Resumo
O presente estudo objetivou a busca de evidências científicas publicadas em estudos analíticos que versam sobre fatores de postergação da aposentadoria de trabalhadores idosos. Foi realizada uma revisão integrativa da literatura com busca de artigos originais nas bases da Biblioteca Virtual de Saúde e SciELO no período de janeiro/2009 a março/2018. Foram selecionados 12 artigos após consenso de revisores independentes gerando duas categorias: Literatura Nacional e Literatura Internacional. Tal escolha foi porque o fenômeno do envelhecimento populacional acarreta impactos sociais e econômicos diferentes entre as nações desenvolvidas e naquelas em desenvolvimento, como o Brasil. Na análise dos resultados encontramos que a decisão de aposentadoria dos idosos envolve uma variedade de fatores pessoais, organizacionais e outros (legislativos, culturais, sociopolíticos e tecnológicos). Em conclusão constatamos a escassez de estudos na temática com amostras exclusivasde idosos em ambas as categorias, assim como a maior ou menor relevância de determinado fator dependerá do contexto de vida de cada trabalhador. Além do mais, como a decisão de aposentadoria é um processo dinâmico, existe carência de estudos longitudinais que necessitam ser supridos com pesquisas mais robustas nacionais da população idosa.
Palavras-chave
Aposentadoria; Idoso; Envelhecimento; Trabalhadores; Emprego
Introdução
O envelhecimento populacional mundial vem ocorrendo rapidamente em consequência da queda da taxa de fecundidade em diversas regiões e da elevação da expectativa de vida11 Organização Mundial de Saúde (OMS). Resumo Relatório Mundial de envelhecimento e saúde. Genebra: OMS; 2015.,22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e pesquisas, informação demográfica e socioeconômica. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2016. Rio de Janeiro: IBGE; 2016.. Em países em desenvolvimento, o fenômeno do envelhecimento populacional tem acontecido em tempo relativamente curto sem que as conquistas sociais tenham ocorrido adequadamente para a maioria da população33 Godinho MR, Ferreira AP. Aposentadoria no contexto de Reforma Previdenciária: análise descritiva em uma instituição de ensino superior. Saúde Debate 2017; 41(115):1007-1019.,44 Neumann LTV, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist 2018; 58(4):611-617..
No Brasil, é relevante a velocidade da ocorrência do envelhecimento populacional. Apresentando uma estimativa da projeção populacional realizada pelas Nações Unidas, de que a proporção da população de idosos no país deverá passar de 11,7% para 23,5% no período de 24,3 anos contados a partir de 201522 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e pesquisas, informação demográfica e socioeconômica. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2016. Rio de Janeiro: IBGE; 2016..
A maior longevidade, ou seja, o aumento do número médio de anos a serem vividos pela população deve ser considerada para fins de planejamento do sistema de seguridade social, que compreende a assistência social, a saúde e a previdência social22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e pesquisas, informação demográfica e socioeconômica. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2016. Rio de Janeiro: IBGE; 2016.,44 Neumann LTV, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist 2018; 58(4):611-617.. Atualmente ampliar a vida profissional dos trabalhadores mais velhos é uma prioridade na agenda de muitos países ocidentais que buscam aumentar as idades de aposentadoria em linha com o aumento da longevidade55 Solinge HV, Henkens K. Living longer, working longer? The impact of subjective life expectancy on retirement intentions and behavior. Eur J Public Health 2010; 20(1):47-51. e pela necessidade social dos trabalhadores prolongarem a sua vida profissional66 Nicolaisen M, Thorsen K, Eriksen SH. Jump into the void? Factors related to a preferred retirement age: Gender, social interests, and leisure activities. Int J Aging Hum Dev 2012; 75(3):239-271.,77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499.. No entanto, a idade de saída real do mercado de trabalho é determinada pelo fator estrutural desse mercado e do sistema previdenciário, bem como pelas condições econômicas, preferências e condições individuais88 Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467..
Além do mais é importante considerar o fator idade como o que mais se sobressai nas relações de trabalho, especialmente com relação aos trabalhadores idosos99 Gurgel MA. O direito ao trabalho, a conquista e a preparação para aposentadoria. In Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC, organizadores. Política nacional do idoso: Velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p. 225-240.. A idade também é uma variável importante para explicar as taxas de atividade, portanto uma consequência do envelhecimento populacional é o envelhecimento da população economicamente ativa (PEA). Desse modo, uma vez que proporcionalmente menos jovens adentram no mercado de trabalho, para haver compensação será necessário permanência mais longa dos trabalhadores na atividade econômica. Esse prolongamento da vida laboral pode ser importante para os idosos não raro pela renda criada, mas também pelo lugar de destaque que o trabalho ocupa na sociabilidade humana1010 Camarano AA, Kanso S, Fernandes D. Brasil envelhece antes e pós-PNI. In Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC, organizadores. Política nacional do idoso: Velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p. 63-106..
Com relação ao mundo ocidental, o trabalho é um dos suportes da autoestima, identidade pessoal e senso de utilidade do indivíduo1111 Fôlha FAS, Novo LF. Aposentadoria: significações e dificuldades no período de transição a essa nova etapa da vida. In: Anais do XI Colóquio Internacional Sobre Gestão Universitária Na América Do Sul. II Congresso Internacional Iglu Florianópolis. Santa Catarina: UFSC; 2011. p.1-13.. Portanto, em uma sociedade predominantemente capitalista, o trabalho encontra-se em um espaço priorizado na vida das pessoas. E nessa sociedade que valoriza apenas quem produz, um idoso aposentado pode apresentar sentimentos negativos pela perda do papel profissional1212 Moreira JO, Barros FMB, Silva JM. Aposentadoria e exercício profissional: um encontro possível para os professores de uma universidade católica. Psicol Argumento 2014; 32(79):123-130..
No que diz respeito à razão de dependência, esse é um indicador para medir a participação relativa do contingente populacional potencialmente inativo, que deveria ser sustentado pela parcela da população potencialmente produtiva. Desse modo, o segmento etário da população definido como economicamente dependente/inativo compreende os indivíduos menores de 15 anos e os de 60 e mais anos, enquanto o segmento potencialmente produtivo/ativo são os com idade entre 15 e 59 anos22 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e pesquisas, informação demográfica e socioeconômica. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2016. Rio de Janeiro: IBGE; 2016..
