Políticas de Saúde de adolescentes e jovens no contexto luso-brasileiro: especificidades e aproximações

Rafaela Schaefer Rosangela Barbiani Carlise Rigon Dalla Nora Karin Viegas Sandra Maria Cezar Leal Priscila Schmidt Lora Rosane Ciconet Vania Dezoti Micheletti Sobre os autores

Resumo

O objetivo deste artigo é caracterizar a produção científica sobre políticas e programas de saúde de adolescentes no Brasil e em Portugal no período 2010-2017. Estudo de revisão da literatura, baseado no método de “Scoping Review”. A questão de investigação: como se caracteriza a produção científica sobre políticas e programas de saúde de adolescentes do Brasil e de Portugal? As buscas foram realizadas no mês de outubro de 2017, nas plataformas BVS, EBSCO e Google Acadêmico. Foram selecionados 22 estudos, 17 brasileiros e 5 portugueses. Foram identificadas sete categorias temáticas transversais: avaliação de políticas e programas; promoção e educação para a saúde; saúde mental; saúde sexual e reprodutiva; violência; saúde bucal e saúde nutricional. Conclui-se que, embora em contextos sociais distintos, as temáticas refletem áreas tradicionais de intervenção das políticas e programas, com exceção daquelas decorrentes do fenômeno da violência estrutural, marcadamente presente na realidade brasileira. Ainda, ausência de temáticas emergentes como identidades de gênero, fluxos migratórios e morbimortalidade por causas externas, revelando possível vazio assistencial das políticas e programas e um campo necessário a ser explorado.

Adolescente; Saúde do adolescente; Políticas públicas; Programas nacionais de saúde; Atenção integral à saúde

Introdução

Este estudo tem como objetivo caracterizar a produção científica sobre políticas e programas de saúde de adolescentes no Brasil e em Portugal. Em um contexto globalizado e multicultural, onde convergem e circulam múltiplas identidades e formas de conceber as fases da adolescência e juventude, optou-se para este trabalho seguir as classificações adotadas pela Organização Pan Americana da Saúde11. Organização Pan-Americana da Saúde (PAHO), Organização Mundial da Saúde (OMS). Plano de Ação para Prevenção da Obesidade em Crianças e Adolescentes. Washington: PAHO; 2014. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.paho.org/bra/images/stories/UTFGCV/planofactionchildobesity-por.pdf?ua=1
http://www.paho.org/bra/images/stories/U...
e Organização Mundial da Saúde22. World Health Organization (WHO). Adolescent Friendly Health Services: an agenda for change. Geneva: WHO; 2002. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.who.int/maternal_child_adolescent/documents/fch_cah_02_14/en
http://www.who.int/maternal_child_adoles...
. Segundo esses organismos, a adolescência e juventude se diferenciam pelas suas especificidades fisiológicas, psicológicas e sociológicas. Sendo assim, a adolescência constitui um processo fundamentalmente biológico durante o qual se acelera o desenvolvimento cognitivo e a estruturação da personalidade. Está dividida em duas etapas de pré-adolescência (de 10 a 14 anos) e de adolescência propriamente dita (de 15 a 19 anos). A juventude é concebida enquanto categoria sociológica, que indica o processo de preparação para o indivíduo assumir o papel de adulto na sociedade, tanto no plano familiar quanto no profissional, estendendo-se dos 15 aos 24 anos.

Em que pese as diversidades geracionais e culturais e, ainda, os marcos legais demarcadores da adolescência e juventude entre Brasil e Portugal, o foco deste estudo está voltado para os sistemas de saúde, especialmente aos arranjos político-institucionais estruturados sob forma de políticas públicas e programas ofertados a essa população, considerando suas necessidades de saúde. Desse universo destacam-se, no Brasil, o Programa Saúde na Escola, desde 200733. Brasil. Decreto nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007. Institui o Programa Saúde na Escola – PSE e dá outras previdências. Diário Oficial da União; 5 dez. e as Diretrizes Nacionais para a Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde44. Brasil. Estatuto da Criança e do Adolescente e legislação pertinente [compilação de Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude]. Porto Alegre: Ministério Público do Rio Grande do Sul, Procuradoria Geral de Justiça; 2010., implantadas em 2010, que embasam inúmeros dispositivos legais e normativos propulsores de políticas e programas para esse segmento55. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Diretrizes Nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde. Brasília: MS; 2010.

6. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde Integral de Adolescentes e Jovens. Orientações para a organização de serviços de saúde. Brasília: MS; 2007.
-77. Brasil. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude – SINAJUVE. Diário Oficial da União 2013; 5 ago.. Portugal possui o Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil (PNSIJ)88. Portugal. Direção-Geral da Saúde. Norma nº 010/2013 de 31/05/2013. Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil. 2013 [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/normas-e-circulares-normativas/norma-n-0102013-de-31052013.aspx
https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/no...
, recentemente atualizado, e ainda o Instituto Português do Desporto e Juventude que mantém o Centro de Conhecimento da Juventude, projeto que reúne virtualmente uma rede de informações e conhecimentos voltados ao público juvenil99. Portugal. Norma da Direção-Geral da Saúde nº010/2013. Saúde Infantil e Juvenil: Programa Nacional. Direção-Geral da Saúde; 2013.. A exemplo do Brasil, Portugal desenvolve o Programa Nacional de Saúde Escolar desde 20091010. Portugal. Lei nº 60 de 6 de agosto de 2009. Programa Nacional de Saúde Escolar - Saúde Sexual e Reprodutiva - Educação Sexual em Meio Escolar. Direção-Geral de Saúde; 2009..

A análise dos resultados da pesquisa à luz dos marcos programáticos de cada país embasou-se na perspectiva teórica de Giovanella et al.1111. Giovanella L, Lobato LVC, Noronha JC, Carvalho AI. Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012. na qual o conceito de política pública está associado a um processo civilizatório de justiça social e ao papel do Estado em ação, isto é, do processo de construção de uma ação governamental para um setor, o que envolve recursos, atores, arenas, ideias e negociação.

Parte-se do pressuposto de que os determinantes sociais da saúde conformam demandas, necessidades e respostas diferenciadas dos sistemas de proteção social, o que incide diretamente no escopo e no alcance das políticas públicas setoriais. Em outras palavras, a sociedade de classes e as disparidades sociais, políticas, étnicas, raciais, migratórias e de gênero determinam fortemente a distribuição de recursos, o acesso às oportunidades e, portanto, as condições de saúde de uma dada população.

