Resumo
Por meio da criação do Sistema Único de Saúde (SUS), os processos de planejamento ganham importância intrínseca para a formulação de políticas públicas de saúde e para subsidiar a tomada de decisões, a implementação de ações e a obtenção de resultados. Como as ferramentas de planejamento são fundamentais para orientar a gestão, é necessário o cuidado nas articulações entre elas, a fim de alcançar a integração dos serviços de saúde, cujo resultado é melhor, mais efetivo e mais barato para o governo. Da mesma forma, processos contínuos de monitoramento e avaliação (M&A) permitem medir e rastrear informações estratégicas, melhorando a qualidade dos sistemas de informação em saúde e dos indicadores de saúde, bem como do desempenho operacional e organizacional. Neste artigo, apresentamos a recente iniciativa de implementação do sistema de M&A na Secretaria de Estado da Saúde do Distrito Federal (SES/DF) e os processos envolvidos em sua qualificação.
Palavra-chave
Planejamento; Monitoramento; Avaliação; Saúde; Sala de situação
Introdução
Sob a influência da teoria desenvolvimentista da Comissão Econômica para América Latina (CEPAL), visando ao crescimento econômico e à racionalização da política substitutiva a ser operada pelo Estado, surge na América Latina na década de 1960, o Planejamento em Saúde baseado em uma metodologia de programação de recursos de saúde aliado às análises de custo-benefício, desenvolvida pelo Centro de Desenvolvimento (CENDES), órgão criado na Venezuela em parceria com a Universidade Central e apoiado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)11. Organización MS, Organización PS. Problemas conceptuales y metodológicos de la programación de la salud. Washington: World Health Organization; 1965. Publicación Cientifica nº 111..
Mesmo com os avanços advindos, o método foi qualificado como excessivamente tecnocrático, economicista, com baixa capacidade de regulação pelo Estado, indefinição de financiamento e dominado por interesses privados11. Organización MS, Organización PS. Problemas conceptuales y metodológicos de la programación de la salud. Washington: World Health Organization; 1965. Publicación Cientifica nº 111..
Para Testa22. Testa M. Estrategia, coherencia y poder en las propuestas de salud – Parte I. Cuadernos Médico Sociales 1987; (38)4:24.a fraqueza do setor público e a desconsideração dos aspectos políticos e macro-institucionais envolvidos nos processos de formulação de políticas e planos, contribuíram para invalidar parcialmente a proposta do CENDES. Como alternativa, surge o conjunto de vertentes do planejamento estratégico que propõe a adesão de outros atores e a viabilidade política dos planos.
Segundo Testa33. Testa M. Estrategia, coherencia y poder en las propuestas de salud. Parte II. Cuadernos Médico Sociales 1987; (39)3:28., embora haja uma ênfase em atores políticos, as matrizes fundadoras e as diversas correntes políticas, que animaram o debate entre correntes de planejamento situacional e estratégico na América Latina, se fundamentavam na concepção marxista de estruturas de classes sociais.
A emergência dessa concepção de planejamento converge historicamente com a construção do movimento de reforma da saúde pública nos países latinos e a luta pela redemocratização dos países que estavam sobre regimes ditatoriais.
A partir da crítica ao planejamento como resultante de um único ator, o Estado, desponta uma visão mais plural, segundo a qual a dinâmica estatal e de intervenção social pressupõe situações de compartilhamento de poder, que suscita a necessidade de planejar em momentos de conflito e de cooperação entre os atores. Condições de exceção (regimes autoritários) exacerbaram o conflito e a relação de desconfiança reforçou contextos estratégicos.
O primeiro marco dessa evolução está representado pelo documento ‘Formulação de Políticas de Saúde’ (1975) do Centro Pan-Americano de Planejamento de Saúde (CPPS). Ele concebe o planejamento como um processo que, embora dominado pelo Estado, supõe a mobilização de vários atores e introduz a necessidade da análise de viabilidade política e da estratégia. De acordo com os dois maiores expoentes dessa corrente, Testa e Matus, o planejamento normativo (PN) cede lugar ao planejamento estratégico (PE)22. Testa M. Estrategia, coherencia y poder en las propuestas de salud – Parte I. Cuadernos Médico Sociales 1987; (38)4:24.,44. Matus C. Política, planejamento e governo. Brasília: IPEA; 1993..
