O lugar do cuidador familiar de idosos com doença de Alzheimer: uma revisão de literatura no Brasil e Estados Unidos

Eliane Varanda Dadalto Fátima Gonçalves Cavalcante Sobre os autores

Resumo

Apresenta-se uma revisão de literatura sobre cuidadores familiares de pacientes com a doença de Alzheimer, no período de 2013 a 2017, disponíveis nas bases de dados BVS, Scopus e PubMed. Descritores utilizados: doença de Alzheimer (DA), cuidadores, saúde do idoso, por combinação. Dos 163 artigos analisados, após aplicação do teste de relevancia, foram selecionados 26, apresentados a partir de cinco unidades temáticas: 1- Revisões de literatura; 2- Perfis de prevalencia dos cuidadores de DA; 3- Pesquisas qualitativas que analisam os sentimentos e os sofrimentos dos cuidadores; 4- Estudos comparativos e testes objetivos; 5- Pesquisas de avaliação de programas de intervenção. A análise compreensiva e comparativa das investigações demarcou diferenças e semelhanças, vantages e desvantagens das amostras e metodologias adotadas no Brasil e nos Estados Unidos. Os artigos analisaram fatores que influenciam o impacto sobre cuidadores familiares com doença de Alzheimer, situando os laços afetivos envolvidos, a reciprocidade esperada, os custos físicos, emocionais e sociais associados a uma doença crônica prolongada e de exigência de cuidados cada vez mais complexos. Verificou-se que o cuidador familiar tanto quanto as pessoas idosas com DA demandam uma ampla rede de suporte, acessível ou articulada, dentro e fora da família.

Palavras-chave:
Doença de Alzheimer; Cuidadores; Saúde do idoso

Introdução

O envelhecimento populacional é um evento mundial em face do aumento da expectativa de vida associado a quedas acentuadas nas taxas de mortalidade e fecundidade. Pela primeira vez na história da humanidade, as pessoas com 60 anos ou mais superarão as crianças menores de 14 anos, correspondendo, respectivamente, a 22,1% e 19,6% da população mundial11 Organização Mundial de Saúde (OMS). Global Health and Aging. Geneva: National Institute on Aging, National Institutes of Health; 2011.. No Brasil, as estatísticas apontam que, atualmente, uma em cada dez pessoas no país tem 60 anos de idade ou mais22 Brasil. Secretaria de Direitos Humanos (SDH). Dados sobre o envelhecimento no Brasil, 2017. [acessado 2018 Nov 13]. Disponível em: http://www.sdh.gov.br/assuntos/pessoa-idosa/dados-estatisticos/ DadossobreoenvelhecimentonoBrasil.pdf
http://www.sdh.gov.br/assuntos/pessoa-id...
,33 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese de Indicadores Sociais: Uma Análise das Condições de Vida da População Brasileira. Rio de Janeiro: IBGE; 2016..

O Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde de 201544 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Resumo. Geneva: OMS; 2015. revela que a porcentagem de pessoas com idade acima dos 60 anos no Brasil cresce acima da média mundial. Enquanto a quantidade de idosos vai duplicar no mundo até o ano de 2050, no Brasil ela quase triplicará. Segundo esse mesmo relatório, em 2025 o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas. Há ainda a projeção de que os idosos irão passar de 24,4 milhões para quase 70 milhões em 2050. Na mesma proporção em que a população idosa aumenta, as doenças crônicas da velhice ganham maior expressão, ocorrendo um crescimento significativo da incidência de doenças crônicas.

Segundo Pimenta et al.55 Pimenta FAP, Bicalho MAC, Romano-Silva MA, Moraes EN, Rezende NA. Chronic diseases, cognition, functional decline, and the Charlson index in elderly people with dementia. Revista da Associação Médica Brasileira 2013; 59(4):326-334., o processo de envelhecimento gera mudança significativa nos padrões de morbimortalidade. De acordo com os dados da OMS44 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Resumo. Geneva: OMS; 2015., “o principal impacto negativo do envelhecimento populacional é o aumento da prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), que são as principais causas de mortalidade e incapacidade em todo o mundo”66 Silva AR, Sgnaolin V, Nogueira EL, Loureiro F, Engroff P, Gomes I. Doenças crônicas não transmissíveis e fatores sociodemográficos associados a sintomas de depressão em idosos. J Bras Psiquiatr 2017; 66(1):45-51.. Os idosos tornam-se frágeis e dependentes em função das doenças crônicas degenerativas, ocasionada especialmente pelas síndromes demenciais.

As DCNT são responsáveis pela maioria das doenças e mortes em muitos países, seja de alta, média ou baixa condição socioeconômica, a qual, quando associada à idade elevada, se torna um problema ainda maior. No Brasil, é hoje considerada como verdadeira epidemia agravada pela transição demográfica acelerada que ocorreu e ainda vem ocorrendo no país, onde mudanças que levaram cem anos para acontecer na Europa, estão ocorrendo no país em duas ou três décadas77 Barreto MS, Carreira l, Marcon SS. Envelhecimento populacional e doenças crônicas: Reflexões sobre os desafios para o Sistema de Saúde Pública. Revista Kairós Gerontologia 2015; 18(1):325-339..

Segundo o Relatório da Associação Internacional de Alzheimer de 201588 Alzheimer's Disease International (ADI). World Alzheimer Report 2015: the global impact of dementia - an analysis of prevalence, incidence, cost and trends. London: ADI; 2015., estima-se que a cada 3,2 segundos, um novo caso de demência é detectado no mundo e a previsão é de que em 2050, haverá um novo caso a cada segundo. A previsão é que o número de doentes de Alzheimer no mundo chegue a 65,7 milhões em 2030 e a 115,4 milhões em 2050. Atualmente, 58% da população com Alzheimer encontra-se nos países desenvolvidos, percentual que atingirá os 72% em 2050. Há indicativos de que uma em cada dez pessoas maiores de oitenta anos deverá ser portadora da doença de Alzheimer (DA), sendo o avançar da idade o principal fator de risco para a doença. Nos países desenvolvidos, a DA já é a terceira causa de morte, perdendo apenas para as doenças cardiovasculares e para o câncer99 Basegio MC, Scherer S. Perspectivas atuais na prevenção da doença de Alzheimer. Estudos Interdisciplinares Sobre Envelhecimento 2012; 17(1):37-57..

