceu uma lista com todas as disciplinas ofertadas e com base nas listas de todas as universidades foi realizada amostragem aleatória simples de disciplinas em cada instituição. Essa amostragem considerou a probabilidade proporcional ao número de alunos em cada universidade, em relação ao total de estudantes de todas as universidades juntas. Foram sorteados 12 alunos em cada disciplina sorteada. Realizou-se a correção por multiplicidade, considerando-se o número de disciplinas cursadas por cada aluno, que geralmente cursam mais de uma e isto altera as probabilidades de seleção.

A amostra foi estimada em 1276 alunos. Este tamanho de amostra permitiu estimar prevalências em torno de 50% com margem de erro de 3% e intervalo de confiança de 95%. Ainda foi possível detectar diferença de 8% na prevalência de síndrome metabólica (estimada em 10%) entre os grupos de expostos e não expostos, assumindo-se probabilidade de erro tipo I de 5% e fixando-se em 80% o poder do estudo e com efeito de desenho de 2. A amostra final foi de 968 alunos, ocorrendo 25,3% de perdas por recusas ou por ausência na sala de aula no dia da entrevista. A taxa de comparecimento dos alunos para a realização dos exames laboratoriais foi de 45,5%.

Cada participante foi submetido a uma entrevista, na qual respondeu um questionário, e teve aferidas as medidas antropométricas e a pressão arterial. Nesta ocasião, o participante era orientado para a realização gratuita do exame de sangue nos laboratórios cadastrados para obtenção das variáveis metabólicas. O questionário foi composto por perguntas referentes a dados socioeconômicos, consumo de bebida alcoólica, tabagismo, consumo alimentar e nível de atividade física.

As variáveis antropométricas utilizadas neste estudo foram: IMC, CC, RCQ e RCA. O IMC foi obtido pela fórmula IMC = peso (kg) / altura22 Carnelosso ML, Barbosa MA, Porto CC, Silva SA, Carvalho MM, Oliveira ALI. Prevalência de fatores de risco para doenças cardiovasculares na região leste de Goiânia (GO). Cien Saude Colet 2010; 15(Supl. 1):1073-1080. (m), e classificado de acordo com os valores estabelecidos para adultos pela World Health Organization (WHO)1414 World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: WHO; 1998. (Report of a WHO Consultation on obesity).. O peso foi aferido por balança portátil Tanita BC533® (Brasil), com o avaliado em pé e descalço. A altura foi medida por estadiomêtro Alturaexata® (Brasil), com o indivíduo em pé, descalço, com os calcanhares juntos, costas retas e os braços estendidos ao lado do corpo1515 Cuppari L. Nutrição clínica no adulto: Guias de medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP-escola paulista de medicina. 2a ed. Barueri: Ed. Manole; 2005..

A CC foi obtida utilizando-se fita métrica não extensível, posicionada imediatamente acima da cicatriz umbilical, e a leitura feita no momento da expiração1515 Cuppari L. Nutrição clínica no adulto: Guias de medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP-escola paulista de medicina. 2a ed. Barueri: Ed. Manole; 2005.. Para classificação foram utilizados pontos de corte propostos pelo National Cholesterol Education Program (NCEP), que aponta risco cardiovascular para valores ≥ 102 cm para homens e ≥ 88 cm para mulheres1616 Third Report of the National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults (Adult Treatment Panel III) final report. Circulation 2002; 106:3143-3421..

A circunferência do quadril (CQ) foi aferida na região de maior perímetro entre a cintura e a coxa1515 Cuppari L. Nutrição clínica no adulto: Guias de medicina ambulatorial e hospitalar, UNIFESP-escola paulista de medicina. 2a ed. Barueri: Ed. Manole; 2005.. A RCQ foi calculada por meio da razão entre CC e circunferência do quadril (CQ) e classificada de acordo com os pontos de corte da WHO1414 World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: WHO; 1998. (Report of a WHO Consultation on obesity)..

A RCA foi encontrada a partir da razão entre CC e altura, ambas em centímetros, e valores ≥ 0,52 para homens e ≥ 0,53 para mulheres foram considerados de risco1717 Pitanga FJG, Lessa I. Associação entre indicadores de obesidade e risco coronariano em adultos na cidade de Salvador, Bahia, Brasil. Rev Bras Epidemiol 2007; 10(2):239-248..

