Resumo
O objetivo deste estudo é identificar fatores associados à continuidade da amamentação por 12 meses ou mais em mulheres trabalhadoras. Estudo transversal realizado por meio de entrevista com 251 trabalhadoras de um hospital, com filhos biológicos entre 12 e 36 meses de idade, não gemelares e sem doença que afetasse a amamentação, e amamentando quando do seu retorno ao trabalho. Para a associação entre a continuidade da amamentação e as variáveis de exposição utilizou-se a regressão multivariável de Poisson. Apenas uma variável relacionada ao local de trabalho da mulher mostrou associação significativa com o desfecho. Trabalhar durante o dia aumentou em 37% a prevalência da amamentação por 12 meses ou mais. Os fatores não relacionados ao trabalho da mulher que mostraram associação positiva com o desfecho: mãe sem curso superior, experiência de amamentação superior a 12 meses; criança não receber outro leite quando a mãe retornou ao trabalho e não ter usado chupeta. Por outro lado, maior idade da mãe, maior idade gestacional, apoio do cuidador da criança e apoio profissional na amamentação associaram-se negativamente ao desfecho. Fatores não relacionados diretamente ao trabalho materno tiveram maior participação na continuidade da amamentação por 12 meses ou mais.
Palavras-chave:
Aleitamento materno; Trabalho feminino; Fatores de risco
Introdução
Tendo em vista o impacto positivo do aleitamento materno (AM) na saúde da criança e da mulher que amamenta11 Victora CG, Bahl R, Barros AJD, França GVA, Horton S, Krasevec J, Murch S, Sankar MJ, Walker N, Rollins NC, Lancet Breastfeeding Series Group. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet 2016; 387(10017):475-490.
2 Grummer-Strawn LM, Rollins N. Summarising the health effects of breastfeeding. Acta Paediatr 2015; 104:1-2.-33 Stuebe A. The risks of not breastfeeding for mothers and infants. Rev Obstet Gynecol 2009; 2(4):222-231., a prevenção do desmame precoce impõe-se, mesmo quando o desejo da mulher é o de manter a amamentação por mais tempo.
Entre as múltiplas razões para a interrupção precoce do AM, sobretudo do aleitamento materno exclusivo (AME), está o trabalho materno44 Warkentin S, Taddei JAAC, Viana K J, Colugnati FAB. Exclusive breastfeeding duration and determinants among Brazilian children under two years of age. Rev Nutr 2013; 26(3):259-269.
5 Rea MF, Venâncio SI, Batista LE, Santos RG, Greiner T. Possibilidades e limitações da amamentação entre mulheres trabalhadoras formais. Rev Saude Publica 1997; 31(2):149-156.-66 Fein SB, Mandal B, Roe BE. Success of strategies for combining employment and breastfeeding. Pediatrics 2008; 122(Supl. 2):S56-S62.. Entretanto, há estudos mostrando que medidas de apoio à manutenção da amamentação após o retorno da mulher ao trabalho têm impacto positivo na continuidade do AM. Entre essas medidas destacam-se políticas de flexibilização de horários, pausas para amamentar ou extrair o leite materno (LM), local apropriado para retirada e armazenamento do leite, apoio do empregador e dos colegas de trabalho77 Weber D, Janson A, Nolan M, Wen L, Rissel C. Female employees' perceptions of organisational support for breastfeeding at work: findings from an Australian health service workplace. Int Breastfeed J 2011; 6(1):19., e disponibilidade de creches no local ou próximo ao trabalho66 Fein SB, Mandal B, Roe BE. Success of strategies for combining employment and breastfeeding. Pediatrics 2008; 122(Supl. 2):S56-S62..