A Organização Mundial da Saúde44 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Resumo. Geneva: OMS; 2015. estima que a prevalência global de demência seja de 47,5 milhões, e este número deverá aumentar substancialmente nos próximos anos, chegando a 135 milhões até 2050. Declara também a necessidade de se assumir a demência como uma prioridade mundial de saúde pública. Segundo esse relatório da OMS44 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Resumo. Geneva: OMS; 2015., os nove países com o maior número das pessoas com demência em 2010 (um milhão ou mais) foram a China (5,4 milhões), EUA (3,9 milhões), Índia (3,7 milhões), Japão (2,5 milhões), Alemanha (1,5 milhões), Rússia (1,2 milhões), França (1,1 milhão), Itália (1,1 milhão) e o Brasil (1,0 milhão).

Segundo a Alzheimer’s Association1010 Alzheimer's Association. Alzheimer's Disease Facts and Figures. Alzheimers Dement 2010; 6(2):158-194., existem 500.000 americanos com 65 anos ou mais com Alzheimer e outras demências. Destes, aproximadamente 40% são estimados com doença de Alzheimer. Estima-se que mais mulheres do que homens têm demência, uma vez que a maior expectativa de vida das mulheres aumenta a possibilidade de desenvolver essa ou outras demências. Em 2010, o Congresso americano aprovou o Projeto de Lei Nacional para o Alzheimer (PL 111-375), instituindo o Departamento de Saúde e Serviços Humanos para desenvolver um plano específico para a doença, atualizado anualmente.

No Brasil, o número de pessoas com demências já atinge cerca de 1,2 milhão. E como o número de idosos vem aumentando significativamente nos últimos 20 anos, estima-se que o número de casos de Alzheimer crescerá consideravelmente. Em nosso país, o cuidado com o idoso tende a ser de base familiar ou institucional, cabendo principalmente à família a responsabilidade por auxiliar o idoso com dependência física e/ou cognitiva, sendo que esta atenção promovida por familiares conta com pouco apoio do Estado1111 Mello JL. Introdução. In: Camarano AA, organizador. Cuidados de Longa Duração para a População Idosa: um novo risco social a ser assumido? Rio de Janeiro: IPEA; 2010..

A DA é uma das demências mais frequentes, doença cerebral irreversível e progressiva. A idade avançada aumenta a incidência de doenças neurodegenerativas, dentre elas a doença de Alzheimer, comprometendo de forma significativa a memória e também outras funções cognitivas, com intensidade suficiente para produzir perda funcional, incluindo até, eventualmente, a perda de funções ligadas a atividades da vida diária ou o reconhecimento de pessoas e lugares.

A demência por ser um processo irreversível de deterioração progressiva requer assistência em tempo integral de um cuidador familiar ou formal. Diversos estudos associam esta tarefa ao desgaste físico e emocional do cuidador, evidenciando uma sobrecarga ainda maior diante do idoso demenciado que apresenta sintomas cognitivos1212 Neri AL. Cuidar de idosos no contexto da família:questões psicológicas. São Paulo: Alínea; 2002.. Há necessidade de se ampliar investigações sobre o impacto das demências na família, especialmente na saúde do cuidador familiar, que pode vir a ser um “paciente oculto”, tendo em vista o predomínio de idosos cuidando de idosos. Segundo Ximenes et al.1313 Ximenes MA, Rico BLD, Pedreira RQ. Doença de Alzheimer: a dependência e o cuidado. Revista Kairós Gerontologia 2014; 17(2):121-140., “a carga de ministrar cuidados torna os familiares as vítimas da doença, espoliando suas reservas, incertezas e a imprevisibilidade abala sua moral e crença de que estejam proporcionando um cuidado digno ao seu familiar”.

O aumento das demências é um problema que se destaca no mundo. O rápido envelhecimento populacional associado com a dependência emerge como um desafio para a saúde pública brasileira, pois, apesar de existirem políticas nacionais voltadas à atenção à pessoa idosa, na prática os recursos existentes e destinados ao atendimento do idoso dependente têm sido precários e insuficientes1414 Bauab JP, Emmel MLG. Mudanças no cotidiano de cuidadores de idosos em processo demencial. Rev Bras Geriatr Gerontol 2014; 17(2):339-352..

O presente estudo de revisão de literatura escolheu, dentre nove países do mundo com a maior prevalência de demência em 2010, os dois países das Américas, os Estados Unidos e o Brasil, respectivamente o segundo e o nono país44 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. Resumo. Geneva: OMS; 2015.. Este artigo apresenta um estudo comparativo sobre as produções de pesquisa relacionadas ao cuidador, com ênfase no cuidador familiar.

Material e método

A revisão partiu da questão: “Como a literatura brasileira e americana aborda o tema do cuidador de idoso com a Doença de Alzheimer?”. O levantamento bibliográfico foi feito em periódicos nacionais e internacionais publicados no período de janeiro de 2013 a maio de 2017, disponíveis nas bases de dados: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scopus e PubMed. Foram utilizados os descritores doença de alzheimer/alzheimer disease, cuidadores/caregivers, saúde do idoso/health of the elderly, por combinação.

Os critérios de inclusão para seleção dos artigos foram: a) o estudo é sobre cuidadores de doentes de Alzheimer dependentes? b) ele versa sobre a saúde do cuidador? c) ele foi publicado de janeiro de 2013 a maio 2017? d) ele foi realizado no Brasil e EUA?

Foram excluídos trabalhos que não estabeleceram nenhuma relação com o tema proposto, não respondiam aos critérios de seleção e os que não foram encontrados na íntegra. Aos artigos selecionados aplicou-se o teste de relevância inicialmente nos títulos, em seguida nos resumos e, por último, na revisão do texto completo. O Quadro 1 explicita o percurso de seleção dos trabalhos incluidos na revisão.