Nesse sentido, as realidades dos dois países estabelecem fronteiras muito distintas. Por outro lado, o elemento comum que dá suporte à perspectiva comparada proposta é o conceito estruturante da política pública que tem, no seio de sua constituição, o papel de universalizar direitos humanos, nesse caso, viabilizando mecanismos ampliados de garantia dos direitos de adolescentes e jovens.

Método

Trata-se de um estudo de revisão da literatura, baseado no método de Scoping Review1212. Arksey H, O’Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. International J Soc Res Methodol 2007; 8(1):19-32.,1313. Levac D, Colquhoun H, O’Brien KK. Scoping studies: advancing the methodology. Implement Sci 2010; 5:69.. Esse é um tipo de método utilizado quando o objetivo é mapear produções relevantes no campo de interesse, onde diferentes desenhos de estudo são úteis. A Scoping Review propõe a realização de cinco passos, mais um sexto considerado opcional, quais sejam: (1) identificação da questão de pesquisa; (2) identificação de estudos relevantes; (3) seleção dos estudos; (4) extração de dados; (5) sumarização e relato de resultados; e (6) apresentação dos resultados para validação da investigação.

A questão de investigação deste estudo foi: “Como se caracteriza a produção científica acadêmica sobre políticas e programas de saúde de adolescentes do Brasil e de Portugal?” A estratégia de busca considerou trabalhos empíricos e teóricos, incluindo teses, dissertações, editoriais e literatura cinzenta. O período estabelecido considerou as publicações de 2010 a 2017. Elegeu-se esse marco temporal em virtude do período de implantação das políticas nacionais de saúde voltadas a esse segmento populacional, sendo no Brasil 2010 e em Portugal 2013.

As fontes de dados verificadas foram Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), Ibecs (Índice Bibliográfico Espanhol de Ciências da Saúde), Medline (Medical Literature Analysis and Retrieval System Online), Biblioteca Cochrane, Scielo (Scientific Electronic Library Online), Adolec Brasil (Base de Dados de Adolescentes), EBSCO e a ferramenta Google Scholar. Os Descritores em Ciências da Saúde (Decs) e Medical Subject Headings (Mesh) utilizados foram: adolescente; saúde do adolescente; política de saúde; políticas públicas; programas nacionais de saúde; programa de saúde do adolescente; atenção integral à saúde da criança e do adolescente; serviços de saúde do adolescente.

Um filtro para identificar estudos realizados nos dois países de interesse, Brasil e Portugal, foi ativado. Além disso, para auxiliar na seleção dos estudos foi estabelecido como critério de inclusão a necessidade de versar sobre alguma política ou programa de saúde de adolescentes, sendo, então, excluídos aqueles que não estabeleciam um link entre seus resultados/discussão e alguma política ou programa de saúde de adolescentes.

As buscas foram realizadas durante o mês de outubro de 2017, por duas pesquisadoras, de forma independente. Em fase posterior, os resultados de cada busca foram comparados e as discordâncias foram resolvidas por consenso. Em outros termos: os pesquisadores confrontaram os resultados das buscas realizadas, verificando as diferenças dos achados, sempre visando incluir o maior número de estudos possível. A Figura 1 exibe o processo de busca, de exclusão e de seleção dos estudos encontrados.

Figura 1
Seleção dos estudos

Para a etapa da extração dos dados foi utilizado um instrumento estruturado no Excel, que identificou e descreveu itens como ano de publicação, autoria, país, sujeitos de pesquisa, tipo de estudo e temática abordada. Esse instrumento permitiu a síntese, a interpretação dos dados e a análise numérica básica da extensão, da natureza e da distribuição dos estudos incorporados na revisão. Depois, foi realizada a compilação e a comunicação dos resultados, com a intenção de apresentar a visão geral de todo o material, através de uma construção temática, organizada de acordo com a natureza dos estudos. Os resultados foram, por fim, partilhados com colegas do grupo de investigação para, através de um processo simples e subjetivo, verificar se eram representativos das realidades investigadas.

Resultados

Foram selecionados 22 estudos, publicados entre os anos de 2010 e 2017, analisados segundo informações de ano de publicação, autoria, país, sujeitos, método e temática (Quadro 1).

Quadro 1
Mapeamento da literatura publicada entre 2010 e 2017 na área de políticas e programas de saúde de adolescentes no Brasil e em Portugal selecionada para análise – Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

A análise numérica mostra que a maioria dos estudos selecionados versava sobre o contexto de políticas e programas de saúde de adolescentes brasileiros (n = 17), a partir de uma análise teórica (n = 12), principalmente os de revisão da literatura (n = 5), ensaios teóricos (n = 4) e análise documental (n = 3). Dentre os 5 estudos de natureza empírica realizados no Brasil, 4 eram de raiz qualitativa.

Dos 5 estudos acerca de políticas e programas de saúde de adolescentes realizados em Portugal, 3 eram empíricos, envolvendo desenho metodológico misto – quantitativo e qualitativo, retrospectivo e Delphi. Dos estudos teóricos (n = 2), um realizou análise documental e o outro um ensaio teórico. Não foi encontrado nenhum estudo de revisão de literatura acerca desta temática em Portugal.

O maior número de estudos foi publicado no ano de 2013, tanto no Brasil (n = 4), quanto em Portugal (n = 2). Com relação ao idioma, a maioria dos estudos foi publicado em português (n = 19). Houve ainda 2 estudos publicados em inglês e um em espanhol. Os participantes dos estudos empíricos analisados foram adolescentes, membros do governo, da sociedade civil, especialistas, professores e gestores.

A partir da leitura e da análise dos estudos foi possível identificar diferentes categorias temáticas transversais ao campo objetal políticas e programas de saúde de adolescentes no Brasil e em Portugal. A Tabela 1 mostra a classificação dos estudos e o n para cada país.

Tabela 1
Categorias temáticas transversais identificadas a partir da análise da literatura selecionada na área de políticas e programas de saúde de adolescentes no Brasil e em Portugal – Porto Alegre, RS, Brasil, 2017.

