Perda de qualidade do sono e fatores associados em mulheres climatéricas

Loss of quality of sleep and associated factors among menopausal women

Agamenon Monteiro Lima Josiane Santos Brant Rocha Viviane Margareth Chaves Pereira Reis Marise Fagundes Silveira Antônio Prates Caldeira Ronilson Ferreira Freitas Daniela Araújo Veloso Popoff Sobre os autores

Resumo

O objetivo deste artigo é identificar a prevalência de perda da qualidade do sono em mulheres climatéricas e os fatores associados. Estudo quantitativo, transversal e analítico, cujas variáveis foram investigadas por questionário estruturado/pré-testado e pelo Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh, em 819 mulheres climatéricas assistidas pela Estratégia Saúde da Família. Regressão de Poisson simples foi utilizada para triagem das variáveis (p < 0, 25). Para a modelagem hierarquizada foi utilizada a regressão de Poisson, adotando nível de significância de 5%. Identificou-se perda de qualidade do sono em 67% da amostra. Variáveis como idade avançada (RP = 1,09; IC = 1,03 – 1,16), sintomas climatéricos moderados e intensos (RP = 1,18; IC = 1,10 – 1,27), ansiedade moderada e grave (RP = 1,17; IC = 1,10 – 1,25), depressão moderada/grave (RP = 1,08; IC = 1,01 – 1,15) e artrite/artrose/reumatismo (RP = 1,07; IC = 1,01 – 1,14) demonstraram associações estatisticamente significativas com a perda de qualidade do sono. A perda de qualidade do sono foi altamente prevalente na população estudada. Os fatores associados à perda da qualidade do sono foram idade avançada, sintomas climatéricos de moderados a intensos, ansiedade e depressão moderada a intensa e presença de artrite/artrose/reumatismo.

Saúde da mulher; Climatério; Sono

Abstract

The scope of this article is to identify the prevalence of the loss of quality of sleep and associated factors among menopausal women. It is a quantitative, cross-sectional and analytical study, the variables of which were investigated by applying a structured/pre-tested questionnaire and the Pittsburgh Sleep Quality Index with 819 menopausal women cared for under the Family Health Strategy. Simple Poisson regression was used to screen the variables (p < 0.25). For multiple analysis, Poisson regression was used based on a hierarchical model, at a significance level of 5%. Loss of quality of sleep was identified in 67% of the sample. Variables such as advanced age (PR = 1.09; CI = 1.03-1.16), moderate and severe menopausal symptoms (PR = 1.18; CI = 1.10-1.27), moderate to severe anxiety (PR = 1.17; CI = 1.10-1.25), moderate to severe depression (PR = 1.08; CI = 1.01-1.15) and arthritis/arthrosis/rheumatism (PR = 1. 07; CI = 1.01 - 1.14) revealed statistically significant associations with loss of quality of sleep. The loss of quality of sleep was highly prevalent in the population studied. Factors associated with loss of quality of sleep were advanced age, moderate to severe menopausal symptoms, moderate to severe anxiety and depression, and the presence of arthritis/arthrosis/rheumatism.

Women’s health; Menopause; Sleep

Introdução

O Brasil vivencia profunda mudança em sua estrutura etária, cujas principais características apontam para o envelhecimento populacional e acentuado aumento do número de mulheres, fatores estes um grande desafio para o setor de saúde brasileiro11. Gonçalves JTT, Silveira MG, Campos MCC, Costa LHR. Sobrepeso e obesidade e fatores associados ao climatério. Cien Saude Colet 2016; 21(4):1146-1155.,22. Pereira ECAP, Schmitt ACB, Cardoso MRA, Pereira WMP, Lorenzi-Filho G, Blumel JE, Aldrighi JM. Prevalência da sonolência diurna excessiva e fatores associados em mulheres de 35 a 49 anos de idade do “Projeto de Saúde de Pindamonhangaba” (PROSAPIN). Rev. Assoc. Med. Bras. 2012; 58(4):447-442.. Para 2025, dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que a expectativa de vida nos países em desenvolvimento será de 78 anos, o que repercutirá no aumento da população de mulheres climatéricas33. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic (report of a WHO consultation on obesity). Genebra: WHO; 1998.,44. Pereira DCL, Lima SMRR. Prevalência de sobrepeso e obesidade em mulheres após a menopausa. Arq. Med. Hosp. Fac. Cienc. Med. Santa Casa São Paulo 2015; 60:1-6.. Considerando essa perspectiva, um aumento na procura dos serviços de saúde por essa população é esperado, tendo como queixas principais os sintomas característicos dessa fase55. Berlezi EM, Balzan A, Cadore BF, Pillatt AP, Winkelmann ER. Histórico de transtornos disfóricos no período reprodutivo e a associação com sintomas sugestivos de depressão na pós-menopausa. Rev. Bras. Geriatr. Gerontol. 2013; 16(2):273-283..

Do grego Klimater, climatério significa ponto crítico e é caracterizado como o período transitório entre a vida reprodutiva e a não reprodutiva da mulher. Trata-se de um processo fisiológico com início a partir da quarta década de vida e que se estende até a senilidade, não se constituindo em doença ou transtorno33. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic (report of a WHO consultation on obesity). Genebra: WHO; 1998.,66. Hoffmann M, Mendes KG, Canuto R, Garcez ADAS, Theodoro H, Rodrigues AD, Olinto MTA. Dietary patterns in menopausal women receiving outpatient care in Southern Brazil. Cien Saude Colet 2015; 20(5):1565-1574.

7. Polisseni AF, Araújo DAC, Polissen F, Mourão Júnior CA, Polisseni J, Fernandes ES, Guerra MO. Depressão e ansiedade em mulheres climatéricas: fatores associados. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2009; 31(1):28-34.

8. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Temático Saúde da Família. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2008.
-99. Nasri F. O envelhecimento populacional no Brasil. Einstein 2008; 6(1):S4-S6..

