Resumo
Objetivou-se analisar a literatura específica sobre os fatores associados ao comportamento suicida em crianças com até 14 anos. Trata-se, portanto, de uma revisão integrativa sobre este tema. Os dados foram coletados nas bases de dados PubMed e Psycinfo, a partir dos seguintes descritores: “risk of suicide”; “children”; “suicide”; “childhood”. O tempo de publicação foi limitado ao período de 1980 a 2016. Um total de 29 artigos preencheu os critérios de elegibilidade e, portanto, foram selecionados e analisados. Os resultados indicaram haver associação do suicídio com fatores neurobiológicos, escolares, sociais e mentais, dentre eles destaca-se o papel da impulsividade. Além disso, evidenciou-se que a maioria dos fatores de vulnerabilidade ao comportamento suicida podem ser prevenidos desde que sejam identificados e a criança receba tratamento psicológico e médico. Conclui-se que conflitos familiares, problemas na escola, bullying, impulsividade e depressão estão associados ao suicídio na infância. Adicionalmente, a escassez de pesquisas no âmbito nacional acerca da temática do suicídio pode contribuir para a invisibilidade desse tema na instauração de programas de promoção e tratamento de saúde.
Suicídio; Infância; Criança; Comportamento suicida; Risco de suicídio
Introdução
O suicídio é um grave problema de saúde pública, atinge todas as faixas etárias e é ocasionado por aspectos psicológicos, sociais, econômicos, biológicos e culturais11. Kõlves K, De Leo D. Suicide methods in children and adolescents. Eur Child Adolesc Psychiatry 2017; 26(2):155-164.
2. Kõlves K, De Leo D. Adolescent suicide rates between 1990 and 2009: Analysis of age group 15–19 years worldwide. J Adolesc Health, 2016; 58(1):69-77.-33. Barrio CA. Assessing suicide risk in children: Guidelines for developmentally appropriate interviewing. Journal of Mental Health Counseling 2007; 29(1):50-66.. Na infância, apesar de apresentar estatísticas baixas no mundo quando comparadas a outras faixas etárias, esse número tem aumentado e chama atenção por ser um evento trágico44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,55. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Situação Mundial da Infância. 2011. [acessado 2017 maio 1]. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowcr11web.pdf
https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowc... que rompe com o paradigma de sonhos e alegrias que deveriam fazer parte da vida dessas crianças. Além de acarretar problemas na economia do país, visto a redução de futuros adultos jovens economicamente ativos.
Pesquisadores33. Barrio CA. Assessing suicide risk in children: Guidelines for developmentally appropriate interviewing. Journal of Mental Health Counseling 2007; 29(1):50-66.,44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163. sugerem que a limitada aptidão das crianças e pré-adolescentes para a resolução de problemas pode aumentar o risco de suicídio devido à falta de estratégias adaptativas em situações de estresse. Em geral, nessa etapa de transição do final da infância e início da adolescência ocorrem intensas mudanças internas e externas causando um impacto sobre a capacidade emocional, física e mental55. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Situação Mundial da Infância. 2011. [acessado 2017 maio 1]. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowcr11web.pdf
https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowc... .
Estudo epidemiológico conduzido em 101 países, no período entre 2000 e 2009, constatou que 14,7% dos suicídios ocorreram em crianças na faixa etária entre 10 e 14 anos66. Kõlves K, De Leo D. Child, Adolescent and Young Adult Suicides: A Comparison Based on the Queensland Suicide Registry. J Child Adolesc Behav 2015; 3(3):1000209.. Destes, 74% morreram por enforcamento e 13% por arma de fogo66. Kõlves K, De Leo D. Child, Adolescent and Young Adult Suicides: A Comparison Based on the Queensland Suicide Registry. J Child Adolesc Behav 2015; 3(3):1000209..
Na Noruega77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12., uma pesquisa revelou que o suicídio corresponde a 61% das mortes por causas externas em crianças com idade entre 10 e 14 anos. Na Austrália, o suicídio corresponde à 2ª causa de morte (27,2%) em crianças com idade entre 10 e 14 anos88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304..
No Brasil, dados do Mapa da Violência, organizado pelo Ministério da Saúde, mostram que, de 2002 a 2012, o número de suicídios entre crianças e adolescentes de 10 a 14 anos aumentou 40%99. Mapa da Violência [Internet]. [acessado 2017 maio 1]. http://www.mapadaviolencia.org.br/. 2014
http://www.mapadaviolencia.org.br/... . O Mapa da Violência99. Mapa da Violência [Internet]. [acessado 2017 maio 1]. http://www.mapadaviolencia.org.br/. 2014
http://www.mapadaviolencia.org.br/... também mostrou que as prevalências de suicídio em crianças e adolescentes no Brasil evoluíram, entre os anos 2000 e 2010, de 0,9 a 1,1 por 100.000 crianças e adolescentes, situando o país na 60ª posição de um total de 98 analisados, valores baixos quando comparados aos de outras nações.
Em 2004, estudo conduzido no Piauí encontrou 30,9% de suicídio em jovens na faixa etária de 10 a 19 anos1010. Parente ACM, Soares RB, Araújo ARF, Cavalcante IS, Monteiro CFS. Caracterização dos casos de suicídio em uma capital do Nordeste Brasileiro. Revista Brasileira de Enfermagem 2007; 60(4):377-381.. Em 2010, em Alagoas, registrou-se que 26% dos jovens (10 a 19 anos) foram internados por tentativa de suicídio em um hospital de referência do estado1111. Alves VM, Silva MAS, Magalhães APN, Andrade TG, Faro ACM, Nardi AE. Suicide attempts in a emergency hospital. Arq. Neuro-Psiquiatr 2014; 72(2):123-128.. Esses dados são preocupantes e alarmantes, sobretudo pela dificuldade de notificação.
