De 1984, ano de criação do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher e da Criança, até chegar ao cenário atual, a agenda da assistência integral à saúde da mulher e da criança experimentou avanços importantes. Políticas, programas e ações foram instituídos e compromissos entre gestores das três esferas de governo foram estabelecidos para responder às transformações do quadro epidemiológico e às demandas do movimento de mulheres pela humanização do parto. Nas duas últimas décadas, destacam-se o Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento (2000), a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, ambos em 2004, e o Pacto pela Redução da Mortalidade Infantil no Nordeste e Amazônia Legal (2009). Embora essas políticas tenham garantido progressos no direito à saúde, com acesso praticamente universal ao pré-natal e ao parto hospitalar e redução da morbimortalidade materna e infantil, a manutenção desses indicadores em valores elevados em comparações internacionais indicam obstáculos a superar, entre eles: o predomínio de causas evitáveis de óbito materno e infantil, a alta frequência de intervenções obstétricas desnecessárias, como a cesariana e a concentração de óbitos neonatais nas primeiras horas de vida11 Leal MC, Szwarcwald CL, Almeida PVB, Aquino EML, Barreto ML, Barros F, Victora C. Saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil nos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Cien Saude Colet 2018; 23(6):1915-1928.. Esta situação remete à gestão dos serviços e aos processos de trabalho no cuidado à saúde da mulher e ao neonato, especialmente no ambiente hospitalar, no qual um percentual importante de eventos adversos ocorre. Com o propósito de transformar este cenário, em 2011, o Ministério da Saúde (MS) lançou a Rede Cegonha (RC) como forma de alcançar mudanças no modelo de atenção ao parto e nascimento, de forma a ampliar o acesso e a qualificação das práticas de cuidado e gestão na assistência à saúde da mulher e da criança. Como parte do processo de aprimoramento da estratégia e de apoio à tomada de decisões, o MS, em parceria com duas instituições de ensino e pesquisa do país (Fundação Oswaldo Cruz e Universidade Federal do Maranhão), realizou a avaliação dos componentes parto e nascimento da RC22 Bittencourt SDA, Vilela MEA, Marques MC, Santos A, Silva CK, Domingues RMSM, Reis A, Santos G. Atenção ao Parto e Nascimento em Maternidades da Rede Cegonha: avaliação do grau de implantação das ações. Cien Saude Colet 2021; 26(3):801-819.. Foram avaliadas 606 maternidades conveniadas ao SUS com plano de ação da RC, responsáveis por mais de 50% dos partos do país, em 2017. A avaliação envolveu gestores, trabalhadores de saúde e puérperas, além de análise documental e de observação da ambiência. O processo avaliativo foi construído reforçando a corresponsabilidade tripartite e estimulando coletivos, de modo a colocar em análise suas práticas e seus modos de organização do trabalho. Este número reúne resultados sob distintas abordagens metodológicas e desenhos analíticos a partir das bases de dados produzidas no processo avaliativo. Os resultados, apresentados em dezessete artigos originais, abordam: i) desafios da RC; ii) aspectos metodológicos da avaliação, ressaltando oportunidades e fragilidades; iii) criação e utilização de matriz de julgamento do grau de implantação das ações de parto e nascimento; iv) análise das iniquidades no acesso ao parto (por raça/cor, idade, deficiência motora, visual, auditiva, dentre outros); v) estrutura física e processo de trabalho na atenção integral ao recém-nascido e a transição do modelo de ambiência em hospitais que realizam partos na RC; vi) situação dos leitos neonatais no país; vii) atenção ao parto por enfermeira; viii) devolutiva estadual dos resultados da avaliação a gestores e trabalhadores; ix) tendência de cesarianas e da mortalidade neonatal antes e após implantação da RC; e, ainda, x) dois estudos qualitativos – um analisa as práticas sociais do parto e do nascer no Brasil na perspectiva das puérperas; e o outro avalia a atenção ao parto e nascimento em maternidades do Norte e Nordeste do Brasil, a partir da percepção dos avaliadores da RC. Esperamos que este suplemento contribua para uma ampla reflexão acerca dos avanços e desafios do parir e do nascer no Brasil. Boa leitura!
Referências
- 1Leal MC, Szwarcwald CL, Almeida PVB, Aquino EML, Barreto ML, Barros F, Victora C. Saúde reprodutiva, materna, neonatal e infantil nos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS). Cien Saude Colet 2018; 23(6):1915-1928.
- 2Bittencourt SDA, Vilela MEA, Marques MC, Santos A, Silva CK, Domingues RMSM, Reis A, Santos G. Atenção ao Parto e Nascimento em Maternidades da Rede Cegonha: avaliação do grau de implantação das ações. Cien Saude Colet 2021; 26(3):801-819.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
15 Mar 2021 - Data do Fascículo
Mar 2021