Avaliação de políticas e programas

Os estudos se propõem a discutir sobre as propostas, as ações e a própria eficácia de determinadas políticas e programas. No Brasil, todos os estudos abordam políticas de saúde, desde a sua construção, até a efetividade da sua implementação. De modo geral, enfatizam a importância de considerar o adolescente não apenas como um gerador de problemas, mas como um sujeito com potencial para contribuir com o desenvolvimento do país1414. Horta NC, Sena RR. Abordagem ao adolescente e ao jovem nas políticas públicas de saúde no Brasil: um estudo de revisão. Physis 2010; 20(2):475-495.. Nesse contexto, afirmam que considerar as dimensões social, cultural e coletiva das realidades em que esses adolescentes estão inseridos1818. Cavalcanti PB, Dantas ACS, Carvalho RN. Contornos e sinergias entre a política de Saúde e o adolescente privado de liberdade: intersetorialidade como desafio. Textos & Contextos 2011; 10(2):399-410. e considerar a participação e a corresponsabilização deles2020. Lopez SB, Moreira MCN. Quando uma proposição não se converte em política? O caso da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens - PNAISAJ. Cien Saude Colet 2013; 18(4):1179-1186. pode resultar em políticas mais inclusivas e eficazes2121. Lopez SB, Moreira MCN. Políticas Nacionais de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens e à Saúde do Homem: interlocuções políticas e masculinidade. Cien Saude Colet 2013; 18(3):743-752..

Estudo de Portugal faz a avaliação de um programa específico, direcionado aos adolescentes com alterações de comportamento, descrevendo, portanto, uma perspectiva mais focalizada. Entretanto, da mesma forma que os estudos brasileiros, se preocupou em considerar a potencialidade dos adolescentes e as especificidades do contexto de vida, ancorados em um processo de coconstrução e de criação de redes3333. Patrão IAM, Rita JS. Intervenção Multifamiliar com Adolescentes com Alterações de Comportamento: Proposta de um Programa de Intervenção. Psychology, Community & Health 2013; 2(3):334-345,.

Promoção e educação para a saúde

A categoria de promoção e educação para a saúde está centrada, principalmente, em aspectos das políticas de saúde escolar, em ambos os países. O ambiente escolar é descrito como um espaço estratégico para o desenvolvimento e a implementação de práticas promotoras de saúde, uma vez que a escola tem papel fundamental na construção de valores e no próprio desenvolvimento da cidadania desses adolescentes2626. Oliveira LB, Schoeninger D, Pressi P, Raulino C, Paravisi AP, Nothaft S. Programa saúde na escola: uma possibilidade de atuação do enfermeiro na promoção da saúde dos escolares. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research 2015; 11(3):190-191.. Os temas abordados estão relacionados, principalmente, com a saúde física e mental, o estilo de vida, o ambiente e a educação/saúde sexual e reprodutiva3434. Riso B. A construção da escola como lugar de saúde: contributo para uma reflexão sobre as políticas de saúde escolar na sociedade portuguesa contemporânea. Educação, Sociedade & Culturas 2013; 38:77-97..

Discutem, ainda, o espaço das atividades extracurriculares no auxílio ao desenvolvimento e à promoção da saúde dos adolescentes. O período extraclasse, quando vivenciado por adolescentes não assistidos, pode predispor ao aumento da vulnerabilidade no que se refere ao contato com situações de trabalho infantil, aliciamento para o tráfico de drogas e/ou vitimização pela violência direta. Com a mesma percepção de espaço estratégico para o desenvolvimento de uma formação integral para a vida, os espaços extracurriculares podem representar oportunidades para a promoção e a educação para a saúde1515. Matias NCF. A importância de políticas públicas além da escola formal para o desenvolvimento infantil e adolescente: Uma revisão de literatura. Interação em Psicologia 2010; 14(1):93-102..

Fora do espaço escolar, as atividades de promoção e educação para a saúde são entendidas como estratégicas para a saúde e o bem estar individual, grupal e social. As atividades prioritárias, segundo adolescentes, família, escola e sociedade perpassam a aprendizagem de estilos de vida saudáveis, de civismo e responsabilidades, escuta e diálogo, bem como a participação social3232. Matos MG, Santos T, Gaspar T. Promoção da saúde nos adolescentes portugueses: orientações técnicas e políticas para uma intervenção – Exercício Delphi. Journal of Child and Adolescent Psychology 2012; 3(1):137-155..

Saúde mental

A categoria de saúde mental foi relacionada ao contexto social em que vivem os adolescentes, principalmente no Brasil. A preocupação atrelada ao uso de drogas e outras substâncias, com a crescente medicalização da vida, expõe soluções de caráter punitivo e institucionalizante, reforçando a importância das políticas públicas, com vistas a frear os excessos desse processo e fortalecer o papel dos órgãos de saúde2929. Assis DAD, Silva AA, Torres T. Políticas de saúde mental, álcool e outras drogas e de criança e adolescente no Legislativo. Saúde em Debate 2017; 41(112):255-272.. Quanto piores as condições sociais, maior o número de intercorrências e internações psiquiátricas reportadas, desafiando as políticas públicas a apresentar a melhor maneira de intervir com esses adolescentes, observando suas particularidades e superando a pequena disponibilidade de recursos3030. Januário SS, Neves Peixoto FS, Lima NN, Nascimento VB, Sousa DF, Pereira Luz DC, Silva CG, Rolim Neto ML. Mental health and public policies implemented in the Northeast of Brazil: a systematic review with meta-analysis. Int J Soc Psychiatry 2017; 63(1):21-32..

Os transtornos emocionais e do comportamento são abordados de forma frequente na literatura acerca da saúde de adolescentes1919. Santos DCM, Jorge MSB, Freitas CHA, Queiroz MVO. Adolescentes em sofrimentopsíquico e a política de saúde mental infanto-juvenil. Acta Paul Enferm 2011; 24(6):845-850.. Esse é um período de extensas e profundas transformações, não somente a nível físico, mas também a nível psicológico. O programa para desenvolvimento de competências sociais vem responder a esse desafio. Com foco na assertividade, autocontrole, cooperação e empatia, propõe, através de quatro eixos centrais – comunicação, comportamento assertivo, cooperação e autocontrole emocional, contribuir para o autoconhecimento dos adolescentes, para o estabelecimento de relações interpessoais positivas e para a valorização pessoal3535. Loureiro C, Santos MR, Frederico-Ferreira M. Conceção do programa de intervenção em enfermagem ‘Melhorar competências com os outros’. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2015; (Ed. Esp. 2):27-32..