Como fatores de risco cardiovascular foram consideradas as variáveis: glicemia, triglicerídeos elevados, HDL-c diminuído, tabagismo, consumo excessivo de álcool, sedentarismo, síndrome metabólica e resistência insulínica.

Os exames laboratoriais de glicemia em jejum, insulinemia e perfil lipídico (Triglicerídeos, HDL-c), foram realizados em aparelho ADVIA 1650 (Bayer CO, EUA). A glicemia foi considerada elevada quando ≥ 100mg/dl1818 Alberti KG, Zimmet P, Shaw J. Metabolic syndrome--a new world-wide definition. A Consensus Statement from the International Diabetes Federation. Diabet Med 2006; 23(5):469-480.. Considerou-se alteração do perfil lipídico para os seguintes valores: triglicérides ≥ 150mg/dl; HDL-C < 50mg/dl em mulheres e < 40mg/dl em homens1616 Third Report of the National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults (Adult Treatment Panel III) final report. Circulation 2002; 106:3143-3421..

A resistência insulínica foi medida pelo Homeostasis model assessment-insulin resistance (HOMA-IR), utilizando-se a fórmula: HOMA-RI = Insulina (µU/mL) x (glicemia mg/dL ≤ 18) ≤ 22,51919 Ybarra J, Sanchez-Hernandez J, Pou J, Fernandez S. Anthropometrical measures are easily obtainable sensitive and specific predictors of insulin resistance in healthy individuals. Prevent Control 2005; 1(2):175-181.. O diagnóstico de resistência insulínica foi feito quando HOMA-RI > 2,72020 Geloneze B, Vasques ACJ, Stabe CFC, Pareja JC, Rosado LEFPL, Queiroz EC, Tambascia MA; BRAMS Investigators. HOMA1-IR and HOMA2-IR indexes in identifying insulin resistance and metabolic syndrome - Brazilian Metabolic Syndrome Study (BRAMS). Arq Bras Endocrinol Metab 2009; 53(2):281-287..

A pressão arterial foi aferida duas vezes com intervalos de cinco minutos, sendo considerada a de valor mais baixo, com aparelhos automáticos digitais Omron® (Japão) com diferentes tamanhos de manguitos. Considerou-se hipertensão para valores de pressão arterial ≥ 130x85mmHg1616 Third Report of the National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults (Adult Treatment Panel III) final report. Circulation 2002; 106:3143-3421..

Foi considerado tabagismo o consumo de pelo menos um cigarro no último mês. O consumo de álcool em excesso foi considerado quando houve um consumo maior que cinco doses em uma só ocasião.

O instrumento utilizado para avaliar o nível de atividade física foi a versão curta do Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ - Internacional Physical Activity Questionnaire - Short form). Os indivíduos deste estudo foram classificados em sedentários, suficientemente ativos e ativos2121 Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC, Braggion G. Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ): estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Rev Ativ Fís Saúde 2001; 6(2):5-18.. Para as análises de associação os indivíduos suficientemente ativos e ativos foram categorizados juntos. A seguir os critérios utilizados para cada grupo:

. Ativos: Indivíduos que realizaram atividade física intensa por pelo menos três dias, atingindo no mínimo 1500 MET (Metabolic Equivalent of Task/ Equivalentes metabólicos); ou, realizaram sete dias ou mais de atividades combinadas (caminhada, atividade moderada ou atividade intensa), atingindo no mínimo 3000 MET.

. Suficientemente ativos: Indivíduos que realizaram atividade física intensa de pelo menos 20 minutos diários por três dias ou mais; ou cinco ou mais dias de atividade moderada e/ou caminhada de pelo menos 30 minutos por dia; ou cinco ou mais dias de atividades combinadas, atingindo no mínimo 600 MET.

. Sedentários: aqueles que não se enquadraram em nenhum dos grupos anteriores.

Para a classificação da Síndrome Metábolica (SM) foram utilizados os critérios do Joint Interim Statement (JIS). Por este critério, a SM é definida a partir da presença de três dos seguintes critérios: 1) glicose em jejum ≥ 110mg/dL; 2) pressão arterial sistólica ≥ 130mmHg e/ou pressão arterial diastólica ≥ 85 mmHg; 3) HDL-C ≤ 40mg/dL em homens e ≤ 50mg/dL em mulheres; 4) triglicerídeos ≥ 150 mg/dL; 5) circunferência da cintura > 90 cm em homens e > 80 cm de mulheres.