Pesquisa de âmbito nacional88 Brasil. Ministério da Saúde (MS). II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: MS; 2009. mostrou que 26,8% das mulheres com filhos menores de 6 meses trabalhando fora estavam amamentando exclusivamente, enquanto que 53,4% daquelas em licença-maternidade e 43,9% das que não trabalhavam fora mantinham esse padrão de amamentação. Entre as mulheres com crianças menores de 1 ano, 81,2% das que não trabalhavam fora estavam amamentando, contra 65% das que trabalhavam fora, evidenciando, assim, o impacto do trabalho materno nas taxas de AM.
O apoio à amamentação no local de trabalho é citado na literatura como um importante fator que influencia a continuidade do AM após o retorno da mulher ao trabalho. Apesar da importância do trabalho materno como fator de risco à manutenção do AM, há poucos estudos publicados sobre o assunto, sobretudo no Brasil. Pouco se conhece acerca das dificuldades e facilidades relacionadas à continuidade do AM após o retorno das mulheres ao trabalho. A presente pesquisa foi idealizada considerando-se que o conhecimento de fatores que interferem na amamentação da mulher trabalhadora é importante para o planejamento de ações que visem à ampliação da duração do AM nessa população. Assim, o seu objetivo foi identificar fatores associados à continuidade do AM por 12 meses ou mais em mulheres trabalhadoras de um hospital geral de grande porte, com ênfase nos fatores relacionados ao local de trabalho.
Materiais e métodos
Este é um estudo transversal, com coleta de dados entre junho de 2016 e julho de 2017, realizado no município de Porto Alegre, sul do Brasil, com 251 servidoras de um hospital público geral de grande porte ligado a uma universidade.
O hospital possui cerca de 6.000 servidores, sendo a maioria do sexo feminino e em idade fértil. Oferece as seguintes facilidades para as servidoras com filhos pequenos: licença-maternidade de 180 dias, liberação de uma hora por dia para amamentação até a criança completar 1 ano de vida; creche localizada próximo à instituição, banco de leite humano (BLH), serviço de disque-amamentação e profissionais capacitados em AM que atuam na unidade de internação neonatal como consultores em lactação.
Participaram da pesquisa trabalhadoras do hospital que atendiam aos seguintes critérios de inclusão: ter filhos biológicos com idade entre 12 e 36 meses, não gemelares, nascidos durante o contrato de trabalho com a instituição; estar amamentando após a licença-maternidade; e não apresentarem doenças (mães e/ou crianças) que afetassem significativamente o AM, tais como malformações orofaciais e doenças neurológicas.
Com o intuito de obter a informação sobre o desfecho, definido como a continuidade do AM por 12 meses ou mais, foi estabelecida a faixa etária mínima de 12 meses. A idade máxima de 36 meses foi estipulada para minimizar um possível viés de memória.
Caso a mulher tivesse mais de um filho na faixa etária do estudo, foi selecionada a criança de menor idade.
As informações foram obtidas por meio de entrevista previamente agendada com as mulheres nas dependências do hospital, utilizando-se questionário estruturado elaborado pelas pesquisadoras especialmente para a pesquisa. As entrevistas tiveram duração média de 30 minutos.
Para o cálculo amostral, foram utilizados os seguintes parâmetros: alfa =5%; poder do estudo =80%; prevalência de AM por 12 meses ou mais =50%99 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e Mulher - PNDS 2006. Brasília: MS; 2009.; prevalência das principais variáveis independentes segundo estudo piloto realizado com 7 mulheres =50 a 60%; razão de chances (odds ratio - OR) =2,0. O cálculo resultou em uma amostra mínima variando de 296 a 317, dependendo das frequências das variáveis independentes.
Os dados coletados foram duplamente digitados com posterior validação e as análises estatísticas feitas pelo software SPSS versão 23. As variáveis quantitativas foram descritas por média e desvio padrão ou mediana e amplitude interquartílica; as categóricas por frequências absolutas e relativas.