Nesse cenário, existem limitações e desafios na prevalência de suicídio em crianças: subnotificação das mortes por suicídio devido à dificuldade ou erro em classificá-las como tais ou registrá-las como acidentais ou por causas indeterminadas44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.; a junção das estatísticas de suicídio na faixa etária de 10 a 19 anos, que compreende períodos de desenvolvimento e de acontecimentos distintos, desconsiderando que jovens efetuam o suicídio por motivos diferentes das crianças e pela ausência de notificação dos hospitais desses casos. Adicionalmente, existe o tabu em torno do suicídio, em que se acredita na crença de que a criança, devido à sua imaturidade cognitiva, não se envolve em atos suicidas44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,99. Mapa da Violência [Internet]. [acessado 2017 maio 1]. http://www.mapadaviolencia.org.br/. 2014
http://www.mapadaviolencia.org.br/... ,1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291..
O interesse por estudar o suicídio em crianças menores de 14 anos no Brasil tem várias justificativas: (1) apesar de ser um tema relevante, tem recebido pouca atenção, não apenas no Brasil, mas no mundo inteiro; (2) aumento preocupante das taxas de suicídio na infância de 2,8 em 1980 para 4,1 em 2013 no país1515. World Health Organization (WHO). Global Health Estimates Summary Tables: Projection of deaths by cause, age and sex. Genebra: WHO; 2013.; (3) evidência obtida por estudos internacionais de que a criança tem consciência do desejo de morrer, o que exige cuidados para promover seu bem-estar e sua saúde psíquica44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.; (4) conhecer os fatores que predispõem uma criança a efetivar o suicídio.
A partir dessa perspectiva, inúmeras questões emergem. Dentre elas, duas se destacam: quais os fatores envolvidos na efetivação do ato suicida na infância? Existe diferença nos fatores precipitantes do risco de suicídio em crianças para outras faixas etárias?
De certa forma, o equacionamento dessas questões, por meio da sistematização das evidências científicas produzidas pelas pesquisas sobre o tema, pode abrir caminhos para a construção de uma base teórico-conceitual que vislumbre a criação de programas eficazes para a prevenção ao suicídio no âmbito da escola e da atenção primária.
A partir dessa perspectiva, objetiva-se analisar a literatura específica sobre suicídio consumado em crianças com até 14 anos. Espera-se que o esclarecimento desse tema possibilite hipóteses ou pressupostos como ponto de partida para futuras intervenções no comportamento suicida na infância.
Método
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura que busca captar, reconhecer e sintetizar a produção do conhecimento acerca de um assunto ou tema1616. Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm 2008; 17(4):758-764.. Esta pesquisa recobre o período de 1980 a 2016 e obedeceu às seguintes etapas metodológicas: estabelecimento da questão norteadora; seleção e obtenção de artigos (critérios de inclusão e exclusão); avaliação dos estudos pré-selecionados; discussão dos resultados e apresentação da revisão integrativa1616. Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm 2008; 17(4):758-764..
Com esse propósito, em 15 de janeiro de 2017, efetuou-se um levantamento das publicações na área de saúde consultando os artigos das bases de dados Pubmed e Psycinfo, por se tratar das bases que concentram maior grau de indexação de periódicos da área de saúde, através dos descritores, que buscassem responder às questões norteadoras: Quais os fatores envolvidos na efetivação do ato suicida na infância? Existe diferença nos fatores precipitantes do risco de suicídio em crianças para outras faixas etárias? Os critérios de inclusão foram: artigos sobre suicídio consumado com indivíduos de 10 a 14 anos. Excluíram-se os artigos que: (a) se voltavam exclusivamente para ideação e tentativa de suicídio; (b) versavam sobre epidemiologia do suicídio em jovens sem apresentar distinção entre menores de 14 anos e maiores de 15 anos; (c) redigidos em outras línguas que não português, inglês e espanhol; (d) publicados anteriormente a 1980; (e) não localizados na íntegra; (f) anais de eventos, dissertações, teses e cartas ao editor.
Os descritores pesquisados foram: “risk of suicide”; “children”; “suicide”; “childhood”. Realizou-se o cruzamento entre os descritores selecionados por meio de duas estratégias de busca: na primeira cruzou-se as palavras-chave utilizando o ícone AND e na segunda os cruzamentos foram realizados por meio do ícone OR.
Nesta busca foram identificados 1.953 artigos nas bases de dados. A partir da pesquisa dos descritores no título ou resumo, foram identificados apenas 586 estudos. Destes, 430 foram excluídos por não preencherem os critérios de inclusão (Figura 1). Dos 156 estudos restantes, 123 foram eliminados por não estarem diretamente relacionados ao tema (89 eram estudos de ideação e tentativa de suicídio e 34 versavam sobre epidemiologia do suicídio de jovens de 10 a 19 anos). Para a análise final, quatro artigos não foram localizados na íntegra, obtendo-se 29 como corpus analítico (Figura 1).
Posteriormente, os artigos foram lidos na íntegra e extraídas informações para a caracterização da produção quanto ao ano de publicação, país de origem do estudo, foco central no método utilizado e ênfase nos resultados e conclusões.
Na etapa da análise das publicações, realizou-se uma adaptação da técnica de análise de conteúdo temática de Bardin1717. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 1979.. Para a análise dos estudos percorreu-se os seguintes passos: (a) leitura de cada artigo buscando uma compreensão global; (b) identificação das ideias relacionadas aos fatores de risco para o suicídio em menores de 14 anos e as diferenças entre os fatores precipitantes nessa faixa etária quando comparados aos adolescentes; (c) classificação dessas ideias em categorias que evidenciam as singularidades e as peculiaridades dos artigos acerca do tema central e (d) elaboração de sínteses interpretativas de cada tema que articula com a visão dos fatores sobre os motivos que levam as crianças a morrem por suicídio.
As categorias foram: (1) Categorização das fontes; (2) A literatura no período de 1980 a 2016; (3) Desafio da classificação das mortes por causas externas em crianças; (4) Método do suicídio em crianças; (5) Relação entre ideação, tentativa e suicídio na infância; (6) Relações entre fatores escolares e suicídio na infância; (7) Relação entre fatores sociais e suicídio na infância; (8) Relações entre transtornos mentais e suicídio na infância.
