Resumo
No Brasil, a distribuição das unidades de terapia intensiva pediátrica (UTIP), causas de admissão, custos despendidos e forma como se presta a assistência ainda são pouco conhecidos. Com o objetivo de descrever o perfil das internações por faixa etária em UTIP do SUS de Pernambuco, em 2010, realizou-se um estudo transversal, com o universo das 1.915 internações nas seis UTIP do estado, captadas no Sistema de Informação Hospitalar. As variáveis foram comparadas por faixa etária. Predominaram internações no sexo masculino (58,1%), na faixa etária de um a quatro anos (32,5%), unidades filantrópicas (64,1%), UTIP tipo III (59,2%) e por neoplasias (28,9%). A permanência média foi de 14,4 dias e o custo médio de R$ 6.674,80. A distância média entre o município de residência e o da UTIP variou de 8,7 a 486,5 km. Ocorreram 207 óbitos (10,8/100 internações), 30% por doenças infectoparasitárias. Identificaram-se diferenças entre as faixas etárias (p < 0,05), exceto quanto ao sexo. Concluindo, em Pernambuco, as internações em UTIP apresentam diferenças no acesso geográfico e nas características sociodemográficas, da admissão e causas de internação e óbito entre faixas etárias.
Unidades de terapia intensiva pediátrica; Sistemas de informação hospitalar; Morbidade; Custos hospitalares; Acesso aos serviços de saúde
Introdução
A terapia intensiva pediátrica surgiu há cerca de 50 anos11. Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460., mas só a partir da década de 1980, com os avanços técnicos, terapêuticos e científicos, passou a expandir-se, com a implantação de unidades específicas para tratamento de crianças em estado crítico de saúde em várias partes do mundo22. Cutulo RA, Furtado Filho JRF, Botelho L. Perfil dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva pediátrica do Hospital Infantil Joana de Gusmão no ano de 1993. ACM 1994; 23(2):95-100., inclusive no Brasil11. Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460.. As unidades de terapia intensiva pediátrica (UTIP), com atenção profissional especializada de forma contínua, materiais específicos e tecnologias necessárias ao diagnóstico, monitorização e tratamento33. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Resolução GM/MS nº 7, 24 de fevereiro de 2010. Dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de Unidades de Terapia Intensiva e dá outras providências. Diário Oficial União 2010; 25 fev., têm contribuído para modificações significativas na evolução e prognóstico de crianças com quadros graves44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733., salvando e prolongando vidas55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.. Por outro lado, representam um dos principais setores consumidores do orçamento hospitalar66. Gemke RJ, Bonsel GJ, Bught AJ. Outcome assessment and quality assurance in pediatric intensive care. In: Tibboel D, van der Voort E, editors. Intensive care in childhood - a challenge to future. 2nd ed. Berlin: Springer; 1996. p. 117-132..
No Brasil, apesar do avanço da terapia intensiva nas últimas décadas, persistem desigualdades na distribuição dos leitos e na qualidade da assistência prestada77. Barbosa AP. Terapia intensiva neonatal e pediátrica no Brasil: o ideal, o real e o possível. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):437-438.. A distribuição e estrutura das UTIP, as principais causas de admissão, os custos despendidos e a forma como se presta assistência intensiva no país ainda são pouco conhecidos11. Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460.. Além disso, entre os estudos que abordam as características de internações em UTIP, a maioria envolve um único centro terciário de referência, tanto na literatura científica nacional22. Cutulo RA, Furtado Filho JRF, Botelho L. Perfil dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva pediátrica do Hospital Infantil Joana de Gusmão no ano de 1993. ACM 1994; 23(2):95-100.,44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.
9. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21-1010. El Halal MGS, Barbieri E, Filho RM, Trotta EA, Carvalho PRA. Admission source and mortality in a pediatric intensive care unit. Indian J Crit Care Med 2012; 16(2):81-86., como na internacional1111. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.
12. Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591.
13. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.-1414. Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61..
Para gestão da rede de atenção à saúde da criança é essencial a caracterização do conjunto de UTIP e da assistência nelas prestada. Nesse sentido, o Sistema de Informação Hospitalar do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS)1515. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual técnico operacional do Sistema de Informações Hospitalares/Atualização, Versão 1. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2011. possibilita a análise de vários aspectos da terapia intensiva pediátrica praticada na rede do SUS, apesar de ainda ser pouco utilizado para essa finalidade. Este estudo, a partir das internações em UTIP constantes no SIH/SUS, pode contribuir com o planejamento e a gestão da rede de cuidados intensivos pediátricos do SUS e, consequentemente, com a organização dos serviços e a qualificação da assistência a pacientes criticamente enfermos. Dessa forma, teve-se como objetivo descrever o perfil das internações no conjunto das UTIP da rede do SUS do estado de Pernambuco, ocorridas em 2010, quanto a características sociodemográficas, do acesso geográfico à assistência, da admissão e as causas de internação e óbito, verificando-se diferenças entre as faixas etárias dos usuários.