As repercussões hormonais do climatério, oriundas do declínio da produção do estradiol, podem implicar em alterações cardiovasculares, cerebrais, cutâneas, geniturinárias, ósseas e vasomotoras, além de mudanças do humor e apetite1010. Conte FA, Franz LBB, Idalêncio VH. Compulsão alimentar e obesidade no climatério: uma revisão de literatura. ABCS Health Sci 2014; 39(3):199-203.. Sabe-se ainda que as alterações endócrinas dessa fase não se restringem ao eixo hipotálamo-hipófise-ovário, sendo extensivas ao eixo hipotálamo-adrenal, o qual exacerba suas atividades ao responder às flutuações de estrogênio. Desta forma, o aumento da síntese de cortisol causado pelas situações de estresse impostas às mulheres climatéricas tende a interferir diretamente no humor e no comportamento do sono1111. Soares CN, Murray BJ. Sleep disorders in women: clinical evidence and treatment strategies. Psychiatr Clin North Am 2006; 29(4):1095-1113., este último, variável dependente deste estudo.

Os distúrbios do sono são altamente prevalentes na população geral, apresentando-se em intensidades variáveis e atingido, sobretudo, indivíduos com deterioração da saúde física e/ou mental1212. Xu Q, Lang CP, Rooney N. A systematic review of the longitudinal relationships between subjective sleep disturbance and menopausal stage. Maturitas 2014; 79(4):401-412.. Tais perturbações são mais comuns em mulheres, sendo o climatério um período propenso, especialmente as fases peri e pós-menopausais1313. Blümel JE, Chedraui P, Baron G, Belzares E, Bencosme <bold>A, </bold>Calle A, Danckers L, Espinoza MT, Flores D, Gomez G, Hernandez-Bueno JA, Izaguirre H, Leon-Leon P, Lima S, Mezones-Holguin E, Monterrosa A, Mostajo D, Navarro D, Ojeda E, Onatra W, Royer M, Soto E, Tserotas K, Vallejo S. A large multinational study of vasomotor symptom prevalence, duration, and impact on quality of life in middle-aged women. Menopause 2011; 18(7):778-785., em que os sintomas vasomotores causados pela diminuição dos níveis de estrogênio são responsáveis por episódios de ondas de calor em torno do rosto e região torácica anterior, acompanhadas de sudorese. Tais eventos duram em média três minutos e se intensificam durante a noite, levando a despertares frequentes que determinam a fragmentação e perda da qualidade do sono1414. Notelovitz M. Climacteric medicine and science: a societal need. In: Notelovitz M, editor. The climacteric in perspective. Lancaster: M.T.P. Press; 1988. p. 19-21.

15. Owens JF, Mattews KA. Sleep disturbance in healthy middle-aged women. Maturitas.1998; 30(1):41-50.
-1616. Kravitz HM, Ganz PA, Bromberger J, Powell LRH, Sutton-Tyrrell K, Meyer PM. Sleep difficulty in women at midlife: a community survey of sleep and the menopausal transition. Menopause 2003; 10(1):19-28..

Apesar de a literatura demonstrar comprometimento na qualidade do sono durante a transição da menopausa, além daqueles relacionados aos sintomas vasomotores, os fatores associados à perda da qualidade do sono ainda são obscuros. A despeito dos avanços na área, o médico generalista e os médicos especialistas possuem pouca informação acerca do impacto dos transtornos do sono nessa população1717. Polo-Kantola P. Sleep problems in midlife and beyond. Maturitas 2011; 68(3):224-232.. Dessa forma, por compreender um período relativamente longo da vida da mulher, o climatério merece atenção crescente da sociedade1717. Polo-Kantola P. Sleep problems in midlife and beyond. Maturitas 2011; 68(3):224-232., sendo fundamental que as mulheres climatéricas sejam acompanhadas sistematicamente visando à promoção da saúde, o diagnóstico precoce, o tratamento imediato dos agravos e à prevenção de danos1818. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual de Atenção à Mulher no Climatério/Menopausa. Brasília: MS; 2008.,1919. Maia C, Guilherme D, Lucchese G. Integration of health surveillance and women’s health care: a study on comprehensiveness in the Unified National Health System. Cad Saude Publica 2010; 26(4):682-692..

Com base nas lacunas identificadas na literatura, o presente estudo busca estimar a prevalência da perda da qualidade do sono e dos fatores a ela associados em mulheres climatéricas assistidas pela Estratégia de Saúde da Família (ESF). Nesse sentido, os achados deste estudo podem constituir possíveis referências para novos estudos que venham a ser conduzidos em outros contextos econômicos e sociais, a fim de provocar mudanças individuais e coletivas para a melhoria do atendimento na atenção primária à saúde.

Métodos

Estudo analítico e transversal, realizado no período de agosto de 2014 a fevereiro de 2015, com população composta por 30.018 mulheres climatéricas cadastradas nas 73 unidades da ESF de Montes Claros, Minas Gerais, Brasil. Para participação no estudo, foi necessário que as mulheres estivessem no climatério e cadastradas em uma das unidades da ESF do município. Não foram incluídas as mulheres que não se apresentaram para a coleta de dados após três tentativas, além de gestantes, puérperas e acamadas.

A amostragem foi probabilística e os sujeitos que atenderam aos pré-requisitos de participação foram selecionados mediante sorteio, seguindo um plano amostral em dois estágios: por conglomerado (unidades da ESF) e por período climatérico (pré, peri e pós menopausa). Nos casos em que as mulheres sorteadas não foram encontradas, foi realizado um novo sorteio até completar a cota de mulheres por amostragem probabilística proporcional a cada unidade da ESF. No processo de amostragem, o tamanho amostral foi calculado para um nível de confiança de 95%. Ao final, 819 mulheres compuseram a amostra de estudo.

Em relação às variáveis investigadas, as características demográficas abrangeram informações relativas à idade, situação conjugal, cor da pele, religião e número de residentes por domicílio. Aspectos socioeconômicos contemplaram informações sobre escolaridade, trabalho remunerado e renda familiar.