Quadro 1
Critérios de inclusão e exclusão de textos selecionados.

Foram analisados 163 artigos, tendo sido excluídos 135 textos após o teste de relevancia, por não responderem aos critérios estabelecidos. Foram, então, selecionados 28 artigos para integrarem esta revisão da literatura.

Foi feita uma análise compreensiva e comparativa das investigações, situando os objetivos, metodologia, amostra, resultados e principais conclusões. Houve o cuidado de situar os estudos nacionais e internacionais e, sobretudo, de demarcar diferenças e semelhanças, vantages e desvantagens das amostras e metodologias adotadas, sinalizando a pertinência e o rigor dos resultados e as implicações dos estudos e recomendações.

Resultados e discussão

Em recente agenda de pesquisa nacional do Ministério da Saúde1515 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Guia prático do cuidador. Brasília: MS; 2008., as DCNT e, em especial, as demências, estão entre as quatorze linhas de pesquisa mais relevantes no país. No entanto, embora a efetividade dos cuidados e das práticas de saúde a idosos seja alvo de atenção nas investigações propostas, nada foi mencionado sobre a questão do cuidador. Por essa razão, urge destacar o lugar do cuidador familiar e a demanda de cuidados de idosos que tende a triplicar nos próximos trinta anos.

Os 28 artigos selecionados foram distribuídos em cinco categorias temáticas: 1- Revisões de literatura; 2- Perfis de prevalencia dos cuidadores de DA; 3- Pesquisas qualitativas que analisam os sentimentos e sofrimentos dos cuidadores; 4- Estudos comparativos e testes objetivos; 5- Pesquisas de avaliação de programas de intervenção.

Revisões de literatura

Dois artigos de revisão de literatura nacionais abrem nossa análise. Oliveira et al.1616 Oliveira KSA, Lucena MCMD, Alchieri JC. Estresse em cuidadores de pacientes com Alzheimer: uma revisão de literatura. Estudos e Pesquisa em Psicologia 2014; 14(1):47-64., do Rio Grande do Norte, analisaram 32 publicações de 2006 a 2013, extraídas do Scielo, PubMed e Bireme, destacando os prejuízos físico-patológicos do estresse no cuidador, associados às práticas de cuidado, acompanhado de ansiedade, depressão, cardiopatias graves e problemas imunológicos, recomendando intervenções continuadas e uma rede de suporte profissional. Os autores chamam atenção de que os estudos em geral não diferenciam o cuidador familiar e o formal.

Ximenes et al.1313 Ximenes MA, Rico BLD, Pedreira RQ. Doença de Alzheimer: a dependência e o cuidado. Revista Kairós Gerontologia 2014; 17(2):121-140. estudaram a produção científica de livros e teses, nas Bibliotecas Virtuais de Saúde em São Paulo, entre agosto e outubro de 2012, selecionando 80 textos, dos quais alguns tópicos em comum foram analisados, numa visão panorâmica. Dessa produção científica se ressaltou o olhar da doença (DA), a reciprocidade esperada pelo cuidado por parte da família, com destaque ao papel do cansaço e da solidão do cuidador e a mobilização de sentimentos opostos, de amor e raiva, paciência e intolerância, medo e insegurança, demandando apoios múltiplos.

Em síntese, de um lado os estudos sublinham o estresse, visto como o aglutinador dos sintomas e sua redução traria a melhora da qualidade de vida do cuidador. De outro, foi destacado um mal estar difuso do cuidador, cansaço e solidão, e sentimentos opostos, cuja melhora viria por meio de intervenções interdisciplinares.

Prevalencia e perfis de cuidadores de DA

Três pesquisas nacionais e uma americana situam a prevalência e o perfil de cuidadores. O estudo americano de Wang et al.1717 Wang XR, Robinson KM, Carter-Harris L. Prevalence of chronic illnesses and characteristics of chronically ill informal caregivers of persons with dementia. Age Aging 2014; 43(1):137-141. buscou examinar a prevalência e a associação de doença crônica entre cuidadores de pessoas com demência, numa amostra de 124 cuidadores informais, por meio de uma rigorosa pesquisa descritiva, correlacional e transversal, baseada em entrevistas individuais, dados sociodemográficos e análises estatísticas. Na amostra, 54 dos cuidadores tinham entre 45 e 64 anos, e 70 estavam na faixa entre 65 e 74 anos, predominando esposas (n = 46) e filhas (n = 34) e, em menor número, esposos (n = 29). Os resultados revelam que 81,5% (n = 101) da amostra tem a presença de pelo menos uma doença crônica, sendo que esse risco é três vezes maior em pessoas com 65 anos ou mais, e quatro vezes maior em mulheres mais velhas cuidadoras de cônjuges, se comparadas com cuidadores homens. Chama atenção o alto nível de comorbidade em cuidadores, independentemente da idade.

Um estudo de coorte transversal, qualitativo-descritivo, feito em Brasília por Seima et al.1818 Seima MD, Lenardt MH, Caldas CP. Relação no cuidado entre o cuidador familiar e o idoso com Alzheimer. Rev Bras Enferm 2014; 67(2):233-240., buscou interpretar a relação no cuidado entre cuidadores familiares e idosos com Alzheimer. Verificaram que os cuidadores são mulheres (n = 178; 86%), idade entre 22 e 83 anos, residem com o idoso (n = 169; 81%), têm mais de oito anos de escolaridade (n = 147; 71%), não possuem ocupação profissional (n = 121; 58%) e apresentam sobrecarga moderada (n = 96; 46,2%). O estudo apontou que a maioria dos cuidadores não participa de grupos de suporte social e eles não tem tempo de cuidar-se e, em seu cotidiano, apoiam-se na fé como principal fonte de autocuidado.