Saúde sexual e reprodutiva

Os estudos abordam questões relacionadas com o papel do Estado acerca de ações educativas e promotoras da saúde integral de adolescentes, a partir das realidades evidenciadas, respondendo às necessidades dessa população. A realidade brasileira, marcada pela insuficiência de recursos básicos, expõe os adolescentes às vulnerabilidades ligadas, principalmente, aos aspectos sociais, de sexualidade, de situação psicoemocional e violência. A gravidez na adolescência aparece, nessa realidade, como um problema de saúde pública, carente de políticas públicas que contemplem o adolescente em sua plenitude, principalmente acerca da complexidade da maternidade nessa fase da vida2525. Lima CC, Souza ACL, Rotella C, Silva DM, Santos D, Assunção DS, Maximino T, Castro VM, Luca Neto VN, Nascimento Neto WG. Políticas de atenção ao adolescente nos trilhos da ciência para uma atenção integral ao adolescente e jovem brasileiro. Pediatria Moderna 2015; 51(4):127-131..

A adolescente, ao engravidar, é obrigada a amadurecer, ao mesmo tempo em que vivencia intenso preconceito relacionado com as dúvidas acerca da sua capacidade materna2525. Lima CC, Souza ACL, Rotella C, Silva DM, Santos D, Assunção DS, Maximino T, Castro VM, Luca Neto VN, Nascimento Neto WG. Políticas de atenção ao adolescente nos trilhos da ciência para uma atenção integral ao adolescente e jovem brasileiro. Pediatria Moderna 2015; 51(4):127-131.. Não obstante, Duarte2222. Duarte JB. La relevancia del conocimiento de las representaciones sociales de los adolescentes varones acerca de la paternidad en la adolescencia para el desarrollo de políticas públicas relevance of awareness of social. Subjetividad y Procesos Cognitivos 2013; 17(2):17-36. demonstra a falta de políticas públicas voltadas à orientação e apoio do adolescente masculino no exercício da paternidade. A gravidez na sociedade brasileira ainda é predominantemente interpretada e relacionada às mulheres, deixando o pai adolescente esquecido e sobre-responsabilizando a mãe.

Por outro lado, o estudo de Carvalho e Figueiredo3131. Carvalho LM, Figueiredo CC. Configurações de conhecimento e política na regulação da educação sexual em meio escolar. Educação, Sociedade & Culturas 2011; (34):67-88. discutem aspectos educacionais da saúde sexual e reprodutiva, questionando o papel do Estado, da família e da sociedade nesse processo. De modo geral, sustentam o papel do Estado como promotor de uma educação em condições de igualdade e equidade, a partir do protagonismo da escola, como instituição socializadora e formadora de valores. A crítica está na percepção do direito e dever parental de educação, principalmente relacionado com o tema controverso da educação sexual e reprodutiva, reduzindo a interferência do Estado nas orientações educativas das escolas, configurando estas como espaço, fundamentalmente, de instrução.

Violência

A violência é caracterizada como uma violação de direitos fundamentais, que afeta de forma desigual regiões e populações de acordo com as características de classe social, gênero, raça, cor e ciclo etário. Os três estudos incluídos nessa categoria foram realizados no Brasil, não sendo identificado nenhum estudo acerca dessa temática em Portugal1717. Cruz LR, Welzbacher AI, Freitas CLS, Costa LXS, Lorini RA. Medidas socioeducativas em meio aberto no município de Santa Cruz do Sul/RS: entre as diretrizes legais e as políticas sociais públicas. Pesquisas e Práticas Psicossociais 2010: 5(1):112-119.,2323. Fonseca FF, Sena RKR, Santos RLA, Dias VD, Costa SM. As vulnerabilidades na infância e adolescência e as políticas públicas brasileiras de intervenção. Rev. Paul. Pediatr. 2013; 31(2):258-264.,2727. Barbiani R. Violação de direitos de crianças e adolescentes no Brasil: interfaces com a política de saúde. Saúde Debate 2016; 40(109):200-211..

Baseado em um modelo econômico excludente e formado por uma população jovem, o Brasil vivencia significativos níveis de violência de diferentes naturezas, principalmente entre a população adolescente. Nesse contexto, as críticas ao Estado na forma como vem desenvolvendo e gerindo suas políticas públicas, bem como na falta de análise dessas políticas e planos públicos, com vistas a monitorar a efetividade de seus métodos e resultados, se caracterizam como tema prioritário de investigação2727. Barbiani R. Violação de direitos de crianças e adolescentes no Brasil: interfaces com a política de saúde. Saúde Debate 2016; 40(109):200-211.. Na mesma linha, Fonseca et al.2323. Fonseca FF, Sena RKR, Santos RLA, Dias VD, Costa SM. As vulnerabilidades na infância e adolescência e as políticas públicas brasileiras de intervenção. Rev. Paul. Pediatr. 2013; 31(2):258-264. versam sobre os elevados índices de violação dos direitos dos adolescentes, na forma de abandono, trabalho precoce, exploração sexual e violência cotidiana, que toma lugar no contexto familiar e escolar, fortemente atrelados às questões econômicas e sociais. Os desafios abordam desde a orientação dos pais até a criação de abrigos e programas comunitários, além do investimento em pesquisas e articulações de novas propostas de intervenção.

Os adolescentes, vítimas de situações de violência, negligência e abandono, na maioria das vezes, não encontram no Estado uma rede de proteção capaz de responder às suas necessidades e contrapor sua situação de vulnerabilidade social. Muitos desses adolescentes acabam por adentrar no universo dos conflitos com a lei e ser encaminhados ao cumprimento de medidas socioeducativas. Nesse contexto, o foco deveria ser para políticas públicas capazes de auxiliar o adolescente na superação da sua condição de exclusão, como foco na reinserção social, a partir de atividades educativas e profissionalizantes. O que se observa, entretanto, é a predominância de medidas punitivas, organizadas por políticas sociais precárias, com ação em rede incipiente, demonstrando a necessidade de avançar em relação à situação dos adolescentes no cumprimento de medidas socioeducativas1717. Cruz LR, Welzbacher AI, Freitas CLS, Costa LXS, Lorini RA. Medidas socioeducativas em meio aberto no município de Santa Cruz do Sul/RS: entre as diretrizes legais e as políticas sociais públicas. Pesquisas e Práticas Psicossociais 2010: 5(1):112-119..

