Fatores associados ao retratamento da tuberculose nos municípios prioritários do Maranhão, Brasil

Tereza Cristina Silva Pollyanna da Fonseca Silva Matsuoka Dorlene Maria Cardoso de Aquino Arlene de Jesus Mendes Caldas Sobre os autores

Resumo

Este estudo investigou os fatores associados aos casos de retratamento de tuberculose por recidiva e por reingresso após abandono. Trata-se de um estudo transversal tipo analítico dos casos notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação em municípios prioritários do Estado do Maranhão, de janeiro de 2005 a dezembro de 2010. Para identificar as associações foi utilizado o modelo de regressão logística. Os pacientes com idade entre 40 e 59 anos (OR = 1,49; p = 0,029) e com a forma clínica pulmonar (OR = 2,79; p = 0,016) apresentaram maior chance para recidiva. Os reingressos após abandono tiveram maior chance nos indivíduos do sexo masculino (OR = 1,53; p = 0,046), com idade entre 20 e 39 anos (OR = 1,65; p = 0,007), com menos de oito anos de estudo (OR = 2,01; p = 0,037) e dependentes de álcool (OR = 1,66; p = 0,037), os quais apresentaram maior chance de novo abandono (OR = 5,96; p < 0,001). Esses dados reforçam a necessidade de estratégias direcionadas a esse grupo, como a ampliação do tratamento supervisionado, intensificação da busca ativa, acompanhamento pós-alta e ações de educação em saúde.

Palavras-chave
Tuberculose; Retratamento; Recidiva

Introdução

A tuberculose representa um grave problema de saúde pública, sendo a segunda causa de morte por doenças infecciosas do mundo. Atualmente, um terço da população mundial está infectada pelo bacilo Mycobacterium tuberculosis, destes, 10% desenvolverão a doença, o que corresponde a aproximadamente 9 milhões de casos novos por ano11. World Health Association (WHO). Global tuberculosis report. Geneva: WHO; 2011..

Um dos maiores desafios nos dias de hoje, para o controle da tuberculose no Brasil, são os casos de retratamento. Esse grupo, formado pelos casos de recidiva e reingressos, apresenta maior chance de desenvolver um desfecho desfavorável para a doença, como óbito, novo abandono e resistência às drogas de tratamento, representando uma ameaça adicional ao controle da tuberculose, implicando em tratamento mais oneroso e mais complicado22. El Sahly HM, Wright JA, Soini H, Bui TT, Williams-Bouyer N, Escalante P, Musser JM, Graviss EA. Recurrent tuberculosis in Houston, Texas: a population-based study. Int J Tuberc Lung Dis 2004; 8(3):333-340.,33. Chaisson RE, Churchyard GJ. Recurrent tuberculosis: relapse, reinfection, and HIV. J Infect Dis 2010; 201(5):653-655.. No Brasil, 96% dos casos de resistência notificados são adquiridos, sendo que mais da metade tem um histórico de três ou mais tratamentos anteriores44. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Secretaria de Vigilância Sanitária. Os casos de retratamento da tuberculose no Brasil. Brasília: MS; 2010..

De acordo com Hijar et al.55. Hijjar MA, Procópio MJ, Freitas LM, Guedes R, Bethem EP. Epidemiologia da tuberculose: importância no mundo, no Brasil e no Rio de Janeiro. Pulmão 2005; 14(4):310-314., no Brasil são notificados por ano cerca de 15 mil casos de retratamento por recidiva ou reingresso após abandono, o que somado aos casos novos corresponde a 9a causa de internações por doenças infecciosas, o 7° lugar em gastos com internação do Sistema Único de Saúde (SUS) por doenças infecciosas e a 4a causa de mortalidade por doenças infecciosas.