É relevante comentar que esse indicador pode não refletir, necessariamente, a razão de dependência econômica, em função de fatores circunstanciais que afetam o mercado do trabalho não sendo contempladas várias situações. Neste sentido destacam-se a incorporação de jovens, a permanência de idosos ou a exclusão de pessoas em idade produtiva1010 Camarano AA, Kanso S, Fernandes D. Brasil envelhece antes e pós-PNI. In Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC, organizadores. Política nacional do idoso: Velhas e novas questões. Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p. 63-106..
De acordo com os dados da seção X da Carta de Conjuntura de abril de 2018 disponíveis no site do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, os idosos brasileiros constituem a parcela menos representativa do total da população ocupada. Porém esse percentual vem aumentando, passando de 6,3% para 7,8% no período de 2012 a 20181313 Lameiras MAP, Sandro SC, Corseuil CHL, Ramos LRA. Mercado de Trabalho. Carta de Conjuntura - 2018 - 2º Trimestre - nº 39 [Internet]. Brasília: IPEA; 2018. [acessado 2018 Set 02]. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=32921&Itemid=3
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?... .
Esse fato pode ser consequência do envelhecimento populacional e uma possível alteração no delineamento comportamental dos trabalhadores mais velhos no que se refere as suas decisões com relação à aposentadoria, que necessita ser ratificado no futuro. O aumento desses trabalhadores mais idosos, provavelmente ocorre por conta de uma possível mudança de comportamento dos brasileiros nessa faixa etária sobre suas decisões em continuar no mercado de trabalho1313 Lameiras MAP, Sandro SC, Corseuil CHL, Ramos LRA. Mercado de Trabalho. Carta de Conjuntura - 2018 - 2º Trimestre - nº 39 [Internet]. Brasília: IPEA; 2018. [acessado 2018 Set 02]. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=32921&Itemid=3
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?... .
No Brasil, os idosos têm desempenhado papel cada vez maior na composição da renda familiar. Com efeito, informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2013 evidenciaram que da população idosa quase 65% eram a principal fonte de renda para as suas famílias e que 15,6% dos idosos aposentados e pensionistas trabalhavam para complementar renda44 Neumann LTV, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist 2018; 58(4):611-617.,1414 Ribas F. As prioridades que devem orientar as políticas para o envelhecimento. Portal do Envelhecimento 2016 [Internet]. [acessado 2018 Maio 30]. Disponível em: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/asprioridades-que-devem-orientar-as-politicas-para-oenvelhecimento/
https://www.portaldoenvelhecimento.com.b... .
Deste modo devem-se considerar os vários fatores que podem intervir na decisão trabalho-aposentadoria, a qual acarreta três possíveis caminhos: a aposentadoria definitiva, o adiamento da aposentadoria com apermanência no mesmo trabalho, ou o trabalho após a aposentadoria1515 Macêdo LSS, Bendassolli PF, Torres TL. Representações Sociais da Aposentadoria e Intenção de Continua Trabalhando. Psicol Soc 2017; 29:e145010.. Portanto, nem sempre a aposentadoria representa um rompimento com o mundo do trabalho77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499.,1212 Moreira JO, Barros FMB, Silva JM. Aposentadoria e exercício profissional: um encontro possível para os professores de uma universidade católica. Psicol Argumento 2014; 32(79):123-130.. Empregados mais velhos estão aceitando cada vez mais o emprego de ponte ou bridge employment, que ocorre quando os trabalhadores mais velhos aceitam um emprego remunerado após a aposentadoria de sua carreira principal77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499.,1616 Bennett MM, Beehr TA, Lepisto LR. A longitudinal study of work after retirement: examining predictors of bridge employment, continued career employment, and retirement. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(3):228-255..
De acordo com a literatura, os fatores determinantes de postergação da aposentadoria entre os idosos podem envolver aspectos pessoais66 Nicolaisen M, Thorsen K, Eriksen SH. Jump into the void? Factors related to a preferred retirement age: Gender, social interests, and leisure activities. Int J Aging Hum Dev 2012; 75(3):239-271.,1717 Pires AS, Ribeiro LV, Souza NVDO, Sá CMS, Gonçalves FGA, Santos DM. A permanência no mundo do trabalho de profissionais de enfermagem com possibilidade de aposentadoria. Cien Cuid Saude 2013; 12(2):338-345.,1818 Figueira DAM, Haddad MCL, Gvozd R, Pissinati PSCP. A tomada de decisão da aposentadoria influenciada pelas relações familiares e laborais. Rev Bras Geriatr Gerontol 2017; 20(2):207-215., aspectos relacionados ao trabalho77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499.,88 Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467. e outros externos que englobam o contexto sociopolítico, a legislação, a cultura e as novas tecnologias1919 Oakman J, Howie L. How can organisations influence their older employees’ decision of when to retire? Work 2013; 45(3):389-397.,2020 Alcover C, Topa G, Fernández JJ. La gestión organizacional de los trabajadores mayores y los procesos de mantenimiento, prolongación y salida de la vida laboral. Papeles Psicólogo 2014; 35(2):91-98.. Enfim, apesar de o trabalhador ter opção de escolher se vai ou não se aposentar, a decisão é condicionada pelos limites e oportunidades que o mundo oferece2121 Barbosa LM, França L, Murta SG. Projetos de Vida, Valores e Ação Comprometida. In: Murta SG. Educação para aposentadoria: promoção de saúde e desenvolvimento na Administração Pública Federal. Brasília: Cead/fub; 2014. p.225-239..
Entender o porquê e saber os fatores que mantêm os trabalhadores mais velhos nas organizações ampliando a sua vida laboral, ajudará gestores e a sociedade a compreender melhor os idosos e na formulação de políticas públicas em prol dessa faixa etária. Desse modo o interesse maior deve ser em direção a tornar a vida profissional mais sustentável para as pessoas2222 Nilsson K, Hydbom A, Rylander L. How are self-rated health and diagnosed disease related to early or deferred retirement? A cross-sectional study of employees aged 55-64. BMC Public Health 2016; 16(1):886-894.. E é importante que a continuidade no trabalho pudesse ser pensada a partir do bem-estar proporcionado pela própria natureza do trabalho e do ambiente em que essas pessoas se encontram1212 Moreira JO, Barros FMB, Silva JM. Aposentadoria e exercício profissional: um encontro possível para os professores de uma universidade católica. Psicol Argumento 2014; 32(79):123-130..