Métodos
Realizou-se um estudo transversal sobre as internações em UTIP ocorridas em Pernambuco, no ano de 2010. Em 2010, a rede do SUS de Pernambuco (SUS-PE) contava com seis UTIP, todas localizadas no município do Recife, capital do estado. Duas pertencentes à rede filantrópica conveniada e quatro à rede própria do SUS, totalizando 55 leitos. Essas UTIP admitem pacientes pediátricos em estado crítico de saúde residentes nos 184 municípios do estado, no distrito de Fernando de Noronha e também em estados vizinhos.
No estudo, foram incluídas todas as internações ocorridas no conjunto de UTIP da rede assistencial do SUS-PE, constantes nos bancos de dados do SIH-SUS, em 2010, independente da faixa etária ou de qualquer outra característica. A internação em UTIP do SUS necessita, além da Autorização de Internação Hospitalar (AIH), de um laudo de procedimento especial, cujos dados compõem o banco do SIH/SUS. Como internações, o SIH/SUS considera o quantitativo de AIH pagas, excluindo as de prorrogação, emitidas para pacientes com longa permanência. Esse quantitativo foi utilizado como uma aproximação do número de pacientes internados, pois as transferências e reinternações geram novas AIH1616. Datasus. [homepage on the internet]. Morbidade hospitalar do SUS por local de internação nota técnica. [cited 2011 Feb 15]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nidescr.htm
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nid... . Os bancos mensais do SIH/SUS foram coletados na página do Departamento de Informática do SUS - Datasus (http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area = 0901).
Do total de internações em hospitais do SUS-PE ocorridas em 2010 (n = 543.720), foram selecionadas as internações com diárias de UTI (n = 14.965) e em seguida as que ocorreram em UTIP (n = 1.915). Foram estudadas variáveis referentes às características sociodemográficas dos pacientes (sexo, faixa etária, local de residência), ao acesso geográfico à assistência intensiva, à natureza e tipo da UTIP, custos, tempo de permanência, procedimentos assistenciais realizados e às causas de admissão e óbito. Utilizou-se a classificação das UTIP em três tipos (I, II e III), em ordem crescente de complexidade, conforme preconiza o Ministério da Saúde1717. Brasil. Portaria GM/MS nº 3.432, 12 de agosto de 1998. Estabelece critérios de classificação para as unidades de tratamento intensivo – UTI. Diário Oficial União 1998; 12 ago., de acordo com a disponibilidade de serviços no hospital, recursos humanos, materiais e equipamentos na unidade.
Todas as variáveis estudadas, com exceção das referentes à distribuição geográfica das internações, foram descritas para quatro faixas etárias, obtendo-se frequências absolutas e relativas e verificando-se a hipótese de homogeneidade das proporções pelo teste qui-quadrado de Pearson, com nível de significância de 5%. Foram obtidas: média mensal de internações, permanência média (em dias), valores pagos pelo SUS (custos em R$) e taxa de letalidade (número de óbitos por 100 internações).
Para distribuição geográfica das internações, segundo local de residência dos pacientes, foram excluídas 131 admissões de moradores em municípios de outros estados ou no distrito de Fernando de Noronha. Elaborou-se mapa coroplético das internações por município e mesorregião de residência. Para cada mesorregião do estado (Sertão, Agreste, Mata e Região Metropolitana do Recife-RMR), calculou-se a distância euclidiana média entre as sedes dos municípios de residência e de internação (Recife). Essa distância (em km) foi utilizada como indicativo do acesso geográfico à assistência em UTIP pelos usuários do SUS residentes no estado.
As causas de internação e óbito foram agrupadas de acordo com os capítulos de morbidade e mortalidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão (CID-10)1818. Organização Mundial da Saúde (OMS). Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão. São Paulo: Edusp; 1994., especificando-se aqueles com maior magnitude. Como causa de internação, utilizou-se o diagnóstico principal que justificou a admissão, definido após a saída da UTIP, conforme normatização do SIH-SUS1616. Datasus. [homepage on the internet]. Morbidade hospitalar do SUS por local de internação nota técnica. [cited 2011 Feb 15]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nidescr.htm
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nid... . O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da instituição principal a qual o trabalho está vinculado.O estudo foi realizado exclusivamente com dados secundários, sem informações que pudessem identificar os indivíduos, respeitando-se os princípios éticos constantes na Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466, de 12 de dezembro de 2012.