Dois outros estudos com amostras menores chegaram a resultados semelhantes. Marins et al.1919 Marins AMF, Hansel CG, Silva J. Behavioral changes of elderly with Alzheimer's Disease and the burden of care for the caregiver. Esc Anna Nery 2016; 20(2):352-356. realizaram pesquisa no Rio de Janeiro com 25 cuidadores de idosos com DA, à luz do Interacionismo Simbólico (IS), com o objetivo de identificar as mudanças comportamentais em idosos com DA e distinções na sobrecarga imposta ao cuidador. Mendes e Santos2020 Mendes CFM, Santos ALS. O cuidado na doença de Alzheimer: as representações sociais dos cuidadores familiares. Saude Soc 2016; 25(1):121-132. investigaram as representações sociais dos cuidadores familiares em um estudo empírico, exploratório, quali-quantitativo, feito em São Paulo, utilizando como método o Discurso do Sujeito Coletivo, em que participaram 21 cuidadores familiares de idosos com Alzheimer. Há conclusões complementares, enquanto a primeira aponta que mudanças comportamentais em idosos com DA têm impacto emocional e resultam em situações estressantes para o cuidador familiar, a segunda destaca que as representações sociais dos cuidadores informais sinalizam ideias de perda de liberdade, de dever moral, de retribuição e inversão de papéis sociais presentes no contexto desses cuidadores e de seus idosos com DA.

Pesquisas qualitativas analisam os sentimentos e sofrimentos dos cuidadores

Sete investigações qualitativas, distribuídas em seis pesquisas nacionais e uma americana, buscaram identificar o impacto da doença de Alzheimer na visão do cuidador informal e de sua família.

Os três primeiros estudos brasileiros buscam trazer luz aos efeitos de uma doença degenerativa como a doença de Alzheimer na família, refletindo sobre como o sistema familiar se reconfigura, como o cuidador informal percebe a DA e o suporte da família e, por fim, qual a representação social do familiar cuidador sobre a DA.

Brasil e Andrade2121 Brasil MC, Andrade CC. Reconfiguração de campo do familiar cuidador do portador de Alzheimer. Psicol Estud 2013; 18(4):713-723. realizaram no Paraná um estudo qualitativo em profundidade com três cuidadoras familiares de pacientes com DA, por meio de entrevistas semiestruturadas, num enfoque fenomenológico e da teoria de campo, com o objetivo de descrever e compreender como ocorre a reconfiguração de campo do familiar cuidador. Foram identificadas quatro categorias de análise: modos de assumir a responsabilidade de cuidar; principais mudanças na família do cuidador familiar pela intensificação da conviência; apoio da rede social como auxilio no enfrentamento do ato de cuidar; estratégias de enfrentamento que conciliem o cuidado do DA com o cuidar da própria vida. Os autores concluíram que quando uma enfermidade grave assola uma família, crises podem acontecer e é necessário tempo para que ela se reorganize.

Andrade et al.2222 Andrade LM, Sena ELS, Carvalho PAL, Matos ALP, Mercês MC, Oliveira DS. Suporte familiar ao cuidador da pessoa com Doença de Alzheimer. Revista Kairós Gerontologia 2014; 17(4):275-295. realizaram um estudo em São Paulo sobre a percepção do doente de DA e o suporte recebido de sua família para o cuidado, no enfoque fenomenológico. Participaram do estudo dez cuidadores do Grupo de Ajuda Mútua (GAM), por meio de entrevista semiestruturada individual e de grupos focais. O estudo observa que os cuidadores necessitam de reconhecimento por parte de seus familiares e, ao incorporar o cuidar como hábito, passam a negar a necessidade de um suporte e se consideram autossuficientes.

Folle et al.2323 Folle AD, Shimizu HE, Naves JOS. Social representation of Alzheimer's disease for family caregivers: stressful and rewarding. Rev Esc Enferm USP 2016; 50(1):79-85. realizaram um estudo com 26 familiares de pacientes com DA, por meio de entrevistas, analisadas pelo programa ALCESTE. O objetivo foi conhecer a Representação Social (RS) sobre a doença (DA). Os resultados apontaram dois eixos temáticos: 1- o cotidiano e o cuidado; 2- a representação social da DA, e seus significados emocional, biológico e médico. Os autores concluem que tendo em vista a dependência do paciente e as repercussões de sua doença, a sobrecarga é o principal conteúdo que requer atenção nas intervenções voltadas para os cuidadores.

Três estudos nacionais enfocam a percepção, o impacto e as dificuldades vivenciadas pelo cuidador familiar. Valente et al.2424 Valente LE, Truzzi A, Souza WF, Alves GS, Sudo FK, Alves CEO, Lanna MEO, Moreira DM, Engelhardt E, Laks J. Autopercepção de saúde em cuidadores familiares de pacientes com demência: fatores sociodemográficos e clínicos. Arquivos de Neuro-Psiquiatria 2011; 69(5):739-744., pesquisadores do Rio de Janeiro, realizaram uma investigação transversal com pares de pacientes com demência e seus cuidadores familiares principais (n = 49), cujo objetivo foi examinar a relação entre o tipo de demência do paciente (DV: demência vascular; DA: doença de Alzheimer; DM: demência mista) e a autopercepção de saúde em cuidadores familiares. Verificou-se que a maioria dos pacientes era do sexo feminino, casada ou viúva, com média de idade de 75 a 76 anos. Constataram também que 45% dos cuidadores autoavaliaram sua própria saúde física como “regular” ou “ruim”, com tendência a pior autopercepção de saúde em cuidadores de pacientes do grupo DA em relação aos cuidadores de pacientes dos grupos DV e DM, apesar de essa diferença não ser significativa em nível estatístico.