Os dados foram digitados no software Microsoft Excel® e processados e analisados no programa estatístico Stata 10.0®. Para testar a normalidade das distribuições das variáveis foi utilizado o teste de Shapiro Wilk. As variáveis quantitativas foram expressas por meio de medianas e percentis 25 e 75, enquanto as variáveis qualitativas, por frequência simples e percentual. Para se investigar associação entre as variáveis antropométricas e os fatores de risco cardiovascular foi utilizado o teste do qui-quadrado. Para a análise de correlação entre os indicadores antropométricos e os metabólicos e pressão arterial, utilizou-se o coeficiente de correlação de Pearson com inclusão dos pesos amostrais. Embora todas as variáveis não tenham apresentado distribuição normal, no Stata® não é possível realizar estimativa da correlação pelo coeficiente de Spearman, corrigindo-se para o delineamento complexo de amostragem ou considerando os pesos amostrais. O cálculo da correlação de Spearman sem correção para o desenho do estudo produz estimativas mais baixas das correlações e subestima os erros de amostragem. Para obtenção do p-valor das correlações foi utilizada regressão linear considerando-se o delineamento complexo da amostra. Em todos os testes o nível de significância foi fixado em 0,05. Para a classificação dos coeficientes de correlação considerou-se correlação fraca quando r < 0,4, moderada quando r ≥ 0,4 a r < 0,5 e forte quando r ≥ 0,52222 Scattolin FAA, Diogo MJD, Colombo RCR. Correlação entre instrumentos de qualidade de vida relacionada à saúde e independência funcional em idosos com insuficiência cardíaca. Cad Saude Publica 2007; 23(11):2705-2715..

A probabilidade de seleção de cada aluno foi calculada para os dois estágios. No primeiro estágio, utilizou-se a razão entre o número de disciplinas sorteadas e o número de disciplinas ofertadas em cada universidade. No segundo estágio, dividiu-se o número de alunos entrevistados pelo número de alunos em cada disciplina. As probabilidades obtidas em cada estágio foram multiplicadas entre si e, finalmente, pelo número de disciplinas que o aluno cursava. Para a análise estatística, os dados foram ponderados pelo inverso da probabilidade de seleção, considerando-se também a estratificação por universidade (pública e privada) e o efeito do conglomerado, por meio do comando svy no Stata®. Como as perdas da realização dos exames de laboratório foram elevadas, realizou-se ponderação por ausência de resposta, por meio do inverso da probabilidade de seleção de cada indivíduo.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa do Hospital Universitário Presidente Dutra da Universidade Federal do Maranhão. Todos os participantes assinaram e receberam uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Foram estudados 968 universitários, com predomínio do sexo feminino (62% vs. 38%) e idade mediana de 22 anos para homens e 23 para mulheres.

A Tabela 1 mostra as medidas descritivas das variáveis metabólicas, pressão arterial e indicadores antropométricos.

Tabela 1
Características descritivas dos universitários segundo sexo, São Luís, MA, 2011-12.

A alteração do perfil lipídico apresentou resultados elevados em ambos os sexos. Os triglicerídeos foram significativamente mais elevados em homens (27,5% vs. 10,3%, p = 0,004) e em ambos os sexos mostraram associação significativa com valores mais elevados para todas as variáveis antropométricas. A diminuição do HDL-c foi significativamente maior em mulheres (63,7% vs. 55,7%, p = 0,001). No sexo feminino a diminuição HDL-c associou-se a maiores valores de IMC (p = 0,035), CC (p = 0,001), RCQ (p = 0,021) e RCA (p = 0,005). Para homens observou-se associação apenas com maiores valores de CC (p = 0,035).

A prevalência de hipertensão foi significativamente maior em homens (57,0% vs. 13,1%, p < 0,001), entretanto, esteve associada a maiores valores para todas as variáveis antropométricas em ambos os sexos.