Com a democratização, é garantida a institucionalização e a legitimação dos espaços de participação da sociedade, na interface entre a sociedade civil, a política e o poder administrativo. Matus55. Matus C. Adeus, senhor Presidente. Governantes governados. São Paulo: Edições Fundap; 1997. enfatiza que num contexto em que vários projetos de sociedade/atores se encontram em confronto constante, além do reconhecimento do conflito e sua tematização, é preciso fortalecer a capacidade de escuta do outro e de interação e negociação. Por isso, considera-se que uma concepção pluralista e comunicativa do planejamento tem maior aplicabilidade.
Nesta conjuntura, segundo Rivera e Artmann66. Rivera FJU, Artmann E. Planejamento e gestão em saúde: histórico e tendências com base numa visão comunicativa. Cien Saude Colet 2010; 15(5):2265-2274., identificam-se dois grandes modelos: o primeiro baseado no enfoque problema-solução, correspondente ao planejamento estratégico-situacional e da qualidade total, o qual considera um modelo de planejamento que vai do presente para o futuro e, o segundo, que trata o PE a partir de cenários, prevendo o planejamento do futuro para o presente, utilizando como modelo a prospectiva estratégica de Godet77. Godet M. Manual de prospectiva estratégica: da antecipação à ação. Lisboa: Cepes; 1993..
Considerando os aspectos da política, do planejamento e da gestão em saúde no Brasil, Paim e Teixeira88. Paim JS, Teixeira CF. Política, planejamento e gestão em saúde: balanço do estado da arte. Rev Saude Publica 2006; 40(n. spe):73-78.citam a divisão histórica proposta por Levcovitz et al.99. Levcovitz E, Baptista TWF, Uchôa SAC, Nespoli G, Mariani M. Produção de conhecimento em política, planejamento e gestão em saúde e políticas de saúde no Brasil (1974-2000). Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2002. (Série Técnica Projeto de Desenvolvimento de sistemas e Serviços de Saúde, 2).: o primeiro período (1974-1979) analisou o sistema de saúde e seus determinantes econômicos, políticos e sociais. O segundo (1980-1986) discute a disseminação da reforma e associação sociopolítica. O terceiro (1987-1990), o ordenamento jurídico-legal dos princípios e diretrizes do projeto de reforma. O quarto (1991-1998) busca a definição do papel de cada esfera de governo e a elaboração de instrumentos de gestão. O quinto período (1999-2000) trata da regulamentação do financiamento e a organização dos modelos de gestão e de atenção da rede regionalizada de serviços e o sexto e último período, a busca de estabilidade do financiamento (emenda constitucional 29) e o desenvolvimento da atenção básica, com a expansão do Programa da Saúde da Família (PSF). Nesse mesmo período foi identificada a existência de outras quatro correntes de planejamento/gestão em saúde99. Levcovitz E, Baptista TWF, Uchôa SAC, Nespoli G, Mariani M. Produção de conhecimento em política, planejamento e gestão em saúde e políticas de saúde no Brasil (1974-2000). Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2002. (Série Técnica Projeto de Desenvolvimento de sistemas e Serviços de Saúde, 2)..
A partir da década de 1990, ocorre o deslocamento do protagonismo do planejamento central e das modalidades estratégicas para um planejamento por objetivos e metas sob um regime de monitoramento e avaliação (M&A).
Segundo Merhy1010. Merhy EE. O SUS e um dos seus dilemas: mudar a gestão e a lógica do processo de trabalho em saúde (um ensaio sobre a micropolítica do trabalho vivo). In: Fleury S, organizadora. Saúde e democracia: a luta do CEBES. São Paulo: Lemos Editorial; 1997. avaliar consiste fundamentalmente em fazer um julgamento de valor a respeito de uma intervenção ou sobre qualquer um dos seus componentes. A avaliação constitui um instrumento essencial de apoio à gestão pela sua capacidade de melhorar a qualidade da tomada de decisão. No entanto, seu uso ainda é incipiente na gestão de serviços de saúde1111. Brousselle A, organizador. Avaliação: conceitos e métodos. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2011.,1212. Contandriopoulos AP. Avaliando a institucionalização da avaliação. Cien Saude Colet 2006; 11(3):705-711..