Santos e Gutierrez2525 Santos CF, Gutierrez BAO. Avaliação da qualidade de vida de cuidadores informais de idosos portadores da doença de Alzheimer. REME 2013; 17(4):792-798. buscaram conhecer a qualidade de vida de cuidadores informais de idosos (DA), num estudo em Minas Gerais. Foi feita uma pesquisa qualitativa com 50 cuidadores, sendo 25 adultos e 25 idosos. Para a coleta de dados utilizaram-se os instrumentos: WHOQOL-Breve, Escala de Depressão Geriátrica e Escala de Rastreamento de Depressão e Escala de Ansiedade. Um segundo estudo de Ilha et al.2626 Ilha S, Backes DS, Santos SSC, Gautério-Abreu DP, Silva BT, Pelzer MT. Doença de alzheimer na pessoa idosa/família: Dificuldades vivenciadas e estratégias de cuidado. Esc Anna Nery 2016; 20(1):138-146. desenvolveu pesquisa exploratória, descritiva, de abordagem qualitativa no Rio de Janeiro, por meio de grupo focal, com seis familiares cuidadores de pessoas idosas com DA, visando conhecer as dificuldades vivenciadas por esses cuidadores. Ambos os estudos identificaram que os familiares cuidadores vivenciam dificuldades de ordem física, mental e social que impõem desafios no convívio e no cuidado à pessoa idosa com DA, incluindo graus de ansiedade e depressão. O primeiro estudo recomendou aos cuidadores o alívio da preocupação e da sobrecarga, mais oportunidades para adquirirem novas informações e habilidades, participação e oportunidades de recreação e lazer. O segundo apontou que a sobrecarga pode ser minimizada por meio da construção e socialização de estratégias coletivas de cuidado.

Day et al.2727 Day JR, Anderson RA, Davis LL. Compassion fatigue in adult daughter caregivers of a parent with dementia. Issues Ment Health Nurs 2014; 35(10):796-804., da Carolina do Norte/EUA buscaram identificar fatores de risco, o que chamaram de “fadiga da compaixão” em filhas adultas cuidadoras. Afirmam que elas podem sofrer fadiga de compaixão, termo que definem como uma combinação de desamparo, desesperança, incapacidade de ser empática e sensação de isolamento resultante da exposição prolongada ao sofrimento percebido. Participaram do estudo randomizado de treinamento em casa, 12 cuidadoras adultas de um pai com demência. A análise de conteúdo foi aplicada a entrevistas. Quatro temas foram identificados: incerteza; dúvida; ligação/afeto; tensão. As descobertas indicaram que as cuidadoras adultas estão em risco de cansaço de longo prazo, apoiando a necessidade de um estudo maior que minimize esse tipo de fadiga que fragiliza o cuidado.

No conjunto, os estudos qualitativos apontam os desafios do cuidar, conviver, apoiar e enfrentar o DA e seu agravamento, face à dependência, à maior sobrecarga do cuidado associada à falta de esperança, ao desamparo e ao isolamento do cuidador, fatores que quando combinados, ampliam o sofrimento e os riscos à saúde do cuidador. Destacam ainda que nos casos em que o cuidador nega suporte, por autossuficiência, ou ao assumir sobrecargas demasiado grandes, o cuidador familiar necessita de ajuda para reconhecer as possibilidades, os limites e os modos de cuidado de si.

Estudos comparativos e testes objetivos

Quatro artigos descrevem investigações por meio de estudos comparativos entre pacientes com DA e cuidadores feitos através de escalas avaliativas, um de âmbito internacional e três nacionais.

Sousa et al.2828 Sousa MF, Santos RL, Turró-Garriga O, Dias R, Dourado MC. Factors associated with caregiver burden: comparative study between Brazilian and Spanish caregivers of patients with Alzheimer' s disease (AD). Int Psicogeriatria 2016; 28(8):1363-1374. compararam os níveis de carga nos cuidadores de pacientes com doença de Alzheimer no Brasil (n = 128) e na Espanha (n = 146), em um estudo intercultural, observacional e transversal com pacientes ambulatoriais com AD e seus cuidadores. Os cuidadores responderam a entrevista ZaritBurden (ZBI) e a um questionário sociodemográfico. Os pacientes foram avaliados em cinco testes, com o Mini-Mental State Examination (MMSE), Functional Activities Questionnaire (FAQ), Disability Assessment for Dementia (DAD), Neuropsychiatric Inventory (NPI) e Clinical Dementia Rating Scale (CDR). Os autores concluíram que um alto nível de estresse foi reportado no Brasil por cuidadores femininos, especialmente aqueles que não puderam contar com um Centro de Atenção Diária. Na Espanha, os mais altos graus de estresse estiveram associados a cuidadores mais jovens que residem com os idosos com DA e que participam de Centros de Atenção Diárias. Além disso, foram observados altos graus de depressão e ansiedade em cuidadores brasileiros e altos graus de apatia e indiferença, agitação, agressão e irritabilidade entre cuidadores espanhóis. Os autores destacam a importância de abordar os sintomas neuropsiquiátricos dos pacientes com DA porque eles são uma fonte essencial do fardo para os cuidadores.

Truzzi et al.2929 Truzzi A, Valente L, Engelhardt L, Laks J. The association between caregiver distress and individual neuropsychiatric symptoms of dementia. Dement Neuropsychol 2013; 7(3):286-291. conduziram um estudo em São Paulo com 150 cuidadores familiares e pacientes com o objetivo de avaliar o desgaste frente a sintomas neuropsiquiátricos (SNP) de cuidadores e de pacientes com demência. Eles analisaram quais fatores dos pacientes e dos cuidadores constituem fortes preditores ao desgaste do cuidador. A maioria dos pacientes possuía um diagnóstico de doença de Alzheimer (66,7%). Os cuidadores foram avaliados através de um questionário sociodemográfico, os Inventários de Ansiedade e Depressão de Beck e o Inventário Neuropsiquiátrico - Desgaste. Os pacientes foram submetidos ao Mini-Exame do Estado Mental, à Escala de Atividades Funcionais e ao Inventário Neuropsiquiátrico. Os resultados mostraram as alterações resultantes dos distúrbios do DA que mais afetam os cuidadores, situado sua M (medidas por escalas aplicadas) e o DP (desvio padrão). A apatia (M = 1,9; DP = 1,8), a agitação (M = 1,3; DP = 1,8) e o comportamento aberrante motor (CAM), (M = 1,2; DP = 1,7) foram os SNP mais desgastantes. A frequência/gravidade dos SNP foi o fator mais fortemente associado ao desgaste do cuidador (rho = 0.72; p < 0,05) e concluíram que o reconhecimento precoce e o manejo da apatia, da agitação e do CAM nos pacientes com demência pelos familiares e profissionais de saúde, possivelmente levará a uma melhor qualidade de vida e cuidado para pacientes e cuidadores.