Saúde bucal

Os estudos discutem ações educativas que superem a lógica da comunicação unidirecional, dogmática e autoritária, na promoção da saúde bucal. Segundo Silva et al.2828. Silva GG, Carcereri DL, Amante CJ. Estudo qualitativo sobre um programa de educação em saúde bucal. Cad. Saúde Colet. 2017; 25(1):7-13., uma educação reflexiva e crítica, que problematize os temas de saúde bucal, considerando a complexidade dos determinantes sociais pode, mais do que estimular o autocuidado, contribuir para o desenvolvimento de uma consciência crítica, autônoma e emancipatória do adolescente. Nessa linha, o estudo de Celeste1616. Celeste RK, Nadanovsky P. How much of the income inequality effect can be explained by public policy? Evidence from oral health in Brazil. Health Policy 2010; 97(2-3):250-258. vem ressaltar a importância do papel das políticas públicas na prevenção dos problemas de saúde bucal.

Saúde nutricional

O estudo de Freitas et al.2424. Freitas LKP, Cunha Junior AT, Knackfuss MI, Medeiros HJ. Obesidade em adolescentes e as políticas públicas de nutrição. Cien Saude Colet 2014; 19(6):1755-1762. vem discutir a problemática relacionada à crescente prevalência de sobrepeso e obesidade em adolescentes, ressaltando a necessidade de criação de políticas públicas e programas de promoção da saúde, visando instituir hábitos alimentares saudáveis e a prática regular de atividade física. Essa temática assume protagonismo em uma realidade até pouco tempo marcada pela fome e pela subnutrição, como é o caso do Brasil, demandando, atualmente, programas educacionais acerca dos valores nutricionais dos alimentos e da importância de prevenir o sobrepeso e a obesidade, no contexto das doenças crônicas não transmissíveis e das suas consequências.

Discussão

Apesar da predominância dos artigos teóricos sobre aspectos transversais às políticas de saúde, é relevante e pertinente a produção de estudos avaliativos, sobretudo daqueles baseados em estudos documentais. Desse conjunto, destaca-se um aspecto fundamental, em geral subtraído dos processos decisórios e de gestão, qual seja, a participação dos sujeitos envolvidos. O fato de adolescentes e jovens não terem a maioridade civil e ou a plena autonomia não os desqualifica à participação, ao contrário, deve ser condição ao planejamento exitoso das ações, servindo, ainda, como exercício e aprendizagem da cidadania. Em 2017, o Conselho Nacional de Direitos da Criança e Adolescente emitiu resolução a ser cumprida em todo o território nacional, no âmbito dos Conselhos Estaduais e Municipais, sobre a participação efetiva de adolescentes e jovens em seus colegiados e plenárias3636. Brasil. Resolução nº 191, de 7 de junho de 2017. Dispõe sobre a participação de adolescentes no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA. Diário Oficial da União 2017; 7 jun.. Em Portugal, o Instituto Português do Desporto e Juventude atualmente está por aprovar o Plano Nacional de Juventude, com consulta aberta para sugestões da população juvenil3737. Portugal. Direção-Geral da Educação. Questionário: Plano Nacional da Juventude. Lisboa: Direção-Geral da Educação; 2017..

Uma diferença evidente entre os países foi o âmbito sobre o qual a política foi avaliada. Considerando as dimensões continentais do Brasil e, sobretudo, a desigualdade social incidente sobre os determinantes sociais da saúde, os estudos abordaram macropolíticas na ótica da intersetorialidade e da equidade de recursos e de atendimento, enquanto que em Portugal o único estudo versa sobre um programa focalizado. Não há estudos discutindo ou revisando as políticas públicas de adolescentes em Portugal.

Quanto às temáticas transversais prevalentes nos estudos, observou-se distribuição paritária entre os eixos que respondem às maiores demandas dos decisores e formuladores de políticas para a adolescência e juventude: saúde sexual e reprodutiva, saúde mental e violência, assim como a presença de estudos abordando serviços oferecidos a essa população, como a saúde bucal e nutricional. Essas demandas e temáticas têm uma abordagem específica – a educação em saúde, e um lócus privilegiado de intervenção – a escola. Diferentemente dos demais ciclos vitais, onde inclui-se a infância, a promoção da saúde e a prevenção de agravos na população adolescente, conforme demonstram os estudos, é compartilhada, quando não terceirizada, à educação e a seus agentes. Não obstante a importância da articulação das políticas da saúde e educação e da centralidade da escola, a responsabilidade clínica e sanitária da população é da rede de saúde, em todos seus níveis de atenção, ressaltando-se, portanto, a importância das ações da atenção primária à saúde, no território e junto às unidades e equipes de saúde.

Nesse contexto, interpreta-se a presença de estudos brasileiros abordando a saúde bucal e a saúde nutricional de adolescentes e jovens. A saúde bucal obteve uma importante inflexão junto aos territórios, a partir de sua inserção nas Equipes de Saúde da Família3838. Brasil. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Estabelece a revisão de diretrizes da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União; 21 set.. Igualmente pautas específicas da realidade brasileira influenciaram a produção de artigos tematizando a violência e a saúde mental. A primeira assume contornos cada vez mais alarmantes. No Brasil, a morte violenta de jovens cresce em marcha acelerada desde os anos 1980. Segundo Cerqueira3939. Cerqueira DRC. Mapa dos Homicídios Ocultos no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA; 2013. (Texto para Discussão, nº 1848)., o custo de bem-estar associado à violência letal que acomete a juventude alcança 1,5% do PIB a cada ano. A morbimortalidade se agudiza na associação com outros fatores como baixa escolaridade, evasão escolar, inserção precária no mundo do trabalho, consumo abusivo de álcool e outras drogas, exposição à violência e acidentes, prática sexual desprotegida, em geral expondo um quadro de iniquidades decorrentes das desigualdades de renda, raça/etnia, gênero, orientação sexual, identidade de gênero e territorialidade. O problema é ainda mais grave e emergencial quando consideramos a diminuição substancial na proporção de jovens na população em geral.

Tal cenário aponta que os adolescentes e jovens de 10-24 anos representam 29% da população mundial, e destes, 80% vivem em países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil4040. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Núcleo de Atenção Integral à Saúde do Adolescente (NASAD). 2008. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.saude.df.gov.br/sobre-a-secretaria/subsecretarias/463-nucleo-de-atencao-integral-a-saude-do-adolescente-nasad.html
http://www.saude.df.gov.br/sobre-a-secre...
. A vulnerabilidade de adolescentes e jovens exige um olhar integral e alargado para o horizonte de políticas públicas que efetivamente os cuidem e os protejam.