Positivamente, a frequência de tabagismo foi baixa para ambos os sexos, porém homens fumavam mais (7,1% vs. 2,2, p = 0,002) que mulheres. O tabagismo foi associado a maiores valores de IMC (p = 0,010) e RCA (p = 0,003) em mulheres, e RCQ (p = 0,036) e RCA (p = 0,002) em homens. O consumo excessivo de bebida alcoólica foi mais elevado em homens (30,9% vs. 16,7%, p < 0,001) e relacionou-se a maiores valores de RCQ (p = 0,018) e RCA (p = 0,003) neste sexo. Mulheres que relataram consumo excessivo de álcool tiveram maiores valores de IMC (p = 0,039) e CC (p = 0,039). O sedentarismo foi bastante elevado em ambos os sexos, sendo maior em mulheres (73,9%). Apesar de apresentar prevalência maior em mulheres não foi observada relação significativa com nenhuma variável antropométrica para esse sexo. Por outro lado, homens sedentários tiveram maiores valores de RCQ (p = 0,038).

A prevalência de SM foi alta, sobretudo, em homens (31,9% vs. 11,5%, p = 0,002). Houve associação entre esta variável e valores mais elevados de todos os indicadores antropométricos tanto em homens quanto mulheres. A prevalência resistência insulínica não mostrou diferença entre sexos. Entretanto, foi observada associação significativa entre esta variável e maiores valores de CC (p = 0,001) em mulheres, e RCQ (p = 0,001) em homens. A resistência insulínica relacionou-se a maiores valores de IMC e RCA em ambos os sexos (Tabela 2 e 3).

Tabela 2
Associação entre indicadores antropométricos de obesidade e fatores de risco cardiovascular em universitários do sexo feminino de São Luís. São Luís, MA, 2011-12.
Tabela 3
Associação entre indicadores antropométricos de obesidade e fatores de risco cardiovascular em universitários do sexo masculino de São Luís. São Luís, MA, 2011-12.

Os resultados obtidos na análise de correlação entre os indicadores metabólicos e pressão arterial e os indicadores antropométricos apontaram uma fraca correlação entre eles, embora significativa em muitos casos. As correlações mais altas foram estabelecidas para o sexo feminino entre os triglicerídeos e IMC (r = 0,31), CC (r = 0,39), RCQ (r = 0,38) e RCA (r = 0,39); e entre a PAD e IMC (r = 0,43), CC (r = 0,41) e RCA (r = 0,38), Insulina e RCQ (r = 0,31), HOMA-IR e RCQ (r = 0,35), para o sexo masculino (Tabela 4).

Tabela 4
Correlação entre indicadores metabólicos e pressão arterial e indicadores antropométricos de obesidade em universitários de São Luís. São Luís, MA, 2011-12.

Discussão

A prevalência de fatores de risco cardiovasculares encontrados nesta população de universitários foi elevada, sobretudo por se tratar de um público jovem, com mediana de idade de 22 anos. Os indicadores antropométricos de obesidade utilizados neste estudo apresentaram, em geral, associação com os fatores de risco cardiovascular, indicando seu potencial desempenho no rastreamento desse risco, mesmo em indivíduos mais jovens.

As medianas de todos os indicadores antropométricos de obesidade, triglicerídeos, HDL-c, PAS, PAD e glicemia foram mais elevados em homens. Já insulina e HOMA-IR foram maiores em mulheres. Outros estudos também observaram resultados semelhantes, com maiores valores de lipídios séricos, pressão arterial e medidas antropométricas no sexo masculino, além de serem maiores nos indivíduos adultos que nos mais jovens2323 Rezende FAC, Rosado LEFPL, Ribeiro RCL, Vidigal FC, Vasques ACJ, Bonard IS, Carvalho CR. Índice de massa corporal e circunferência abdominal: associação com fatores de risco cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. 2006; 87(6):728-734.

24 Nascente FMN, Jardim PCBV, Peixoto MRG, Monego ET, Barroso WKS, Moreira HG, Vitorino PVO, Scala LN. Hipertensão arterial e sua associação com índices antropométricos em adultos de uma cidade de pequeno porte do interior do Brasil. Rev Assoc Med Bras 2009; 55(6):716-722.
-2525 Gharakhanlou R, Farzad B, Agha-Alinejad H, Steffen LM, Bayati M. Medidas antropométricas como preditoras de fatores de risco cardiovascular na população urbana do Irã. Arq Bras Cardiol 2012; 98(2):126-135..