Resultados
Em 2010, ocorreram 1.915 internações em UTIP da rede do SUS do estado de Pernambuco, correspondendo a uma média mensal de 160 admissões (Tabela 1). A faixa etária de 1-4 anos apresentou a maior proporção de internações, seguida pelo grupo de menores de um ano. Nessas duas faixas, ocorreram 58,4% das internações em UTIP, com uma média mensal de 52 e 41 admissões, respectivamente. Para as faixas etárias de 5-9 anos e ≥ 10 anos, a média mensal de internações foi de 34 e 32 admissões. O tempo médio de permanência nas UTIP para o total das internações foi de 14,4 dias, variando entre 18,7 dias, em menores de um ano, e 11,7 dias, no grupo ≥ 10 anos. Nas faixas de 1-4 anos e 5-9 anos, a média de permanência foi de 14,3 e 11,9 dias, respectivamente.
Para o total das internações, o custo foi de 12,8 milhões de reais, correspondendo a um valor médio pago pelo SUS por internação de R$ 6.674,80 (Tabela 1). O custo diminuiu com o avançar da idade, correspondendo a R$ 8.361,50 nos menores de um ano e a R$ 7.089,23, R$ 5.563,79 e R$ 5.022,60 nos grupos de 1-4 anos, 5-9 anos e ≥ 10 anos, respectivamente. Ocorreram 207 óbitos, correspondendo a uma média mensal de 17 mortes. A maior ocorrência de óbitos foi observada no grupo de menores de um ano (40,1%) e a menor na faixa de 5-9 anos (14,0%). Quanto à taxa de letalidade, em cada 100 internações, 10,8 evoluíram para o óbito. Porém, houve diferenças em relação aos grupos etários: a letalidade em menores de um ano (16,7/100 internações) foi 2,4 vezes superior a menor taxa observada (7,1/100 internações), na faixa de 5-9 anos.
Entre os pacientes residentes em Pernambuco (Figura 1), não houve nenhuma internação de moradores em 23 municípios (12,4%). Por outro lado, 75 municípios (40,5% do total) contribuíram com uma a quatro internações, 45 (24,3%) e 42 municípios (22,8%) com cinco a nove e 10 ou mais internações, respectivamente. Quanto às mesorregiões, 44,7% das internações foram de residentes em municípios da RMR, seguidos por moradores no Agreste (24,6%), na Mata (16,3%) e no Sertão (14,0%). Como todas as UTIP localizavam-se na capital do estado, os pacientes residentes na RMR foram os que apresentaram menor deslocamento, com uma distância euclidiana média entre a sede do município de residência e o da UTIP de 8,7 km. Em outro extremo, essa distância foi de 486,5 km entre os moradores no Sertão. Ocupando posição intermediária, a distância entre os residentes no Agreste e na Mata foi de 152,4 km e de 77,0 km, respectivamente.
Características da distribuição geográfica das internações em UTIP por município e mesorregião de residência. Pernambuco, 2010
A maioria dos pacientes admitidos em UTIP era do sexo masculino (58,1%), porém não houve diferença estatisticamente significante (p = 0,967) entre as faixas etárias estudadas (Tabela 2). Predominaram internações em unidades da rede filantrópica (64,1%) e em UTIP do tipo III (59,2%). Somente em menores de um ano, ocorreu maior frequência de internações em UTIP da rede própria do SUS e do tipo II. A distribuição das internações segundo natureza e tipo de UTIP apresentou diferenças entre as faixas etárias (p < 0,001). Quando se categorizou o tempo de permanência, observou-se que 68,7% das internações duraram até 14 dias, com diferenças entre as faixas etárias (p < 0,001).
Quanto aos procedimentos realizados nas internações (Tabela 2), também foram observadas diferenças entre as faixas etárias (p < 0,001). Houve predomínio de procedimentos clínicos, com exceção dos menores de um ano, nos quais 52,8% dos procedimentos foram cirúrgicos. Entre as 1.095 internações em que se realizaram procedimentos clínicos, a terapêutica oncológica foi a mais frequente (40,1%). No caso das 809 internações com procedimentos cirúrgicos, a maior frequência foi de cirurgias do aparelho circulatório (37,7%).
Em relação às causas de internação e óbito (Tabela 3), foram verificadas diferenças entre as faixas etárias (p < 0,001). Para o total de internações, a principal causa de hospitalização (capítulo CID-10) foi constituída pelas neoplasias (28,9%), seguidas pelas malformações congênitas (19%) e doenças infectoparasitárias (13,7%), do aparelho respiratório (13,7%) e do aparelho digestivo (9,4%). A partir de um ano, não se observou diferença entre as faixas etárias quanto à posição ocupada pelas três primeiras causas. Nos menores de um ano, as malformações congênitas constituíram a causa de internação mais frequente e as neoplasias, a sexta.
Como causas de óbito (Tabela 3), predominaram as doenças infecciosas e parasitárias (30%), seguidas pelas neoplasias (14%), malformações congênitas (13,5%) e doenças do aparelho respiratório (12,6%). Em todas as faixas etárias, as doenças infectoparasitárias também representaram a principal causa de óbito, com exceção do grupo de 5-9 anos, no qual ocuparam o segundo lugar, superadas pelas neoplasias.