Por outro lado, apesar das decisões políticas em muitos países para aumentar a idade oficial de aposentadoria nas próximas décadas, poucas pesquisas foram realizadas sobre os fatores que influenciam a intenção dos funcionários mais velhos de continuar trabalhando após a idade normal de aposentadoria2323 Have M, Dorsselaer S, Graaf R. Associations of work and health-related characteristics with intention to continue working after the age of 65 years. Eur J Public Health 2014; 25(1):122-124.. Considerando o aumento na longevidade, são relevantes os estudos direcionados a população dos idosos e de sua participação no mundo do trabalho. Esses dados ajudarão no esclarecimento da temática diminuindo a escassez de conhecimentos desse fenômeno recente que é o prolongamento da vida laboral com permanência de idosos nas instituições. Assim como poderá estimular outras pesquisas, despertar reflexões e originar ações direcionadas ao bem-estar e melhoria da qualidade de vida do trabalhador idoso brasileiro melhorando o seu contexto laboral.
Diante das considerações feitas, realizou-se este estudo por meio de uma revisão integrativa da literatura sobre essa temática. Portanto, o objetivo deste estudo foi de analisar as evidências científicas publicadas que retratam os fatores relacionados à postergação da aposentadoria pelos trabalhadores idosos.
Método
Este é um estudo descritivo, do tipo revisão integrativa de literatura, cujo método possibilita busca, análise crítica e síntese do conhecimento produzido sobre o tema investigado podendo incluir estudos de diversas metodologias. Desse modo, permite a identificação de lacunas de conhecimento, direcionamento para futuras pesquisas e a incorporação da aplicabilidade de resultados significativos na prática2424 Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm 2008; 17(4):758-764.
25 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer Integrative review: what is it? How to do it? Einstein 2010; 8(1 Pt 1):102-106.-2626 Botelho LLR, Cunha CCA, Macedo M. O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão Soc 2011; 5(11):122-136..
Na realização desta revisão integrativa foram obedecidas as seguintes etapas: 1) Identificação do tema e elaboração da questão norteadora da pesquisa; 2) Estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão e busca na base de dados; 3) Categorização dos estudos selecionados; 4) Avaliação dos estudos incluídos na revisão; 5) Análise e interpretação dos resultados; e 6) Apresentação da revisão e síntese do conhecimento2323 Have M, Dorsselaer S, Graaf R. Associations of work and health-related characteristics with intention to continue working after the age of 65 years. Eur J Public Health 2014; 25(1):122-124..
Baseado no tema foi elaborada a seguinte questão norteadora: Quais são as evidências científicas publicadas nos últimos nove anos que retratam os fatores relacionados à postergação da aposentadoria pelos trabalhadores idosos (60 anos ou mais)? Para tanto os artigos foram selecionados em março de 2018 nas seguintes bases de dados: Scientific Eletronic Library On Line (SciELO) e Biblioteca Virtual de Saúde (BVS). Essa última engloba a Medical Literature Analysis and Retrievel System Online (MEDLINE), Literatura Científica e Técnica da America Latina e Caribe (LILACS), Index Psicologia (Index Psico), Índice Bibliográfico Espanhol de Ciências da Saúde (IBECS), Banco de Dados de Enfermagem (BDENF) e Centro Nacional de Informação de Ciências Médicas de Cuba (CUMED).
Na pesquisa das referências utilizaram-se os descritores controlados MeSH (Medical Subject Headings) e DeSC (Descritores em Ciências da Saúde) intermediados pelos operadores boleanos “AND” e “OR”, e dessa maneira as estratégias de busca ocorreram com a seguinte chave na busca avançada: Retirement OR Jubilación OR Aposentadoria AND Aged OR Anciano OR Idoso OR “Aged, 80 and over” OR “Anciano de 80 o más años” OR “Idoso de 80 anos ou mais”. Optou-se por essa chave ampla porque não se mostraram frutíferas as buscas em outras chaves quando incluímos descritores não controlados tais como “Retirement age”; “Retirement decision”; “Older workers”; Postpone; Postponement; Postponing; Procrastinate, entre outros.
Com relação aos critérios de inclusão para seleção das referências foram estabelecidos: ser artigo original cujo texto completo esteja disponível on-line e que apresente conteúdo sobre fatores que levam os idosos a postergar a aposentadoria; publicado em revista científica nos idiomas inglês, espanhol e português; no período de 01/01/2009 à 22/04/2018.
É relevante considerar que devido à escassez de artigos com amostra exclusiva de idosos, nesta revisão integrativa consideramos aqueles mistos compreendendo idosos e também trabalhadores mais velhos ou maduros (de 40 anos ou mais). Quanto aos critérios de exclusão foram descartados os artigos de revisão, teses, dissertações, livros, editoriais, resenhas e documentos governamentais.
Inicialmente a seleção dos artigos foi realizada pela leitura criteriosa dos títulos, resumos e palavras-chave por dois revisores de forma independente para verificação da adequação aos critérios de inclusão e exclusão. Após a subtração dos artigos em duplicata, foi realizada nova triagem com a leitura dos textos na íntegra, sendo eliminados os que não contemplavam os objetivos definidos e eleitos os artigos para revisão após consenso entre revisores.
Na terceira etapa da revisão para extração dos dados dos artigos selecionados utilizamos instrumento preconizado e validado por Ursi2727 Ursi ES. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura [dissertação]. Universidade de São Paulo: Ribeirão Preto; 2005. que possibilitou a síntese de cada um resguardando suas diferenças2626 Botelho LLR, Cunha CCA, Macedo M. O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão Soc 2011; 5(11):122-136..
Em seguida procedemos à avaliação do rigor metodológico através de instrumento adaptado do Critical Appraisal Skills Programme (CASP), da Public Health Resource Unit (PHRU), elaborado pela Universidade de Oxford2727 Ursi ES. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura [dissertação]. Universidade de São Paulo: Ribeirão Preto; 2005.. Essa ferramenta adaptada contou com 10 itens (máximo 10 pontos) classificando os trabalhos com as seguintes pontuações: 6 a 10 pontos com boa qualidade metodológica e viés reduzido e o mínimo 5 pontos com qualidade metodológica satisfatória com risco de viés aumentado (Quadro 1).