Devido ao elevado número de variáveis envolvidas para explicar o desfecho, foi elaborado um modelo hierárquico de regressão1010 Victora CG, Huttly SR, Fuchs SC, Olinto MT. The role of conceptual frameworks in epidemiological analysis: a hierarchical approach. Int J Epidemiol 1997; 26(1):224-227., em que as variáveis são agrupadas em blocos de acordo com a sua relação de proximidade com o desfecho1111 Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MI. Factors associated with exclusive breastfeeding in the first six months of life in Brazil: a systematic review. Rev Saude Publica 2015; 49:91.. Assim, as diferentes variáveis foram distribuídas em três níveis hierárquicos, a saber: distal, intermediário e proximal. A Figura 1 lista as variáveis que foram exploradas em cada nível hierárquico quanto a uma possível associação com a continuidade do AM por 12 meses ou mais na população estudada.
Modelo hierárquico conceitual utilizado para identificar os fatores associados com a continuidade do AM por ≥12 meses em mulheres trabalhadoras.
Primeiramente, estimou-se a associação entre o desfecho e as variáveis de cada bloco, utilizando-se a regressão de Poisson univariável. As variáveis que atingiram nível de significância p<0,20 na análise univariável foram submetidas à regressão de Poisson multivariável, ou seja, submetidas juntas no seu bloco à regressão de Poisson (análise intrabloco). A variável que atingia nível de significância p<0,20 na análise intrabloco permanecia no modelo até o final, ajustando os efeitos nos blocos subsequentes por serem considerados possíveis fatores de confusão. A magnitude da associação foi estimada por meio de razão de prevalência bruta (RP) e ajustada (RPa) e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%), sendo considerada significativa a associação com valor de p<0,05. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital que sediou a pesquisa e cadastrada na Plataforma Brasil. Todas as participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Resultados
Inicialmente, foram contatadas 300 mulheres. Dessas, 49 não foram incluídas no estudo por não estarem amamentando quando do retorno ao trabalho. Portanto, participaram deste estudo 251 mulheres que atendiam aos critérios de elegibilidade. A Tabela 1 apresenta as características da população estudada.
A duração mediana do AME foi de 150 dias e 95% das crianças estavam recebendo outro tipo de leite na época do retorno da mulher ao trabalho, o que ocorreu entre 4 e 11 meses, com mediana de 6 meses.
A maioria das mulheres relatou que pretendia amamentar por mais de 12 meses e praticamente todas disseram que gostariam de continuar a amamentação após o retorno ao trabalho; 62,3% das crianças foram efetivamente amamentadas por 12 meses ou mais.
A Tabela 2 mostra alguns dados relacionados com o retorno ao trabalho na condição de lactante. A maioria das mulheres trabalhava na assistência aos pacientes e apenas durante o dia. A média da carga horária semanal foi de 35,5 horas. Aproximadamente – das mulheres relataram não ter sido informadas pela instituição a respeito de assuntos ligados à amamentação após o retorno ao trabalho, e o nível de desconhecimento sobre algumas facilidades da instituição variou de acordo com a facilidade.
Em torno de 1/3 das servidoras extraiu leite da mama durante a jornada de trabalho e/ou procuraram o BLH. Pouco menos de ¼ das crianças frequentou a creche e 13,5% foram amamentadas nesse local. Quando questionadas sobre o espaço destinado à amamentação na creche, mais da metade das mulheres que amamentaram nesse local o considerou inadequado.
A Tabela 3 apresenta o modelo final da análise multivariável hierarquizada estimando as associações entre a continuidade da amamentação por 12 meses ou mais e as diversas variáveis exploradas.
O resultado final da análise mostrou que os seguintes fatores apresentaram associação positiva com a continuidade da amamentação por 12 meses ou mais: mães sem curso superior; mães com experiência prévia de amamentação igual ou maior que 12 meses; criança não estar recebendo outro leite quando do retorno da mãe ao trabalho; criança não ter usado chupeta; e mãe trabalhar somente durante o dia. Por outro lado, os seguintes fatores mostraram associação negativa com o desfecho: idade da mãe (prevalência 3% menor a cada ano de idade); idade gestacional do recém-nascido (prevalência 7% menor para cada semana a mais de gestação); mãe ter apoio do cuidador da criança e apoio profissional na amamentação.