Resultados e discussão
O recorte com o qual operamos nesta revisão e que compreende a faixa etária entre 10 e 14 anos se deve à escassez de literatura específica sobre suicídio em crianças menores de 10 anos. Embora haja foco na prevenção do suicídio na adolescência na maioria dos países, muitas vezes não é levado em conta que as crianças mais novas também são capazes de se matar
Os fatores predisponentes para o suicídio de crianças entre 10 e 14 anos são discutidos e articulados em conjunto com a literatura sobre adolescência devido à escassa literatura específica sobre crianças. Contudo, buscou-se concentrar a discussão na faixa etária delimitada nesta revisão.
Caracterização das fontes
Observou-se que apesar da expansão da produção do conhecimento sobre suicídio de crianças, os estudos enquadram esse fenômeno dentro da faixa etária entre 10 e 19 anos, não havendo uma distinção específica entre a infância e a adolescência. Desse modo, ao delimitar o foco em estudos sobre suicídio de crianças em menores de 14 anos, verifica-se uma redução bastante significativa dessa produção, obtendo-se apenas 29 estudos (Quadro 1).
Em termos de ano de publicação, há uma concentração de dez artigos nos anos de 2011 a 2016. Entre os países de realização das pesquisas que originaram os artigos, predominam os Estados Unidos (EUA) com sete. Não foram encontradas publicações de origem brasileira.
Sobre os desenhos metodológicos, a maioria (n = 25) apresentou abordagem retrospectiva, dos quais 15 utilizaram a autópsia psicológica. Tal abordagem busca reconstruir a história de vida das pessoas que morreram por suicídio em múltiplas fontes de informações: familiares, amigos, profissionais de saúde, prontuário médico e outros documentos importantes.
Os obstáculos que se colocam à produção de estudos sobre suicídio na infância dizem respeito à resistência de familiares em revelar o fenômeno, ainda por preconceito, ou por haver uma dificuldade em notificar tais dados, pelas ocorrências de suicídio se camuflarem sob a forma de morte acidental, como afogamento ou intoxicação.
A literatura no período de 1980 a 2016
Na data de 1980, encontrou-se apenas um estudo realizado a partir de autópsias psicológicas, visando compreender as circunstâncias e os fatores precipitantes para o suicídio em menores de 14 anos e em adolescentes de 15 a 19 anos, com enfoque nos transtornos mentais1818. Hoberman HM, Garfinkel BD. Completed suicide in children and adolescents. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988; 57(6):689-695.. Na década de 1990, as investigações se ampliam e aparecem estudos de caso-controle, de prevalência e comorbidade com transtorno mental e eventos estressantes sociais1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.
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A década de 2000 foi marcada pela ampliação expressiva de trabalhos, o que pode ser justificado pelo aumento expressivo no número de suicídios consumados na infância1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.,2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.
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31. Sourander A, Klomek AB, Niemelä S, Haavisto A, Gyllenberg D, Helenius H, Sillanmäki L, Ristkari T, Kumpulainen K, Tamminen T, Moilanen I, Piha J, Almqvist F, Gould MS. Childhood Predictors of Completed and Severe Suicide Attempts. Arch Gen Psychiatry 2009; 66(4):398-406.-3232. Kim YS, Leventhal B. Bullyingcand suicide. A review. Int J Adolescv Med Health 2008; 20(2):133-154.. São pesquisas de caso-controle, coorte, desenvolvem-se estudos multicêntricos internacionais e há um rigor técnico em torno da classificação das mortes por suicídio em crianças, buscando reunir e discutir aspectos sobre bullying, depressão e suicídio.
Em 2010, surgem estudos mais específicos com a população menor de 14 anos enfatizando traços de personalidade, fatores associados ao bullying, estresse psicossocial e suas implicações psiquiátricas77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.
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Desafio da classificação das mortes por causas externas em crianças
Um dos desafios apontados para o suicídio de crianças é a classificação correta da morte nessa faixa etária. Na Noruega, Grøholt e Ekeberg1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417., ao reclassificarem a morte de crianças por suicídio no período de 1990 a 1992, concluíram que houve uma redução de 50% das mesmas. Nos EUA, 31,5% dos participantes afirmaram que não tinham evidências que justificasse a morte por suicídio, 29% narraram que a morte aconteceu devido ao histórico de jogos de asfixia e 10,9% afirmaram que a idade da criança confirma a morte acidental1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481..
Dessa forma, Grøholt e Ekeberg1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417. recomendam alguns critérios para avaliar a morte por suicídio de crianças: investigar as atividades relevantes na vida destas, como a expressão de intenção de desejo de morrer; sinais de sofrimento mental; presença de dor emocional ou física; eventos ou perdas estressantes; desespero e os meios utilizados para a morte e as circunstâncias para que não fossem salvos.
Adicionalmente, admite-se a dificuldade em identificar se a morte por enforcamento ocorreu por suicídio ou por acidente. Nesse sentido, muitas crianças assistem cenas de enforcamento em desenhos animados, em pinturas e em programas de televisão. Ressalta-se que este método não requer habilidades específicas77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.. Portanto, devem-se analisar as circunstâncias sociais, psicológicas e psiquiátricas envolvidas na morte das crianças para classificá-las de modo correto.
Métodos de suicídio na infância
Houve predominância que variou de 48 a 90% dos casos de mortes por suicídio na infância por enforcamento, seguida de 14% a 22% por arma de fogo e, em menores proporções, 4% a 7% por envenenamento, 7% a 30% por precipitação e 2% a 4% por afogamento44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,66. Kõlves K, De Leo D. Child, Adolescent and Young Adult Suicides: A Comparison Based on the Queensland Suicide Registry. J Child Adolesc Behav 2015; 3(3):1000209.
7. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.
8. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.-99. Mapa da Violência [Internet]. [acessado 2017 maio 1]. http://www.mapadaviolencia.org.br/. 2014
http://www.mapadaviolencia.org.br/... ,1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.
13. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.-1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.,2121. Brent DA, Baugher M, Bridge J, Chen T, Chiappetta L. Age- and sex related risk factors for adolescent suicide. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1999; 38(12):1497-1505.,2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.,2626. Beautrais A. Child and Young adolescent suicide in New Zealand. Aust N Z J Psychiatry 2001; 35(5):647-653.,2828. Agritmis H, Yayci N, Colak B, Aksoy E. Suicidal deaths in childhood and adolescence. Forensic Sci Int 2004; 142(1):25-31.,3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182.,4141. Dervic K, Friedrich E, Oquendo MA, Voracek M, Friedrich MH, Sonneck G. Suicide in Austrian children and Young adolescentes aged 14 and younger. Eur Child Adolesc Psychiatry 2006; 15(7):427-434..
