DireitoS, LutaS e PolíticaS
“Existe uma grande desordem sobre os céus e a situação é excelente”! Frase atribuída a Mao Tzé-Tung, ela inspira uma mescla de apocalipse com um novo alvorecer.
A frase foi resgatada e disseminada recentemente por Slavoj Zizek, cientista social e filósofo esloveno, em seu livro “Vivendo no fim dos tempos”, publicado em 2012, pela Editora Boitempo em que o autor aponta elementos que anunciariam a crise final do capitalismo: “a crise ecológica, as consequências da revolução biogenética, os desequilíbrios do próprio sistema (problemas de propriedade intelectual, a luta vindoura por matérias-primas, comida e água) e o crescimento explosivo de divisões e exclusões sociais”.
Zizek não deixa, entretanto, de distinguir sinais emancipatórios que apontariam recomeços.
A sensação que nos atravessa no Brasil atual é de desalento pelo retrocesso que estamos vivendo em termos de perdas de direitos conquistados ao longo de lutas anteriores. Por outro lado, é parte do DNA da Saúde Coletiva brasileira a luta e a resistência. Não diria que já há um novo porvir se avizinhando no horizonte, mas é excelente a oportunidade que temos para rever e produzir novas experiências conceituais e imaginar outras possibilidades de lutas e resistências.
O presente número temático “Direito à cidade: Promoção da equidade para grupos em situação de vulnerabilidade” aspira contribuir com uma porção desta luta colocando em cena a cidade, suas vulnerabilidades e potencialidades.
Os 13 artigos que abrem este número da Revista problematizam o tema e se subdividem em cinco frentes colocando em cena:
o direito à cidade e distintas agendas urbanas - Cidades Saudáveis, Cidades Sustentáveis, Cidades Inteligentes e Cidades Educadoras - e suas interconexões com o direito à saúde;
os modos de escuta e participação dos grupos em situação de vulnerabilidade na busca ao direito de existir das minorias para aumentar seus regimes de visibilidade, no enfrentamento das fragilidades encontradas na ocupação do espaço urbano, no uso da terra, na infraestrutura, na segurança pública, no saneamento básico, etc.;
metodologias avaliativas priorizando não apenas olhar para a efetividades das práticas, mas para conferir um grau menos fragmentado do ponto de vista disciplinar ao construto “vulnerabilidade”, sem se descuidar, no entanto, das especificidades territoriais das políticas públicas;
a proteção conferida pela lei às minorias, analisando a “vulnerabilidade legislativa” como “fraca” ou “forte” em relação ao idoso, deficiente, LGBT, índio, mulher, criança/adolescente e negros;
políticas e programas que busquem materializar o direito à cidade enfatizando a necessária articulação intersetorial que crie sinergia na diversidade dos recursos, dos talentos e das ideias e que fortaleça a abordagem dos determinantes sociais da saúde.
Entende-se que a questão de que tipo de cidade é desejada, não pode ser divorciada do tipo de laços sociais, relação com a natureza, estilos de vida, tecnologias e valores estéticos.
David Harvey, geógrafo britânico, avança neste debate com uma reflexão mais conectiva entre cidadãos, cidades, valores e natureza. Para ele o direito à cidade depende do exercício de um poder coletivo de moldar o processo de urbanização, pois a liberdade de construir e reconstruir a cidade e a nós mesmos tem sido um dos mais preciosos e negligenciados direitos humanos.
O direito à saúde é parte do conjunto de direitos sociais reconhecidos e garantidos por alguns países, que têm como inspiração o dever do Estado no financiamento das ações de saúde e a universalidade como direito de cidadania.
O direito à saude se entrecruza com o direito à cidade na medida em que, ao se garantir espaços urbanos saudáveis para a população, estará também reduzindo iniquidades e expandindo o usufruto dos efeitos positivos da urbanização a grupos excluídos e injustiçados.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Dez 2017