Discussão
Este estudo identificou a magnitude das internações e mortes na totalidade das UTIP do SUS de Pernambuco, evidenciando, entre as faixas etárias, diferenças relacionadas às suas características. Revelou-se, ainda, a concentração espacial das UTIP em hospitais localizados na capital do estado, indicando a desigualdade de acesso geográfico a cuidados intensivos pela população pediátrica residente em áreas mais afastadas.
Informações sobre o universo de UTIP de determinada região são escassos11. Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460.,1919. Barbosa AP, Cunha AJLA, Carvalho ERM, Portella AF, Andrade MPF, Barbosa MCM. Terapia intensiva neonatal e pediátrica no Rio de Janeiro: distribuição de leitos e análise de equidade. Rev Assoc Med Bras 2002; 48(4):303-311.,2020. Saporiti A. Cuidados intensivos pediátricos: trabajo colaborativo sobre características de población y grupos de riesgos/ Pediatric intensive care: collaborative study on characteristics of population and high risk groups. J Pediatr (Rio J) 1999; 75(3):C2-C10., não se identificando, até então, estudos dessa natureza referentes aos estados da região Nordeste do Brasil. Nesse aspecto, ressalta-se que a inclusão de todas as UTIP da rede do SUS-PE no estudo foi possível devido a disponibilidade de informações no SIH/SUS a respeito das características dos usuários e da assistência prestada. O uso desse sistema como fonte para diversas investigações é crescente, devido à produção ágil e melhoria da qualidade da sua base de dados, além da facilidade de acesso2121. Drumond EF, Machado CJ, Vasconcelos MR, Franca E. Utilização de dados secundários do SIM, Sinasc e SIH na produção científica brasileira de 1990 a 2006. Rev bras estud popul 2009; 26(1):7-19.. Ressalva é feita ao diagnóstico principal de admissão e de óbito, com menor confiabilidade, principalmente quando a causa é mais especificada2222. Escosteguy CG, Portela MC, Medronho RA, Vasconcellos MTL. AIH versus prontuário médico no estudo do risco de óbito hospitalar no infarto agudo do miocárdio no Município do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica 2005; 21(4):1065-1076.,2323. Travassos-Veras CM, Martins MS. A confiabilidade dos dados nos formulários de Autorização de Internação Hospitalar (AIH), Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica 1994; 10:3.. A esse respeito, para minimizar a possibilidade de viés, recomenda-se que o diagnóstico principal seja agrupado em capítulos da CID-102424. Bittencourt SA, Camacho LAB, Leal MA. O Sistema de Informação Hospitalar e sua aplicação na saúde coletiva. Cad Saude Publica 2006; 22(1):19-30., estratégia que foi utilizada neste estudo.
A comparação dos achados observados em diversos estudos sobre as internações em UTIP apresenta limitações, pois unidades diferentes possuem características distintas, como idade dos pacientes admitidos, causas de admissão, disponibilidade de recursos no hospital e atributos próprios da população local. Ainda assim, é descrito que a maioria das admissões em UTIP é de lactentes22. Cutulo RA, Furtado Filho JRF, Botelho L. Perfil dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva pediátrica do Hospital Infantil Joana de Gusmão no ano de 1993. ACM 1994; 23(2):95-100.,44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.
5. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.-66. Gemke RJ, Bonsel GJ, Bught AJ. Outcome assessment and quality assurance in pediatric intensive care. In: Tibboel D, van der Voort E, editors. Intensive care in childhood - a challenge to future. 2nd ed. Berlin: Springer; 1996. p. 117-132.,88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.,1111. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.,1313. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.,2525. Bertolini G, Ripamonti D, Cattaneo A, Apolone G. Pediatric risk of mortality: an assessment of its performance in a sample of 26 Italian intensive care units. Crit Care Med 1998; 26(8):1427-1432.
26. Goodman DM, Wilde RA, Green TP. Oncology patients in the pediatric intensive care unit: room for optimism? Crit Care Med 2000; 28(11):3768-3769.-2727. Singhal D, Kumar N, Puliyel JM, Singh SK, Srinivas V. Prediction of mortality by application of PRISM score in intensive care unit. Indian Pediatr 2001; 7(38):714-719., devido a características inerentes a essa faixa etária, na qual o sistema imunológico ainda não está completamente desenvolvido, tornando-os mais susceptíveis a doenças e complicações que necessitam de cuidados intensivos44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120..