Habicht et al.1313. Habicht JP, Victora CG, Vaughan JP<italic>.</italic> Evaluation designs for adequacy, plausibility and probability of public health programme performance and impact. Int J Epidemiol 1999; 28(1):10-18. destacam que o monitoramento é uma ação que permite a observação, a medição e a avaliação contínua. É fundamental para o acompanhamento rotineiro de informações prioritárias, tanto para o processo de implementação de um programa, como para o acompanhamento de seu desempenho operacional e finalístico. Partindo desse pressuposto, institucionalizar a avaliação e o monitoramento em âmbito da gestão nacional, regional, municipal ou local torna-se essencial, de forma a integrá-la em um sistema organizacional.
Diante deste cenário, o processo de planejamento, monitoramento e avaliação da SES/DF, prioriza a integração entre os instrumentos de planejamento e gestão: o Plano Plurianual (PPA), a Programação Anual de Saúde (PAS), o Plano Distrital de Saúde (PDS), o Acordo de Gestão do Governador (AR), o Acordo de Gestão Regional (AGR) e o Pacto Interfederativo.
Para isso, a SES/DF vem implantando um sistema de M&A, entendido como um conjunto de atividades articuladas, sistemáticas e formalizadas de produção, registro, acompanhamento e análise das informações estratégicas que permite, além de uma visão integral do PE, qualificar o processo de tomada de decisão.
Neste artigo apresentamos as iniciativas recentes para a implantação do sistema de M&A da SES e os processos envolvidos na qualificação do M&A.
A descentralização do Sistema de Saúde do Distrito Federal
Em 2016, a população do DF foi estimada em 2.977.216 habitantes1414. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População, projeção. Rio de Janeiro: IBGE; 2016. [acessado 2018 Maio 20]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/
https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/p... . No entanto, considerando a Região Integrada de Desenvolvimento do Entorno do Distrito Federal (RIDE-DF), criada pela Lei Complementar (LC) nº 94, de 19 de fevereiro de 1998 e regulamentada pelo Decreto Presidencial nº 7.469, de 4 de maio de 2011, apresenta uma população estimada de 1.293.768, totalizando 4.208.598 habitantes1515. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População, projeção. Rio de Janeiro: IBGE; 2015. [acessado 2018 Maio 20]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/
https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/p... .
Hartz1616. Hartz ZMA. Meta-avaliação da gestão em saúde: desafios para uma nova saúde pública. Cien Saude Colet 2012; 17(4):829-837. ressalta que diferentemente dos demais estados do país, é uma Unidade da Federação (UF) com características peculiares, possuindo funções político-administrativas de estado e município. Como estado possui a responsabilidade de articulação por meio de atividades de planejamento, coordenação, monitoramento e avaliação de toda a política de saúde, enquanto que como município tem contato direto com a população prestando serviços de atenção básica, média e alta complexidade.
Com a finalidade de aprimorar a administração, o território do DF foi dividido em 31 Regiões Administrativas (RA), das quais apenas 19 possuem poligonais definidas. Garcia1717. Garcia RC. Subsídios para organizar avaliações da ação governamental. Planejamento e Políticas Públicas 2001; 23:7-70. enfatiza que esses elementos são balizadores para a definição das políticas públicas de saúde nos quais as ações devem ser pensadas não só para o conjunto da população brasiliense, mas também para o entorno que exerce forte pressão em diversas áreas setoriais: saúde, educação, segurança e habitação.
A SES tem a responsabilidade de gerir o SUS no âmbito do DF, além de ter papel fundamental nas discussões sobre as ações e serviços de saúde no âmbito da RIDE.
Até 2015, a SES/DF manteve um modelo de gestão verticalizada e concentrada na Administração Central (ADMC). A partir da publicação do Decreto nº 36.918 de 26/11/2015, e alterações subsequentes de sua estrutura, a Secretaria passou a ser composta pelas: Administração Central (ADMC), Unidades de Referência Assistencial (URA), Unidades de Referência Distrital (URD) e Superintendências das sete Regiões de Saúde (Central, Centro Sul, Oeste, Sul, Sudoeste, Norte e Leste) que são as menores unidades de gestão do território. Em 2017, foi publicado o Regimento Interno das Superintendências de Regiões de Saúde, que definiu os limites de responsabilidade de cada unidade organizacional1818. Brasil. Decreto nº 7.469, de 4 de maio de 2011. Regulamenta a Lei Complementar no 94, de 19 de fevereiro de 1998, que autoriza o Poder Executivo a criar a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno - RIDE e instituir o Programa Especial de Desenvolvimento do Entorno do Distrito Federal. Diário Oficial da União 2011; 5 maio..