Em Singapura, 90% das mortes ocorreram por precipitação e 9% por enforcamento3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182.. Na Áustria, na década de 1990, houve o dobro de mortes por arma de fogo quando comparada às décadas de 1970 e 19802121. Brent DA, Baugher M, Bridge J, Chen T, Chiappetta L. Age- and sex related risk factors for adolescent suicide. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1999; 38(12):1497-1505.. Na Inglaterra, não foram registradas mortes por suicídios provocados por arma de fogo2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.. Esse estudo chama atenção para a intoxicação por álcool e antidepressivos encontrados em 9% dos casos2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.. Na Turquia, nos EUA e na Inglaterra, encontraram proporção significativa de 13 a 30% de mortes por envenenamento2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.,3636. Coskun M, Zoroglu S, Ghaziuddin N. Suicide rates among Turkish and American youth: a cross-cultural comparison. Arch Suicide Res 2012; 16(1):59-72..
Relação entre ideação, tentativa e suicídio
As crianças verbalizam menos o desejo de morrer quando comparadas aos adolescentes. Estudo na Noruega constatou que 68% dos adolescentes verbalizaram seu desejo de morrer e apenas 29% das crianças haviam expressado verbalmente a ideação suicida ou escrito um bilhete que denotasse o esvaziamento das forças para viver3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.,3434. Freuchen A, Kjelsberg E, Lundervold AJ, Grøholt B. Differences between children and adolescents who commit suicide and their peers: A psychological autopsy of suicide victims compared to accident victims and a community sample. Child Adolesc Psychiatry Ment Health 2012; 6(1):1-12.. Outro estudo na Noruega sinalizou que 40,9% haviam dado avisos verbais sobre o suicídio, expressando seu comportamento suicida para colegas e professores3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206..
Apesar da inexistência de dados concretos sobre ideação suicida na infância, uma vez que esse tema ainda é pouco investigado em nível mundial, os pesquisadores encontraram mudanças nos comportamentos e alguns conjuntos de sinais. Nos meses que antecederam o suicídio, as crianças tornaram-se mais caladas e quietas, evitaram sair de casa e nos dias que precederam o suicídio não foram à escola77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.
13. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.-1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291..
As crianças tendem a manifestar seu desejo de morrer na semana que antecede o ato3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.. Estudo sobre os bilhetes suicidas deixados por menores de 14 anos reportou que 61% escreveram bilhetes nos dias e meses que antecederam o suicídio, o que sugere o desafio em identificar precocemente o comportamento suicida nessa faixa etária2929. Weinberger LE, Sreenivasan S, Sathyavagiswaran L, Markowitz E. Child and adolescent suicide in a large, urban area: Psychological, demographic and situational factors. J Forensic Sci 2001; 46(4):902-907..
Freuchen e Grøholt3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206. discorrem que os bilhetes suicidas evidenciaram a ambivalência entre a busca de forças para continuar vivendo e a decisão de dar um fim à sua vida. Destaca-se que três bilhetes foram escritos no ambiente escolar, como atividade da disciplina e, destes, dois foram corrigidos pelos professores quanto à gramática e estrutura do texto. Apesar da existência dos bilhetes manifestando explicitamente o desejo de morrer, a escola não tomou nenhuma providência quanto a entrar em contato com os pais ou encaminhar as crianças para avaliação psicológica.
Nessa linha de raciocínio, o interesse por suicídio é um sinal que não deve ser ignorado em crianças. Manifestações verbais, de modo direto ou indireto, que referem a “pensamentos de morte”, mudanças de comportamento e curiosidade pela temática da morte devem ser levadas a sério, exigindo atenção imediata88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.,1818. Hoberman HM, Garfinkel BD. Completed suicide in children and adolescents. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988; 57(6):689-695.,2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099.,3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.,4141. Dervic K, Friedrich E, Oquendo MA, Voracek M, Friedrich MH, Sonneck G. Suicide in Austrian children and Young adolescentes aged 14 and younger. Eur Child Adolesc Psychiatry 2006; 15(7):427-434..
No caso da manifestação verbal, a criança, na fase final da infância e início da adolescência, pode ir diretamente ao assunto, confidenciando aos seus amigos que quer morrer ou apenas insinuando e comentando sobre seu desejo de morte com professores e, em menor frequência, com seus familiares.
Um dos desafios para a prevenção do suicídio na infância é a detecção precoce da ideação suicida. A mudança do comportamento da criança não deve passar despercebida ou ser confundida com uma fase de temperamento difícil ou retraído4242. Organização Mundial da Saúde (OMS). Prevenção do suicídio: Manual para professores e educadores. Brasília: OMS; 2000.. Além disso, faz-se necessário superar a ideia de que a criança não tem capacidade cognitiva para se matar.
Dados mais concretos sobre tentativa de suicídio reportam que 13,1% das crianças já haviam tentado suicídio anteriormente77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.,2323. Marttunen MJ, Aro HM, Henriksson MM, Lönnqvist JK. Mental disorders in adolescent suicide: DSM-III-R Axes I and II diagnoses in suicides among13- to 19-year olds in Finland. Arch Gen Psychiatry 1991; 48(9):834-839.,3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.,3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182.,3838. Séguin M, Renaud J, Lesage A, Robert M, Turecki G. Youthand Young adult suicide: A study of life trajectory. J Psychiatry 2011; 45(7):863-870.. Quando comparado com as mortes acidentais de crianças, 23% haviam tentado o ato no ano que antecedeu a morte por suicídio2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099..