Instrumento de avaliação do rigor metodológico dos artigos selecionados da revisão integrativa.
Nos estudos também foi aplicado instrumento da Agency for Healthcare and Research and Quality (AHRQ) do EUA. Nesta revisão seguimos Stillwell et al.2828 Stillwell S, Melnyk BM, Fineout-Overholt E, Williamson K. Evidence-Based Practice: Step by step. Am J Nurs 2010; 110(5):41-47., que apresentam classificação hierárquica de acordo com sete níveis de evidências segundo o delineamento da pesquisa (Quadro 2).
Instrumento para classificação hierárquica das evidências para avaliação dos estudos selecionados na revisão integrativa.
Em seguida foi realizada a categorização e análise dos artigos, e depois a síntese e interpretações dos resultados. Por último foi efetuada a síntese do conhecimento com discussão dos resultados e propostas para estudos futuros.
Resultados
Inicialmente com a pesquisa nas bases de dados foram encontradas 13.795 produções que após filtragem utilizando os critérios de inclusão de idioma, anos e tipo de documento foram eliminadas 11.338. Após leitura dos títulos, resumos e palavras-chaves dos 2.457 trabalhos e exclusão de duplicatas restaram 53 artigos para leitura na íntegra, dos quais 41 não atenderam aos critérios de elegibilidade e, finalmente foram selecionados 12 para constituir a presente revisão (Figura 1).
Os doze artigos foram submetidos ao instrumento preconizado por Ursi2727 Ursi ES. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura [dissertação]. Universidade de São Paulo: Ribeirão Preto; 2005. para reunir e sintetizar as informações-chave, e após categorização dos artigos. Todos os trabalhos apresentaram escore maior ou igual a sete de acordo com análise crítica por meio do CASP, demonstrando a boa qualidade da metodologia utilizada com viés reduzido2929 Milton Keynes Primary Care Trust. Critical Appraisal Skills Programme (CASP): Making sense of evidence. London: Oxford; 2002..
A análise dos estudos possibilitou a construção de duas categorias: literatura nacional e literatura internacional. A categorização se justifica em função de que os primeiros apresentam várias características semelhantes tais como idioma; terem sido realizados em país em desenvolvimento com grandes desigualdades sociais, e onde são consideradas idosas as pessoas de 60 anos ou mais. Enquanto os artigos internacionais encontrados todos em inglês, são originários de países desenvolvidos, a maioria deles com altos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), e onde idosos são os que têm 65 anos ou mais.
Nos Quadros 3 e 4 estão registradas síntese da caracterização e outras informações relevantes dos estudos selecionados de acordo com a categorização de Literatura nacional e internacional respectivamente.
Literatura Nacional
Todos os artigos dessa categoria foram classificados com nível VI de evidência por apresentarem evidências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo2828 Stillwell S, Melnyk BM, Fineout-Overholt E, Williamson K. Evidence-Based Practice: Step by step. Am J Nurs 2010; 110(5):41-47..
A pesquisa de Menezes e França3030 Menezes G, França LH. Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais. Rev Psicol Organizações Trabalho 2012; 12(3):315-328. investigou variáveis na decisão de aposentadoria em servidores públicos com idade entre 45 e 67 anos. Esses autores por meio de análises de regressão logística múltiplas encontraram que a idade, a percepção do trabalho, a flexibilidade de horário e o controle do trabalho predizem a decisão de postergar a aposentadoria. Vale ressaltar dois achados, sendo primeiro que apenas ¼ dos participantes optaram por trabalhar na aposentadoria para complementação de renda, e outro foi que a variável alta expectativa de vida não foi significativa.
Pires et al.1717 Pires AS, Ribeiro LV, Souza NVDO, Sá CMS, Gonçalves FGA, Santos DM. A permanência no mundo do trabalho de profissionais de enfermagem com possibilidade de aposentadoria. Cien Cuid Saude 2013; 12(2):338-345. realizaram estudo em profissionais de enfermagem idosos com possibilidade de aposentadoria, cujos resultados evidenciaram que o fator financeiro era o principal influenciador para permanência no trabalho. Outros fatores encontrados por esses autores foram: apreciação do ambiente laboral e das atividades praticadas; o trabalho era estratégia contra o ócio e o espaço doméstico; percepção positiva em relação ao trabalho e a negativa sobre a aposentadoria.
Os autores Figueira et al.1818 Figueira DAM, Haddad MCL, Gvozd R, Pissinati PSCP. A tomada de decisão da aposentadoria influenciada pelas relações familiares e laborais. Rev Bras Geriatr Gerontol 2017; 20(2):207-215. evidenciaram em grupo de reflexão de pré-aposentados, na faixa etária de 48 a 60 anos, que vivências na família e no trabalho influenciam na tomada de decisão de aposentadoria, e a depender do contexto pode levar ou não a sua postergação.
O estudo de Macêdo et al.1515 Macêdo LSS, Bendassolli PF, Torres TL. Representações Sociais da Aposentadoria e Intenção de Continua Trabalhando. Psicol Soc 2017; 29:e145010. foi realizado com 283 servidores públicos, com idade entre 48 e 69 anos, que já podiam ou faltavam menos de 5 anos para se aposentar. Os resultados revelaram que a decisão de adiar a aposentadoria ocorria para servidores que se percebiam atuantes no trabalho, com ausência de atividades substitutivas, e ambiente doméstico não atrativo.
Literatura Internacional
Dos artigos dessa categoria todos foram localizados na MEDLINE, sendo cinco classificados com nível de evidência IV pelas evidências provenientes de estudos longitudinais bem delineados. Enquanto os outros três com evidência VI pelas evidências derivadas de um único estudo qualitativo ou descritivo2828 Stillwell S, Melnyk BM, Fineout-Overholt E, Williamson K. Evidence-Based Practice: Step by step. Am J Nurs 2010; 110(5):41-47..