A fim de ordenar os esforços de desconcentração do modelo de gestão, foi desenvolvido o Programa de Gestão Regional (PRS) no qual cada região é representada por uma superintendência que celebra um Acordo de Gestão Regional (AGR), acordo este que é um instrumento formal de pactuação entre a ADMC e cada uma das sete superintendências1919. Brasil. Decreto nº 38.017, de 21 de fevereiro de 2017. Diário Oficial do Distrito Federal 2017; 22 fev. Republicação: Diário Oficial do Distrito Federal 2017; 23 fev.. Nesse processo, a ADMC, além de garantir às regiões as condições necessárias para o desenvolvimento das atividades, deve desenvolver estratégias de incentivos institucionais de modo a implantar um modelo de gestão por resultados1818. Brasil. Decreto nº 7.469, de 4 de maio de 2011. Regulamenta a Lei Complementar no 94, de 19 de fevereiro de 1998, que autoriza o Poder Executivo a criar a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno - RIDE e instituir o Programa Especial de Desenvolvimento do Entorno do Distrito Federal. Diário Oficial da União 2011; 5 maio..
Para orientar os processos decisórios dos gestores regionais, e aperfeiçoar o processo de monitoramento e avaliação dos AGR, foi definida a metodologia de M&A a ser utilizada, foi pactuada uma matriz de metas e indicadores, e foram identificados os pontos de atenção à saúde, a relação das ações e serviços de cada ponto de atenção, os serviços habilitados, o faturamento anual, o custo total por unidade e, ainda, foi elaborada a matriz de responsabilidades.
Outra iniciativa, voltada para o alinhamento estratégico, a qualidade da gestão e a melhoria de desempenho, foi a criação do Escritório de Processos, que tem como objetivo a institucionalização de rotinas que promovam a organização, o monitoramento, a avaliação e o alcance de resultados nos diferentes processos organizacionais desenvolvidos pelos seus servidores para o cumprimento da sua missão institucional. Suas competências são desenvolver, recomendar e multiplicar metodologias e melhores práticas da gestão de processos; conhecer e apoiar o mapeamento dos processos organizacionais desenvolvidos pela instituição e disponibilizar as informações sobre eles, promovendo a sua uniformização e descrição em manuais; fomentar o M&A de desempenho dos processos organizacionais, de forma contínua, mediante a construção de indicadores; e implantar melhorias nos processos visando aumentar a eficiência, a eficácia e a efetividade.
Esta iniciativa está alinhada com a metodologia adotada pela Governadoria, Secretaria de Estado da Casa Civil, Secretaria de Estado de Planejamento, Orçamento e Gestão e das Relações Institucionais e Sociais. Apesar de recente, todos os processos das áreas técnicas já estão mapeados e em processo de validação e apreciação1919. Brasil. Decreto nº 38.017, de 21 de fevereiro de 2017. Diário Oficial do Distrito Federal 2017; 22 fev. Republicação: Diário Oficial do Distrito Federal 2017; 23 fev..
Alinhamento dos instrumentos de planejamento da SES/DF
O planejamento no SUS é uma função gestora que, além de requisito legal, é um dos mecanismos relevantes para assegurar a unicidade e os princípios constitucionais. Expressa tanto as responsabilidades dos gestores de cada esfera de governo em relação à saúde da população do território, quanto a integração da organização sistêmica. A tarefa de planejar exige conhecimento técnico que se expressa em instrumentos e ferramentas desenvolvidas em processos de trabalho, de forma a orientar e integrar as ações e os serviços de saúde2020. Distrito Federal. Secretaria de Saúde (SS). [Internet]. Brasília: SSDF; 2012. [acessado 2018 Maio 20]. Disponível em: http://www.saude.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2017/11/RAG_2012-Parte_I.pdf
http://www.saude.df.gov.br/wp-conteudo/u... .