A inexistência de produções portuguesas abordando políticas de enfrentamento à violência pode estar relacionada às condições de vida e de acesso às políticas básicas que garantem à população adolescente e jovem um patamar favorável de segurança social, aqui entendida como um conceito mais amplo, não apenas com a ausência de risco, mas com uma certa condição de previsibilidade e certeza quanto ao futuro. Segundo Scherer4141. Scherer GA. Serviço Social e Arte: Juventudes e Direitos Humanos em Cena. São Paulo: Ed. Cortez; 2013., a categoria segurança possui uma íntima relação com a proteção, que visa assegurar um conjunto de garantias, preservando o sujeito dos mais diversos riscos que possa encontrar ao longo de sua vida.

Essa tendência se repete nas produções que abordaram a temática saúde mental. Enquanto no Brasil os autores debatem a saúde mental fortemente associada às condições sociais acima evidenciadas, em Portugal a realidade é outra, sendo o único estudo preocupado com o desenvolvimento de competências sociais para problemas de comportamento. Com uma população de 10.562.178, majoritamente composta por adultos e idosos, as crianças e os adolescentes (0-14 anos) representam 14,88% do total, ao passo que os jovens (15-24 anos) alcançam 10,86%4242. Portugal. Instituto Nacional de Estatística. Censos 2011. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos2011_apresentacao&xpid=CENSOS
http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid...
.

Tal padrão de distribuição demográfica talvez possa explicar a ênfase dada ao segmento infantil na reformulação da política de saúde portuguesa, realizada em 2013, quanto à saúde mental88. Portugal. Direção-Geral da Saúde. Norma nº 010/2013 de 31/05/2013. Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil. 2013 [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/normas-e-circulares-normativas/norma-n-0102013-de-31052013.aspx
https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/no...
. O texto assinala que o novo Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil “parte em resposta, por um lado, à necessidade de melhoria dos padrões de qualidade, harmonizando os conteúdos das ações de saúde com as novas evidências científicas e com novas morbilidades e, por outro, a uma maior relevância de problemas de saúde preexistentes.” O documento enfatiza o novo enfoque nas questões relacionadas com o desenvolvimento infantil, as perturbações emocionais e do comportamento e os maus tratos, mas quanto à população jovem, não há nenhuma referência à saúde mental e outras temáticas.

Apesar de serem consideradas pessoas saudáveis, adolescentes e jovens em geral são concebidos como “grupo de risco”, sobretudo em relação à exposição ao álcool e outras drogas e ao exercício da sexualidade. Esse último tema foi abordado por 03 artigos2222. Duarte JB. La relevancia del conocimiento de las representaciones sociales de los adolescentes varones acerca de la paternidad en la adolescencia para el desarrollo de políticas públicas relevance of awareness of social. Subjetividad y Procesos Cognitivos 2013; 17(2):17-36.,2525. Lima CC, Souza ACL, Rotella C, Silva DM, Santos D, Assunção DS, Maximino T, Castro VM, Luca Neto VN, Nascimento Neto WG. Políticas de atenção ao adolescente nos trilhos da ciência para uma atenção integral ao adolescente e jovem brasileiro. Pediatria Moderna 2015; 51(4):127-131.,3131. Carvalho LM, Figueiredo CC. Configurações de conhecimento e política na regulação da educação sexual em meio escolar. Educação, Sociedade & Culturas 2011; (34):67-88., situados na categoria saúde sexual e reprodutiva. Os artigos brasileiros sinalizaram o papel das políticas públicas na proteção e cuidado para com a “maternidade vulnerável”, isto é, sobre as condições de vida de meninos e meninas e seus recém-nascidos, face às consequências e riscos envolvidos, sobretudo em populações pobres. Dada a premência de ações nessa área no Brasil, foram lançadas em 2015 orientações básicas para a saúde sexual e a saúde reprodutiva4343. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Cuidando de Adolescentes: orientações básicas para a saúde sexual e a saúde reprodutiva. Brasília: MS; 2015., articuladas à rede de atenção materno-infantil. Também está em desenvolvimento a estratégia “ Proteger e cuidar”, que objetiva melhorar a capacidade de integralidade da resposta nacional da Atenção Básica, principalmente nas questões de organização dos serviços, de desenvolvimento e crescimento e da saúde sexual e saúde reprodutiva.

O enfoque dado à produção portuguesa refere-se ao papel da educação em tratar dessa complexa temática, chamando à responsabilidade outras instâncias públicas, como a saúde. Nesse sentido, em Portugal, desde 2009, foi instituída a educação sexual em meio escolar, por meio da Lei n.º 60/20094444. Portugal. Assembleia da República. Lei n.º 60/2009, de 6 de Agosto. Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar; 2009.. Essa legislação se insere no Programa Nacional de Saúde Reprodutiva (PNSR), criado em 2007, abrangendo as áreas de: planejamento familiar, vigilância pré-natal, diagnóstico pré-natal, interrupção voluntária da gravidez e procriação medicamente assistida4545. Portugal. Direção-Geral da Saúde. Programa Nacional de saúde reprodutiva. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.saudereprodutiva.dgs.pt/
http://www.saudereprodutiva.dgs.pt/...
.

A Saúde Sexual e Reprodutiva de adolescentes e jovens é um tema que merece ser melhor estudado pela academia, gestores e profissionais de saúde. Subjaz à discussão o respeito aos direitos humanos, na ótica do universo adolescente e jovem que deve perpassar todas as agendas e políticas. Nesse sentido, Novaes4646. Novaes RCR. Introdução. In: Castro JA, Aquino LMC, Andrade CC, organizadores. Juventude e Políticas Sociais no Brasil. Brasília: IPEA; 2009. alerta que, pela ótica das demandas juvenis, os direitos humanos referem-se a um conceito que contempla a diversidade de direitos – civis, econômicos, culturais, sociais, políticos e difusos. Nessa perspectiva, ainda segundo a autora, a concepção de adolescentes e jovens como sujeitos de direitos está ancorada na compreensão da indivisibilidade dos direitos individuais e coletivos e expressa o grande desafio das democracias contemporâneas para articular igualdade e diversidade no planejamento e execução de políticas públicas.