A caracterização dos hábitos de vida se deu pela investigação da prática de atividade física, tabagismo, consumo de álcool e hábito alimentar. Com relação à atividade física, foi utilizado o International Physical Activity Questionnaire (IPAQ), validado para o português por Matsudo et al.2020. Matsudo SM, Araújo TL, Matsudo VKR, Andrade DR, Andrade EL, Oliveira LC. Braggion G. Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ):estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Rev. Bras. Ativ. Saúde 2001; 6(2):5-18.. A versão curta adotada nesta pesquisa consta de seis perguntas relacionadas à atividade física realizada na última semana, por pelo menos 10 minutos contínuos, anterior à aplicação do questionário.

Quanto à avaliação dos aspectos clínicos, a relação cintura quadril foi obtida por mensurações com fita métrica milimetrada inelástica, em que os avaliadores localizaram os trocânteres maiores como referência para colocação da fita horizontalmente ao redor do quadril. Para a medida da circunferência abdominal, utilizou-se o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca, diretamente sobre a pele2121. Park HS, Oh SW, Cho SI, Choi WH, Kim YS. The metabolic syndrome and associated lifestyle factors among South Korean adults. Int J Epidemiol 2004; 33(2):328-336.. Ambas medidas, cintura e quadril, foram realizadas três vezes e quando diferenças superiores a um centímetro e meio eram encontradas, as medidas foram refeitas. Para relação cintura quadril, foi dividido o valor da circunferência abdominal pela do quadril.

A mensuração da estatura ocorreu com auxílio do antropômetro SECA 206 numa parede com noventa graus em relação ao chão e sem rodapés. Para medida do peso (kg) foi utilizada balança portátil SECA OMEGA 870 digital. O Índice de Massa Corporal - IMC foi então calculado pelo produto da divisão do peso corporal pela estatura ao quadrado (P/E22. Pereira ECAP, Schmitt ACB, Cardoso MRA, Pereira WMP, Lorenzi-Filho G, Blumel JE, Aldrighi JM. Prevalência da sonolência diurna excessiva e fatores associados em mulheres de 35 a 49 anos de idade do “Projeto de Saúde de Pindamonhangaba” (PROSAPIN). Rev. Assoc. Med. Bras. 2012; 58(4):447-442.)2222. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO consultation on obesity. Geneva: WHO; 2000.. Os resultados do IMC foram classificados, segundo os critérios da WHO2222. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO consultation on obesity. Geneva: WHO; 2000. em adultos: Peso adequado (18,5 a 24,9); Sobrepeso (25,0 a 29,9); Obesidade (30,0 ou acima).

Informações relativas à terapia hormonal foram coletadas por autorrelato. A sintomatologia climatérica foi avaliada por meio do índice de Blatt-Kupperman2323. Alder E. The Blatt-Kupperman menopausal index: a critique. Maturitas 1998; 29(1):19-24., cujas respostas para cada sintoma investigado seguiram a seguinte escala de escore: 0 (ausência de sintomas); 1 (sintomas leves); 2 (sintomas moderados) e 3 (sintomas intensos). Para o cálculo do escore total, os sintomas pesquisados apresentam pesos diferenciados, nos quais as ondas de calor (fogachos) assumem maior relevância (peso 4), parestesia, insônia e nervosismo um valor intermediário (peso 2) e os demais sintomas, como tristeza, vertigens, fraqueza, artralgia/ mialgia, cefaleia, palpitação e formigamento têm peso 1 (um). Multiplicando a intensidade do sintoma pelo respectivo fator de conversão e, em seguida, fazendo a soma dos resultados obtidos, alcança-se uma pontuação capaz de classificar a síndrome climatérica em leve, moderada e intensa. Para a categorização das fases do climatério foram classificadas como pré-menopausais as mulheres com ciclo menstrual regular (de 28 a 28 dias, 29 a 29 dias e ciclos mais longos), perimenopausais com ciclo menstrual irregular variando de 2 a 11 meses e pós- menopausais com ciclo menstrual interrompido a mais de 12 meses2424. Associação Brasileira de Climatério (SOBRAC). Guia da Menopausa. 7ª Ed. São Paulo: Sociedade Norte-Americana de Menopausa (NAMS); 2013..

Dados relativos à sonolência diurna foram autorrelatados. Para avaliação da qualidade do sono foi utilizado o instrumento The Pittsburgh sleep quality índex (Índice de Qualidade de Sono de Pittsburgh - IQSP), um questionário autorreferido que avalia a qualidade do sono ao longo das últimas 4 semanas e distingue sono “ruim” de sono “bom”2525. Buysse DJ, Reynolds CF, Monk TH, Berman SR, Kupfer DJ. The Pittsburgh Sleep Quality Index: a new instrument for psychiatric practice and research. Psychiatry Res 1989; 28(2):193-213.. É composto por 19 questões graduadas (Escala de Lickert) em pontos de zero (nenhuma dificuldade) a três (dificuldade grave) e analisadas por escores de sete componentes: (1) qualidade subjetiva do sono; (2) a latência do sono; (3) a duração do sono; (4) a eficiência habitual do sono; (5) as alterações do sono; (6) o uso de medicações para o sono; (7) sonolência ou disfunção diurna. Os escores (dos sete componentes) são somados e o total oscila entre 0 a 21 pontos. Pontuações de 0 a 4 indicam sono de qualidade preservada, pontuações de 5 a 10 indicam qualidade de sono comprometida, pontuações acima de 10 indicam grande perda de qualidade de sono.

A ansiedade foi investigada por meio do Inventário de Ansiedade de Beck, validado para a língua portuguesa por Cunha2626. Cunha JA. Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2001.. Este instrumento possui uma escala sintomática que mensura a gravidade dos sintomas da ansiedade, sendo composta por 21 itens, com quatro opções de respostas, classificando os sintomas da ansiedade como: mínimo de 0 a 10, leve de 11 a 19, moderado de 20 a 30 e grave de 31 a 63. As respostas foram posteriormente categorizadas em: com ansiedade Mínima/Leve; Moderada/Grave.