As recidivas são caracterizadas pela persistência de bacilos em pacientes considerados curados, podendo ocorrer por reinfecção (recidiva exógena) ou reativação (recidiva endógena). Em geral, as recidivas precoces estão associadas à reativação endógena, caracterizadas pela capacidade do bacilo de sobreviver mesmo na presença de concentrações bactericidas de quimioterápicos durante tratamentos conduzidos corretamente66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233.,77. Ruffino-Netto A. Recidiva da tuberculose. J bras pneumol 2007; 33(5):xxvii-xxviii.. Os bacilos persistentes não são necessariamente resistentes às drogas, mas podem possuir metabolismo lento ou irregular. Ao encontrar condições favoráveis, que comprometem a destruição bacilar, como a baixa imunológica causada por situações como presença de aids, diabetes, alcoolismo, neoplasias, desnutrição e uso de corticóides, tornam-se metabolicamente ativos e voltam a se multiplicar, facilitando o desenvolvimento das recidivas66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233.,88. Albuquerque MFM, Leitão CCS. Fatores prognosticos para o desfecho do tratamento da tuberculose pulmonar em Recife, Pernambuco, Brasil. Rev Panam Salud Pública 2001; 9(6):368-374.,99. Bandera A, Gori, A, Catozzi L, Degli Esposti A, Marchetti G, Molteni C, Ferrario G, Codecasa L, Penati V, Matteelli A, Franzetti F. Molecular epidemiology study of exogenous reinfection in an area with a low incidence of tuberculosis. J clin microbial 2001; 39(6):2213-2218..

As recidivas mais tardias estão mais associadas à reinfecção exógena, principalmente em regiões onde a incidência é elevada e as condições sociais são precárias, o que expõe os indivíduos a novas infecções22. El Sahly HM, Wright JA, Soini H, Bui TT, Williams-Bouyer N, Escalante P, Musser JM, Graviss EA. Recurrent tuberculosis in Houston, Texas: a population-based study. Int J Tuberc Lung Dis 2004; 8(3):333-340.,1010. Jasmer RM, Bozeman L, Schwartzman K, Cave MD, Saukkonen JJ, Metchock B, Khan A, Burman WJ; Tuberculosis Trials Consortium. Recurrent tuberculosis in the United States and Canada: relapse or reinfection? Am J Respir Crit Care Med 2004; 170(12):1360-1366.,1111. Cox H, Kebede Y, Allamuratova S, Ismailov G, Davletmuratova Z, Byrnes G, Doshetov D. Tuberculosis recurrence and mortality after successful treatment: impact of drug resistance. PLoS Med 2006; 3(10):e384.. Ruffino-Netto77. Ruffino-Netto A. Recidiva da tuberculose. J bras pneumol 2007; 33(5):xxvii-xxviii. sugere que testes diagnósticos atuais, como a reação em cadeia da polimerase (PCR) poderiam elucidar a natureza do processo (reinfecção ou reativação).

O reingresso após abandono é caracterizado pela volta do paciente ao tratamento após ter faltado por mais de trinta dias, a partir da data agendada para o seu retorno66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233.. O abandono do tratamento tem sido apontado por diversos estudos como um grave problema que leva a manutenção da cadeia de transmissão do bacilo, uma vez que o paciente não tratado adequadamente continua como fonte de infecção, aumentando o risco de agravamento da doença, de mortalidade e favorecendo o desenvolvimento de bactérias resistentes aos fármacos, dificultando o controle da doença1212. Sassaki CM, Scatena LM, Gonzales RIC, Ruffino-Netto A, Hino P, Villa TCS. Predictors of favorable results in pulmonarytuberculosis treatment (Recife, Pernambuco, Brazil, 2001-2004. Rev Esc Enferm USP 2010; 44(2):504-510..

De acordo com Ruffino-Neto77. Ruffino-Netto A. Recidiva da tuberculose. J bras pneumol 2007; 33(5):xxvii-xxviii., poucos estudos investigam a questão do retratamento, o qual se apresenta como um indicador importante para monitoramento do Programa Nacional de Controle de Tuberculose (PNCT), pois permite identificar o desempenho do programa em relação ao resgate dos casos. Os retratamentos podem estar associados tanto a fatores organizacionais dos programas como a fatores individuais66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233.. Conhecer os fatores associados ao retratamento constitui um subsídio ao aprimoramento das estratégias de controle, direcionando o tratamento e o acompanhamento, visando reduzir os desfechos desfavoráveis. Diante disto, este estudo tem o objetivo de investigar os fatores associados aos casos de retratamento por recidiva e por reingresso após abandono.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal tipo analítico dos casos de tuberculose notificados nos municípios prioritários para o controle da tuberculose no estado do Maranhão, no período de 2005 a 2010.

