Estado, políticas públicas e saúde no sistema penitenciário

André Vinicius Pires Guerrero Barbara Coelho Vaz Fernanda Maria Duarte Severo Helena Fonseca Rodrigues Jaqueline Tavares de Assis June Corrêa Borges Scafuto Marden Marques Soares Filho Martinho Braga Batista e Silva Nara Denilse de Araújo Santos Pollyanna Bezerra Lima Alves Sobre os autores

O sistema penitenciário brasileiro vem, há anos, sendo alvo de críticas em função das condições de indignidade material, sanitária e mental a que as pessoas privadas de liberdade são submetidas. Nosso número temático apresenta 25 artigos como parte dos esforços científicos de qualificar um fenômeno social complexo do tempo presente, mas tantas vezes silenciado e invisibilizado.

No Brasil, a taxa de encarceramento dos últimos 15 anos cresceu 7% ao ano, dez vezes mais rápido do que o crescimento populacional, nos colocando, no cenário mundial, entre os países com maiores taxas de encarceramento. O quadro compreensivo interdisciplinar da produção acadêmica revela as condições precárias da vida no cárcere, com problemas de segurança e riscos, insalubridade, superlotação, estrutura física e organizacional insuficientes, condições geradoras de inúmeros agravos para toda a comunidade carcerária.

O diálogo acerca dessas condições com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade e outras políticas públicas destinadas à inclusão social dessa população é uma tarefa que precisa ganhar organicidade crítica e ter a implementação potencializada. Assim, esta chamada pretendeu adensar o enfrentamento das desigualdades e vulnerabilidades em saúde e psicossociais nas prisões, explorando aspectos relativos às condições de vida da comunidade carcerária, à oferta de serviços e cuidados, ao processo de trabalho no sistema penitenciário, às ações orientadas ao desencarceramento e à produção de alternativas para uma vida digna.

Inicialmente, esta edição apresenta um artigo que dimensiona socialmente o encarceramento no Rio de Janeiro frente a questões centrais no processo das políticas públicas. De modo correlato, o segundo artigo apresenta uma contribuição das ciências sociais em diálogo profundo com a dimensão governamental brasileira. Centrado no contexto pandêmico, uma revisão sistemática abordou o cenário nacional e internacional e amplificou o olhar crítico sobre as políticas de governança das condições de saúde da comunidade carcerária.

Corroborando a emergência da pauta de gênero e questões relacionadas à interseccionalidade nas agendas de pesquisa contemporânea, bem como o crescimento da população feminina encarcerada desde 2006, nesta edição, sete artigos versam sobre esse recorte populacional.

No que diz respeito às práticas de cuidado, atenção e promoção da saúde e aos estudos singulares acerca das equipes de saúde no sistema prisional, são retratadas ações e serviços referentes à realidade do atendimento atrás e fora das grades em mais de sete artigos.

Tradicionalmente, no âmbito científico, os estudos de caráter epidemiológico a respeito de doenças infectocontagiosas, como tuberculose e HIV/Aids, ocupam lugar de destaque, como pode ser verificado na edição “Saúde nas prisões: avaliações, políticas e práticas”11 Sánchez A, Leal MC, Larouzé B. Realidade e desafios da saúde nas prisões. Cien Saude Colet 2016; 21(7):1996. (2016) e na revisão sistemática sobre saúde penitenciária de Góis et al.22 Gois SM, Santos Junior HP, Silveira MF, Gaudêncio MM. Para além das grades e punições: uma revisão sistemática sobre a saúde penitenciária. Cien Saude Colet 2012; 17(5):1235-1246.. Já neste número temático, são apenas três artigos.

Por fim, na esfera da saúde mental, dois artigos nos apontam as dificuldades do Estado em assegurar direitos fundamentais garantidos nos instrumentos legais. Além disso, um artigo aborda doenças crônicas e outros dois tratam da dificuldade de acesso aos medicamentos.

Ressalta-se que os problemas relacionados ao cárcere não se encerram na instituição e estendem as conse quências da prisão, que ressoam na vida em liberdade. Esperamos que esse número temático aponte reflexões pertinentes para enfrentarmos a problemática complexa do encarceramento no Brasil e nos apoie na busca de conhecimentos capazes de consolidar alternativas sociais para que nossas políticas públicas sejam mais efetivas e justas.

Referências

  • 1
    Sánchez A, Leal MC, Larouzé B. Realidade e desafios da saúde nas prisões. Cien Saude Colet 2016; 21(7):1996.
  • 2
    Gois SM, Santos Junior HP, Silveira MF, Gaudêncio MM. Para além das grades e punições: uma revisão sistemática sobre a saúde penitenciária. Cien Saude Colet 2012; 17(5):1235-1246.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    Dez 2022
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