A tentativa é o fator de risco mais significativo para o suicídio. A tentativa de suicídio é mais frequente em crianças do sexo feminino que do sexo masculino3030. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.. Esse dado também é persistente em outras faixas etárias. Os estudiosos advertem que ter arma de fogo em casa e ausentar-se, deixando a criança sozinha, devem ser considerados verdadeiros alertas aos familiares44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,66. Kõlves K, De Leo D. Child, Adolescent and Young Adult Suicides: A Comparison Based on the Queensland Suicide Registry. J Child Adolesc Behav 2015; 3(3):1000209.,77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,2525. Schimdt P, Müller R, Dettmeyer R, Madea B. Suicide in children, adolescentes and Young adults. Forensic Sci Int 2002; 127(3):161-167.,4040. Skinner R, Steven M. Suicide among children and adolescentes in Canada: trends and sex differences, 1980-2008. CMAJ 2012; 184(9):1029-1034.. Ademais, a ocorrência de tentativa de suicídio na infância é um dos fatores de risco mais significativo para a repetição do ato em outras fases da vida1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562..
Considera-se também a exposição de crianças ao comportamento suicida de familiares e pessoas próximas. Soole88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304. e Dervic1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291. mostram que crianças que tiveram familiares com depressão ou que um dos pais ou outro parente efetuou e obteve êxito no suicídio foram significativamente mais propensos a tentá-lo. Freuchen e Grøholt3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206. encontraram que 43% das crianças que morreram por suicídio haviam tido exposição ao fenômeno na comunidade ou na família.
Desse modo, reflete-se como o suicídio é um evento complexo que acarreta estresse para a família e provoca uma desorganização de seus membros, especialmente entre os filhos que vivem mais próximos de seus pais e tendem a ser mais visivelmente afetados.
Esses resultados apontam que as experiências de cada criança com os sinais de depressão, morte e suicídio, assim como aquilo que lhes é dito sobre isso, são cruciais para a compreensão que ela terá sobre o suicídio. Pesquisa realizada por Mishara4343. Mishara BL. Conceptions of death and suicide in children ages 6-12 and their implications for suicide prevention. Suicide Life Threat Behav 1999; 2(20):105-118. encontrou que crianças com idades entre 5 e 11 anos possuem entendimento minucioso sobre suicídio. As crianças aos 8 e 9 anos conseguiram elaborar conceitos de vida e morte, embora ainda sejam um pouco imaturos4343. Mishara BL. Conceptions of death and suicide in children ages 6-12 and their implications for suicide prevention. Suicide Life Threat Behav 1999; 2(20):105-118.. Portanto, é uma barreira para a detecção do risco de suicídio considerar que as crianças não entendem o conceito de suicídio.
Relação entre processo cognitivo e suicídio na infância
Estudo teórico sobre suicídio na infância narra que o desenvolvimento cognitivo da criança não deve ser subestimado, pois as crianças demonstraram ter dificuldade em julgar e gerir as circunstâncias estressantes devido à imaturidade do córtex anterior e posterior1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.. Nesse sentido, alterações neurocomportamentais desencadeadas na puberdade, como os impulsos e as mudanças emocionais, podem estar relacionados ao suicídio nessa faixa etária1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291..
Vale ressaltar que a impulsividade, oriunda também da imaturidade cerebral, é característica acentuada nesse ciclo de vida e agrava o fato dela estar intimamente relacionada ao risco de tentativas de suicídio.
Essas mudanças podem não ocorrer de forma concomitante com os processos cognitivos, como seu desenvolvimento, o amadurecimento da capacidade reflexiva e crítica e a maturação do juízo. Desse modo, os componentes cognitivos e afetivos do comportamento envolvem sistemas neurobiológicos e estão entre as últimas regiões cerebrais a amadurecer1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291..
Estudo na Noruega3434. Freuchen A, Kjelsberg E, Lundervold AJ, Grøholt B. Differences between children and adolescents who commit suicide and their peers: A psychological autopsy of suicide victims compared to accident victims and a community sample. Child Adolesc Psychiatry Ment Health 2012; 6(1):1-12. não encontrou diferença entre o desenvolvimento e a maturação cognitiva entre crianças menores de 13 anos e adolescentes entre 15 e 20 anos. Nessa linha de pensamento, novas pesquisas devem ser conduzidas para aprofundar a relação entre a imaturidade cognitiva e o suicídio em crianças menores de 14 anos.
Relação entre fatores escolares e suicídio na infância
Os problemas escolares constituem um importante fator precipitante para o suicídio na infância. Compreende-se por problemas relacionados à escola: o bullying, o abandono escolar, as crises disciplinares e a dificuldade de interação social.
Numerosos estudos encontraram que quase metade das crianças apresentaram, recentemente, problemas disciplinares na escola44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.,2020. Gould MS, Fisher P, Parides M, Flory M, Shaffer D. Psychosocial risk factors of child and adolescente completed suicide. Arch Gen Psychiatry 1996; 53(12):1155-1162.,2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.,2525. Schimdt P, Müller R, Dettmeyer R, Madea B. Suicide in children, adolescentes and Young adults. Forensic Sci Int 2002; 127(3):161-167.,2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099.,2929. Weinberger LE, Sreenivasan S, Sathyavagiswaran L, Markowitz E. Child and adolescent suicide in a large, urban area: Psychological, demographic and situational factors. J Forensic Sci 2001; 46(4):902-907.
30. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.-3131. Sourander A, Klomek AB, Niemelä S, Haavisto A, Gyllenberg D, Helenius H, Sillanmäki L, Ristkari T, Kumpulainen K, Tamminen T, Moilanen I, Piha J, Almqvist F, Gould MS. Childhood Predictors of Completed and Severe Suicide Attempts. Arch Gen Psychiatry 2009; 66(4):398-406.,3434. Freuchen A, Kjelsberg E, Lundervold AJ, Grøholt B. Differences between children and adolescents who commit suicide and their peers: A psychological autopsy of suicide victims compared to accident victims and a community sample. Child Adolesc Psychiatry Ment Health 2012; 6(1):1-12.,3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182.. Dentre os problemas disciplinares, 25,3% falharam na nota escolar, 18,3% abandonaram a escola e 16,3% foram suspensos2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.. A abstenção na escola é um evento que está interligado ao isolamento social e ao comportamento suicida2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099.,3030. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.,3838. Séguin M, Renaud J, Lesage A, Robert M, Turecki G. Youthand Young adult suicide: A study of life trajectory. J Psychiatry 2011; 45(7):863-870.. A ausência na escola pode estar relacionada à vergonha, à culpa e ao medo em lidar com os problemas escolares expressados por problemas disciplinares, notas baixas, dificuldade de se relacionar afetivamente com os colegas e por violência sofrida pelos seus pares.