Para avaliar os sintomas da depressão foi utilizado o Inventário de Depressão de Beck (BDI), um dispositivo psicométrico de autoavaliação composto por 21 itens que se referem à sintomatologia depressiva: tristeza, fracasso, culpa, decepção, vontade de matar, irritação, decisão, desânimo, prazer, castigo/punição, fraqueza, choro, interesse pelas pessoas, trabalho, cansaço, perda de peso, interesse sexual, sono, apetite e problemas físicos. Pacientes com pontuação maior que 15 foram diagnosticadas com depressão. Considerou-se depressão leve valores entre 16 e 20, moderada entre 21 e 29 e grave igual ou maior que 302727. Gorenstein C, Andrade L. Validation of a Portuguese version of the Beck Depression Inventory and the State-Trait Anxiety Inventory in Brazilian subjects. Braz J. Med. Biol. Res. 1996; 29(4):453-457..

Para avaliação do risco de desenvolvimento de doença cardiovascular (DCV) nas mulheres climatéricas foi utilizado o Escore de Risco Global de Framingham (ERF). A idade, o colesterol-HDL, o colesterol total, a pressão arterial sistólica em pacientes tratadas e não tratadas de hipertensão arterial sistêmica, o tabagismo e a presença de diabetes autorreferida como comorbidade foram utilizados como variáveis para essa avaliação. Cada variável foi pontuada de acordo com valores específicos e o somatório das pontuações transformados em porcentagem de risco. O ERF classifica como alto risco os valores > 20%, intermediário risco, entre 6 e 20%, e baixo risco < 6%2828. D’Agostino RB, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM. Kannel WB. General Cardiovascular Risk Profile for Use in Primary Care: The Framingham Heart Study. Circulation 2008; 117(6):743-753..

Avaliou-se a IU autorreferida e a quantificação da perda através do instrumento validado para a realidade brasileira, International Consultation on Incontinence Questionnaire Short Form - ICIQ-S2929. Tamanini JT, Dambros M, D’Ancona CA, Palma PC, Rodrigues Netto N. Validação para o português do International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form (ICIQ-SF). Rev Saude Publica 2004; 38(3):438-444.. O ICIQ-SF é composto de quatro questões que avaliam a frequência, a gravidade e o impacto da IU. Partindo da definição de IU da International Continence Society (ICS) como a queixa de qualquer perda involuntária de urina3030. Lopes MHBM, Higa R. Restrições causadas pela incontinência urinária à vida da mulher. Rev. Esc. Enferm USP 2006; 40(1):34-41., considerou-se incontinentes as mulheres que respondessem “apresenta perda urinária” no questionário ICIQ-SF.

Foram coletadas amostras sanguíneas para o exame da glicemia de jejum. A amostra de sangue foi analisada pelos kits dos testes de triglicérides, colesterol e glicemia de jejum compatível com o equipamento Hitashi 912. Os valores foram categorizados em: < 110 mg%; ≥ 110 mg%; Sem informação.

A aferição da pressão arterial foi realizada com aparelho calibrado, de braço, digital e automático MicroLife, testado e validado pela British Hypertension Society3131. Belghazi J, El Feghali RN, Moussalem T, Rejdych M, Asmar RG. Validation of four automatic devices for self-measurement of blood pressure according to the International Protocol of the European Society of Hypertension. Vasc Health Risk Manag 2007; 3(4):389-400.. Foram realizadas três medidas, com intervalo de um minuto entre elas no membro superior esquerdo na posição sentada. Para análise, foi considerada a média das duas últimas. Caso houvesse diferença entre algumas das medidas (superior a 4 mmHg), aguardava-se cinco minutos e seguia-se novo bloco de três aferições. As participantes foram categorizadas em: Normotensas; Hipertensas; Sem informação.

Informações relativas à presença de artrite/artrose/reumatismo e problemas na coluna foram coletadas por declaração da própria entrevistada, através de instrumento adaptado do questionário VIGITEL.

Dessa forma, pela amplitude de variáveis e possibilidades descritivas do presente estudo, optou-se como desfecho a presença ou ausência da perda da qualidade de sono. Com relação aos procedimentos estatísticos, foi apresentada na fase descritiva a prevalência da variável de desfecho. Posteriormente, foram empregados os recursos da estatística descritiva para caracterização da amostra em estratos específicos dos fatores demográficos, socioeconômicos, hábitos de vida, aspectos clínicos e morbidades. Em seguida, foram efetuadas análises bivariadas para seleção das variáveis (Regressão de Poisson simples), objetivando identificar possíveis associações entre as variáveis independentes e o desfecho, ao nível de significância de p < 0, 25.

Para a modelagem hierarquizada, foi utilizada a regressão de Poisson, com variância robusta, o bloco das variáveis demográficas e socioeconômicas foi considerado o determinante distal (primeiro nível). As variáveis relacionadas aos hábitos de vida compuseram o bloco seguinte (segundo nível) e as variáveis relacionadas aos aspectos clínicos, obstétricos e de morbidades compuseram o terceiro e último nível, mais proximal à variável dependente (comprometimento da qualidade do sono). Foram obtidas as razões de prevalências (RP) e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%), sendo adotado para o modelo final o nível de significância de 5% (p < 0,05).

Os sujeitos que concordaram em participar da presente pesquisa assinaram ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Por se tratar de um estudo envolvendo humanos, este estudo foi submetido, apreciado e aprovado para execução por um Comitê de Ética e Pesquisa, sendo os preceitos éticos da resolução CNS 466/2012 integralmente observados3232. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: MS; 2012..

Resultados

Foram avaliadas 819 mulheres climatéricas, estando a maioria na faixa etária entre 46 a 65 anos (45,9%). A maioria também declarou possuir companheiro (63,5%), referiu a cor da pele como parda (64,1%), declarou escolaridade concentrada na primeira fase do Ensino Fundamental (41,1%) e renda familiar de até um salário mínimo (43,3%) (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização das mulheres climatéricas segundo variáveis demográficas, socioeconômicas e de hábitos de vida.