Solinge e Henkes55 Solinge HV, Henkens K. Living longer, working longer? The impact of subjective life expectancy on retirement intentions and behavior. Eur J Public Health 2010; 20(1):47-51. realizaram pesquisa com duas coletas (2001 e 2006/2007) de amostras aleatórias com funcionários públicos e de quatro empresas multinacionais holandesas, com idade de 50 anos ou mais. Nesse estudo os resultados sugerem que os trabalhadores com alta expectativa de vida percebida e com a intenção de trabalhar por mais tempo não conseguem concretizar as suas intenções.
Nilsson et al.3131 Nilsson K, Hydbom A, Rylander L. Factors influencing the decision to extend working life or retire. Scand J Work Environ Health 2011; 37(6):473-480. fizeram estudo na Suécia, com empregados no setor saúde de 55 a 64 anos de idade, e entre as conclusões destacaram que o ambiente de trabalho mental e físico, o ritmo de trabalho, a habilidade e a competência eram fatores importantes para saber se trabalhadores mais velhos acreditavam que podiam trabalhar até os 65 anos de idade ou mais.
Na Finlândia, Perkiö-Mäkelä e Hirvonen3232 Perkiö-Mäkelä M, Hirvonen M. Physical workload and thoughts of retirement. Work 2012; 41(1):303-306. em pesquisa com grande amostra de empregados entre 45 e 63 anos, demonstraram que esses indivíduos consideravam continuar trabalhando quando ocorria baixa carga física de trabalho associada a um ou mais dos seguintes fatores: boa saúde, ganhos financeiros, trabalho significativo e desafiador, e carga horária flexível.
Os autores Oakamana e Howie1919 Oakman J, Howie L. How can organisations influence their older employees’ decision of when to retire? Work 2013; 45(3):389-397. realizaram estudo com grupos focais de 42 funcionários públicos mais velhos (mais de 40 anos) na Austrália, onde encontraram que o fornecimento de condições e ambientes de trabalho flexíveis assim como trabalho interessante e desafiador são fatores chaves no processo de extensão da vida laborativa.
A pesquisa de Thorsen et al.3333 Thorsen SV, Jensen PH, Bjørner JB. Psychosocial work environment and retirement age: a prospective study of 1876 senior employees. Int Arch Occup Environ Health 2016; 89(6):891-900. com acompanhamento por quatro anos com participantes do esquema de aposentadoria antecipada da Dinamarca, foi concentrada na faixa etária dos 60 a 64 anos que podiam se aposentar. A conclusão desses autores foi que a alta satisfação no trabalho e as condições positivas psicossociais de trabalho podem fazer com que os funcionários mais velhos adiem a aposentadoria.
Wind et al.77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499. encontraram em amostra de aposentados holandeses com idade entre 57 e 67 anos que a motivação para o trabalho, a saúde física, a situação financeira do domicílio e o voluntariado desempenharam um papel relevante em trabalhar para além da aposentadoria.
O trabalho desenvolvido por Hofäcker e Naumann3434 Hofäcker D, Naumann E. The emerging trend of work beyond retirement age in Germany. Increasing social inequality? Z Gerontol Geriatr 2015; 48(5):473-479. analisou dados de três rodadas disponíveis (anos de 1996, 2002 e 2011) do “Inquérito de Envelhecimento Alemão” (DEAS), que é um estudo transversal e longitudinal nacional na população com 40 anos ou mais. Os resultados demonstraram que a mudança no paradigma político da aposentadoria antecipada alemã alterou o comportamento de emprego dos trabalhadores mais velhos, com o aumento do tempo da vida laborativa. Esses autores sugerem que a probabilidade dos trabalhadores mais instruídos e os de menor escolaridade trabalhar além da idade de aposentadoria convergem em termos quantitativos, no entanto as razões diferem porque os primeiros desejam voluntariamente enquanto os últimos são motivados por necessidade financeira. A conclusão do estudo revela que o fator de motivação da escolha de continuar trabalhando além da aposentadoria pode reforçar as desigualdades sociais.
Cho et al.88 Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467. realizaram estudo longitudinal de oito anos para identificação dos determinantes do processo de aposentadoria em trabalhadores assalariados com mais de 50 anos, utilizando comparação de dados da Coreia do Sul, Alemanha e EUA. As estatísticas revelaram que mais de 40% dos assalariados trabalhavam após aposentadoria nos três países.
A análise empírica desse estudo coreano demonstrou que o recebimento de pensões menores leva a postergação da aposentadoria ou trabalhar após a mesma. Na Alemanha tem sistema de previdência social bem financiado que permite aos idosos com baixa escolaridade maior probabilidade de se aposentarem. Em contraste, os idosos coreanos recebem vencimentos de aposentadoria tão pequenos que não podem sair da vida laboral remunerada, mesmo que eles desejem. Nos EUA não foi evidenciado impacto estatisticamente significativo entre a pensão pública e a interação de uma ocupação com grau de instrução. Esse resultado pode ser explicado porque para os americanos as aposentadorias públicas estão mais direcionadas para as classes de baixa renda, enquanto a previdência corporativa prevalece para a maioria dos trabalhadores88 Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467..
Discussão
Na busca das referências nas bases de dados, entre os 12 artigos selecionados apenas o realizado por Pires et al.1717 Pires AS, Ribeiro LV, Souza NVDO, Sá CMS, Gonçalves FGA, Santos DM. A permanência no mundo do trabalho de profissionais de enfermagem com possibilidade de aposentadoria. Cien Cuid Saude 2013; 12(2):338-345. no Brasil compreendeu exclusivamente trabalhadores idosos. Desse modo constatou-se a escassez de publicações científicas no cenário brasileiro e internacional versando sobre fatores de adiamento de aposentadoria de trabalhadores idosos com amostra somente de indivíduos idosos de acordo com os critérios cronológicos da OMS3535 Organização Mundial de Saúde (OMS). Envelhecimento ativo: uma política de saúde / World Health Organization; tradução Suzana Gontijo. Brasília: OPAS; 2005..