O Estado do Maranhão localiza-se na região Nordeste do Brasil, apresenta uma área de 333.935, 507 Km2 e população de 6.574.789 habitantes1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo demográfico. Rio de Janeiro; 2010 [acessado 2013 Nov 10]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil.php?sigla=ma.
http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil....
. Possui 217 municípios, sendo oito considerados prioritários para o controle de tuberculose (Açailândia, Caxias, Codó, Imperatriz, Paço do Lumiar, São José de Ribamar, São Luís e Timon), por apresentarem mais de cem mil habitantes e incidência elevada de tuberculose (média de 36,4/100.000 habitantes em 2011).

A população foi constituída por todos os casos de tuberculose notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) nos municípios prioritários do Estado do Maranhão, no período de primeiro de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de 2010.

Foram considerados critérios de inclusão: casos novos e casos de retratamento (recidiva e reingresso) de tuberculose pulmonar e extrapulmonar; e como critério de não inclusão: tipo de entrada por transferência e mudança de diagnóstico.

Considerou-se caso novo aquele com tuberculose que nunca se submeteu à quimioterapia antituberculosa ou fez uso de tuberculostáticos por menos de 30 dias; e de retratamento os casos de recidiva (doença ativa após ter feito tratamento anterior e tiver tido alta por cura) e os casos de reingresso (retorno ao tratamento após abandono por mais de sessenta dias, a partir da última consulta).

As informações foram coletadas no banco de dados do Sistema de Informações sobre Agravos de Notificação (SINAN) da Secretaria de Estado de Saúde do Maranhão, salvas no aplicativo Tabwin versão 3.5 e exportadas para o Excel (Microsoft Corp., Estados Unidos). Em seguida, foram excluídas todas as variáveis que pudessem identificar os indivíduos, resguardando-se a confidencialidade dos dados de identificação de cada caso, bem como retiradas as inconsistências (informações imprecisas), incompletudes (informações incompletas) e duplicidades (dois ou mais registros para o mesmo caso).

Variáveis do estudo

Considerou-se como variável dependente ou resposta o retratamento (recidiva e reingresso).

As variáveis independentes selecionadas foram: sexo (masculino e feminino), idade (≤ 19, 20 a 39, 40 a 59, ≥ 60 anos), raça/cor (branca e não branca), escolaridade em anos de estudo (8 e ≥ 8), zona de moradia (rural e urbana), forma clínica (pulmonar e extrapulmonar), ter aids (sim e não), alcoolismo (sim e não), diabetes (sim e não), doença mental (sim e não) e tipo de encerramento (cura, abandono, óbito e tuberculose drogarresistente-TBDR).

Análise dos dados

As análises estatísticas foram realizadas no programa STATA, na versão 11.0 (Stata Corp., College Station, USA). Para identificar os fatores associados ao retratamento (recidiva e reingresso) foi utilizado o modelo de regressão logística simples. As variáveis cujo valor de p ≤ 0,20 foram incluídas no modelo de regressão logística múltipla, para ajustar possíveis vieses. A seleção das variáveis foi realizada pelo método passo a passo (stepwise) com eliminação retrógrada de variáveis. As variáveis com valor de p ≤ 0,05 permaneceram no modelo final. Foram estimados os odds ratios (OR) e seus respectivos intervalos de 95% de confiança (IC 95%). As categorias de referência atribuíram-se OR de 1.

Aspectos éticos

O estudo foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HUUFMA), atendendo aos requisitos exigidos pela Resolução 196/96 e 466/12, do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

Entre janeiro de 2005 a dezembro de 2010, o total de casos de tuberculose no Estado do Maranhão foi 2.277, destes, 1991 (87,4%) eram casos novos, 138 (6,1%) eram recidivas e 148 (6,5%) reingresso após abandono.

Na análise não ajustada, observou-se que as faixa etárias entre 40 e 59 anos (p = 0,007) e ≥60 anos (p = 0,058), ter tuberculose pulmonar (p = 0,012) e ter aids (p = 0,035) apresentaram-se associadas significativamente a recidiva da doença (Tabela 1).

Tabela 1
Análise não ajustada dos fatores associados aos casos de retratamento de tuberculose por recidivas, notificados nos municípios prioritários do Maranhão, no período de 2005 a 2010.