Folquitto et al.3030 Folquitto JC, Marques RCG, Tatsch MF, Bottino CMC. Correlation between neuropsychiatric symptoms and caregiver burden in a population-based sample from São Paulo, Brazil: A preliminary report. Dement Neuropsychol 2013; 7(3):258-262. investigaram, num estudo em São Paulo, a correlação entre sintomas neuropsiquiátricos (SNP) e a sobrecarga do cuidador em 1.563 indivíduos selecionados aleatoriamente e avaliados através do Mini-Exame do Estado Mental, Fuld Object Memory Evaluation, Informant Questionnaire on Cognitive Decline in the Elderly e da Escala Bayer - Atividades de Vida Diária. O Inventário Neuropsiquiátrico foi aplicado nos cuidadores para avaliar os SNP e a Escala Zarit de Sobrecarga no Cuidador para avaliar sobrecarga nos cuidadores. O estudo também avaliou 25 sujeitos com Comprometimento Cognitivo não Demência (CIND), 61 pacientes com DA e 79 idosos saudáveis. Os resultados apontaram que houve correlação positiva boa entre os escores do INP (Inventário Neuropsiquiátrico) e da Zarit. A conclusão é que o tratamento e a gestão adequados dos sintomas neuropsiquiátricos em pacientes com demência pode ter um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes e de seus cuidadores.

Borghi et al.3131 Borghi AC, Castro VC, Marcon SS, Carreira L. Sobrecarga de familiares cuidadores de idosos com doença de Alzheimer: um estudo comparativo. Rev. Latino-Am. Enfermagem 2013; 21(4):876-883. realizaram no Paraná pesquisa visando comparar a sobrecarga do cuidador familiar principal com a do cuidador secundário do idoso com DA e identificar qual dimensão gera maior impacto com 20 cuidadores primários de idosos com Alzheimer e 20 secundários. Foi utilizada a Escala de Avaliação da Sobrecarga de Familiares de Pacientes Psiquiátricos. Os resultados mostraram que os cuidadores principais apresentaram maior sobrecarga do que os secundários nas atividades relacionadas à assistência cotidiana e a preocupação com o idoso foi a dimensão que mais influenciou na sobrecarga subjetiva dos cuidadores. Ou seja, quanto maior é a sobrecarga, melhor deverá ser as ações de planejamento em saúde.

Os dados apontam que a gravidade do quadro da DA é proporcional à sobrecarga vivenciada pelo cuidador e quanto maior é o grau de sobrecarga cotidiana, mais diretamente o cuidador é afetado em sua saúde. Portanto, não apenas a melhoria do tratamento do DA assegura a qualidade de vida do idoso com DA e de seu cuidador, como o grau de sobrecarga dos cuidadores, em revezamento, deve ser monitorado.

Pesquisas de avaliação de programas de intervenção

Há nove publicações sobre avaliação de programas de intervenção, oito americanas e uma brasileira. Dois estudos avaliam programas de intervenção e seus efeitos, três examinam práticas psicoterápicas e uma técnica meditativa, dois examinam estratégias por meio da internet e da web, um analisa uma investigação longitudinal com cuidadores e um último aborda o impacto de um programa educacional.

O estudo de Lykens et al.3232 Lykens K, Moayad N, Biswas S, Reyes-Ortiz C, Singh KP. Impact of a community based implementation of REACH II program for caregivers of Alzheimer's patients. PloS One 2014; 9(2):e89290. examinou o impacto do programa de base comunitária REACH II sobre a vida e a saúde do cuidador em uma cidade americana. O REACH II visa reduzir a carga e a depressão de cuidadores de pacientes com AD e é prestado por agências comunitárias nos Estados Unidos. Um total de 494 famílias foi incluído no programa e, destas, 177 completaram o programa de seis meses. A idade mediana para cuidadores foi de 62 anos. Os escores do domínio para Depression and Caregiver Burden demonstraram melhorias estatisticamente significativas ao final da investigação. O Programa ofereceu treinamento e capacitação aos cuidadores, desenvolveu habilidades de cuidado, apoio psicológico e acolhimento a diferenças étnicas e de raça. Na segunda fase, foram acrescidas informações estratégicas aos cuidadores, instruções didáticas, técnicas de manejo de estresse, estratégias de solução de problemas e grupo de suporte através de telefone. Os resultados foram positivos aos cuidadores que completaram o programa, com destaque aos negros e hispânicos, se comparados aos brancos.

Moore et al.3333 Moore RC, Chattillion EA, Ceglowski J, Ho J, von Känel R, Mills PJ, Ziegler MG, Patterson TL, Grant I, Mausbach BT. A randomized clinical trial of Behavioral Activation (BA) therapy for improving psychological and physical health in dementia caregivers: Results of the Pleasant Events Program (PEP). Behaviour Research and Therapy 2013; 51(10):623-632. avaliaram, nos EUA, a eficácia do “Programa de Eventos Agradáveis” (PEP), por meio de uma intervenção comportamental de seis semanas, concebida para reduzir o risco de doenças cardiovasculares e sintomas de depressão em cuidadores. Foram levados em consideração características demográficas, sintomas depressivos, escala de apoio social. Um total de 100 familiares cuidadores foram randomizados para a intervenção PEP (N = 49) ou uma condição de controle de suporte de informação (SI) equivalente ao tempo (N = 51). Os resultados mostraram-se favoráveis aos participantes que receberam a PEP. O programa PEP diminuiu a depressão e melhorou uma medida de saúde fisiológica em idosos cuidadores de pacientes com demência. Outros estudos são necessários para medir a eficácia da PEP em prevenir doenças cardiovasculares.