Considerações Finais

Este estudo abordou a produção científica sobre as políticas públicas e programas de saúde voltados à população adolescente e jovem nos países Brasil e Portugal. O conjunto das obras demonstra uma produção incipiente e de fluxo intermitente nesse campo temático. Os estudos do tipo avaliativos, modelagem recorrente ao campo objetal de Políticas e Programas, assim como os empíricos, foram minoria em relação àqueles do tipo teórico. Essas características indicam maior interesse investigativo pelas áreas temáticas transversais, em detrimento do campo (políticas e programas). Assim sendo, o corpus de análise foi composto por artigos que abordaram de forma secundária o campo das políticas e programas, analisando-o de forma complementar aos objetos de estudo prioritários. Essa característica da produção demandou para a análise a abordagem das temáticas subjacentes às agendas públicas, buscando conexões entre as diretrizes que as sustentam e suas relações com os contextos sociais de cada país, em suas peculiaridades no atendimento às demandas e necessidades de seus adolescentes e jovens.

Tal tendência pode ser explicada pela recente implementação nos dois países de legislações, diretrizes e políticas estruturadas e específicas para a saúde do público adolescente e jovem. Entretanto, pode-se afirmar que ambos países já possuem marcos programáticos robustos e estruturantes para a devida capilarização de ações nos estados e regiões, constituindo-se campo fértil para as pesquisas e a produção de conhecimento.

O interesse focal por temáticas relevantes que permeiam as ações em saúde também é justificável pela complexidade da qual se reveste o atendimento direto a adolescentes e jovens.

Embora em contextos sociais distintos, as temáticas refletem áreas tradicionais de intervenção das políticas e programas no âmbito da saúde de adolescentes e jovens, com exceção daquelas decorrentes do fenômeno da violência estrutural, marcadamente presente na realidade brasileira. Identificou-se, ainda, ausência de temáticas emergentes que afetam a saúde da população adolescente e jovem como identidades de gênero, fluxos migratórios e morbimortalidade por causas externas, entre as quais o suicídio, revelando possível vazio assistencial das políticas e programas e um campo necessário a ser explorado pela produção científica.

Nessa direção, o conhecimento crítico e a apropriação abrangente da política em si é fundamental, pois dela emanam diretrizes técnicas, assistenciais, recursos orçamentários que incidem diretamente na gestão local dos serviços de saúde.