Neste estudo, predominaram as internações entre um e quatro anos de idade, o que está de acordo com o observado em uma unidade do Uruguai2828. Laphitz C, Assandri E, Ferreira Maia A, Ferrari AM. Derivación de pacientes pediátricos a unidades de cuidados intensivos: estudio de cuatro años en una Institución de Asistencia Médica Colectiva. Rev Med Uruguay 2005; 21(3):215-221. e em outra na capital do estado de São Paulo-Brasil99. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21, onde as admissões, nessa faixa etária, foram superiores as observadas em menores de um ano. Ressalta-se que cerca de 60% das internações ocorreram em menores de cinco anos, com posterior queda com o avançar da idade. O que difere do perfil de uma UTIP na Etiópia, onde a faixa etária predominante foi de 10 a 14 anos2929. Abebe T, Girmay M, Michael G, Tesfaye M. The epidemiological profile of pediatric patients admitted to the general intensive care unit in an ethiopian university hospital. Int J Gen Med 2015; 8:63-67..
O tempo médio de permanência (14,4 dias) encontrado foi superior ao observado em outros estudos: 5,5 dias em Botucatu-São Paulo88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.; 7,3 dias em Maringá-Paraná55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.; de 6,6 a 8,9 dias em Porto Alegre-Rio Grande do Sul44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.; 9,7 dias em São Paulo (capital)99. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21; 5,0 dias em Medellín-Colômbia1313. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.. Entretanto, tais estudos levaram em consideração somente uma unidade, cujas características da demanda e do serviço podem ter contribuído para o menor tempo de internação observado. Os menores de um ano apresentaram tempo de permanência e custos de internação maiores. Tal achado corrobora o descrito por Chalom et al.3030. Chalom R, Raphaely RC, Costarino Junior AT. Hospital cost of pediatric intensive care. Crit Care Med 1999; 27(10):2079-2085., de que o tempo de permanência é a variável com maior correlação com os custos da internação, que, por conseguinte, vêm associados à maior gravidade das doenças e ao surgimento de complicações.
A taxa de letalidade descrita em UTIP22. Cutulo RA, Furtado Filho JRF, Botelho L. Perfil dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva pediátrica do Hospital Infantil Joana de Gusmão no ano de 1993. ACM 1994; 23(2):95-100.,44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.,1111. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.
12. Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591.
13. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.-1414. Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61.,2020. Saporiti A. Cuidados intensivos pediátricos: trabajo colaborativo sobre características de población y grupos de riesgos/ Pediatric intensive care: collaborative study on characteristics of population and high risk groups. J Pediatr (Rio J) 1999; 75(3):C2-C10.,2828. Laphitz C, Assandri E, Ferreira Maia A, Ferrari AM. Derivación de pacientes pediátricos a unidades de cuidados intensivos: estudio de cuatro años en una Institución de Asistencia Médica Colectiva. Rev Med Uruguay 2005; 21(3):215-221.,3131. Flori HR, Glidden DV, Rutherford GW, Matthay AM. Pediatric acute lung injury: prospective evaluation of risk factors associated with mortality. Am J Respir Crit Care Med 2005; 171(9):995-1001.varia de 6,7%1212. Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591. a 36,1%1414. Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61., intervalo bastante amplo e no qual se encontra o valor observado no conjunto das UTIP de Pernambuco (10,8%). Essa taxa sofreu influência da UTIP que concentrou cerca de 60% das internações em Pernambuco, pois, em estudos anteriores, a letalidade dessa unidade foi de 9%3232. Aragão RCF, Albuquerque MFPM, Mello MJG, Ximenes RAA. Risk factors associated with death in children admitted to a paediatric intensive care unit. Journal of tropical pediatrics 2001; 47(2):86-91. e 10,2%3333. Mello MJG, Albuquerque MFPM, Lacerda HR, Barbosa MTS, Ximenes RAA. Risk factors for healthcare-associated infection in a pediatric intensive care unit. Pediatr Crit Care Med 2010; 11(2):246-252.. A maior letalidade foi observada nos pacientes mais jovens44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,1313. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.,diferente de estudo realizado em UTIP de Porto Alegre-Rio Grande do Sul1010. El Halal MGS, Barbieri E, Filho RM, Trotta EA, Carvalho PRA. Admission source and mortality in a pediatric intensive care unit. Indian J Crit Care Med 2012; 16(2):81-86., onde a taxa de letalidade aumentou com o avançar da idade. A predominância de admissões no sexo masculino44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.
9. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21
10. El Halal MGS, Barbieri E, Filho RM, Trotta EA, Carvalho PRA. Admission source and mortality in a pediatric intensive care unit. Indian J Crit Care Med 2012; 16(2):81-86.
11. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.
12. Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591.
13. Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.-1414. Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61.,2929. Abebe T, Girmay M, Michael G, Tesfaye M. The epidemiological profile of pediatric patients admitted to the general intensive care unit in an ethiopian university hospital. Int J Gen Med 2015; 8:63-67., descritas por vários autores, também foi observada neste estudo em todas as faixas etárias, porém sem diferença significativa entre elas.