Com relação aos métodos de pesquisa utilizados, nos artigos da presente revisão houve predomínio de métodos qualitativos na literatura brasileira e quantitativos no âmbito internacional. Nesse último ressaltamos a presença de pesquisas com amostras robustas e de estudos longitudinais que lhes conferem pontos fortes. Este achado corrobora com os relatos sobre a carência de estudos nacionais que utilizam métodos longitudinais de investigação3636 Leandro-França C, Murta SG. Fatores de risco e de proteção na adaptação à aposentadoria. Psicol Argumento 2014; 32(76):33-43.. Por outro lado, como ponto forte para as pesquisas nacionais, os autores Hofäcker e Naumann3434 Hofäcker D, Naumann E. The emerging trend of work beyond retirement age in Germany. Increasing social inequality? Z Gerontol Geriatr 2015; 48(5):473-479. relatam que a pesquisa quantitativa possivelmente alcança seus limites analíticos e que temática complexa como decisão de aposentadoria é beneficiada e melhor captada por abordagens qualitativas44 Neumann LTV, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist 2018; 58(4):611-617..
De modo semelhante ao que já está consolidado na literatura mundial, entre a maioria dos artigos selecionados houve concordância com relação à variável saúde ou percepção subjetiva do estado de saúde como um preditor para a aposentadoria definitiva. No estudo realizado na Finlândia, os resultados evidenciaram que a própria saúde foi declarada como uma razão para considerar o trabalho contínuo além da idade oficial de jubilação especialmente por funcionários com alta carga de trabalho físico3232 Perkiö-Mäkelä M, Hirvonen M. Physical workload and thoughts of retirement. Work 2012; 41(1):303-306.. No entanto, o trabalho sueco relata que embora as pessoas precisem de boa saúde e boa capacidade para trabalhar, a economia pareceu ser mais importante que o estado de saúde entre os entrevistados do estudo3131 Nilsson K, Hydbom A, Rylander L. Factors influencing the decision to extend working life or retire. Scand J Work Environ Health 2011; 37(6):473-480..
De acordo com Stafford et al.3737 Stafford M, Cooper R, Cadar D, Carr E, Murray E, Richards M, Stansfeld S, Zaninotto P, Head J, Kuh D. Physical and cognitive capability in mid-adulthood as determinants of retirement and extended working life in a British cohort study. Scand J Work Environ Health 2017; 43(1):15-23., a educação e o status ocupacional podem confundir ou modificar a associação entre a capacidade física ou cognitiva e aposentadoria. Esses autores relatam que os trabalhadores com menos educação ou empregos com status mais baixo podem ser menos capazes de fazer adaptações no trabalho, enquanto as tarefas envolvidas em empregos de status mais elevado tendem a exigir maior nível educacional e podem exigir maior nível de capacidade cognitiva3737 Stafford M, Cooper R, Cadar D, Carr E, Murray E, Richards M, Stansfeld S, Zaninotto P, Head J, Kuh D. Physical and cognitive capability in mid-adulthood as determinants of retirement and extended working life in a British cohort study. Scand J Work Environ Health 2017; 43(1):15-23.. Esse relato é compatível com os achados dessa revisão integrativa. Com efeito, nos resultados do estudo de Wind et al.77 Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499., os autores identificaram que o nível educacional poderia explicar apenas, parcialmente, quais fatores previram trabalhar além da aposentadoria.
Além do mais o estudo alemão considerou que as razões para permanecer trabalhando além da aposentadoria diferem pela educação, e esta foi considerada um dos principais determinantes da desigualdade social3434 Hofäcker D, Naumann E. The emerging trend of work beyond retirement age in Germany. Increasing social inequality? Z Gerontol Geriatr 2015; 48(5):473-479.. Os autores dessa pesquisa ainda afirmam que a tendência emergente do trabalho além da aposentadoria reforça as desigualdades sociais, uma vez que os trabalhadores com menor nível educacional podem não ser capazes de atender às demandas ou até mesmo se beneficiarem das políticas que encorajam prolongamento da vida laboral. Ou seja, em contraste com os trabalhadores altamente qualificados, a decisão de aposentadoria de trabalhadores de baixa escolaridade é principalmente orientada por necessidades econômicas e com frequência não está compatível com o nível de emprego ou capacidade de trabalho por mais tempo3434 Hofäcker D, Naumann E. The emerging trend of work beyond retirement age in Germany. Increasing social inequality? Z Gerontol Geriatr 2015; 48(5):473-479..
O estudo coreano examinou os determinantes do processo de aposentadoria por meio de uma comparação entre três países desenvolvidos, mas que possuem diferentes mercados de trabalho e instituições sociais nacionais. A análise empírica nessa pesquisa mostrou que uma pensão pública pequena leva a uma aposentadoria posterior, e sugere que o nível de escolaridade exerce correlação positiva ou negativa de acordo com o grau de bem estar e financiamento da previdência social do país88 Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467..
Os resultados da investigação de Menezes e França3030 Menezes G, França LH. Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais. Rev Psicol Organizações Trabalho 2012; 12(3):315-328. não confirmaram os achados dos autores Solinge e Henkes55 Solinge HV, Henkens K. Living longer, working longer? The impact of subjective life expectancy on retirement intentions and behavior. Eur J Public Health 2010; 20(1):47-51. que a expectativa de vida subjetiva influencia a intenção da decisão de aposentadoria dos trabalhadores, uma vez que essa variável não foi estatisticamente significativa. Porém um ponto forte do trabalho holandês pelo delineamento longitudinal foi a possibilidade de examinar intenções de aposentadoria em conjunto com o comportamento efetivo de aposentadoria. Esses autores sugerem que alguns trabalhadores mais velhos podem ter pouco controle sobre o momento da aposentação ou nem sempre a aposentadoria é voluntária.
Um achado interessante a ser ressaltado no estudo nacional de Menezes e França3030 Menezes G, França LH. Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais. Rev Psicol Organizações Trabalho 2012; 12(3):315-328. foi que apenas ¼ dos participantes declararam que continuariam trabalhando por razões econômicas, demonstrando que a opção de trabalhar na aposentadoria nem sempre é estimulada pela necessidade de complementar os rendimentos3030 Menezes G, França LH. Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais. Rev Psicol Organizações Trabalho 2012; 12(3):315-328..
No que se refere aos parceiros de vida e amigos próximos, tanto os artigos nacionais quanto os dos outros países mostraram desempenho importante desses fatores no que diz respeito, a saber, se os trabalhadores mais velhos querem postergar a aposentadoria, e apresentam correlação positiva ou negativa de acordo com a vivência de cada pessoa.