A alteração do perfil lipídico é um importante fator de risco cardiovascular, que tem sido cada vez mais observado em indivíduos jovens99 Beck CC, Lopes AS, Pitanga FJG. Indicadores antropométricos de sobrepeso e obesidade como preditores de alterações lipídicas em adolescentes. Rev. paul. pediatr. 2011; 29(1):46-53.. As principais dislipidemias associadas ao risco cardiovascular são o aumento dos triglicerídeos séricos e a diminuição do HDL-c. Encontramos uma elevada taxa de HDL-c reduzido em ambos os sexos, o que provavelmente se deve à grande frequência de excesso de peso, sedentarismo e consumo de álcool.

Para os triglicerídeos foram observadas associações significativas com maiores valores de todas as variáveis antropométricas para ambos os sexos. Por outro lado, foram encontradas mais associações entre HDL-c e variáveis antropométricas no sexo feminino. Em mulheres de Curitiba/PR, Krause et al.2626 Krause MP, Hallage T, Gama MPR, Sasaki JE, Miculis CP, Buzzachera CF, Silva SG. Associação entre Perfil Lipídico e Adiposidade Corporal em Mulheres com Mais de 60 Anos de Idade. Arq Bras Cardiol 2007; 89(3):163-169. também encontraram relação direta entre alterações em triglicerídeos e HDL-c e as variáveis antropométricas IMC, CC e RCQ, sendo que os níveis de significância mais elevados foram observados para CC e RCQ. Esses resultados sugerem que o aumento da gordura corporal, especialmente em nível abdominal, tende a provocar a alteração das variáveis lipídicas séricas.

A prevalência de HAS encontrada foi significativamente maior em homens. Sabe-se que o excesso de peso está relacionado a outros fatores de risco cardiovascular, como HDL-c diminuído e hipertrigliceridemia, que apresentam grande impacto na elevação da pressão arterial2323 Rezende FAC, Rosado LEFPL, Ribeiro RCL, Vidigal FC, Vasques ACJ, Bonard IS, Carvalho CR. Índice de massa corporal e circunferência abdominal: associação com fatores de risco cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. 2006; 87(6):728-734.. Portanto, a alta prevalência de HAS neste estudo pode ser explicada pela elevada frequência de excesso de peso e alteração do perfil lipídico, bem como o sedentarismo. A HAS pode ser considerada preditora do risco para outras doenças cardiovasculares e está diretamente relacionada com as medidas antropométricas de obesidade55 Fonseca FL, Brandão AA, Pozzan R, Campana EMG, Pizzi OL, Magalhães MEC, Freitas EV, Brandão AP. A relação entre a pressão arterial e indices antropométricos na infância/adolescência e o comportamento das variáveis de risco cardiovascular na fase adulta jovem em seguimento de 17 anos: Estudo do Rio de Janeiro. Rev SOCERJ 2008; 21(5):281-290.. A HAS mostrou associação significativa com maiores valores para todas as variáveis antropométricas tanto em homens quanto em mulheres. Mascena et al.2727 Mascena GV, Cavalcante MSB, Marcelino GB, Holanda SA, Brandt CT. Fatores de risco cardiovascular em estudantes da Faculdade de Ciências Médicas de Campina Grande. Medicina (Ribeirão Preto) 2012; 45(3):322-328., encontrou associação (p < 0,001) entre HAS e obesidade (medida pelo IMC e pela CC) em universitários de Campina Grande/PB. Nascente et al.2424 Nascente FMN, Jardim PCBV, Peixoto MRG, Monego ET, Barroso WKS, Moreira HG, Vitorino PVO, Scala LN. Hipertensão arterial e sua associação com índices antropométricos em adultos de uma cidade de pequeno porte do interior do Brasil. Rev Assoc Med Bras 2009; 55(6):716-722., em um estudo com adultos em Goiás, encontraram maior prevalência de HAS em homens, sendo que os obesos apresentaram 2,3 vezes maior risco de HAS e aqueles com CC elevada, 3,2 vezes maior risco. Os indicadores antropométricos de obesidade abdominal, sobretudo CC e RCA, parecem possuir melhor desempenho na predição da pressão arterial elevada99 Beck CC, Lopes AS, Pitanga FJG. Indicadores antropométricos de sobrepeso e obesidade como preditores de alterações lipídicas em adolescentes. Rev. paul. pediatr. 2011; 29(1):46-53..