Quanto ao local de residência, aproximadamente 45% das admissões foram de moradores da Região Metropolitana do Recife. Essa mesorregião é composta por 14 municípios, concentra 42% da população do estado e todas as UTIP da rede do SUS-PE localizam-se em seu município-sede (Recife). Em 2010, em decorrência dessa concentração geográfica das unidades, usuários residentes em 147 dos 170 dos municípios das outras mesorregiões do estado percorreram distâncias consideráveis em busca de cuidados intensivos. Embora seja desejável a localização de UTIP em municípios com hospitais com maior estrutura, recursos e pessoal qualificado, no caso de Pernambuco, inclusive por conta de sua configuração geográfica, fica evidente que a localização exclusiva das UTIP na capital representa uma importante iniquidade no acesso ao tratamento intensivo.
Os pacientes residentes em municípios do Sertão deslocaram-se em média mais de 480 km e os do Agreste, mais de 150 km em busca de assistência intensiva. Caso a mensuração das distâncias percorridas tivesse considerado a malha viária, o que não foi possível com os dados secundários utilizados, esses valores seriam ainda maiores, a exemplo de um determinado município do Sertão, distante 730 km da capital do estado, que teve uma média mensal de três moradores admitidos em UTIP localizadas no município do Recife.
A regionalização da atenção terciária, mais especificamente da terapia intensiva pediátrica, portanto, requer avaliação, por parte do estado, para assegurar ao paciente acesso ao cuidado requerido, sem as barreiras representadas pelas grandes distâncias a serem percorridas. A falta de equidade na distribuição geográfica das UTIP limita o acesso de pacientes residentes em municípios mais distantes do Recife, penalizando uma grande parcela da população. No município de São Paulo, Souza et al.11. Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460. referem o transporte inadequado no setor público de crianças criticamente enfermas, com prejuízo de sua condição clínica. Embora essa questão não tenha sido investigada neste estudo, é provável que tal situação seja corriqueira em Pernambuco, potencializando os malefícios da desigualdade na distribuição geográfica de UTIP no estado. Ressalta-se, portanto, a importância de um sistema efetivo de controle de vagas e de transporte para a criança criticamente enferma, para minimizar os efeitos negativos da concentração geográfica das UTIP. Em outra frente, a implementação de programas de prevenção e gestão de doenças e acidentes na infância pode contribuir para redução da necessidade de internação em UTIP.
A maioria das admissões foi realizada nas duas UTIP da rede filantrópica, uma das quais abriga o maior quantitativo de leitos e é a única unidade do tipo III no estado. O tipo de procedimentos realizados nas internações em UTIP depende das características dos hospitais e das unidades de terapia intensiva neles inseridos, o que influi no perfil da clientela admitida. Neste estudo, a maior frequência de procedimentos clínicos é compatível com o encontrado em algumas UTIP44. Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.,55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,99. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21,1111. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.. Mas, em outras existe a predominância de procedimentos cirúrgicos66. Gemke RJ, Bonsel GJ, Bught AJ. Outcome assessment and quality assurance in pediatric intensive care. In: Tibboel D, van der Voort E, editors. Intensive care in childhood - a challenge to future. 2nd ed. Berlin: Springer; 1996. p. 117-132.,88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.,1414. Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61.,2525. Bertolini G, Ripamonti D, Cattaneo A, Apolone G. Pediatric risk of mortality: an assessment of its performance in a sample of 26 Italian intensive care units. Crit Care Med 1998; 26(8):1427-1432.. No conjunto das unidades estudadas, os procedimentos cirúrgicos só predominaram em menores de um ano, embora três UTIP estejam inseridas em hospitais com serviço de cirurgia pediátrica e outras três localizem-se em hospitais que realizam cirurgia cardíaca em crianças. Em menores de um ano, a maior frequência de procedimentos cirúrgicos, entre os quais predominam cirurgias do aparelho circulatório, decorre, provavelmente, das malformações congênitas constituírem a primeira causa de admissão em UTIP nesse grupo etário.
Entre as causas de admissão nas UTIP, as neoplasias ocuparam o primeiro lugar, no geral e em todas as faixas etárias a partir de um ano. Tal característica também foi observada em UTIP da Grécia1111. Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518., mas difere do encontrado em outras unidades55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.,99. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21,1212. Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591.,2828. Laphitz C, Assandri E, Ferreira Maia A, Ferrari AM. Derivación de pacientes pediátricos a unidades de cuidados intensivos: estudio de cuatro años en una Institución de Asistencia Médica Colectiva. Rev Med Uruguay 2005; 21(3):215-221., nas quais predominam causas respiratórias. A maior ocorrência de doenças de caráter crônico no conjunto das UTIP estudadas em Pernambuco pode estar relacionada com as características das próprias unidades e dos hospitais em que se inserem e também com a desigualdade de acesso geográfico que foi evidenciada. Deve ser investigada, portanto, a possibilidade de pacientes residentes no interior do estado com indicação de cuidados intensivos por doenças agudas não serem sequer transferidos para a capital, onde se localizam as UTIP.