Discussão
Este estudo tem o mérito de ser o primeiro a ser realizado no Brasil detalhando as características relacionadas ao trabalho da mulher que poderiam interferir no AM após o seu retorno ao trabalho, relacionando-as com a duração dessa prática.
Surpreendentemente, das 22 variáveis relacionadas ao trabalho da mulher, apenas uma mostrou-se associada à continuidade do AM por 12 meses ou mais: o turno de trabalho. Trabalhar somente durante o dia aumentou em 37% a prevalência de continuidade do AM por 12 meses ou mais. Essa associação já havia sido relatada em outro estudo brasileiro, sugerindo que mulheres que trabalham no período noturno podem ter um distanciamento maior em relação aos cuidados da criança, não conseguindo amamentar em virtude do cansaço decorrente do trabalho noturno1212 Morais AMB, Machado MMT, Aquino PS, Almeida MI. Vivência da amamentação por trabalhadoras de uma indústria têxtil do Estado do Ceará, Brasil. Rev Bras Enferm 2011; 64(1):66-71..
O presente estudo não encontrou associação entre manutenção do AM após o retorno da mulher ao trabalho e políticas de flexibilização de horário, pausas para amamentar ou extrair o LM, local apropriado para retirada e armazenamento do leite, apoio da chefia e dos colegas de trabalho e creche no local ou próximo ao trabalho. Tais associações foram encontradas em outros estudos66 Fein SB, Mandal B, Roe BE. Success of strategies for combining employment and breastfeeding. Pediatrics 2008; 122(Supl. 2):S56-S62.,77 Weber D, Janson A, Nolan M, Wen L, Rissel C. Female employees' perceptions of organisational support for breastfeeding at work: findings from an Australian health service workplace. Int Breastfeed J 2011; 6(1):19.,1313 Dinour LM, Szaro JM. Employer-based programs to support breastfeeding among working mothers: A systematic review. Breastfeed Med 2017; 12(3): 131-141.,1414 Marinelli KA, Moren K, Taylor JS, The Academy of Breastfeeding Medicine.Breastfeeding support for mothers in workplace employment or educational settings: summary statement. Breastfeed Med 2013; 8(1):137-142.. Diferenças importantes entre estes estudos e o nosso, tais como características da população estudada e do ambiente de trabalho, bem como duração da licença-maternidade e definição do desfecho, podem explicar, pelo menos em parte, tais diferenças.
Na população estudada, fatores individuais e outros não vinculados diretamente ao trabalho da mulher associaram-se em maior número com a continuidade do AM por 12 meses ou mais do que fatores relacionados ao trabalho. Os fatores individuais que se mostraram associados com a manutenção do AM após o retorno ao trabalho no presente estudo, tais como idade materna, escolaridade, experiência prévia em amamentação, idade gestacional, uso de outros leites, apoio à amamentação e uso de chupeta têm sido associados com a duração do AM em outros estudos1111 Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MI. Factors associated with exclusive breastfeeding in the first six months of life in Brazil: a systematic review. Rev Saude Publica 2015; 49:91.,1515 Muelbert M. Fatores Associados com a Manutenção do Aleitamento Materno por 6, 12 e 24 meses em uma coorte de mães adolescentes [dissertação]. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2017.
16 Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Boccolini PMM. Breastfeeding can prevent hospitalization for pneumonia among children under 1 year old. J Pediatr (Rio J) 2011; 87(5):399-404.
17 Brasileiro AA, Ambrosano GMB, Marba STM, Possobon RF. A amamentação entre filhos de mulheres trabalhadoras. Rev Saude Publica 2012; 46(4):642-648.-1818 Martins EJ, Giugliani ERJ. Which women breastfeed for 2 years or more? J Pediatr (Rio J) 2012; 88(1):67-73.. Esses fatores, portanto, devem ser levados em consideração também na elaboração de estratégias de promoção do AM após retorno ao trabalho.