As variáveis que apresentaram associação significante ao reingresso foram: o sexo masculino (p < 0,001), ter entre 20 e 39 anos (p = 0,07), ter menos de oito anos de estudo (p = 0,015), ter tuberculose pulmonar (p = 0,013), ser dependente de álcool (p < 0,001), não ter realizado o tratamento supervisionado (p < 0,001) e ter encerramento por abandono (p < 0,001 (Tabela 2).

Tabela 2
Análise não ajustada dos fatores associados aos casos de retratamento de tuberculose por reingressos, notificados nos municípios prioritários do Maranhão, no período de 2005 a 2010.

Após o ajuste do modelo permaneceram como fatores associados para recidiva ter idade entre 40 e 59 anos (OR = 1,49, IC95% = 1,04-2,13; p = 0,029) e ter tuberculose pulmonar (OR = 2,79, IC95% = 1,21-6,43; p = 0,016). Para o reingresso permaneceu como fator associado o sexo masculino (OR = 1,53, IC95% = 1,01-2,33; p = 0,046), ter idade entre 20 e 39 anos (OR = 1,65, IC95% = 1,47-2,38; p = 0,007), ter menos de oito anos de estudo (OR = 2,01, IC95% = 1,04-3,89; p = 0,037), ser dependente de álcool (OR = 1,66, IC95% = 1,03-2,67; p = 0,037) e ter encerramento por abandono (OR = 5,96, IC 95% = 4,13-8,60; p < 0,001) (Tabela 3).

Tabela 3
Análise ajustada dos fatores associados aos casos de retratamento (recidiva e reingresso) de tuberculose, notificados nos municípios prioritários do Maranhão, no período de 2005 a 2010.

Discussão

Os resultados do presente estudo apresentaram uma prevalência de recidiva a doença de 6,1% e de reingresso ao tratamento de 6,5%, considerada relativamente baixa quando estudada separadamente. Por outro lado, o retratamento (recidiva e reingresso) perfaz um percentual de 12,6%, superior aos 10,0% estimado pelo Ministério da Saúde77. Ruffino-Netto A. Recidiva da tuberculose. J bras pneumol 2007; 33(5):xxvii-xxviii.,1414. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Controle da tuberculose: uma proposta de integração ensino-serviço. 5a ed. Rio de Janeiro: Funasa; 2002., porém próximo aos 13,9% registrados por Diniz et al.1515. Diniz LS, Gerhardt G, Miranda JA, Manceau JN. Efetividade do tratamento da tuberculose em oito municípios de capitais brasileiras. Bol Pneumol Sanit 1995; 3:6-19., em oito municípios de capitais brasileiras, e inferior aos 17,8% do estudo de Vieira e Leitão1616. Vieira MLG, Leitão GCM. Tuberculose: a realidade documentada do Centro de Saúde Flávio Marcílio, em Fortaleza-CE. Rev Rene 2005; 6(3):71-77., realizado em Fortaleza.

Convém ressaltar que por se tratar de um estudo transversal, optou-se pelo uso da razão de chances (OR), devido à prevalência dos casos de recidiva à doença e reingresso ao tratamento serem inferior a 10%, uma vez que a OR tende a superestimar as associações e a produzir falsos positivos quando a prevalência do evento for alta (usualmente acima de 10%).

As prevalências de recidivas e dos reingressos ao tratamento encontradas no presente estudo apresentaram divergências aos achados na literatura. As recidivas foram superiores aos 4,3% encontrados por Picon et al.1717. Picon PD, Bassanesi SL, Caramori MLA, Ferreira RLT, Jarczewski CA, Vieira PRB. Fatores de risco para a recidiva da tuberculose. J Bras Pneumol 2007; 33(5):572-578. no Rio Grande do Sul, e inferiores aos 7,8% registrados por Yamagishi e Toyota1818. Yamagishi F, Toyota M. Research and control of relapse tuberculosis cases. Kekkaku. 2009 Dec; 84(12):767-768., no Japão. Da mesma forma, os reingressos foram inferiores aos 9,9% registrados por Barbosa e Costa1919. Barbosa IR, Costa ICC. Aspectos epidemiológicos da tuberculose no município de Natal. Rev Enferm UFPI 2013; 2(2):14-20., na cidade de Natal, mas superior aos 3,6% descritos por Furlan et al.2020. Furlan MCR, Oliveira SP, Marcon SS. Fatores associados ao abandono do tratamento de tuberculose no estado do Paraná. Acta paul enferm 2012; 25(n. esp.):108114., no estado do Paraná. Alguns estudos têm apresentado as frequências de reingresso inferiores as de abandono2121. Augusto CJ, Carvalho WS, Gonçalves AL, Ceccato MGB, Miranda SS. Características da tuberculose no estado de Minas Gerais entre 2002 e 2009. J Bras Pneumol 201; 39(3):357-364.,2222. Vasconcellos FCS, Chatkin MN. Perfil epidemiológico da tuberculose em pelotas-Rio Grande do Sul–Brasil. R bras ci Saúde 2008; 11(3):229-238.. Esta diferença, talvez possa ser explicada pelo fato de alguns casos de abandono, quando retornam ao serviço, sejam notificados como caso novo e não como reingresso.