As crianças que morreram por suicídio apresentaram maiores problemas de desempenho escolar e dificuldades acadêmicas. Entretanto, não se sabe se a queda no rendimento escolar é mediada por eventos estressantes na vida ou por distúrbios de atenção, aprendizagem, conduta, ansiedade e depressão. Sabe-se que sentimentos depressivos podem influenciar no desempenho escolar na medida em que a criança não consegue acreditar na sua capacidade de superar as adversidades4242. Organização Mundial da Saúde (OMS). Prevenção do suicídio: Manual para professores e educadores. Brasília: OMS; 2000..
O Manual de Prevenção do Suicídio para professores e educadores reforça que qualquer mudança súbita ou dramática que afete o desempenho, a capacidade de prestar atenção ou o comportamento de crianças ou adolescentes deve ser levado a sério4242. Organização Mundial da Saúde (OMS). Prevenção do suicídio: Manual para professores e educadores. Brasília: OMS; 2000..
Nos dias atuais, outro problema grave que acomete as crianças no ambiente escolar diz respeito ao bullying. Bullying se refere ao comportamento violento manifestado por intimidação e o maltrato entre escolares de forma repetida e mantida no tempo com a intenção de humilhar e submeter abusivamente uma vítima indefesa4444. Bauman AS, Toomey RB, Walker JL. Associations among bullying, Cyberbullying, and suicide in high school students. J Adolesc 2013; 36(2):341-350..
Na Noruega, 29% das crianças que morreram por suicídio haviam sido vítimas de bullying3030. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.. Estudo de coorte encontrou associação significativa entre bullying e comportamento suicida. As vítimas de intimidação e maus-tratos pelos seus colegas eram significativamente mais susceptíveis a sofrer impacto na saúde mental e apresentaram baixa autoestima, isolamento social e sintomas depressivos2020. Gould MS, Fisher P, Parides M, Flory M, Shaffer D. Psychosocial risk factors of child and adolescente completed suicide. Arch Gen Psychiatry 1996; 53(12):1155-1162..
Em relação ao gênero, agressores e vítimas do sexo masculino estiveram mais propensos a ter comportamento suicida do que aqueles que nunca estiveram envolvidos em bullying e as meninas que eram vítimas de intimidações frequentemente estiveram mais susceptíveis a efetuar o suicídio2020. Gould MS, Fisher P, Parides M, Flory M, Shaffer D. Psychosocial risk factors of child and adolescente completed suicide. Arch Gen Psychiatry 1996; 53(12):1155-1162..
Revisão sistemática sobre bullying e suicídio não encontrou associação significativa entre esses dois eventos4444. Bauman AS, Toomey RB, Walker JL. Associations among bullying, Cyberbullying, and suicide in high school students. J Adolesc 2013; 36(2):341-350.. Em contraste a isso, estudos têm reportado o papel do bullying no sofrimento mental manifestado pela solidão, isolamento social, dificuldade de se relacionar com os pares, depressão infantil e comportamento suicida88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.,2121. Brent DA, Baugher M, Bridge J, Chen T, Chiappetta L. Age- and sex related risk factors for adolescent suicide. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1999; 38(12):1497-1505.,2323. Marttunen MJ, Aro HM, Henriksson MM, Lönnqvist JK. Mental disorders in adolescent suicide: DSM-III-R Axes I and II diagnoses in suicides among13- to 19-year olds in Finland. Arch Gen Psychiatry 1991; 48(9):834-839.,3030. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.,3131. Sourander A, Klomek AB, Niemelä S, Haavisto A, Gyllenberg D, Helenius H, Sillanmäki L, Ristkari T, Kumpulainen K, Tamminen T, Moilanen I, Piha J, Almqvist F, Gould MS. Childhood Predictors of Completed and Severe Suicide Attempts. Arch Gen Psychiatry 2009; 66(4):398-406.,3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.,3434. Freuchen A, Kjelsberg E, Lundervold AJ, Grøholt B. Differences between children and adolescents who commit suicide and their peers: A psychological autopsy of suicide victims compared to accident victims and a community sample. Child Adolesc Psychiatry Ment Health 2012; 6(1):1-12..
Bauman et al.4444. Bauman AS, Toomey RB, Walker JL. Associations among bullying, Cyberbullying, and suicide in high school students. J Adolesc 2013; 36(2):341-350. em estudo transversal com 1.491 estudantes nos EUA encontraram que a depressão é um mediador significativo entre o bullying e a vitimização tradicional e as tentativas de suicídio, independente do sexo. Dentre aqueles que apresentaram depressão, 42% das meninas estiveram mais propensas a tentar suicídio enquanto que para os meninos o risco foi de 60%. Esse mesmo autor discorre que as ações de bullying são tentativas de humilhar publicamente a vítima, com o objetivo de prejudicar suas amizades e seu status social, fazendo com que a vítima se sinta melancólica, angustiada e sem suporte social. Existe ainda uma associação entre a insatisfação com a imagem corporal e as chances de ser mais vitimado ou de praticar o bullying3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182..
A fragilidade psicológica dessas crianças em aceitar/reconhecer suas próprias características físicas e as intensas mudanças que ocorrem nessa fase da vida, assim como em lidar com a diferença do outro, reforçam a necessidade de que os pais e os professores investiguem e reconheçam o sofrimento mental dessas crianças para o encaminhamento ao tratamento psicológico e psiquiátrico. Adicionalmente, há a urgência na criação de estratégias preventivas que trabalhem as habilidades pessoais e sociais das crianças para a manutenção de um ambiente escolar saudável55. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Situação Mundial da Infância. 2011. [acessado 2017 maio 1]. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowcr11web.pdf
https://www.unicef.org/brazil/pt/br_sowc... ,3535. Loh C, Tai BC, Ng, WY, Chia A, Chia BH. Suicide in Young Singaporeans aged 10-24 years between 2000 to 2004. Arch Suicide Res, 2012; 16(2):174-182..