Um resultado aparentemente paradoxal encontrado no presente estudo foi a associação negativa entre apoio profissional e manutenção da amamentação por mais tempo. É possível que as mulheres que relataram não ter tido apoio profissional tivessem menos problemas na amamentação, necessitando menos desse apoio e, inclusive, procurando menos esses profissionais.
Apesar da importância da informação no manejo da amamentação na fase de retorno ao trabalho1717 Brasileiro AA, Ambrosano GMB, Marba STM, Possobon RF. A amamentação entre filhos de mulheres trabalhadoras. Rev Saude Publica 2012; 46(4):642-648., destaca-se, no presente estudo, a desinformação das mulheres. A maioria referiu não ter recebido orientações da instituição sobre o retorno ao trabalho amamentando e não sabia da possibilidade de obter os serviços de consultoras em lactação; algumas desconheciam a existência de BLH na instituição e outras sequer sabiam da possibilidade de redução de jornada de trabalho de 1 hora por dia até a criança completar 1 ano.
A instituição onde foi realizada esta pesquisa, apesar de oferecer várias facilidades que promovem e protegem a amamentação, como por exemplo, ser certificada na Iniciativa Hospital Amigo da Criança, licença-maternidade de 6 meses, disponibilidade de BLH e de profissionais especializados em AM e creche próxima ao local de trabalho, não dispõe de ações direcionadas às mulheres que retornam ao trabalho e querem manter a amamentação. Essa, provavelmente, é a razão de apenas um terço das mulheres terem extraído o seu leite durante a jornada de trabalho, medida muito importante para a manutenção do suprimento de leite. Pode explicar, também, o fato de metade das que extraíam o leite ter o desprezado, mesmo havendo na instituição toda a infraestrutura necessária para a retirada e armazenamento do LM de forma segura, privando, assim, a criança de receber o LM em casa na ausência da mãe.
Um estudo conduzido na Austrália com mulheres profissionais de saúde também mostrou desconhecimento delas quanto a aspectos relacionados à amamentação após retorno ao trabalho1919 Xiang N, Zadoroznyj M, Tomaszewski W, Martin B. Timing of return to work and breastfeeding in Australia. Pediatrics 2016; 137(6):e20153883.. Os autores observaram que muito poucas mulheres conversaram com os gestores sobre amamentação após o retorno ao trabalho e sabiam da pausa para extrair o LM. Mais da metade relatou que provavelmente teria amamentado mais após o retorno ao trabalho se tivesse recebido mais informação e suporte do seu local de trabalho.
No presente estudo, pouco mais da metade das entrevistadas referiu ter recebido apoio de colegas e chefias para continuar a amamentação após o retorno ao trabalho. Apesar do pouco apoio relatado, foi maior do que o observado por Weber et al.77 Weber D, Janson A, Nolan M, Wen L, Rissel C. Female employees' perceptions of organisational support for breastfeeding at work: findings from an Australian health service workplace. Int Breastfeed J 2011; 6(1):19. na Austrália, onde apenas 11% das entrevistadas disseram ter tido apoio da chefia e 13% dos colegas para manter o AM. É interessante observar também que, na percepção das mulheres do presente estudo, não houve diferença entre o apoio oferecido por colegas homens ou mulheres.
Há relatos de que mães que não conseguem amamentar durante a jornada de trabalho têm mais chances de desmamar2020 Brasileiro AA, Possobon RF, Carrascoza KC, Ambrosano GMB, Moraes ABA. Impacto do incentivo ao aleitamento materno entre trabalhadoras formais. Cad Saude Publica 2010; 26(9):1705-1713. e que manter as crianças perto ou no local de trabalho ajudaria na continuidade do AM após o retorno das mulheres ao trabalho, dando oportunidade para elas oferecerem o peito diretamente66 Fein SB, Mandal B, Roe BE. Success of strategies for combining employment and breastfeeding. Pediatrics 2008; 122(Supl. 2):S56-S62.. Isto não ocorreu com as mulheres do presente estudo, o que pode ser explicado pelo fato de que muitas crianças que frequentavam a creche não eram amamentadas nesse local. A inadequação do espaço disponível para as mães amamentarem na creche, segundo relatado por elas, pode ter contribuído para a baixa adesão de amamentação nesse local.