As doenças infecciosas e parasitárias, com exceção dos pacientes entre cinco e nove anos, representaram a mais comum causa de óbito, o que difere do observado em Maringá-Paraná55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120. e em Botucatu-São Paulo88. Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301., onde as doenças respiratórias foram mais frequentes. Já em UTIP da capital de São Paulo99. Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21, as neoplasias constituíram a principal causa de óbito e, em unidade da Etiópia2929. Abebe T, Girmay M, Michael G, Tesfaye M. The epidemiological profile of pediatric patients admitted to the general intensive care unit in an ethiopian university hospital. Int J Gen Med 2015; 8:63-67., os traumatismos (causas externas).
De forma geral, quando o diagnóstico é precoce, a maioria das doenças infecciosas e respiratórias é de manejo mais fácil e não necessita de muitos recursos e tecnologia avançada quando comparadas com afecções de caráter crônico55. Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.. As doenças infecciosas e parasitárias como principal causa de morte em UTIP, por serem extremamente dependentes de melhores condições de vida e sensíveis à prevenção primária, sugerem, portanto, deficiências na rede de atenção à saúde e na estrutura social do estado.
Ressalta-se que os achados deste perfil podem contribuir com a gestão da rede de atenção à saúde de Pernambuco, visando à definição mais apropriada da localização e estrutura das UTIP, a alocação e qualificação de pessoal, além do fornecimento de equipamentos e insumos, possibilitando a melhoria do acesso e da qualidade da atenção prestada no estado.Para garantir uma boa qualidade em cuidados intensivos pediátricos, não basta apenas adequar a oferta de leitos e a estrutura das unidades (recursos físicos, materiais, humanos e financeiros). É necessário, também, aprimorar os processos assistenciais, com investimento sustentado tanto na formação e educação continuada de toda a equipe de saúde, como em linhas de pesquisa específicas para o setor.
Concluindo, em Pernambuco, as internações em UTIP predominam em unidades filantrópicas e do tipo III, no grupo de 1-4 anos e por neoplasias. Existem desigualdades no acesso geográfico à internação e nas características dos grupos etários. Os procedimentos clínicos superam os procedimentos cirúrgicos e as doenças infectoparasitárias representam a principal causa de óbito em UTIP.
Referências
- 1Souza DC, Troster EJ, Carvalho WB, Shin SH, Cordeiro AMG. Disponibilidade de unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal no município de São Paulo. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):453-460.
- 2Cutulo RA, Furtado Filho JRF, Botelho L. Perfil dos pacientes internados na unidade de terapia intensiva pediátrica do Hospital Infantil Joana de Gusmão no ano de 1993. ACM 1994; 23(2):95-100.
- 3Brasil. Ministério da Saúde (MS). Resolução GM/MS nº 7, 24 de fevereiro de 2010. Dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de Unidades de Terapia Intensiva e dá outras providências. Diário Oficial União 2010; 25 fev.
- 4Einloft PR, Garcia PC, Piva JP, Bruno F, Kipper DJ, Fiori RM. Perfil epidemiológico de dezesseis anos de uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev Saude Publica 2002; 36(6):728-733.
- 5Molina RCM, Marcon SS, Uchimura TT, Lopes EP. Caracterização das internações em uma unidade de terapia intensiva pediátrica, de um hospital escola da região Sul do Brasil. Cienc Cuid Saúde 2008; 7(Supl. 1):112-120.
- 6Gemke RJ, Bonsel GJ, Bught AJ. Outcome assessment and quality assurance in pediatric intensive care. In: Tibboel D, van der Voort E, editors. Intensive care in childhood - a challenge to future 2nd ed. Berlin: Springer; 1996. p. 117-132.
- 7Barbosa AP. Terapia intensiva neonatal e pediátrica no Brasil: o ideal, o real e o possível. J Pediatr (Rio J) 2004; 80(6):437-438.
- 8Alves MVMFF, Bissiguini PO, Nitsche MJT, Olbrich SRLR, Lis CHBL, Toso AR. Perfil dos pacientes internados em uma unidade de terapia intensiva pediátrica de um hospital escola do interior de São Paulo. Cienc Cuid Saúde 2014; 13(2):294-301.
- 9Lanetzki CS, Oliveira CAC, Bass LM, Abramovici S, Troster EJ. O perfil epidemiológico do Centro de Terapia Intensiva Pediátrico do Hospital Israelita Albert Einstein. Einstein 2012; 10(1):16-21
- 10El Halal MGS, Barbieri E, Filho RM, Trotta EA, Carvalho PRA. Admission source and mortality in a pediatric intensive care unit. Indian J Crit Care Med 2012; 16(2):81-86.
- 11Briassoulis G, Filippou O, Natsi L, Mavrikiou M, Hatzis T. Acute and chronic paediatric intensive care patients: current trends and perspectives on resource utilization. QJM 2004; 97(8):507-518.
- 12Khilnani P, Sarma D, Singh R, Uttam R, Rajdev S, Makkar A, Kaur J. Demographic profile and outcome analysis of a tertiary level Pediatric Intensive Care Unit. Indian J Pediatr 2004; 71(7):587-591.