Gottems et al.2121. Gottems LB, Oliveira A, Roque MV, Neves MJ, Oliveira CFDS. O programa de gestão regional da saúde no Distrito Federal. X Congresso Consad, 2017, 13p.ressaltam que os instrumentos de planejamento de gestão devem estar interligados e em consonância com os instrumentos de planejamento orçamentário. Blumm et al.2222. Blumm MHN, Bauer CAB, Gama GMS, Costa MKA, coordenação; Almeida MO colaboração. Manual de gestão de processos da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Brasília: Subsecretaria de Planejamento, Regulação, Avaliação e Controle; 2014. apontam que, em 2012, o Planejamento Estratégico Situacional (PES) da SES/DF, não estava compatível com o PPA (2012-2015) e o PDS (2012-2015) em suas estratégias e metas gerando uma incongruência entre as metas e seus indicadores, inadequada utilização de recursos e análises distorcidas dos resultados.
Diante deste quadro, no período de 2015-2016, a área de planejamento da Secretaria de Saúde promoveu oficinas com a participação de gestores e profissionais das diversas áreas assistenciais, para elaboração do PE, PDS, PPA e PES, construindo de forma participativa o alinhamento dos instrumentos de planejamento e programação em saúde (Figuras 1, 2 e 3), subsidiando a elaboração da PAS e a Proposta da Lei Orçamentária Anual (PLOA)2323. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual de planejamento no SUS. Brasília: Fiocruz, MS; 2016..
A partir de maio de 2017, essas iniciativas foram reforçadas com a implantação de processos de análise e avaliação de resultados, por meio de reuniões específicas e periódicas entre os gestores da alta direção, denominadas Reuniões de Avaliação de Resultados (RAR)2424. Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Gestão pública em saúde: programação anual de saúde e relatório anual de saúde. São Luís: UNA-SUS/UFMA; 2016. (Guia de Gestão Pública em Saúde, Unidade V).. Essas reuniões contribuem para a construção de referências e evidências que subsidiam a tomada de decisão em relação à manutenção, melhoria ou reprogramação das ações planejadas, reforçando na agenda estratégica da instituição a importância do processo do PDCA (planejar, executar, verificar e agir corretivamente).
Este modelo de acompanhamento foi elaborado de forma a instrumentalizar as áreas técnicas com a perspectiva de organizar de forma sistemática o monitoramento e o acompanhamento de resultados pactuados no PE.
As ferramentas de M&A, gestão e disseminação das informações da SES/DF
O monitoramento é fundamental para o acompanhamento rotineiro de informações prioritárias de uma programação, tanto para o desempenho operacional como para seu desempenho finalístico. A avaliação, por sua vez, traz a visão de juízo de valor que auxilia na tomada de decisão, sendo capaz de subsidiar mudanças na construção e/ou na implementação de programas, projetos ou políticas de saúde2525. Distrito Federal. Secretaria de Saúde (SS). Planejamento e gestão em saúde. Brasília: SSDF; 2012. [acessado 2018 Maio 30]. Disponível em: http://www.saude.df.gov.br/planejamento-e-gestao-em-saude/
http://www.saude.df.gov.br/planejamento-... .
Na visão de Felisberto2626. Felisberto E. Da teoria à formulação de uma Política Nacional de Avaliação em Saúde. Cien Saude Colet 2006; 11(3):553-563., a disseminação da cultura avaliativa e sua incorporação às rotinas, qualifica as ações dos tomadores de decisão (profissionais de saúde, planejadores, gestores e representantes de organizações da sociedade civil), produzindo mudanças nesses processos.
Carvalho et al.2727. Carvalho ALB, Souza MF, Shimizu HE, Senra IMVB, Oliveira KC. A gestão do SUS e as práticas de monitoramento e avaliação: possibilidades e desafios para a construção de uma agenda estratégica. Cien Saude Colet 2012; 17(4):901-911. comenta que apesar da disponibilidade de diversos sistemas de informação voltados à operação de estabelecimentos assistenciais, gerência de serviços, investigação ou controle de diversas doenças, a sua utilização tem sido preconizada para o planejamento de intervenções sobre a realidade sanitária. Todavia, o uso de informações estratégicas e qualificadas em saúde, ainda é um desafio para os gestores, pois muitas vezes, os vários sistemas de informação em uso admitem dados duplicados, têm dificuldades de acesso e não contam com relatórios de análise gerencial2828. Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS). Os sistemas de informação em Saúde. In: Conass. Coleção Progestores – Para entender a Gestão do SUS. Sistema Único de Saúde. Brasília: CONASS; 2007. p.74-101..
As ferramentas de tecnologias da informação (TI) têm impulsionado as estratégias de monitoramento, ampliando as possibilidades de avaliação da situação de saúde. O uso dessas ferramentas tem permitido integrar diferentes sistemas de informação e contribui no processo de monitoramento em saúde.