A baixa frequência de tabagismo na amostra (4,3%) foi um achado positivo. Essa prática foi mais frequente em homens e os que a referiram apresentaram maiores valores de RCQ e RCA. O hábito de fumar parece ser preditor de obesidade abdominal em homens, o que condiz com relação encontrada no presente estudo2828 Onat A, Uyarel H, Hergenc G, Karabulut A, Albayrak S, Can G. Determinants and definition of abdominal obesity as related to risk of diabetes, metabolic syndrome and coronary disease in Turkish men: A prospective cohort study. Atherosclerosis 2007; 191(1):182-190..

O consumo excessivo de álcool foi elevado, sobretudo, em homens. Ainda não existem muitos estudos sobre a associação entre o consumo de álcool e variáveis antropométricas, o que dificulta a comparação dos resultados deste estudo. O consumo de álcool, seja excessivo ou não, parece estar associado à adiposidade corporal e à obesidade abdominal em jovens e adultos2929 Pinho CPS, Diniz AS, Arruda IKG, Batista Filho M, Coelho PC, Sequeira LAS, Lira PIC. Prevalência e fatores associados à obesidade abdominal em indivíduos na faixa etária de 25 a 59 anos do Estado de Pernambuco, Brasil. Cad Saude Publica 2013; 29(2):313-324.. No presente estudo, esse achado também foi confirmado, uma vez que mulheres etilistas apresentaram maiores valores de IMC e CC, enquanto os homens tiveram valores mais elevados de RCQ e RCA.

O consumo de álcool favorece o desenvolvimento da obesidade, pois geralmente, a energia que fornece é adicional ao valor energético diário dos indivíduos. Além disso, a ingestão de bebida alcoólica aumenta o apetite e está associada ao consumo de outros alimentos concomitantemente, o que também contribui para o ganho de peso3030 Kachani AT, Brasiliano S, Hochgraf PB. O impacto do consumo alcoólico no ganho de peso. Rev. Psiq. Clín. 2008; 35(Supl. 1): 21-24.. Por ter prioridade no metabolismo, o álcool pode alterar a oxidação lipídica, contribuindo para o estoque de gorduras, sobretudo na região abdominal3030 Kachani AT, Brasiliano S, Hochgraf PB. O impacto do consumo alcoólico no ganho de peso. Rev. Psiq. Clín. 2008; 35(Supl. 1): 21-24.. Isso pode explicar o fato de termos encontrado associação significativa do consumo excessivo de álcool com as variáveis de obesidade abdominal.

O aumento do uso do computador e a grande ocupação do tempo dos estudantes pelas atividades ligadas à universidade interferem negativamente na prática de atividade física2727 Mascena GV, Cavalcante MSB, Marcelino GB, Holanda SA, Brandt CT. Fatores de risco cardiovascular em estudantes da Faculdade de Ciências Médicas de Campina Grande. Medicina (Ribeirão Preto) 2012; 45(3):322-328.,3131 Zemdegs CS, Corsi LB, Coelho LC, Pimentel GD, Hirai AT, Sachs A. Lipid profile and cardiovascular risk factors among first-year Brazilian university students in São Paulo. Nutr Hosp 2011; 26(3):553-559.. A taxa de sedentarismo nesta amostra foi elevada, sendo maior em mulheres. Apesar disso, esta variável apresentou valores significativamente maiores apenas para o indicador antropométrico RCQ, no sexo masculino. A maior prevalência de obesidade abdominal em homens sedentários também foi encontrada por Pinho et al.2929 Pinho CPS, Diniz AS, Arruda IKG, Batista Filho M, Coelho PC, Sequeira LAS, Lira PIC. Prevalência e fatores associados à obesidade abdominal em indivíduos na faixa etária de 25 a 59 anos do Estado de Pernambuco, Brasil. Cad Saude Publica 2013; 29(2):313-324., resultado esperado, uma vez que parece existir uma relação inversa entre gordura corporal e gasto energético, além de uma melhor distribuição de gordura em indivíduos ativos3232 Oliveira EO, Velásquez-Melendez G, Kac G. Fatores demográficos e comportamentais associados à obesidade abdominal em usuárias de centro de saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Rev Nutr 2007; 20(4):361-369..