As recidivas apresentaram-se associadas em adultos maiores de 40 anos, semelhantes aos achados de Oliveira e Moreira Filho66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233., porém diferentes dos achados de Picon et al.1717. Picon PD, Bassanesi SL, Caramori MLA, Ferreira RLT, Jarczewski CA, Vieira PRB. Fatores de risco para a recidiva da tuberculose. J Bras Pneumol 2007; 33(5):572-578., que não encontraram associação com a idade. Essa associação da recidiva com idade pode ser explicada como decorrente da diminuição da imunidade, doenças concomitantes e desnutrição.

A relação entre o reingresso após abandono e o adulto jovem é reflexo da menor adesão ao tratamento e maior percentual de abandono nessa faixa etária2323. Chirinos NEC, Meirelles BHS. Fatores associados ao abandono do tratamento da tuberculose: uma revisão integrativa. Texto contexto-enferm 2011; 20(3):599-606.,2424. Heck MA, Costa JSD, Nunes MF. Prevalência de abandono do tratamento da tuberculose e fatores associados no município de Sapucaia do Sul (RS), Brasil, 2000-2008. Rev Bras Epidemiol 2011; 14(3):478-485.. Esse comportamento é explicado pela melhor percepção da gravidade da doença pelos pacientes mais idosos, enquanto os mais jovens não apresentam o mesmo estímulo, além de apresentarem hábitos de vida que dificultam cumprir o tratamento especialmente após a melhora clínica66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233.,2525. Mendes AM, Fensterseifer LM. Tuberculose: porque os pacientes abandonam o tratamento? Bol Pneumol Sanit 2004; 12(1):25-36..

A forma clínica pulmonar apresentou associação com os casos de recidiva, concordando com o estudo de Oliveira e Moreira Filho66. Oliveira HB, Moreira Filho DCM. Recidivas em tuberculose e seus fatores de risco. Rev Panam Salud Publica 2000; 7(4):233. e de El Sahly et al.22. El Sahly HM, Wright JA, Soini H, Bui TT, Williams-Bouyer N, Escalante P, Musser JM, Graviss EA. Recurrent tuberculosis in Houston, Texas: a population-based study. Int J Tuberc Lung Dis 2004; 8(3):333-340.. Esse achado pode ser justificado pelo fato da tuberculose ser a forma mais frequente, de fácil diagnóstico e a principal fonte de transmissão.

Quanto ao sexo masculino, observou-se associação com o reingresso após abandono, provavelmente porque a frequência de abandono é significativamente maior no sexo masculino2626. Ferreira SM, Silva AM, Botelho C. Noncompliance with treatment for pulmonary tuberculosis in Cuiabá, in the State of Mato Grosso - Brazil. J Bras Pneumol 2005; 31(5):427-435.,2727. Vieira AA, Ribeiro SA. Adesão ao tratamento da tuberculose após a instituição da estratégia de tratamento supervisionado no município de Carapicuíba, Grande São Paulo. J Bras Pneumol 2011; 37(2):223-231., o que pode estar relacionado aos hábitos de vida e a possibilidade das mulheres serem mais resistentes e por terem maior cuidado com a saúde do que os homens2828. Vendramini SH, Gazetta CE, Chiavalotti Netto F, Cury MR, Meirelles EB, Kuyumjian FG, Villa TCS. Tuberculose em município de porte médio do sudeste do Brasil: indicadores de morbidade e mortalidade, de 1985 a 2003. J Bras Pneumol 2005; 31(3):237-243..