Relações entre fatores sociais e suicídio na infância
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Estudos oriundos de autópsias psicológicas reportaram intensos conflitos familiares em um contexto de transição de lar e de cuidados entre os pais, assim como a mudança, a suspensão ou os problemas escolares. A separação dos pais também foi reportada, entretanto, a associação entre esse fato e suicídio foi mediada por fatores psicossociais77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500.,3030. Klomek AB, Sourander A, Niemela S, Kumpulainen K, Piha J, Tamminen T. Childhood bullying behaviors as a risk for suicide attempts and completed suicides: A population-based birth cohort study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2009; 48(3):254-261.. Portanto, tais situações sociais acarretaram em discussões e resultaram em eventos estressantes que culminaram no ato suicida como a única solução para esses problemas.
Numerosos estudos1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1818. Hoberman HM, Garfinkel BD. Completed suicide in children and adolescents. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988; 57(6):689-695.,1919. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.,2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500.,2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.,3838. Séguin M, Renaud J, Lesage A, Robert M, Turecki G. Youthand Young adult suicide: A study of life trajectory. J Psychiatry 2011; 45(7):863-870. mostraram a associação existente entre risco de suicídio e ausência de diálogo entre os pais, sobretudo a ausência de comunicação da mãe2828. Agritmis H, Yayci N, Colak B, Aksoy E. Suicidal deaths in childhood and adolescence. Forensic Sci Int 2004; 142(1):25-31.. Com efeito, a maioria das crianças foi exposta à negligência dos pais e teve um suporte social inadequado para lidar com os momentos difíceis3838. Séguin M, Renaud J, Lesage A, Robert M, Turecki G. Youthand Young adult suicide: A study of life trajectory. J Psychiatry 2011; 45(7):863-870.. Conflitos entre pais e filhos são mais comuns em crianças do que em adolescentes88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304..
A ausência ou as barreiras para uma comunicação efetiva entre os pais e as crianças reflete que o comportamento suicida das crianças permanece silencioso. As crianças que morrem por suicídio encontram-se sozinhas, isoladas e desamparadas2424. Windfuhr K. Suicide in juveniles and adolescents in the United Kingdom. J Child Psychol Psychiatry 2008; 49(11):1155-1165.,4242. Organização Mundial da Saúde (OMS). Prevenção do suicídio: Manual para professores e educadores. Brasília: OMS; 2000..
Adicionalmente, a presença de abuso físico, sexual e emocional esteve fortemente associado ao maior risco de suicídio na infância88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,1818. Hoberman HM, Garfinkel BD. Completed suicide in children and adolescents. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988; 57(6):689-695.
19. Grøholt B, Ekeberg Ø, Wichstrøm L, Haldorsen T. Suicide among children and younger and older adolescents in Norway: A comparative study. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1998; 37(5):473-481.-2020. Gould MS, Fisher P, Parides M, Flory M, Shaffer D. Psychosocial risk factors of child and adolescente completed suicide. Arch Gen Psychiatry 1996; 53(12):1155-1162.,2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500.,2323. Marttunen MJ, Aro HM, Henriksson MM, Lönnqvist JK. Mental disorders in adolescent suicide: DSM-III-R Axes I and II diagnoses in suicides among13- to 19-year olds in Finland. Arch Gen Psychiatry 1991; 48(9):834-839.,2626. Beautrais A. Child and Young adolescent suicide in New Zealand. Aust N Z J Psychiatry 2001; 35(5):647-653.,2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099.,3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206.. A presença de violência evidencia o ambiente hostil e as adversidades a que as crianças foram expostas, fazendo-as se sentirem um fardo, resultando em intenso sofrimento psíquico.
Estudo de Buffraerts et al.4545. Bruffaerts R, Demyttenaere K, Borges G, Haro JM, Chiu WT, Hwang I, Karam EG, Kessler RC, Sampson N, Alonso J, Andrade LH, Angermeyer M, Benjet C, Bromet E, de Girolamo G, de Graaf R, Florescu S, Gureje O, Horiguchi I, Hu C, Kovess V, Levinson D, Posada-Villa J, Sagar R, Scott K, Tsang A, Vassilev SM, Williams DR, Nock MK. Childhood adversities as risk factors for onset and persistence of suicidal behavior. Br J Psychiatry 2010; 197(1):20-27. em 21 países encontrou que as adversidades na infância estiveram mais associadas com a tentativa de suicídio nessa fase da vida do que na adolescência. Crianças entre 4 e 13 anos que sofreram abuso sexual tiveram 10 vezes mais chance de tentar o suicídio; esse risco diminuiu para 6 vezes em adolescentes entre 14 e 19 anos.
Pffeifer1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562. descreve que a exposição a situações estressantes na infância pode ampliar o sentimento de desesperança, implicando na percepção de que essas circunstâncias possuem pouca probabilidade de resolução. Juntamente com a imaturidade das habilidades para enfrentar os problemas das crianças, encontra-se a ausência de um suporte social adequado, fazendo-as sofrer em silêncio, sozinhas e sem amparo.
Estudos neurobiológicos apresentados por Dervic et al.1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291. encontraram também uma desregulação da serotonina em crianças que foram abusadas e negligenciadas por seus pais. Neste sentido, futuras investigações neurobiológicas podem aprofundar a interação entre as alterações séricas de serotonina, eventos estressantes na vida e comportamento suicida em crianças.
Relações entre transtornos mentais e suicídio na infância
Numerosas pesquisas mostram que transtornos mentais estão fortemente relacionados com suicídio em crianças. Metade das crianças tinha o diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), um terço apresentou transtorno de personalidade antissocial, depressão e em menor proporção problemas com álcool44. Weller EB, Young KM, Rohrbaugh, AH, Weller RA. Overview and assessment of the suicidal child. Depress Anxiety 2001; 14(3):157-163.,77. Freuchen AF, Kjelsberg EE, Grøholt BG. Suicide or accident? A psychological autopsy study of suicide in youth sunder the age of 16 compared to deaths labeled as accidents. Child Adolesc Psychiatry Ment Health, 2012; 6(1):1-12.,1212. Grøholt B, Ekeberg Ø. Suicide in Young people under 15 years: Problems of classification. Nord J Psychiatry, 2003; 57(6):411-417.,2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500.