A SM foi maior em homens, o que pode estar ligado ao fato de que a maioria das variáveis que compõem o diagnóstico da síndrome foram mais prevalentes no sexo masculino. Ademais, o elevado consumo de álcool e tabagismo, mais observado entre homens, também pode estar relacionado com o desenvolvimento da SM. Semelhantemente a este estudo, outras pesquisas têm mostrado associação significativa dos indicadores antropométricos com a SM3333 Rocha NP, Siqueira-Catania A, Barros CR, Pires MM, Folchetti LD, Ferreira SRG. Análise de diferentes medidas antropométricas na identificação de síndrome metabólica, com ou sem alteração do metabolismo glicídico. Arq Bras Endocrinol Metab 2010; 54(7):636-643.,3434 Ferreira AP, Ferreira CB, Brito CJ, Pitanga FJG, Moraes CF, Naves LA, Nóbrega OT, França NM. Predição da Síndrome Metabólica em Crianças por Indicadores Antropométricos. Arq Bras Cardiol 2011; 96(2):121-125.. Rocha et al.3333 Rocha NP, Siqueira-Catania A, Barros CR, Pires MM, Folchetti LD, Ferreira SRG. Análise de diferentes medidas antropométricas na identificação de síndrome metabólica, com ou sem alteração do metabolismo glicídico. Arq Bras Endocrinol Metab 2010; 54(7):636-643., ao estudarem a relação entre SM e as variáveis IMC, CC, CQ, RCQ, RCA e massa magra, concluíram que todas elas são capazes de identificar portadores da SM.

A resistência insulínica esteve presente em 6,2% dos universitários e não houve diferença na prevalência entre sexo. Foi observada associação significativa da resistência insulínica com IMC e RCA para ambos os sexos. Maiores valores de CC se associaram apenas no sexo feminino, enquanto que maiores valores de RCQ apenas em homens. Matos et al.1212 Matos LM, Giorelli GV, Dias CB. Correlation of anthropometric indicators for identifying insulin sensitivity and resistance. Sao Paulo Med J2011; 129(1):30-35., em São Paulo, observaram que IMC, CC e RCA foram os indicadores antropométricos que mais se associaram à resistência insulínica. O aumento da adiposidade corporal contribui para a diminuição da sensibilidade à insulina, por isso indivíduos com obesidade, sobretudo central, tendem a apresentar maior prevalência de resistência insulínica1111 Vasques ACJ, Rosado LEFPL, Rosado GP, Ribeiro RCL, Franceschini SCC, Geloneze B, Priore SE, Oliveira DR. Habilidade de indicadores antropométricos e de composição corporal em identificar a resistência à insulin. Arq Bras Endocrinol Metab 2009; 53(1):72-79.,3333 Rocha NP, Siqueira-Catania A, Barros CR, Pires MM, Folchetti LD, Ferreira SRG. Análise de diferentes medidas antropométricas na identificação de síndrome metabólica, com ou sem alteração do metabolismo glicídico. Arq Bras Endocrinol Metab 2010; 54(7):636-643.. No presente estudo, esse achado foi confirmado.

Entre as variáveis do perfil lipídico, as maiores correlações foram observadas entre os triglicerídeos e os indicadores antropométricos de obesidade abdominal. No estudo de Gharakhanlou et al.2525 Gharakhanlou R, Farzad B, Agha-Alinejad H, Steffen LM, Bayati M. Medidas antropométricas como preditoras de fatores de risco cardiovascular na população urbana do Irã. Arq Bras Cardiol 2012; 98(2):126-135., com a população urbana do Irã, as variáveis de obesidade abdominal foram as que melhor se correlacionaram com a hipertrigliceridemia e o HDL-c reduzido, porém ao contrário do observado no presente estudo, essas correlações foram mais pronunciadas em homens.

Os componentes da pressão arterial (PAS e PAD) também apresentaram correlações significativas com os indicadores antropométricos de obesidade. No estudo de Rezende et al.2323 Rezende FAC, Rosado LEFPL, Ribeiro RCL, Vidigal FC, Vasques ACJ, Bonard IS, Carvalho CR. Índice de massa corporal e circunferência abdominal: associação com fatores de risco cardiovascular. Arq. Bras. Cardiol. 2006; 87(6):728-734. foram observadas correlações leves a moderadas entre IMC e PAS (r = 0,36 ), PAD (r = 0,41); e CC e PAS (r = 0,46), PAD (r = 0,50).