Outra variável que apresentou associação com os casos de reingresso após abandono foi a baixa escolaridade, sendo esta considerada um reflexo de todo um conjunto de condições socioeconômicas precárias, que aumentam a vulnerabilidade à tuberculose e são responsáveis pela maior incidência da enfermidade e pela menor adesão ao tratamento2929. Mascarenhas MDM, Araújo LM, Gomes KRO. Perfil epidemiológico da Tuberculose entre casos notificados no município de Piripiri, Estado do Piauí, Brasil. Epidemiol serv saúde 2005; 14(1):7-14.,3030. Coelho DMM, Viana RL, Madeira CA, Ferreira LOC, Campelo V. Perfil epidemiológico da tuberculose no Município de Teresina-PI, no período de 1999 a 2005. Epidemiol serv saúde 2010; 19(1):33-42..

O alcoolismo apresentou-se associado ao reingresso ao tratamento, o que além de afetar o sistema imunológico contribui de forma significativa para o abandono de tratamento e tem se mostrado como fator preditor para a irregularidade da quimioterapia1717. Picon PD, Bassanesi SL, Caramori MLA, Ferreira RLT, Jarczewski CA, Vieira PRB. Fatores de risco para a recidiva da tuberculose. J Bras Pneumol 2007; 33(5):572-578., o que explica o maior percentual de alcoolismo entre os reingressantes2525. Mendes AM, Fensterseifer LM. Tuberculose: porque os pacientes abandonam o tratamento? Bol Pneumol Sanit 2004; 12(1):25-36.,2626. Ferreira SM, Silva AM, Botelho C. Noncompliance with treatment for pulmonary tuberculosis in Cuiabá, in the State of Mato Grosso - Brazil. J Bras Pneumol 2005; 31(5):427-435.,3131. Telles MA, Ferrazoli L, Waldman EA, Giampaglia CM, Martins MC, Ueki SY, Chimara E, Silva CA, Cruz V, Waldman CC, Heyn I, Hirono IU, Riley LW. A population-based study of drug resistance and transmission of tuberculosis in an urban community. Int J Tuberc Lung Dis 2005; 9(9):970-976.3333. Silveira CSS, Passos PT, Soder TCH, Machado CPH, Fanfa LS, Carneiro M, Fanfa L, Machado CPH. Perfil epidemiológico dos pacientes que abandonaram o tratamento para tuberculose em um município prioritário do rio grande do sul. Rev Epidemiol Control Infect 2012; 2(2):46-50..

Embora a aids não tenha apresentado a associação, após o ajuste, com os casos de retratamento por recidiva deste estudo, é importante destacar que a literatura tem evidenciado fortemente essa relação99. Bandera A, Gori, A, Catozzi L, Degli Esposti A, Marchetti G, Molteni C, Ferrario G, Codecasa L, Penati V, Matteelli A, Franzetti F. Molecular epidemiology study of exogenous reinfection in an area with a low incidence of tuberculosis. J clin microbial 2001; 39(6):2213-2218.,1717. Picon PD, Bassanesi SL, Caramori MLA, Ferreira RLT, Jarczewski CA, Vieira PRB. Fatores de risco para a recidiva da tuberculose. J Bras Pneumol 2007; 33(5):572-578.,3434. Narayanan S, Swaminathan S, Supply P, Shanmugam S, Narendran G, Hari L, Ramachandran R, Locht C, Jawahar MS, Narayanan PR. Impact of HIV infection on the recurrence of tuberculosis in South India. J Infect Dis 2010; 201(5):691-703., o que pode ser explicado pela imunodeficiência, a qual facilita a reinfecção exógena e a ativação endógena22. El Sahly HM, Wright JA, Soini H, Bui TT, Williams-Bouyer N, Escalante P, Musser JM, Graviss EA. Recurrent tuberculosis in Houston, Texas: a population-based study. Int J Tuberc Lung Dis 2004; 8(3):333-340.,99. Bandera A, Gori, A, Catozzi L, Degli Esposti A, Marchetti G, Molteni C, Ferrario G, Codecasa L, Penati V, Matteelli A, Franzetti F. Molecular epidemiology study of exogenous reinfection in an area with a low incidence of tuberculosis. J clin microbial 2001; 39(6):2213-2218.,3535. Zignol M, Wright A, Jaramillo E, Nunn P, Raviglione MC. Patients with previously treated tuberculosis no longer neglected. Clin Infect Dis 2007; 44(1):61-64.,3636. Korenromp EL, Scano F, Williams BG, Dye C, Nunn P. Effects of human immunodeficiency virus infection on recurrence of tuberculosis after rifampin-based treatment: an analytical review. Clin Infect Dis 2003; 37(1):101-112., além dos esquemas de tratamento tanto da aids quanto da tuberculose apresentarem efeitos colaterais adversos, o que contribui para o abandono e consequentemente com os reingressos3737. Rodrigues ILA, Monteiro LL, Pacheco RHB, Silva SED. Abandono do tratamento de tuberculose em coinfectados TB/HIV. Rev Esc Enferm USP 2010; 44(2):383-387..

