Ao completar seus 25 anos com esta Edição Comemorativa, a Revista Ciência & Saúde Coletiva destaca para o leitor, dentre muitos outros, quatro aspectos que a tornam relevante, sem esconder suas fragilidades e desafios para o futuro.
Em primeiro lugar, está sua pertença à Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) cuja história de 40 anos se confunde com a construção do SUS. Isso está no DNA da Revista e marca seu crescimento, desenvolvimento e compromisso. A partir dessa sintonia, observa-se que seu foco principal é a política de saúde.
Em segundo lugar, desde sua primeira edição, em setembro de 1996, em sua coleção de artigos, a Revista Ciência & Saúde Coletiva acompanha a formulação, a implantação, a implementação e a avaliação das ações do SUS. Por isso, pode-se afirmar que ela vem contribuindo para o aprimoramento da reflexão sobre o setor. Silva et al.11 Silva LV, Esperidião MA, Silveira AS, Paim JS. A construção do campo da Saúde Coletiva e as políticas de saúde - Contribuições da Revista Ciência & Saúde Coletiva. Cien Saude Colet 2020; 25(12):2013-2022. destacam este periódico como um grande pilar para a constituição do campo22 Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2012. da Saúde Coletiva.
Acrescenta-se que ela tem cumprido outro papel também muito importante hoje para o país, que é o de incrementar a reflexão mundial sobre políticas de saúde. Por ser a revista brasileira do campo que mais publica sobre o tema, ela se sente contemplada no Relatório de Atividades da CAPES referente à Área de Saúde Coletiva de 2017, que compara os triênios de 2003-2005 e de 2013-2015, no portal SJR: “A produção brasileira em Política de Saúde passou da 26ª para a 7ª posição na produção de artigos científicos no mundo, representando 3,2% do total no triênio 2013-2015. A participação da produção nacional em Saúde Pública, Saúde Ambiental, Saúde Ocupacional e em Epidemiologia em relação à produção mundial dobrou no período, enquanto a da área de Ciências Sociais em Saúde aumentou sete vezes”33 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). CAPES divulga resultado final da Avaliação Quadrienal 2017. [acessado 2020 Ago 24]. Disponível em https://www.capes.gov.br/36-noticias/8558-avaliacao-da-capes-aponta-crescimento-da-pos-graduacao-brasileira
https://www.capes.gov.br/36-noticias/855... .
Um terceiro aspecto muito interessante que o acervo da Revista sugere é o do tratamento epistemológico do fenômeno saúde/doença. Boa parte dos textos articula conhecimentos de ciências básicas, de saúde coletiva e de clínica. Esse comportamento poderia ser execrado anos atrás, quando era importante distinguir o que era ou não era saúde coletiva, num momento inicial de construção do campo. No entanto, no mundo contemporâneo, como lembram Wallerstein44 Wallerstein I. Análise dos sistemas mundiais. In: Giddens A, Turner J, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 447-70. e Giddens e Turner55 Giddens A, Turner JH. Apresentação. In: Giddens A, Turner JH, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 8-21., a distinção de matérias e áreas tem mais o sentido de reserva de mercado disciplinar do que de orientação da produção de conhecimentos frente a realidades complexas e que exigem a colaboração teórica e multimétodos.
Em quarto lugar, uma observação sobre os métodos científicos utilizados pelos autores. No decorrer do tempo, como ocorre na maioria dos periódicos do setor, observa-se o predomínio das abordagens epidemiológicas que usam métodos quantitativos, em detrimento dos estudos qualitativos. Porém, existe uma boa parcela do acervo da Revista que apresenta trabalhos multimétodos e articula análises de dados estatísticos e aprofundamento compreensivo dos problemas. Como ocorre no campo científico do mundo inteiro44 Wallerstein I. Análise dos sistemas mundiais. In: Giddens A, Turner J, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 447-70.,55 Giddens A, Turner JH. Apresentação. In: Giddens A, Turner JH, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 8-21., as principais críticas em relação ao acervo comemorativo se referem ao insuficiente aprofundamento metodológico e analítico tanto dos estudos quantitativos como dos qualitativos. Portanto, essa questão continua a ser relevante para editores e pareceristas que analisam os originais a serem publicados. O desafio maior, porém, é dos professores, pesquisadores e orientadores que formam os autores. A publicação de um artigo é a última etapa do processo científico e depende da qualidade dos trabalhos e do grau de cientificidade que a comunidade acadêmica apresenta.
Como qualquer ação humana, a Revista Ciência & Saúde Coletiva permanentemente vivencia problemas e obstáculos: foi assim durante 25 anos. Sua disposição é de enfrentá-los e cada vez mais oferecer aos colaboradores e aos leitores um acervo de pensamento que os ajude a serem autores e atores na construção científica do campo e do SUS.
Referências
- 1Silva LV, Esperidião MA, Silveira AS, Paim JS. A construção do campo da Saúde Coletiva e as políticas de saúde - Contribuições da Revista Ciência & Saúde Coletiva. Cien Saude Colet 2020; 25(12):2013-2022.
- 2Bourdieu P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2012.
- 3Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). CAPES divulga resultado final da Avaliação Quadrienal 2017. [acessado 2020 Ago 24]. Disponível em https://www.capes.gov.br/36-noticias/8558-avaliacao-da-capes-aponta-crescimento-da-pos-graduacao-brasileira
» https://www.capes.gov.br/36-noticias/8558-avaliacao-da-capes-aponta-crescimento-da-pos-graduacao-brasileira - 4Wallerstein I. Análise dos sistemas mundiais. In: Giddens A, Turner J, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 447-70.
- 5Giddens A, Turner JH. Apresentação. In: Giddens A, Turner JH, organizadores. Teoria social hoje. São Paulo: Editora Unesp; 1999. p. 8-21.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
04 Dez 2020 - Data do Fascículo
Dez 2020