Quanto ao perfil clínico e de morbidades, a maioria apresentou valores alterados para a RCQ (62,6%) e para o IMC, com registro de sobrepeso e obesidade (75,4%). Entre as morbidades investigadas, maiores prevalências foram observadas para a hipertensão (43,3%) e problemas de coluna (50,9%). O comprometimento da qualidade do sono, variável-desfecho do presente estudo, foi identificado para (67,0%) da amostra estudada (Tabela 2).

Tabela 2
Caracterização das mulheres climatéricas, segundo aspectos clínicos, obstétricos e morbidades

As Tabelas 3 e 4 apresentam, entretanto, apenas as variáveis que se mostraram associadas até o nível de 25% (p < 0,25) ao desfecho comprometimento da qualidade de sono.

Tabela 3
Associação das características demográficas, hábitos de vida com o comprometimento da qualidade do sono em mulheres climatéricas; Montes Claros, 2016
Tabela 4
Associação das características clínicas e morbidades com a qualidade de sono em mulheres climatéricas, 2014

Após análise múltipla, no componente mais distal de determinação, a idade apresentou associação com o comprometimento da qualidade do sono, sendo que, mulheres com idade de 52 a 65 anos, apresentaram maiores prevalências para o comprometimento da qualidade do sono. No componente proximal, as variáveis associadas ao comprometimento da qualidade do sono foram: sintomas intensos do climatério, depressão, artrite/artrose/reumatismo e ansiedade (Tabela 5).

Tabela 5
Razão de prevalência ajustada das variáveis associadas ao comprometimento da qualidade do sono em mulheres climatéricas, Montes Claros, 2014.

Discussão

Por ser um determinante indicador nas variáveis de qualidade de vida da mulher no climatério3333. De Lorenzi DRS, Danelon C, Sacioloto B, Padilha Júnior I. Fatores indicadores da sintomatologia climatérica. Rev Bras Ginecol Obstet 2005; 27(1):7-11., a perda da qualidade do sono constitui-se em sério agravo à saúde e importante questão de saúde pública. Para Berlezi et al.55. Berlezi EM, Balzan A, Cadore BF, Pillatt AP, Winkelmann ER. Histórico de transtornos disfóricos no período reprodutivo e a associação com sintomas sugestivos de depressão na pós-menopausa. Rev. Bras. Geriatr. Gerontol. 2013; 16(2):273-283., os fogachos noturnos constituem a principal queixa sintomática do climatério relacionada ao sono, mas quadros clínicos como alterações cardiovasculares e sonolência diurna excessiva também são muito prevalentes em mulheres nessa fase3434. Corrêa KM, Bittencourt LRA, Tufik S, Hachul H. Frequência dos distúrbios de sono em mulheres na pós-menopausa com sobrepeso/obesidade. Rev Bras Ginecol Obstet 2014; 36(2):90-96..

No presente estudo, a perda de qualidade do sono foi identificada em 67 % da amostra, sendo ainda mais evidente nas mulheres pós-menopáusicas. Esses achados alinham-se aos de Corrêa et al.3434. Corrêa KM, Bittencourt LRA, Tufik S, Hachul H. Frequência dos distúrbios de sono em mulheres na pós-menopausa com sobrepeso/obesidade. Rev Bras Ginecol Obstet 2014; 36(2):90-96., Wu et al.3535. Wu H, Lai J, Hwang J. Quality of life and sleep quality amongst climacteric women seeking medical advice in Northern Taiwan. Sleep Med. 2012; 13:906-912. e Campos et al.3636. Campos HH, Bittencourt LRA, Haidar MA, Tufik S, Baracat EC. Prevalência de distúrbios do sono na pós-menopausa. Rev Bras Ginecol Obstet 2005; 27(12):731-736., que identificaram alterações do sono nas populações estudadas em ocorrências que variaram de 28% e 63%, sobretudo após a menopausa.

À exceção da idade mais avançada, a influência de outros fatores demográficos e socioeconômicos sobre o sono das participantes não ficou totalmente evidente. Entretanto, a escolaridade e sua relação com a qualidade do sono tem sido constantemente descrita na literatura sobre o climatério, sendo a baixa escolaridade um preditor determinante uma vez que a escola figura como porta de acesso à educação em saúde3737. Souza CL, Aldrighi JM, Lorenzi Filho G. Qualidade do sono em mulheres paulistanas no climatério. Rev Assoc Med Bras 2005; 51(3):170-176.,3838. Tasali E, Van Cauter E, Ehrmann DA. Polycystic Ovary Syndrome and Obstructive Sleep Apnea. Sleep Med Clin 2008; 3(1):37-46.. Estudo realizado por Rosaneli et al.3939. Rosaneli CF, Baena CP, Auler F, Nakashima ATA, Netto-Oliveira ER, Oliveira AB, Guarita-Souza LC, Olandoski M, Faria-Neto JR. Aumento da pressão arterial e obesidade na infância: uma avaliação transversal de 4.609 escolares. Arq Bras Cardiol 2014; 103(3):238-244. retrata a ambiência escolar como adequada para o desenvolvimento de atividades saudáveis, incluindo alimentação adequada e realização de atividades educacionais e físicas, as quais constituem fatores decisivos no combate às doenças ou alterações sistêmicas. Portanto, o pouco tempo vivenciado na escola impacta negativamente a qualidade de vida e ainda está fortemente relacionado à infelicidade, fracas relações sociais e baixa percepção de autocuidado e saúde.

Apesar da consensual, associação negativa entre menopausa e qualidade de vida em mulheres de meia-idade, especialmente no domínio psicológico, alguns pesquisadores têm investigado a influência do estilo de vida, especialmente dos hábitos de atividade física, sobre os sintomas do climatério/menopausa, entre eles os problemas relacionados ao sono. Sabe-se que altos níveis de atividade física têm sido associados a uma melhor qualidade de vida, principalmente no domínio físico, já que baixos níveis de atividade física parecem correlacionar-se com o ganho de peso e obesidade nessa fase4040. Guimarães ACA, Baptista F. Influence of habitual physical activity on the symptoms of climacterium/menopause and the quality of life of middle-aged women. Int J Womens Health 2011; 3:319-328.. No presente estudo, apesar de os hábitos de atividade física não se mostrarem associados à variável-desfecho, outros hábitos como consumo de gorduras e tabagismo demonstraram associação quando da análise bivariada. Todavia, ao se proceder a análise múltipla, assim como nos estudos de Woods e Mitchel4141. Woods NF, Mitchell ES. Sleep Symptoms During the Menopausal Transition and Early Postmenopause: Observations from the Seattle Midlife Women’s Health Study. Sleep 2010; 33(4):539-549., essas variáveis não confirmaram associação, possivelmente devido à baixa prevalência autodeclarada tanto de consumo de gordura animal quanto de tabagismo entre a população estudada.