Nesse cenário, para realizar o monitoramento do PE, a SES/DF adotou um conjunto de medidas que permitem o acompanhamento da execução de seus resultados e auxilia na tomada de decisões.
Em 2016 foi desenvolvido um instrumento gerencial dos Instrumentos de Planejamento denominado Sistema de Planejamento da SES/DF (SESPLAN). Este sistema permite o registro de dados das diversas áreas da secretaria, compartilhando as informações do ciclo do planejamento, ampliando a compreensão dos macroprocessos, desde os finalísticos até os de sustentação e a análise dos resultados. É composto de seis módulos:
Metas e Indicadores: apresenta as pactuações, monitoramento e resultados com análise detalhada;
Programação Anual de Saúde (PAS): permite o acompanhamento da execução das ações;
Execução Orçamentária (LOA): apresenta a programação e detalhamento das despesas, considerando a disponibilidade financeira;
Sistema de Acompanhamento Governamental (Etapa SAG): acompanha a produção e o recurso orçamentário;
Produção/Atividades: permite o registro de informações complementares do Objetivo Estratégico (OE) pactuado;
Relatórios: provê a contextualização das informações e resultados das pactuações e subsidia as prestações de contas da SES/DF.
O SESPLAN se mostrou eficiente e preencheu uma lacuna na integração dos instrumentos de planejamento e M&A. Contudo, o volume crescente de dados, acessos e número de usuários usando a rede intranet da Secretaria, por vezes, ocasionou a perda dos registros de dados e confiabilidade das informações. Uma das limitações no uso do sistema se deve ao fato de ter sido desenvolvido em plataforma Excel.
Em 2018, se iniciou a informatização do SESPLAN em tecnologia livre e em plataforma web, com uma base de dados relacionais. Dessa forma, fica garantida a integridade dos dados e o acesso dos usuários através de qualquer navegador web.
Com a implantação do sistema, apenas usuários autorizados possuem acesso aos dados, permitindo o registro de log das atividades realizadas, garantindo a integridade e auditoria das informações registradas. Os resultados dos indicadores, antes registrados manualmente no sistema, são, em sua grande maioria, calculados de forma automática pela ferramenta, tornando possível a análise durante todo o ciclo de monitoramento e em tempo oportuno para avaliação. Os resultados são exibidos em um painel de monitoramento interativo, que permite o detalhamento das informações registradas.
Outra atividade de monitoramento realizada é em relação ao credenciamento e habilitação de serviços de saúde, através de registro de dados em planilhas Excel, feito de forma fragmentada pelas várias áreas técnicas envolvidas, dificultando desta forma, o compartilhamento de informações e o monitoramento e a avaliação integral do processo pelos gestores.
A fim de suprir essa deficiência foi construído o Sistema de Gestão de Credenciamento e Habilitação (SIGECH), um sistema informatizado em plataforma web, que permite o acesso simultâneo de vários usuários, o registro de informações sobre as portarias vigentes, os serviços habilitados e com potencial de habilitação, os planos de ação em execução para resolução de “não conformidades” apontadas pela vigilância sanitária, além do acompanhamento dos prazos estabelecidos para o credenciamento e as habilitações de serviços de saúde. Por meio de relatórios e painéis gráficos, todas as etapas/fases do processo são visualizadas, o que permite o monitoramento e a avaliação detalhada com vistas ao cumprimento dos prazos definidos.
Gestão de indicadores
Segundo Santos2929. Santos LC. Crítica a modelos de avaliação de desempenho de sistemas de saúde [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2015., para o desafio de se realizar ações de saúde mais efetivas para atender aos usuários existe a necessidade de construir e utilizar indicadores de M&A. Indicadores podem ser entendidos como medidas quantitativas e/ou qualitativas, com intencionalidades, a partir de registros dos fatos ou fenômenos da realidade. Conhecer a realidade sempre será um desafio, resultando em representações que podem estar mais ou menos distantes dela.
A construção e o uso de indicadores – aptos a trazer informações mais precisas e essenciais sobre os aspectos da realidade, subsidiando a tomada de decisões voltadas para os direitos e o bem-estar de todos – ainda não é uma prática muito adotada no âmbito de governos, gestores, entidades não governamentais que interagem com o SUS e mesmo do controle social em todas as suas dimensões.