Aboulafia-Brakha et al.3434 Aboulafia-Brakha T, Suchecki D, Gouveia-Paulino F, Nitrini R, Ptak R. Cognitive-behavioural group therapy improves a psychophysiological marker of stress in caregivers of patients with Alzheimer's disease. Aging Ment Health 2014; 18(6):801-808. realizaram estudo nos EUA com objetivo de comparar os efeitos de uma terapia de grupo cognitivo-comportamental (CBT) com um grupo de psicoterapia do Programa EDUC, avaliando a secreção de cortisol em cuidadores de pacientes com doença de Alzheimer moderada (AD). Os 26 participantes foram divididos aleatoriamente para um dos dois programas de intervenção (CBT ou EDUC). Todos responderam a avaliação pré-intervenção e questionários assim como também foram colhidas amostras de saliva e coletadas amostras de sangue. Os efeitos das intervenções foram avaliados com autorrelatório. Os resultados apontaram que a psicoterapia para cuidadores pode contribuir para a redução dos sintomas neuropsiquiátricos de pacientes com AD, e a terapia cognitivo comportamental atenua as respostas psicofisiológicas a situações estressantes em cuidadores, reduzindo níveis de cortisol, podendo levar a um impacto positivo na saúde destes. Diferentes abordagens psicoterápicas trazem contribuições específicas aos cuidadores.

Garand et al.3535 Garand L, Rinaldo D, Alberth MM, Delany J,Beasock SL, Lopez OL, Reynolds 3rd CF, Dew MA. Effects of problem solving therapy on mental health outcomes in family caregivers of persons with a new diagnosis of mild cognitive impairment or early dementia: a randomized controlled trial. Am J Geriatr Psychiatry 2014; 22(8):771-781. avaliaram, nos EUA, os efeitos da Terapia de Resolução de Problemas (PST) sobre a saúde mental de cuidadores de idosos com comprometimento cognitivo leve (MCL; n = 43) ou demência precoce (DP; n = 30). Eles escolheram esse grupo (N = 73), pois consideraram que os cuidadores com alto grau de desgaste com idosos com demência grave não responderiam bem a esse tipo de intervenção. Os resultados mostram-se positivos para a saúde mental dos cuidadores de idosos com demência leve (MCL), com redução de sintomas depressivos e melhora nos níveis de ansiedade.

Um estudo americano de medicina alternativa conduzido por Danucalov et al.3636 Danucalov MA, Kozasa EH, Ribas KT, Galduróz JCF, Garcia MC, Verreschi ITN, Oliveira KC, Oliveira LR, Leite JR. A yoga and compassion meditation program reduces stress in familial caregivers of Alzheimer's disease patients. Evid Based Complement Alternat Med 2013; 2013:513149. buscou investigar os efeitos da prática do yoga em combinação com meditação da compaixão sobre a qualidade de vida, atenção, vitalidade e autocompaixão dos cuidadores familiares de pacientes com doença de Alzheimer (n = 46). Foi feito estudo comparativo entre grupo experimental (n = 25) e grupo controle (n = 21). Os resultados sugerem que um programa de meditação de yoga e compaixão de oito semanas pode melhorar a qualidade de vida, a vitalidade, a atenção e a autocompaixão dos cuidadores familiares de pacientes com doença de Alzheimer, reduzindo estresse, ansiedade e depressão.

Dois estudos americanos investigaram ações por meio de recursos online ou baseados em vídeo. Kajiyama et al.3737 Kajiyama B, Thompson LW, Eto-Iwase T, Yamashita M, Mario J, Tzuang YM, Gallagher-Thompson D. Exploring the Effectiveness of an Internet-Based Program for Reducing Caregiver Distress Using the iCare Stress Management E-Training Program. Aging Ment Health 2013; 17(5):544-554. verificaram se o programa americano de treinamento online I Care Stress Management, por três meses, reduz estresse, incômodo, depressão e qualidade de vida precária para cuidadores familiares de demência (n = 150). Os resultados foram considerados promissores, mas houve alto nível de abandono do programa. Austrom et al.3838 Austrom MG, Geros KN, Hemmerlein K, McGuire SM, Gao S, Brown SA, Callahan CM, Clark DO. Use of a Multiparty Web Based Videoconference Support Group for Family Caregivers. Dementia 2015; 14(5):682-690., por meio de um estudo piloto nos EUA, avaliaram a viabilidade e a aceitabilidade de um grupo de suporte de vídeo baseado na Web (n = 5), por meio de vídeo conferência semanal ao longo de seis meses, oferecido em tempo real para cuidadores de pessoas com demência. A experiência envolveu cinco cuidadores de pessoas com demência que relataram melhora na ansiedade, na depressão e na pontuação de saúde física. Os pesquisadores concluíram que o suporte baseado na web foi uma experiência positiva, embora não possam generalizar por ter sido um grupo pequeno. Essa pode ser uma ferramenta que venha alcançar populações maiores, otimizando custos de deslocamento.

Mausbach et al.3939 Mausbach BT, Chattillion EA, Ho J, Flynn LM, Tiznado D, von Känel R, Patterson TL, Grant I. Why does placement of persons with Alzheimer's disease into long-term care improve caregivers' well-being? Examination of psychological mediators. Psychol Aging 2014; 29(4):776-786. realizaram um consistente estudo longitudinal de cinco anos com 126 cuidadoras de doentes de Alzheimer (DA), todas esposas com 55 anos ou mais, para avaliar se a institucionalização do DA diminui sintomas depressivos do cuidador. O estudo parte da evidência de que o cuidador de DA de longo termo é afetado por um estresse crônico e elevado grau de sintomas depressivos. A investigação buscou identificar fatores psicológicos que vulnerabilizam o cuidador, em especial o familiar, e como esse grupo pode ser apoiado com mais efetividade, mesmo no curso de uma doença crônica de longo prazo. Foram usadas escalas de avaliação de depressão, de restrição de atividade (social e de lazer), de maestria pessoal (autocontrole), avaliação de participação em psicoterapia, uso de medicamentos ou apoio grupal, e análise do grau de suporte social em 44 esposas que deixaram os maridos num centro de atenção diária, em comparação com as demais que continuaram provendo assistência integral. Foram feitas avaliações anuais por meio de escalas e acompanhamentos trimestrais, com possibilidade de contatar os pesquisadores, se necessário. O impacto de uma ou mais internações dos familiares com DA, nos cuidadores, foi monitorado. Os resultados indicam que quando se diminui a atividade restritiva e se amplia a maestria pessoal dos cuidadores, observa-se redução dos sintomas depressivos. Ou seja, os cuidadores que optaram por realizar internações de seus amados parentes, tiveram melhor resposta na redução da depressão, voltando a ter mais mobilidade e assertividade pessoal e bem-estar.