Ao abordar os aspectos clínicos da amostra de estudo, a presente pesquisa desvela resultados preocupantes em relação à RCQ e ao IMC, uma vez que a aferição das medidas antropométricas registrou alto índice de sobrepeso e obesidade, aumentando o risco de morbimortalidades associadas. Tal resultado vai ao encontro do estudo de Steiner et al.4242. Steiner ML, Azevedo LH, Bonacordi CL, Barros AZ, Strufaldi R, Fernandes CE. Avaliação de consumo alimentar, medidas antropométricas e tempo de menopausa de mulheres na pós-menopausa. Rev Bras Ginecol Obstet 2015; 37(1):16-23., que observaram predominância de sobrepeso ou obesidade no perfil antropométrico de mulheres na pós-menopausa, as mais atingidas pela perda da qualidade do sono neste estudo. O comprometimento do sono contribui para o sedentarismo e, por esta razão, constitui-se em um dos principais fatores associados ao sobrepeso e obesidade. Pereira e Lima44. Pereira DCL, Lima SMRR. Prevalência de sobrepeso e obesidade em mulheres após a menopausa. Arq. Med. Hosp. Fac. Cienc. Med. Santa Casa São Paulo 2015; 60:1-6., Farias et al.4343. Farias ER, Faria FR, Franceschini SCC, Peluzio MCG, Sant’ana LFR, Novaes JF, Ribeiro SMR, Ribeiro AQ, Priore SE. Resistência à insulina e componentes da síndrome metabólica, análise por sexo e por fase da adolescência. Arq. Bras. Endocrinol. Metab. 2014; 58(6):610-618 e Gravena et al.4444. Gravena AAF, Rocha SC, Romeiro TC, Agnolo CMD, Gil LM, Carvalho MDB, Pelloso SM. Sintomas climatéricos e estado nutricional de mulheres na pós-menopausa usuárias e não usuárias de terapia hormonal. Rev Bras Ginecol Obstet 2013; 35(4):178-184. acrescentam que, graças à redução do gasto de energia em atividades laborais e no cumprimento de afazeres domésticos, é grande a prevalência de sobrepeso e obesidade na população climatérica.

De acordo com Lizcano e Gusman4545. Lizcano F, Guzmán G. Estrogen Deficiency and the Origin of Obesity during Menopause. Biomed. Res. Int. 2014; 2014:757461., esses resultados também podem ser explicados pela deficiência hormonal (no presente estudo, apenas 6,5 % das mulheres declararam fazer terapia hormonal) e pela redução do metabolismo basal, o que pode levar sobretudo ao aumento da gordura abdominal. O aumento da ingestão calórica e a depressão também explicam as alterações no IMC. Rosini et al.4646. Rosini TC, Silva ASR, Moraes C. Obesidade induzida por consumo de dieta: modelo em roedores para o estudo dos distúrbios relacionados com a obesidade. Rev. Assoc. Med. Bras. 2012; 58(3):383-387. afirmam que o excesso de gordura na dieta, o consumo de comida de alto valor energético, através de porções de grandes tamanhos, frequência de ingestão, menor custo e maior disponibilidade de alimentos manipulados também podem figurar como fatores responsáveis pela obesidade.

Esses agravos podem provocar uma mudança na imagem que a mulher tem de si, levando-a à insegurança e ansiedade. Tais fatores, aliados às predisposições biológicas, problemas de ordem subjetiva e social, podem evoluir gradualmente para um processo de depressão4747. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Temático Saúde da Família. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2008.. No presente estudo, os sintomas intensos do climatério demonstraram associação ao comprometimento da qualidade do sono. Da mesma forma, variáveis como ansiedade e depressão de moderada a grave também se mostraram associadas ao sono de qualidade ruim. Esses achados corroboram os resultados de outros estudos que investigaram transtornos emocionais em mulheres no climatério, associando-os à perda da qualidade do sono11. Gonçalves JTT, Silveira MG, Campos MCC, Costa LHR. Sobrepeso e obesidade e fatores associados ao climatério. Cien Saude Colet 2016; 21(4):1146-1155.,22. Pereira ECAP, Schmitt ACB, Cardoso MRA, Pereira WMP, Lorenzi-Filho G, Blumel JE, Aldrighi JM. Prevalência da sonolência diurna excessiva e fatores associados em mulheres de 35 a 49 anos de idade do “Projeto de Saúde de Pindamonhangaba” (PROSAPIN). Rev. Assoc. Med. Bras. 2012; 58(4):447-442.,77. Polisseni AF, Araújo DAC, Polissen F, Mourão Júnior CA, Polisseni J, Fernandes ES, Guerra MO. Depressão e ansiedade em mulheres climatéricas: fatores associados. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. 2009; 31(1):28-34.,1111. Soares CN, Murray BJ. Sleep disorders in women: clinical evidence and treatment strategies. Psychiatr Clin North Am 2006; 29(4):1095-1113.,1616. Kravitz HM, Ganz PA, Bromberger J, Powell LRH, Sutton-Tyrrell K, Meyer PM. Sleep difficulty in women at midlife: a community survey of sleep and the menopausal transition. Menopause 2003; 10(1):19-28.,1717. Polo-Kantola P. Sleep problems in midlife and beyond. Maturitas 2011; 68(3):224-232.. A maioria das pacientes com depressão apresentaram perda da qualidade do sono, com queixa de despertares noturnos frequentes, sono não restaurador, redução tempo total de sono e sonhos perturbadores provocando sonolência diurna4848. Chellappa SL. Sonolência excessiva diurna e depressão: causas, implicações clínicas e manejo terapêutico. Rev. Psiquiatr. R Gd. Sul 2009; 31(3):1-8..