Analisando as conclusões das pesquisas das duas categorias observa-se que são concordantes no que se referem aos vários fatores relacionados ao trabalho que afetam a decisão dos trabalhadores mais velhos de continuar trabalhando além da idade de aposentadoria, tais como motivação no trabalho, compromisso com a carreira, percepção do trabalho, flexibilidade de horário, exigências do emprego, controle do trabalho, satisfação com suas funções e valorização, possibilidades de desenvolvimento, relações positivas de gestão, boa comunidade e bom ambiente de trabalho, sem discriminação pela idade, entre outros. No estudo dinamarquês, é relevante considerar que alta satisfação no trabalho foi o mais forte preditor psicossocial da aposentadoria tardia3333 Thorsen SV, Jensen PH, Bjørner JB. Psychosocial work environment and retirement age: a prospective study of 1876 senior employees. Int Arch Occup Environ Health 2016; 89(6):891-900.. E o estudo australiano recomenda uma revisão regular do desempenho e satisfação dos funcionários para maximizar a produtividade e a retenção de trabalhadores mais velhos1919 Oakman J, Howie L. How can organisations influence their older employees’ decision of when to retire? Work 2013; 45(3):389-397..
Considerações finais
Apesar de ser um fenômeno mundial, o processo de envelhecimento populacional acarreta impactos sociais e econômicos diferentes entre as nações desenvolvidas e naquelas em desenvolvimento, como o Brasil. A transição etária está ocorrendo de forma rápida em termos de status nacional, sem que a população tenha alcançado as devidas conquistas sociais e melhoria real das condições de vida33 Godinho MR, Ferreira AP. Aposentadoria no contexto de Reforma Previdenciária: análise descritiva em uma instituição de ensino superior. Saúde Debate 2017; 41(115):1007-1019.. Portanto, questiona-se a generalização dos resultados internacionais à população brasileira, considerando que os níveis de IDH, regras previdenciárias, condições sociais, políticas e econômicas são diferentes de outros países3636 Leandro-França C, Murta SG. Fatores de risco e de proteção na adaptação à aposentadoria. Psicol Argumento 2014; 32(76):33-43..
Além do mais a natureza transversal das pesquisas nacionais não possibilitou que os fatores determinantes do adiamento da aposentadoria fossem analisados de modo dinâmico, uma vez que os participantes apenas foram inquiridos sobre o processo. Assim como não foram realizados estudos de acompanhamento para verificar se as intenções mencionadas se transformarão em comportamento real na época da aposentadoria2323 Have M, Dorsselaer S, Graaf R. Associations of work and health-related characteristics with intention to continue working after the age of 65 years. Eur J Public Health 2014; 25(1):122-124.. Daí conclui-se que a carência de estudos de coorte nesta temática é lacuna que precisa ser suprida com estudos mais robustos nacionais.
Com base nas considerações feitas, existe a necessidade de estudos voltados para as expectativas dos trabalhadores idosos brasileiros frente à aposentadoria, melhor compreensão do processo de envelhecimento, dos fatores que determinam a participação da vida profissional na velhice e que afetam as decisões sobre a extensão da vida profissional.
Além do mais as estratégias de retenção da força de trabalho na profissão devem ser aliadas à melhoria das condições de trabalho, que é um fator determinante para a permanência desses trabalhadores3838 Macêdo MLAF, Pires DEP, Cavalcante CAA. Aposentadoria na Enfermagem: Uma Revisão de Literatura. REME 2014; 18(4):979-985.. E se os governantes utilizam de meios de incentivo para os trabalhadores idosos postergarem a aposentadoria, por outro lado eles devem proporcionar o apoio necessário para os que desejam se aposentar1515 Macêdo LSS, Bendassolli PF, Torres TL. Representações Sociais da Aposentadoria e Intenção de Continua Trabalhando. Psicol Soc 2017; 29:e145010.. No entanto, segundo Haddad3939 Haddad EGM. Prefácio. In: Costa JS, Del-Masso MCS, Soares N, Paiva SOC, organizadores. Aproximações e ensaios sobre a velhice. Franca: UNESP-FCHS; 2017. p. 14-16. o que se observa é que apesar do envelhecimento da população estar aumentando no mundo, o modelo econômico exerce poder acima de todas as fronteiras e governos, e não faz investimentos objetivando melhorar os sistemas de proteção social aos idosos3939 Haddad EGM. Prefácio. In: Costa JS, Del-Masso MCS, Soares N, Paiva SOC, organizadores. Aproximações e ensaios sobre a velhice. Franca: UNESP-FCHS; 2017. p. 14-16..
Referências
- 1Organização Mundial de Saúde (OMS). Resumo Relatório Mundial de envelhecimento e saúde Genebra: OMS; 2015.
- 2Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e pesquisas, informação demográfica e socioeconômica. Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2016 Rio de Janeiro: IBGE; 2016.
- 3Godinho MR, Ferreira AP. Aposentadoria no contexto de Reforma Previdenciária: análise descritiva em uma instituição de ensino superior. Saúde Debate 2017; 41(115):1007-1019.
- 4Neumann LTV, Albert SM. Aging in Brazil. Gerontologist 2018; 58(4):611-617.
- 5Solinge HV, Henkens K. Living longer, working longer? The impact of subjective life expectancy on retirement intentions and behavior. Eur J Public Health 2010; 20(1):47-51.
- 6Nicolaisen M, Thorsen K, Eriksen SH. Jump into the void? Factors related to a preferred retirement age: Gender, social interests, and leisure activities. Int J Aging Hum Dev 2012; 75(3):239-271.
- 7Wind A, Pas S, Blatter BM, Beek AJ. A life course perspective on working beyond retirement-results from a longitudinal study in the Netherlands. BMC Public Health 2016; 16:499.
- 8Cho J, Lee A, Woo K. A comparative study on retirement process in Korea, Germany, and the United States: Identifying determinants of retirement process. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(4):441-467.
- 9Gurgel MA. O direito ao trabalho, a conquista e a preparação para aposentadoria. In Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC, organizadores. Política nacional do idoso: Velhas e novas questões Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p. 225-240.