Santos2929. Santos LC. Crítica a modelos de avaliação de desempenho de sistemas de saúde [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2015. enfatiza que os indicadores de saúde, quando gerados de forma regular em um sistema dinâmico, podem ser instrumentos valiosos para a gestão e a avaliação da situação da saúde e das ações em todos os níveis da Saúde Pública.
Para isso, é importante estabelecer um processo de M&A das políticas públicas de saúde, pois na gestão do SUS, há mais de duas décadas, ainda utiliza conceitos, metodologias e os mais diversos instrumentos. Berreta et al.3030. Berreta IQ, Lacerda JT, Calvo MCM. Modelo de avaliação da gestão municipal para o planejamento em saúde. Cad Saude Publica 2011; 27(11):2143-2154. citam que esse modus operandi, ao mesmo tempo em que possibilitou a disseminação e o aprofundamento dessa prática em áreas estratégicas, necessita de uma visão mais sistêmica, de forma a contribuir com o processo de implementação de políticas e programas.
Neste sentido, foram selecionados indicadores com aferições sistemáticas para auxiliar no acompanhamento e desempenho do sistema de saúde, subsidiando análises estratégicas e operacionais, a prestação de contas e a concretização dos objetivos e metas pactuados na gestão 2016 – 2019.
Concomitante com a seleção de indicadores foi a elaboração de uma ficha técnica de qualificação de indicadores, com campos pré-definidos que detalham as principais características de cada indicador, incluindo sua memória de cálculo, interpretação e limitações. Está em elaboração um catálogo, a ser disponibilizado na Sala de Situação em Saúde da SES/DF, contendo todos os indicadores monitorados pelos instrumentos de gestão.
Outra iniciativa em curso é a utilização de uma abordagem de monitoramento e avaliação cooperativa de situações de risco e de vulnerabilidade social do Território, tendo a perspectiva de torná-lo Saudável e Sustentável, tomando como referência a Agenda 2030 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Para isso, está em elaboração metodologia para a avaliação de indicadores relacionados a metas do ODS nᵒ 3 “Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades” utilizando-se de um sistema interativo de análise, monitoramento e avaliação do Território com a participação da comunidade local e da ativação de redes sócio-técnicas.
Propõe-se ainda estabelecer um espaço colaborativo no Portal da Sala de Situação em Saúde, para disseminação das informações das Redes. O primeiro local em que está sendo testada a metodologia em forma de Projeto é conhecido como Cidade Estrutural, referida também como Vila Estrutural que compõe a região administrativa do Setor Complementar de Indústria e Abastecimento (SCIA) no DF.
Sala de Situação em Saúde (SSS) da SES/DF
A questão do M&A de políticas públicas responde a uma demanda da sociedade por uma gestão pública de excelência e planejada, um novo modelo de gestão dos recursos públicos e que tem se fortalecido desde meados da década de 19903131. Brasil. Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011. Regulamenta a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde – SUS, o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. Diário Oficial da União 2011; jun 29.. Um componente importante deste processo é a disseminação destas informações com o objetivo de potencializar a transparência de gestão e a regulação social.
A permanente disponibilidade de informações auxilia os gestores na concepção e operacionalização das atividades de planejamento, no subsídio à tomada de decisões e deve explicitar a intencionalidade das políticas, programas e projetos3232. Rede Interagencial de Informação para a Saúde (Ripsa). Rede Interagencial de Informação para a Saúde Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. 2ª ed. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2008.. As informações e o modelo de análise devem ser acessíveis e ao alcance da sociedade, conferindo ao M&A a função pedagógica e reflexiva no processo de planejamento3333. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Planejamento estratégico do Ministério da Saúde: 2011 – 2015: resultados e perspectivas. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2013..
A SSS da SES/DF é um espaço físico e virtual, se constituindo em um instrumento integrador de dados e informações dos principais sistemas de informações em saúde em uso na SES, permitindo a democratização de informações estratégicas, como por exemplo, indicadores do estado de saúde da população. A SSS auxilia na análise dos dados sanitários e no diagnóstico situacional, possibilitando a identificação dos problemas prioritários da população em seus territórios e as necessidades locais de saúde, subsidiando a gestão no planejamento das ações de saúde.