Referências

  • 1
    Organização Pan-Americana da Saúde (PAHO), Organização Mundial da Saúde (OMS). Plano de Ação para Prevenção da Obesidade em Crianças e Adolescentes Washington: PAHO; 2014. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.paho.org/bra/images/stories/UTFGCV/planofactionchildobesity-por.pdf?ua=1
    » http://www.paho.org/bra/images/stories/UTFGCV/planofactionchildobesity-por.pdf?ua=1
  • 2
    World Health Organization (WHO). Adolescent Friendly Health Services: an agenda for change Geneva: WHO; 2002. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.who.int/maternal_child_adolescent/documents/fch_cah_02_14/en
    » http://www.who.int/maternal_child_adolescent/documents/fch_cah_02_14/en
  • 3
    Brasil. Decreto nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007. Institui o Programa Saúde na Escola – PSE e dá outras previdências. Diário Oficial da União; 5 dez.
  • 4
    Brasil. Estatuto da Criança e do Adolescente e legislação pertinente [compilação de Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude]. Porto Alegre: Ministério Público do Rio Grande do Sul, Procuradoria Geral de Justiça; 2010.
  • 5
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Diretrizes Nacionais para a atenção integral à saúde de adolescentes e jovens na promoção, proteção e recuperação da saúde Brasília: MS; 2010.
  • 6
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde Integral de Adolescentes e Jovens. Orientações para a organização de serviços de saúde Brasília: MS; 2007.
  • 7
    Brasil. Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013. Institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude – SINAJUVE. Diário Oficial da União 2013; 5 ago.
  • 8
    Portugal. Direção-Geral da Saúde. Norma nº 010/2013 de 31/05/2013. Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil 2013 [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/normas-e-circulares-normativas/norma-n-0102013-de-31052013.aspx
    » https://www.dgs.pt/directrizes-da-dgs/normas-e-circulares-normativas/norma-n-0102013-de-31052013.aspx
  • 9
    Portugal. Norma da Direção-Geral da Saúde nº010/2013. Saúde Infantil e Juvenil: Programa Nacional. Direção-Geral da Saúde; 2013.
  • 10
    Portugal. Lei nº 60 de 6 de agosto de 2009. Programa Nacional de Saúde Escolar - Saúde Sexual e Reprodutiva - Educação Sexual em Meio Escolar Direção-Geral de Saúde; 2009.
  • 11
    Giovanella L, Lobato LVC, Noronha JC, Carvalho AI. Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2012.
  • 12
    Arksey H, O’Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. International J Soc Res Methodol 2007; 8(1):19-32.
  • 13
    Levac D, Colquhoun H, O’Brien KK. Scoping studies: advancing the methodology. Implement Sci 2010; 5:69.
  • 14
    Horta NC, Sena RR. Abordagem ao adolescente e ao jovem nas políticas públicas de saúde no Brasil: um estudo de revisão. Physis 2010; 20(2):475-495.
  • 15
    Matias NCF. A importância de políticas públicas além da escola formal para o desenvolvimento infantil e adolescente: Uma revisão de literatura. Interação em Psicologia 2010; 14(1):93-102.
  • 16
    Celeste RK, Nadanovsky P. How much of the income inequality effect can be explained by public policy? Evidence from oral health in Brazil. Health Policy 2010; 97(2-3):250-258.
  • 17
    Cruz LR, Welzbacher AI, Freitas CLS, Costa LXS, Lorini RA. Medidas socioeducativas em meio aberto no município de Santa Cruz do Sul/RS: entre as diretrizes legais e as políticas sociais públicas. Pesquisas e Práticas Psicossociais 2010: 5(1):112-119.
  • 18
    Cavalcanti PB, Dantas ACS, Carvalho RN. Contornos e sinergias entre a política de Saúde e o adolescente privado de liberdade: intersetorialidade como desafio. Textos & Contextos 2011; 10(2):399-410.
  • 19
    Santos DCM, Jorge MSB, Freitas CHA, Queiroz MVO. Adolescentes em sofrimentopsíquico e a política de saúde mental infanto-juvenil. Acta Paul Enferm 2011; 24(6):845-850.
  • 20
    Lopez SB, Moreira MCN. Quando uma proposição não se converte em política? O caso da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens - PNAISAJ. Cien Saude Colet 2013; 18(4):1179-1186.
  • 21
    Lopez SB, Moreira MCN. Políticas Nacionais de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens e à Saúde do Homem: interlocuções políticas e masculinidade. Cien Saude Colet 2013; 18(3):743-752.
  • 22
    Duarte JB. La relevancia del conocimiento de las representaciones sociales de los adolescentes varones acerca de la paternidad en la adolescencia para el desarrollo de políticas públicas relevance of awareness of social. Subjetividad y Procesos Cognitivos 2013; 17(2):17-36.
  • 23
    Fonseca FF, Sena RKR, Santos RLA, Dias VD, Costa SM. As vulnerabilidades na infância e adolescência e as políticas públicas brasileiras de intervenção. Rev. Paul. Pediatr. 2013; 31(2):258-264.
  • 24
    Freitas LKP, Cunha Junior AT, Knackfuss MI, Medeiros HJ. Obesidade em adolescentes e as políticas públicas de nutrição. Cien Saude Colet 2014; 19(6):1755-1762.
  • 25
    Lima CC, Souza ACL, Rotella C, Silva DM, Santos D, Assunção DS, Maximino T, Castro VM, Luca Neto VN, Nascimento Neto WG. Políticas de atenção ao adolescente nos trilhos da ciência para uma atenção integral ao adolescente e jovem brasileiro. Pediatria Moderna 2015; 51(4):127-131.
  • 26
    Oliveira LB, Schoeninger D, Pressi P, Raulino C, Paravisi AP, Nothaft S. Programa saúde na escola: uma possibilidade de atuação do enfermeiro na promoção da saúde dos escolares. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research 2015; 11(3):190-191.
  • 27
    Barbiani R. Violação de direitos de crianças e adolescentes no Brasil: interfaces com a política de saúde. Saúde Debate 2016; 40(109):200-211.
  • 28
    Silva GG, Carcereri DL, Amante CJ. Estudo qualitativo sobre um programa de educação em saúde bucal. Cad. Saúde Colet. 2017; 25(1):7-13.
  • 29
    Assis DAD, Silva AA, Torres T. Políticas de saúde mental, álcool e outras drogas e de criança e adolescente no Legislativo. Saúde em Debate 2017; 41(112):255-272.
  • 30
    Januário SS, Neves Peixoto FS, Lima NN, Nascimento VB, Sousa DF, Pereira Luz DC, Silva CG, Rolim Neto ML. Mental health and public policies implemented in the Northeast of Brazil: a systematic review with meta-analysis. Int J Soc Psychiatry 2017; 63(1):21-32.
  • 31
    Carvalho LM, Figueiredo CC. Configurações de conhecimento e política na regulação da educação sexual em meio escolar. Educação, Sociedade & Culturas 2011; (34):67-88.
  • 32
    Matos MG, Santos T, Gaspar T. Promoção da saúde nos adolescentes portugueses: orientações técnicas e políticas para uma intervenção – Exercício Delphi. Journal of Child and Adolescent Psychology 2012; 3(1):137-155.
  • 33
    Patrão IAM, Rita JS. Intervenção Multifamiliar com Adolescentes com Alterações de Comportamento: Proposta de um Programa de Intervenção. Psychology, Community & Health 2013; 2(3):334-345,
  • 34
    Riso B. A construção da escola como lugar de saúde: contributo para uma reflexão sobre as políticas de saúde escolar na sociedade portuguesa contemporânea. Educação, Sociedade & Culturas 2013; 38:77-97.
  • 35
    Loureiro C, Santos MR, Frederico-Ferreira M. Conceção do programa de intervenção em enfermagem ‘Melhorar competências com os outros’. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2015; (Ed. Esp. 2):27-32.
  • 36
    Brasil. Resolução nº 191, de 7 de junho de 2017. Dispõe sobre a participação de adolescentes no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA. Diário Oficial da União 2017; 7 jun.
  • 37
    Portugal. Direção-Geral da Educação. Questionário: Plano Nacional da Juventude Lisboa: Direção-Geral da Educação; 2017.
  • 38
    Brasil. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Estabelece a revisão de diretrizes da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União; 21 set.
  • 39
    Cerqueira DRC. Mapa dos Homicídios Ocultos no Brasil Rio de Janeiro: IPEA; 2013. (Texto para Discussão, nº 1848).
  • 40
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Núcleo de Atenção Integral à Saúde do Adolescente (NASAD). 2008. [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.saude.df.gov.br/sobre-a-secretaria/subsecretarias/463-nucleo-de-atencao-integral-a-saude-do-adolescente-nasad.html
    » http://www.saude.df.gov.br/sobre-a-secretaria/subsecretarias/463-nucleo-de-atencao-integral-a-saude-do-adolescente-nasad.html
  • 41
    Scherer GA. Serviço Social e Arte: Juventudes e Direitos Humanos em Cena São Paulo: Ed. Cortez; 2013.
  • 42
    Portugal. Instituto Nacional de Estatística. Censos 2011 [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos2011_apresentacao&xpid=CENSOS
    » http://censos.ine.pt/xportal/xmain?xpgid=censos2011_apresentacao&xpid=CENSOS
  • 43
    Brasil. Ministério da Saúde (MS). Cuidando de Adolescentes: orientações básicas para a saúde sexual e a saúde reprodutiva Brasília: MS; 2015.
  • 44
    Portugal. Assembleia da República. Lei n.º 60/2009, de 6 de Agosto. Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar; 2009.
  • 45
    Portugal. Direção-Geral da Saúde. Programa Nacional de saúde reprodutiva [acessado 2017 Out 31]. Disponível em: http://www.saudereprodutiva.dgs.pt/
    » http://www.saudereprodutiva.dgs.pt/
  • 46
    Novaes RCR. Introdução. In: Castro JA, Aquino LMC, Andrade CC, organizadores. Juventude e Políticas Sociais no Brasil Brasília: IPEA; 2009.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2018

Histórico

  • Recebido
    12 Out 2017
  • Aceito
    26 Fev 2018
  • Revisado
    25 Abr 2018
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br