- 10Camarano AA, Kanso S, Fernandes D. Brasil envelhece antes e pós-PNI. In Alcântara AO, Camarano AA, Giacomin KC, organizadores. Política nacional do idoso: Velhas e novas questões Rio de Janeiro: IPEA; 2016. p. 63-106.
- 11Fôlha FAS, Novo LF. Aposentadoria: significações e dificuldades no período de transição a essa nova etapa da vida. In: Anais do XI Colóquio Internacional Sobre Gestão Universitária Na América Do Sul. II Congresso Internacional Iglu Florianópolis Santa Catarina: UFSC; 2011. p.1-13.
- 12Moreira JO, Barros FMB, Silva JM. Aposentadoria e exercício profissional: um encontro possível para os professores de uma universidade católica. Psicol Argumento 2014; 32(79):123-130.
- 13Lameiras MAP, Sandro SC, Corseuil CHL, Ramos LRA. Mercado de Trabalho. Carta de Conjuntura - 2018 - 2º Trimestre - nº 39 [Internet]. Brasília: IPEA; 2018. [acessado 2018 Set 02]. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=32921&Itemid=3
» http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=32921&Itemid=3 - 14Ribas F. As prioridades que devem orientar as políticas para o envelhecimento. Portal do Envelhecimento 2016 [Internet]. [acessado 2018 Maio 30]. Disponível em: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/asprioridades-que-devem-orientar-as-politicas-para-oenvelhecimento/
» https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/asprioridades-que-devem-orientar-as-politicas-para-oenvelhecimento/ - 15Macêdo LSS, Bendassolli PF, Torres TL. Representações Sociais da Aposentadoria e Intenção de Continua Trabalhando. Psicol Soc 2017; 29:e145010.
- 16Bennett MM, Beehr TA, Lepisto LR. A longitudinal study of work after retirement: examining predictors of bridge employment, continued career employment, and retirement. Int J Aging Hum Dev 2016; 83(3):228-255.
- 17Pires AS, Ribeiro LV, Souza NVDO, Sá CMS, Gonçalves FGA, Santos DM. A permanência no mundo do trabalho de profissionais de enfermagem com possibilidade de aposentadoria. Cien Cuid Saude 2013; 12(2):338-345.
- 18Figueira DAM, Haddad MCL, Gvozd R, Pissinati PSCP. A tomada de decisão da aposentadoria influenciada pelas relações familiares e laborais. Rev Bras Geriatr Gerontol 2017; 20(2):207-215.
- 19Oakman J, Howie L. How can organisations influence their older employees’ decision of when to retire? Work 2013; 45(3):389-397.
- 20Alcover C, Topa G, Fernández JJ. La gestión organizacional de los trabajadores mayores y los procesos de mantenimiento, prolongación y salida de la vida laboral. Papeles Psicólogo 2014; 35(2):91-98.
- 21Barbosa LM, França L, Murta SG. Projetos de Vida, Valores e Ação Comprometida. In: Murta SG. Educação para aposentadoria: promoção de saúde e desenvolvimento na Administração Pública Federal Brasília: Cead/fub; 2014. p.225-239.
- 22Nilsson K, Hydbom A, Rylander L. How are self-rated health and diagnosed disease related to early or deferred retirement? A cross-sectional study of employees aged 55-64. BMC Public Health 2016; 16(1):886-894.
- 23Have M, Dorsselaer S, Graaf R. Associations of work and health-related characteristics with intention to continue working after the age of 65 years. Eur J Public Health 2014; 25(1):122-124.
- 24Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm 2008; 17(4):758-764.
- 25Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer Integrative review: what is it? How to do it? Einstein 2010; 8(1 Pt 1):102-106.
- 26Botelho LLR, Cunha CCA, Macedo M. O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gestão Soc 2011; 5(11):122-136.
- 27Ursi ES. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura [dissertação]. Universidade de São Paulo: Ribeirão Preto; 2005.
- 28Stillwell S, Melnyk BM, Fineout-Overholt E, Williamson K. Evidence-Based Practice: Step by step. Am J Nurs 2010; 110(5):41-47.
- 29Milton Keynes Primary Care Trust. Critical Appraisal Skills Programme (CASP): Making sense of evidence London: Oxford; 2002.
- 30Menezes G, França LH. Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais. Rev Psicol Organizações Trabalho 2012; 12(3):315-328.
- 31Nilsson K, Hydbom A, Rylander L. Factors influencing the decision to extend working life or retire. Scand J Work Environ Health 2011; 37(6):473-480.
- 32Perkiö-Mäkelä M, Hirvonen M. Physical workload and thoughts of retirement. Work 2012; 41(1):303-306.
- 33Thorsen SV, Jensen PH, Bjørner JB. Psychosocial work environment and retirement age: a prospective study of 1876 senior employees. Int Arch Occup Environ Health 2016; 89(6):891-900.
- 34Hofäcker D, Naumann E. The emerging trend of work beyond retirement age in Germany. Increasing social inequality? Z Gerontol Geriatr 2015; 48(5):473-479.
- 35Organização Mundial de Saúde (OMS). Envelhecimento ativo: uma política de saúde / World Health Organization; tradução Suzana Gontijo Brasília: OPAS; 2005.
- 36Leandro-França C, Murta SG. Fatores de risco e de proteção na adaptação à aposentadoria. Psicol Argumento 2014; 32(76):33-43.
- 37Stafford M, Cooper R, Cadar D, Carr E, Murray E, Richards M, Stansfeld S, Zaninotto P, Head J, Kuh D. Physical and cognitive capability in mid-adulthood as determinants of retirement and extended working life in a British cohort study. Scand J Work Environ Health 2017; 43(1):15-23.
- 38Macêdo MLAF, Pires DEP, Cavalcante CAA. Aposentadoria na Enfermagem: Uma Revisão de Literatura. REME 2014; 18(4):979-985.
- 39Haddad EGM. Prefácio. In: Costa JS, Del-Masso MCS, Soares N, Paiva SOC, organizadores. Aproximações e ensaios sobre a velhice Franca: UNESP-FCHS; 2017. p. 14-16.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
28 Set 2020 - Data do Fascículo
Out 2020
Histórico
- Recebido
07 Jun 2018 - Aceito
11 Fev 2019 - Publicado
13 Fev 2019