Partindo dos princípios e diretrizes da Política Nacional de Informação e Informática em Saúde (PNIIS)3434. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Informação e Informática em Saúde. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2016., da Lei de Acesso à Informação (LAI)3535. Brasil. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Diário Oficial da União 2011; 18 nov. e do Controle Social, que apontam para a democratização das informações de saúde, a SES/DF, em 2017, formalizou um convênio com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que estabelece o apoio à qualificação e ao aperfeiçoamento do M&A, da gestão da informação e para a implantação de uma SSS.
É essencial para fundamentar o processo de qualificar as informações produzidas, conhecer a fonte de dados e avaliar se os mesmos são válidos e confiáveis, condição fundamental para a análise objetiva das condições de saúde, assim como para decisões baseadas em evidências.
Também é fundamental conhecer as principais demandas por informação da população, encaminhadas através da Ouvidoria ou pelo Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão (e-SIC), com o propósito de disponibilizá-las no Portal da Sala de Situação e dessa forma aumentar a transparência ativa da SES.
Portanto, em termos de uso e funções, a SSS da SES/DF, está preparada não somente para o fornecimento de informações qualificadas para subsidiar o processo de planejamento, monitoramento e avaliação das ações em saúde, mas também, para aumentar a transparência ativa da instituição, em total alinhamento com a iniciativa internacional de Parceria para o Governo Aberto, que pretende difundir e incentivar globalmente práticas governamentais relacionadas à transparência dos governos, ao acesso à informação pública e à participação social (Figura 4).
Sala de Situação como elemento integrador do Sistema de Monitoramento e Avaliação da SES/DF.
Nesse sentido, também estão sendo realizadas pesquisas e estudos sobre tecnologias de informação e comunicação (TIC), disponíveis no mercado nacional e internacional e suas possibilidades de uso na Sala de Situação e demais componentes do sistema de M&A, com o objetivo de modernização dos processos e melhoria da organização da infraestrutura atual, frente às necessidades da SES/DF.
Ressalta-se a utilização de softwares livres com padrões, tecnologias, procedimentos e mecanismos de controle necessários para atender às condições de disseminação e compartilhamento de dados e informações públicas no modelo de Dados Abertos, em conformidade com os padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico (ePING).
A SSS integra o sistema de M&A da SES/DF e contribui para o acompanhamento dos diversos instrumentos de gestão pactuados e seus principais indicadores, com o intuito de subsidiar análises estratégicas, a prestação de contas, a concretização dos objetivos e das metas pactuadas na gestão 2016 – 2019.
A capacitação de servidores envolvidos no processo de planejamento, monitoramento e avaliação é mais um elemento de sustentabilidade a um processo de M&A de qualidade. E por acreditar nisso, a SES/DF promoverá no ano de 2019, por meio de parceria com a Fiocruz, um curso EAD de especialização (100 vagas) e outro de mestrado profissional (35 vagas), ambos em Avaliação em Saúde.
Considerações finais
O PE da SES/DF objetiva o aprimoramento da gestão e a qualidade das ações, programas e serviços de saúde, e para isso instituiu como uma das suas prioridades, a implantação de um sistema de M&A, se utilizando da SSS, para disseminar informações estratégicas e de qualidade, de forma organizada, sistêmica, com base técnico-científica, disponibilizadas em tabelas, gráficos, mapas, documentos técnicos ou relatórios estratégicos, facilitando ao gestor, ao trabalhador e ao cidadão que utiliza o SUS, conhecer a realidade da saúde da população do DF.
De outra forma, as reuniões de avaliação de resultados (RAR), outra atividade que integra o sistema de M&A da SES/DF além de contribuir para a construção de referências e evidências que subsidiam a tomada de decisão, são espaços de discussão que propiciam a formação do conhecimento no âmbito organizacional, pois possibilitam a interação do conhecimento tácito e o explícito de cada um dos participantes e, dessa forma, contribuem para o amadurecimento institucional.
Espera-se uma avaliação contínua dos gestores a respeito dos mecanismos e instrumentos disponíveis no sistema de M&A da SES/DF e sua capacidade de demandar e produzir informações sobre o desempenho e os resultados dos programas de saúde, com vistas à sua utilização, contribuição para o aprendizado institucional e o aperfeiçoamento das políticas públicas.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
27 Jun 2019 - Data do Fascículo
Jun 2019
Histórico
- Recebido
15 Jun 2018 - Revisado
06 Fev 2019 - Aceito
26 Mar 2019