Os casos de reingresso apresentaram quase seis vezes mais chance de abandonar, novamente, o tratamento. Concordando com os achados de Dooley et al.3838. Dooley KE, Lahlou O, Ghali I, Knudsen J, Elmessaoudi MD, Cherkaoui I, Aouad RE. Risk factors for tuberculosis treatment failure, default, or relapse and outcomes of retreatment in Morocco. BMC Public Health 2011; 11:140., Ferreira et al.2626. Ferreira SM, Silva AM, Botelho C. Noncompliance with treatment for pulmonary tuberculosis in Cuiabá, in the State of Mato Grosso - Brazil. J Bras Pneumol 2005; 31(5):427-435. e Silva et al.3939. Silva CCAV, Andrade MS, Cardoso MD. Fatores associados ao abandono do tratamento de tuberculose em indivíduos acompanhados em unidades de saúde de referência na cidade do Recife, Estado de Pernambuco, Brasil, entre 2005 e 2010. Epidemiol Serv Saúde 2013; 22(1):77-85.. Várias razões têm sido atribuídas a essa situação de não adesão ao tratamento, as quais envolvem barreiras sociais, culturais, demográficas e estruturais dos programas de saúde2525. Mendes AM, Fensterseifer LM. Tuberculose: porque os pacientes abandonam o tratamento? Bol Pneumol Sanit 2004; 12(1):25-36.,4040. Queiroz EM, Bertolozzi MR. Tuberculose: tratamento supervisionado nas Coordenadorias de Saúde Norte, Oeste e Leste do Município de São Paulo. Rev Esc Enferm USP 2010; 44(2):453-461.,4141. Paixão LMM, Gotinjo ED. Perfil de casos de tuberculose notificados e fatores associados ao abandono, Belo Horizonte, MG. Rev Saude Publica 2007; 41(2):205-213.. Esses casos devem ser tratados como grupo prioritário, na tentativa de evitar o agravamento e o desenvolvimento de bactérias resistentes, necessitando, portanto, de monitoramento sistemático ao longo do tratamento.

Uma das grandes dificuldades encontradas neste estudo foi o uso de fontes secundárias, os quais apresentaram um grande número de variáveis sem informação ou com preenchimento incompleto, o que pode ter prejudicado algumas análises. Porém o estudo apresenta relevância, pois permite conhecer fatores associados a um dos problemas apontados pela literatura como dificuldades para o controle da tuberculose. Contribuindo, assim, com informações que podem ser usadas para o planejamento de estratégias de controle da tuberculose no Estado do Maranhão.

Conclusão

Conclui-se que as chances de recidiva foram maiores em adultos com tuberculose pulmonar e os reingressos em adultos jovens, do sexo masculino, baixa escolaridade, dependentes de álcool e com maior chance de abandonar, novamente, o tratamento. Dessa forma, um acompanhamento sistemático dos casos de tuberculose pós-alta além de investimentos em educação e saúde, podem contribuir para prevenção e controle dos casos. Vale ressaltar que, neste contexto, a estruturação dos programas para atender essa demanda e a capacitação dos agentes comunitários, que servem de ponte entre os serviços de saúde e a comunidade, são pontos importantes com capacidade de contribuir para um melhor controle da tuberculose.

Agradecimentos

Pelo financiamento da Fundação de Amparo a Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema) e APP Universal e Universal CNPq/2010.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    05 Out 2015
  • Revisado
    26 Abr 2016
  • Aceito
    28 Abr 2016
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