De um modo geral, as correlações entre insulina de jejum e o HOMA-IR foram fracas, porém significativas. As correlações mais altas para estas medidas foram estabelecidas com a RCQ em homens. Rocha et al.3333 Rocha NP, Siqueira-Catania A, Barros CR, Pires MM, Folchetti LD, Ferreira SRG. Análise de diferentes medidas antropométricas na identificação de síndrome metabólica, com ou sem alteração do metabolismo glicídico. Arq Bras Endocrinol Metab 2010; 54(7):636-643., encontrou correlações leves a moderadas entre HOMA-IR e IMC (r = 0,50), CC (r = 0,49), RCQ (r = 0,26) e RCA (r = 0,51).

A obesidade abdominal está diretamente ligada à gordura visceral que é indicador de uma série de alterações metabólicas observadas neste estudo, como diminuição do HDL-c, hipertensão e resistência insulínica2626 Krause MP, Hallage T, Gama MPR, Sasaki JE, Miculis CP, Buzzachera CF, Silva SG. Associação entre Perfil Lipídico e Adiposidade Corporal em Mulheres com Mais de 60 Anos de Idade. Arq Bras Cardiol 2007; 89(3):163-169.. De um modo geral as variáveis de obesidade abdominal apresentaram maior correlação com os fatores de risco cardiovascular do que o IMC, indicando que este tipo de obesidade pode estar mais relacionado com o risco cardiovascular que a obesidade geral, medida pelo IMC2525 Gharakhanlou R, Farzad B, Agha-Alinejad H, Steffen LM, Bayati M. Medidas antropométricas como preditoras de fatores de risco cardiovascular na população urbana do Irã. Arq Bras Cardiol 2012; 98(2):126-135..

Um dos pontos fortes do presente estudo é o fato de trabalhar com uma amostra de base populacional, formada por adultos jovens, população na qual são poucos os estudos no Brasil. Além disso, este estudo apresenta a associação, ainda pouco estudada, entre indicadores antropométricos e resistência insulínica. Foi utilizado o Joint Interim Statement (JIS), que é o critério mais atual para o diagnóstico de SM e que considera menores valores para CC. O percentual de perdas foi satisfatório considerando as proporções do estudo (25,3%). Em contrapartida, a taxa de comparecimento a realização dos exames laboratoriais foi baixa, de 45,5%. Em virtude disso, é possível que algumas estimativas estejam superestimadas, caso os indivíduos que tenham comparecido aos exames sejam aqueles que apresentavam maior percentual de alterações.

Uma limitação do estudo foi ter feito o cálculo das correlações por meio do coeficiente de Pearson, que assume distribuição normal. Isto foi feito para se evitar a subestimativa dos erros de amostragem. Foi realizada comparação das estimativas obtidas com a correlação de Pearson com ponderação e de Spearman sem ponderação e os valores obtidos com a correlação de Pearson foram no mesmo sentido mas um pouco mais elevadas. Os p-valores do coeficiente de Spearman foram também comparados com os p-valores obtidos por regressão linear com correção para o delineamento de amostragem. Ambos forneceram estimativas semelhantes e consistentes.

Conclusão

Em conclusão, este estudo encontrou elevada frequência de importantes fatores de risco cardiovascular como alteração do perfil lipídico, HAS, consumo de álcool, sedentarismo, SM e resistência insulínica. Estes fatores de risco demonstraram significativa associação com os principais indicadores antropométricos de obesidade. Esses resultados apontam para a utilidade desses indicadores na identificação de indivíduos com risco.

Os indicadores que mais se associaram aos fatores de risco cardiovascular foram IMC, CC e RCA em mulheres e RCQ e RCA em homens. Os indicadores antropométricos de obesidade se correlacionaram mais com as variáveis metabólicas e pressão arterial no sexo feminino que no masculino.

Todos os fatores de risco cardiovascular analisados neste estudo são modificáveis, por isso, reforça-se a importância de incentivar a adoção de um estilo de vida mais saudável no público estudado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2015

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2014
  • Aceito
    19 Jun 2014
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