Lopes e Cachioni4040 Lopes LO, Cachioni M. Impacto de uma intervenção psicoeducacional sobre o bem-estar subjetivo de cuidadores de idosos com doença de Alzheimer. Temas Psicol 2013; 21(1):165-181., num estudo feito em São Paulo, investigaram o impacto de um programa psicoeducacional dirigido a cuidadores familiares de idosos com DA (n = 21) em relação às avaliações desses cuidadores sobre o seu bem-estar subjetivo. O programa teve o objetivo de conhecer o processo da doença e conhecer as várias realidades do cuidado, num espaço de apoio e aprendizagens mútuas, que trabalhou por meio do educar, instruir e compartilhar cinco eixos temáticos: processo demencial; DA; Tratamento; Alterações fisiológicas e comportamentais; o cuidado. Após o Programa, foram aplicados quatro instrumentos: Escala de Satisfação Geral com a Vida; Escala de Satisfação com a Vida Referenciada a Domínios; Escala de Ânimo Positivo e Negativo; e Escala de Depressão Geriátrica. Na amostra predominaram o grupo de mulheres acima de 60 anos, com maior escolaridade, renda inferior a cinco salários mínimos, inativo, cônjuge, sem dividir tarefas, residindo com o doente de DA. Ao comparar diferenças antes e após a intervenção, houve variância de acordo com o sexo, o gênero, os graus de parentesco, a renda, a idade e o tempo de cuidado. Os resultados indicaram que os cuidadores apresentaram melhora na satisfação geral com a vida, interação social e afetos positivos.

Considerações finais

Os assuntos tratados na literatura brasileira e americana sobre os cuidadores da doença de Alzheimer denota que os dois países estão em diferentes momentos de investigação. Os estudos brasileiros descrevem as dificuldades vivenciadas pelos cuidadores e poucos trabalhos avaliam as tentativas de intervir e minorar o sofrimento dos cuidadores. Os estudos americanos destacam a necessidade de cuidar do cuidador, investigando a eficácia de programas e os resultados de diferentes tipos de intervenções ou de monitoramento de apoios a curto, médio e longo prazo, investindo na melhoria da saúde do cuidador.

Os estudos incluídos nesta revisão relataram que a maioria dos indivíduos que exercem a tarefa de cuidar no contexto familiar é do sexo feminino e geralmente são filhas ou esposas dos doentes de Alzheimer. Embora muitos destaquem que são mulheres acima de 60 anos, ou seja, idosos cuidando de idosos, há outros que apontam que mulheres de todas as idades, desde a juventude, já são acionadas a ocuparem esse lugar de cuidador, havendo perfis de cuidadores que variam em função das gerações, diferenças culturais, raciais e étnicas, como alguns estudos comparativos apontaram.

Há consenso de que é preciso destacar as necessidades dos cuidadores submetidos a cuidados de longa duração, nas fases graves da DA, e o quanto essa sobrecarga excessiva deveria ser monitorada, divida, ou compensada com apoios subjetivos e externos, formais ou do Estado. A restrição de atividades sociais e de lazer, o não exercício de habilidades pessoais e de manejo de situações problema, por parte do cuidador, pode mantê-lo refém de sintomas disfuncionais e neuropsiquiátricos, em risco de adoecer ou de não sobreviver. É necessário reconhecer possibilidades e limites e de ampliar os modos de cuidado de si.

Os artigos analisaram fatores que influenciam o impacto sobre cuidadores familiares com doença de Alzheimer, situando os laços afetivos envolvidos, a reciprocidade esperada, os custos físicos, emocionais e sociais associados a uma doença crônica prolongada e de exigência de cuidados cada vez mais complexos. O cuidador familiar tanto quanto as pessoas idosas com DA demandam uma ampla rede de suporte, nem sempre existente, acessível ou articulada, dentro e fora da família, com o apoio dos serviços, unidades ou redes de atenção, como se recomenda que as políticas públicas venham a respaldar.

Inúmeros estudos, americanos ou brasileiros, apontam a importância de que haja intervenções e apoios, dentro e fora da família, em instituições e unidades de saúde para idosos com DA e seus familiares. O cuidador cansado tende a ter reações que podem causar estresse, sentimento de culpa e perda da paciência. O sofrimento emocional e afetivo parece ser o que mais pesa no cuidador familiar e passa a influenciar de modo negativo o seu cotidiano, transformando sua vida e o contexto familiar. É preciso reunir várias estratégias terapêuticas e farmacológicas, psicoterapias, atividades educativas, informativas e didáticas, capacitação de competências pessoais e sociais, encontros por meio de grupos focais, em que haja a possibilidade de acompanhamento sistemático e longitudinal. Especialmente, deve-se ressaltar que quanto mais grave o quadro demencial, mais monitoramento deve haver entre o cuidador primário e o secundário, acionando o suporte de redes de atenção à saúde, de atenção primária e de serviços.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jan 2021
  • Data do Fascículo
    Jan 2021

Histórico

  • Recebido
    14 Out 2019
  • Aceito
    07 Out 2020
  • Publicado
    09 Out 2020
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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