Estudo conduzido por Blümel et al.1313. Blümel JE, Chedraui P, Baron G, Belzares E, Bencosme <bold>A, </bold>Calle A, Danckers L, Espinoza MT, Flores D, Gomez G, Hernandez-Bueno JA, Izaguirre H, Leon-Leon P, Lima S, Mezones-Holguin E, Monterrosa A, Mostajo D, Navarro D, Ojeda E, Onatra W, Royer M, Soto E, Tserotas K, Vallejo S. A large multinational study of vasomotor symptom prevalence, duration, and impact on quality of life in middle-aged women. Menopause 2011; 18(7):778-785.também verificou que, semelhante aos sintomas vasomotores (SVM) característicos da fase climatérica mais intensa, sintomas psicológicos como ansiedade e depressão se relacionaram significativamente aos distúrbios do sono. Os mesmos autores ainda relatam que a ansiedade tem sido associada ao aumento do risco de insônia e que a depressão ocorre mais comumente em mulheres com SVM do que naquelas sem. Postula-se que os SVM estejam associados à depressão por causarem despertares repetidos, com fragmentação do sono, e assim prejudicar o bem-estar diurno. No entanto, em um estudo sobre perturbações do sono em indivíduos deprimidos, não foi consistente a associação entre depressão e despertares ou SVM4949. Joffe H, Soares CN, Thurston RC, White DP, Cohen LS, Hall JE. Depression is associated with worse objectively and subjectively measured sleep, but not more frequent awakenings, in women with vasomotor symptoms. Menopause 2009; 16(4):671-679.. Embora mecanismos fisiopatológicos detalhados ainda sejam obscuros, a associação de SVM aos problemas do sono parece bem definida e registrada em estudos recentes com diferentes desenhos1212. Xu Q, Lang CP, Rooney N. A systematic review of the longitudinal relationships between subjective sleep disturbance and menopausal stage. Maturitas 2014; 79(4):401-412.,4949. Joffe H, Soares CN, Thurston RC, White DP, Cohen LS, Hall JE. Depression is associated with worse objectively and subjectively measured sleep, but not more frequent awakenings, in women with vasomotor symptoms. Menopause 2009; 16(4):671-679..

Neste estudo, diferentemente de alguns resultados encontrados na literatura4545. Lizcano F, Guzmán G. Estrogen Deficiency and the Origin of Obesity during Menopause. Biomed. Res. Int. 2014; 2014:757461.,5050. Thurston RC, Santoro N, Matthews KA. Are vasomotor symptoms associated with sleep characteristics among symptomatic midlife women? Comparisons of self-report and objective measures. Menopause 2012; 19(7):742-748., não foi demonstrada associação entre hipertensão arterial e perda da qualidade de sono. Como o instrumento utilizado para aferir a qualidade do sono - o IQSP, não considera essa medida, esta pode ser uma explicação presumível para a ausência de associação. Apesar disso, Fernandes et al.5151. Fernandes CE, Pinho-Neto JSL, Gebara OCE, Santos Filho RD, Pinto Neto AM, Pereira Filho AS, Athayde AVL, Sposito AC, Ferrari AEM, Albergaria BH, Silva CR, Arruda CG, Stephan C, Nahas EP, Pellini EAJ, Alexandre ERG, Coutinho EM, Porto E, Lima GR, Andrade IALB, Ferreira JAS, Lima JC, Aldrighi JM, Machado LV, Azevedo LH, Pompei LM, Bertolami M, Steiner ML, Albernaz MA, Sá MFS, Wender COM, Melo NR, Spritzer PM, Strufaldi R, Machado RB, Bossemeyer RP, Costa RR, Peixoto S, Carvalho VBI. Diretriz Brasileira sobre prevenção de doenças cardiovasculares em mulheres climatéricas e a influência da terapia de reposição hormonal (TRH) da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e da Associação Brasileira do Climatério (SOBRAC). Arq Bras Cardiol 2008; 91(1):1-23. evidenciam que em torno de 80% das mulheres apresentam hipertensão arterial na menopausa, podendo esta condição estar relacionada ao aumento de peso, à redução da atividade física e à própria falta de proteção hormonal ao sistema cardiovascular.

Outra variável que confirma associação após ajuste da análise foi a fase climatérica, estando a perda de qualidade do sono mais prevalente nas mulheres pós-menopáusicas, Hachul et al.5252. Hachul H, Bittencourt LRA, Soares JM, Tufik S, Baracat EC. Sleep in post-menopausal women: differences between early and late post-menopause. Eur. J. Obstet Gynecol Reprod Biol 2009; 145(1):81-4.encontraram resultados semelhantes ao relatarem que, embora a menopausa precoce esteja associada a vários sintomas devido ao hipoestrogenismo (Síndrome do climatério), queixas subjetivas relacionadas ao sono eram mais frequentes no grupo de mulheres na pós-menopausa tardia. Este achado não foi relacionado à idade da paciente, mas sim aos anos após a menopausa. Uma possível explicação está no efeito nocivo, a longo prazo, do hipoestrogenismo no final de pós-menopausa, atentando para que mais atenção deve ser dada à identificação de potenciais diferenças nos sintomas entre as mulheres das diferentes fases e para que estudos futuros incluam investigações completas de ambas as medidas objetivas e subjetivas de distúrbios do sono. Ainda corroborando os presentes resultados, estudo conduzido por Zhang et al.5353. Zhang JP, Wang YQ, Yan MQ, Li ZA, Du XP, Wu XQ. Menopausal Symptoms and Sleep Quality During Menopausal Transition and Postmenopause. Chin Med J (Engl) 2016; 129(7):771-777. demonstra uma maior prevalência de sintomas ocorridos na pós-menopausa precoce; seguida da menopausa tardia.