- 13Parra ME, Gonzzáles AFE, Oshoa WC, Velez AQ. Morbmortalidad em la unidad de cuidados intensivos pediátricos del hospital universitario San Vicente de Paúl, Medellín, Colombia, 2001-2005. Iatreia 2008; 21(1):33-40.
- 14Embu HY, Yiltok SJ, Isamade ES, Nuhu SI, Oyeniran OO, Uba FA. Paediatric admissions and outcome in a general intensive care unit. Afr J Paediatr Surg 2011; 8(1):57-61.
- 15Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual técnico operacional do Sistema de Informações Hospitalares/Atualização, Versão 1 Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2011.
- 16Datasus. [homepage on the internet]. Morbidade hospitalar do SUS por local de internação nota técnica. [cited 2011 Feb 15]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nidescr.htm
» http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sih/nidescr.htm - 17Brasil. Portaria GM/MS nº 3.432, 12 de agosto de 1998. Estabelece critérios de classificação para as unidades de tratamento intensivo – UTI. Diário Oficial União 1998; 12 ago.
- 18Organização Mundial da Saúde (OMS). Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – Décima Revisão São Paulo: Edusp; 1994.
- 19Barbosa AP, Cunha AJLA, Carvalho ERM, Portella AF, Andrade MPF, Barbosa MCM. Terapia intensiva neonatal e pediátrica no Rio de Janeiro: distribuição de leitos e análise de equidade. Rev Assoc Med Bras 2002; 48(4):303-311.
- 20Saporiti A. Cuidados intensivos pediátricos: trabajo colaborativo sobre características de población y grupos de riesgos/ Pediatric intensive care: collaborative study on characteristics of population and high risk groups. J Pediatr (Rio J) 1999; 75(3):C2-C10.
- 21Drumond EF, Machado CJ, Vasconcelos MR, Franca E. Utilização de dados secundários do SIM, Sinasc e SIH na produção científica brasileira de 1990 a 2006. Rev bras estud popul 2009; 26(1):7-19.
- 22Escosteguy CG, Portela MC, Medronho RA, Vasconcellos MTL. AIH versus prontuário médico no estudo do risco de óbito hospitalar no infarto agudo do miocárdio no Município do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica 2005; 21(4):1065-1076.
- 23Travassos-Veras CM, Martins MS. A confiabilidade dos dados nos formulários de Autorização de Internação Hospitalar (AIH), Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica 1994; 10:3.
- 24Bittencourt SA, Camacho LAB, Leal MA. O Sistema de Informação Hospitalar e sua aplicação na saúde coletiva. Cad Saude Publica 2006; 22(1):19-30.
- 25Bertolini G, Ripamonti D, Cattaneo A, Apolone G. Pediatric risk of mortality: an assessment of its performance in a sample of 26 Italian intensive care units. Crit Care Med 1998; 26(8):1427-1432.
- 26Goodman DM, Wilde RA, Green TP. Oncology patients in the pediatric intensive care unit: room for optimism? Crit Care Med 2000; 28(11):3768-3769.
- 27Singhal D, Kumar N, Puliyel JM, Singh SK, Srinivas V. Prediction of mortality by application of PRISM score in intensive care unit. Indian Pediatr 2001; 7(38):714-719.
- 28Laphitz C, Assandri E, Ferreira Maia A, Ferrari AM. Derivación de pacientes pediátricos a unidades de cuidados intensivos: estudio de cuatro años en una Institución de Asistencia Médica Colectiva. Rev Med Uruguay 2005; 21(3):215-221.
- 29Abebe T, Girmay M, Michael G, Tesfaye M. The epidemiological profile of pediatric patients admitted to the general intensive care unit in an ethiopian university hospital. Int J Gen Med 2015; 8:63-67.
- 30Chalom R, Raphaely RC, Costarino Junior AT. Hospital cost of pediatric intensive care. Crit Care Med 1999; 27(10):2079-2085.
- 31Flori HR, Glidden DV, Rutherford GW, Matthay AM. Pediatric acute lung injury: prospective evaluation of risk factors associated with mortality. Am J Respir Crit Care Med 2005; 171(9):995-1001.
- 32Aragão RCF, Albuquerque MFPM, Mello MJG, Ximenes RAA. Risk factors associated with death in children admitted to a paediatric intensive care unit. Journal of tropical pediatrics 2001; 47(2):86-91.
- 33Mello MJG, Albuquerque MFPM, Lacerda HR, Barbosa MTS, Ximenes RAA. Risk factors for healthcare-associated infection in a pediatric intensive care unit. Pediatr Crit Care Med 2010; 11(2):246-252.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Mar 2019
Histórico
- Recebido
28 Out 2016 - Revisado
21 Mar 2017 - Aceito
23 Mar 2017