É interessante observar que, apesar de não haver um programa institucional de acolhimento às mulheres que retornam ao trabalho após a licença-maternidade e que querem manter a amamentação, a maioria das servidoras da instituição onde o estudo foi conduzido relatou estar satisfeita com o apoio recebido, o que pode ser um reflexo da satisfação geral da trabalhadora com a instituição.
Outro achado interessante deste estudo foi a maior duração do AME entre as mulheres estudadas quando comparadas com a população do município de Porto Alegre (150 dias vs. 52 dias88 Brasil. Ministério da Saúde (MS). II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: MS; 2009.). Uma das hipóteses para esse achado é o fato de a maioria das mulheres de nosso estudo ser profissional de um hospital que valoriza a amamentação, haja vista ser certificado pela Iniciativa Hospital Amigo da Criança. A licença-maternidade de 6 meses, somada ao fato de que as mulheres que desmamaram antes de retornarem ao trabalho não fizeram parte do estudo, pode ter contribuído para esse resultado.
Apesar da relevância dos achados deste estudo, é importante apontar algumas limitações. Destaca-se o fato de ter sido realizado em um único local e com uma população constituída na sua maioria por profissionais de saúde. Além disso, as mulheres deste estudo têm alguns privilégios que a maioria das trabalhadoras no Brasil não possui, como licença-maternidade de 6 meses, alta escolaridade, disponibilidade de um BLH e creche próximo ao local de trabalho. Por isso, são necessárias pesquisas futuras em locais com estrutura e organização diferentes para as mulheres que amamentam e com outros perfis de população para um melhor entendimento dos fatores no ambiente de trabalho que facilitam ou dificultam a continuidade do AM após o retorno da mulher ao trabalho.
Concluindo, este estudo mostrou que, entre as servidoras da instituição pesquisada, os fatores ligados diretamente ao trabalho da mulher que poderiam interferir negativamente na manutenção do AM após o retorno da mulher ao trabalho não se associaram à continuidade do AM por 12 meses ou mais. Isto pode ser explicado, pelo menos em parte, pelos benefícios oferecidos pela instituição, sobretudo a licença-maternidade de 6 meses. Apesar disso, é provável que um programa de acolhimento das mulheres que querem manter a amamentação após o retorno ao trabalho poderia mudar esse cenário e aumentar as prevalências de amamentação continuada aos 12 meses, além de tornar mais fácil e prazerosa a experiência de conciliar trabalho materno e amamentação. Os fatores associados à continuidade do AM encontrados neste estudo, inclusive os não relacionados ao local de trabalho, devem ser levados em consideração na elaboração de estratégias de promoção do AM após retorno ao trabalho.
Referências
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- 2Grummer-Strawn LM, Rollins N. Summarising the health effects of breastfeeding. Acta Paediatr 2015; 104:1-2.
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- 14Marinelli KA, Moren K, Taylor JS, The Academy of Breastfeeding Medicine.Breastfeeding support for mothers in workplace employment or educational settings: summary statement. Breastfeed Med 2013; 8(1):137-142.
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- 19Xiang N, Zadoroznyj M, Tomaszewski W, Martin B. Timing of return to work and breastfeeding in Australia. Pediatrics 2016; 137(6):e20153883.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
26 Nov 2021 - Data do Fascículo
Nov 2021
Histórico
- Recebido
04 Fev 2020 - Aceito
19 Out 2020 - Publicado
21 Out 2020