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No que tange ao acompanhamento de serviço de saúde mental, uma minoria estava em contato com estes e apenas uma pequena parcela recebeu tratamento psiquiátrico no ano que antecedeu o suicídio. Cerca de 85% não estavam em tratamento psiquiátrico no mês anterior ao suicídio2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500..
Beautrais2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099. destaca que as crianças do sexo feminino tiveram mais contato com os serviços de saúde do que os homens. O estudo de Freuchen et al.3434. Freuchen A, Kjelsberg E, Lundervold AJ, Grøholt B. Differences between children and adolescents who commit suicide and their peers: A psychological autopsy of suicide victims compared to accident victims and a community sample. Child Adolesc Psychiatry Ment Health 2012; 6(1):1-12. foi o único a apontar que 17% das crianças que morreram por suicídio receberam algum tipo de serviço psicológico e psiquiátrico na escola. O risco de suicídio é maior em crianças com algum transtorno mental do que entre aquelas que não possuem diagnóstico psiquiátrico.
Vários pesquisadores mostraram associação entre traços de personalidade e risco de suicídio2020. Gould MS, Fisher P, Parides M, Flory M, Shaffer D. Psychosocial risk factors of child and adolescente completed suicide. Arch Gen Psychiatry 1996; 53(12):1155-1162.,2727. Beautrais AL. Suicide and serious attempts in youth: A multiple-group comparison study. Am J Psychiatry 2003; 160(6):1093-1099.
28. Agritmis H, Yayci N, Colak B, Aksoy E. Suicidal deaths in childhood and adolescence. Forensic Sci Int 2004; 142(1):25-31.-2929. Weinberger LE, Sreenivasan S, Sathyavagiswaran L, Markowitz E. Child and adolescent suicide in a large, urban area: Psychological, demographic and situational factors. J Forensic Sci 2001; 46(4):902-907.,3939. Crepeau-Hobson F. The psychological autopsy and determination of child suicides: A survey of medical examiners. Archivesof Suicide Research 2010; 14(1):24-34.. Hoberman e Garfinkel1818. Hoberman HM, Garfinkel BD. Completed suicide in children and adolescents. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988; 57(6):689-695. descrevem que as crianças eram mais propensas a serem raivosas, nervosas, ansiosas e impulsivas antes do ato fatal.
Estudo recente conduzido por Freuchen e Grøholt3333. Freuchen A, Grøholt B. Characteristics of suicide notes of children and Young adolescents: An examination of the notes from suicide victims 15 years and younger. Clin Child Psychol Psychiatry 2015; 20(2):194-206. mostrou que as crianças que morreram por suicídio eram mais sensíveis, preocupadas e impulsivas em comparação com aquelas que morreram por mortes acidentais. Revisão sistemática apontou que serem extremamente inteligentes, desconfiadas, raivosas, sensíveis à críticas e isolamento social foram características marcantes em crianças que morreram por suicídio88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304..
Diferentemente de outras faixas etárias, a impulsividade foi associada ao risco de suicídio em crianças88. Soole R, Kolves K, De Leo D. Suicide in Children: A Systematic Review. Arch Suicide Res 2015; 19(3):285-304.,1313. Pfeffer CR. Childhood suicidal behaviour: A developmental perspective. Psychiatr Clin North Am 1997; 20(3):551-562.,1414. Dervic K, Brent DA, Oquendo MA. Completed suicide in childhood. Psychiatr Clin North Am 2008; 31(2):271-291.,2222. Brent DA, Perper J, Moritz G, Baugher M, Allman C. Suicide in adolescents with no apparent psychopathology. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1993; 32(3):494-500.. Na infância, as ações são frequentemente precipitadas, por essa razão, encontra-se a tentativa de suicídio mais frequente após eventos estressantes.
Entende-se, assim, que apesar de nem todos os jovens com transtornos psiquiátricos pensarem em suicídio, aqueles que apresentaram comportamento suicida indicavam em sua maioria esse fator predisponente.
Considerações finais
Sobre o acervo estudado, ressalta-se: (1) São fatores predisponentes para o suicídio na infância: problemas escolares, dentre os quais se destacam o bullying e o rendimento ruim; histórico de violência física e sexual e conflitos familiares, em que as tensões e a rigidez das relações são barreiras para a comunicação e um relacionamento harmonioso entre pais e filho, e a morte de parente ou pessoa próxima por suicídio. Portanto, é de suma importância conversar com as crianças sobre suicídio; (2) Metade das crianças apresentaram algum tipo de transtorno mental, especificamente, Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), transtorno de personalidade antissocial e depressão. Nesse sentido, reconhece-se a intrínseca relação entre transtornos mentais e suicídio em crianças. (3) Apesar da imaturidade cognitiva, as crianças têm capacidade e compreensão do ato suicida; (4) As crianças dão menos pistas verbais do seu desejo de morrer e são mais impulsivas na tentativa de suicídio; (5) Nos meses que antecedem o suicídio, ocorrem mudanças de comportamento e de atitude, as crianças apresentam falta de interesse em atividades prazerosas, abstenção da escola e isolamento social (6) As crianças que morreram por suicídio não possuíam estratégias de enfrentamento de situações de estresse.
Dentre as limitações deste artigo podem ser citadas: a bibliografia estudada se restringiu às bases de dados indicadas no método de revisão; escassez da bibliografia brasileira sobre suicídio em crianças menores de 10 anos, o que impede que sejam feitas generalizações dos dados, uma vez que as informações apresentadas dizem respeito à realidade de outras sociedades e de outras faixas etárias.
A literatura ressalta a grande existência desse fenômeno, muitas vezes desconhecido na faixa etária estudada, e que é possível prevenir o suicídio na infância. Portanto, é extremamente necessário o reconhecimento do sofrimento psíquico e do comportamento suicida na infância para que essas crianças possam ter tratamento psiquiátrico adequado. Devem ser desenvolvidos protocolos visando o reconhecimento precoce do comportamento suicida. Os profissionais de saúde e os professores devem ser capacitados para que sejam capazes de ajudar as crianças com sinais que predispõem o risco para o suicídio.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Set 2017
Histórico
- Recebido
15 Fev 2017 - Aceito
18 Abr 2017 - Revisado
13 Jun 2017