Outra morbidade frequentemente associada às alterações do sono tem sido a incontinência urinária (IU). Estudo com mulheres portuguesas afetadas pela IU, em que foram avaliados os fatores de risco associados e seu impacto sobre a qualidade de vida das mesmas, foi demonstrado que mulheres com mais de 50 anos apresentam mais distúrbios do sono e limitações de desempenho quando comparadas às participantes mais jovens5454. Amaral MO, Coutinho EC, Nelas PA, Chaves CM, Duarte JC. Risk factors associated with urinary incontinence in Portugal and the quality of life of affected women. Int J Gynaecol Obstet 2015; 131(1):82-86., corroborando os resultados descritivos da presente pesquisa que encontrou uma maior prevalência de IU nas mulheres que relataram perda de qualidade sono, estando este agravo mais prevalente entre as mulheres com mais de 52 anos. Sabe-se, todavia, que a IU está associada a vários fatores de risco além da idade, incluindo paridade, tipo de parto, peso ao nascer do neonato, menopausa, sobrepeso, obesidade e algumas comorbidades médicas, especialmente diabetes5555. Irwin DE, MilsomI, Hunskaar S, Reilly K, Kopp Z, Herschorn S, Coyne K, Kelleher C, Hampel C, Artibani W, Abrams P. Population-based survey of urinary incontinence, overactive bladder, and other lower urinary tract symptoms in five countries: results of the EPIC study. Eur Urol 2006; 50(6):1306-1315.,5656. Dolan LM, Hilton P. Obstetric risk factors and pelvic floor dysfunction 20 years after first delivery. Int Urogynecol J 2010; 21(5):535-544.. Dessa forma, a alta percentagem de IU encontrada entre as mulheres com algum transtorno do sono pode ser respaldada mais uma vez pela considerável prevalência de alguns dos fatores de risco supracitados nesse extrato populacional da amostra.

Finalmente, o presente estudo encontrou associação entre auto relato de artrite/artrose/reumatismo e comprometimento do sono. Estudos realizados por Szoeke et al.5757. Szoeke CEI, Cicuttini J, Guthrie J, Dennerstein L. Self-reported arthritis and the menopause. Climateric 2005; 8(1):49-55., Wu et al.3535. Wu H, Lai J, Hwang J. Quality of life and sleep quality amongst climacteric women seeking medical advice in Northern Taiwan. Sleep Med. 2012; 13:906-912. e Guimarães e Baptista4040. Guimarães ACA, Baptista F. Influence of habitual physical activity on the symptoms of climacterium/menopause and the quality of life of middle-aged women. Int J Womens Health 2011; 3:319-328. assumem que dores e rigidez nas articulações têm sido um dos sintomas mais frequentemente relatados por mulheres de meia idade, estando a artrite associada à fase pós-menopausal, à idade, ao índice de massa corporal e ao humor depressivo, fatores estes já previamente associados ao comprometimento do sono neste e em outros estudos de semelhante desenho. A alta prevalência de sobrepeso e obesidade na amostra populacional deste estudo pode explicar o surgimento de inúmeras queixas físicas relacionadas à menopausa, dentre elas as dores articulares, sobretudo quando o ganho de peso é superior a cinco quilogramas4040. Guimarães ACA, Baptista F. Influence of habitual physical activity on the symptoms of climacterium/menopause and the quality of life of middle-aged women. Int J Womens Health 2011; 3:319-328..

Nesse contexto, o presente estudo investigou os fatores associados à perda da qualidade de sono, por meio de amostra probabilística estratificada e representativa da população climatérica assistida na atenção primária. No entanto, apresenta como principal limitação o seu desenho do tipo transversal, medindo o desfecho e a exposição simultaneamente e não provando a temporalidade. Além disso, aponta para a necessidade de avaliar a incidência de demais fatores relacionados à qualidade do sono da mulher climatérica, como a insônia, o grau de sonolência diurna e a possível presença de Ronco e Síndrome das Apneias Obstrutivas do Sono (SAOS) utilizando instrumentos direcionados para tais fins como a Escala de Sonolência de Epworth e o Questionário de Berlim. Especificamente em relação ao objeto deste estudo, sugere-se ainda a realização de investigações mais aprofundadas para aferição dos índices de depressão e ansiedade; e em torno da sonolência diurna, uma vez que essas condições estão descritas na literatura como causas e consequências da perda da qualidade do sono no climatério.

Os achados deste estudo revelam alterações de sono em grande parte das mulheres climatéricas investigadas e os fatores associados foram idade avançada, sintomas climatéricos de moderados a intensos, ansiedade e depressão moderadas a graves e presença de artrite/artrose/reumatismo. Tais sintomas parecem estar inter-relacionados e relacionados com alterações estrogênicas presentes desde a pré-menopausa.

Apesar do estudo não ter revelado associação de sobrepeso e obesidade com alterações do sono, a categorização do IMC apresenta como fator limitante a utilização do modelo WHO2222. World Health Organization (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a WHO consultation on obesity. Geneva: WHO; 2000. em adultos como o único critério diagnóstico de sobrepeso e obesidade, uma vez que a composição corporal associado ao envelhecimento deve ser considerada. Entretanto, este modelo de categorização também foi utilizado em outros estudos com grupos populacionais semelhantes5858. Yan LL, Daviglus ML, Liu K, Pirzada A, Garside DB, Schiffer L, Dyer AR, Greenland P. BMI and health-related quality of life in adults 65 years and older. Obes. Res. 2004; 12(1):69-76.

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Faz-se necessária a urgente intervenção no processo de atenção e cuidado à saúde da mulher climatérica, haja vista a associação entre os sintomas do climatério aos sintomas do envelhecimento. Conhecer os fatores associados pode contribuir para o planejamento de ações, programas e políticas voltadas para a promoção da saúde, prevenção e diagnóstico precoce desses agravos, impactando positivamente na qualidade de vida desse grupo populacional.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    Jul 2019

Histórico

  • Recebido
    22 Abr 2017
  • Aceito
    19 Out 2017
  • Revisado
    21 Out 2017
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