Características e estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas por profissionais da atenção primária à saúde

Sheylane de Queiroz Moraes Francisco Timbó de Paiva Neto Mathias Roberto Loch Rogério César Fermino Cassiano Ricardo Rech Sobre os autores

Resumo

O estudo buscou descrever as características e estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas por profissionais da atenção primária à saúde (APS). Foi realizada uma pesquisa com 587 profissionais de saúde (85,4% mulheres) que atuam na APS de Florianópolis, no estado de Santa Catarina, Sul do Brasil. Foram considerados os aconselhamentos efetuados nos últimos 12 meses, avaliando-se aspectos operacionais relacionados às práticas e estratégias utilizadas. A frequência de orientação de atividade física foi de 86,2% (IC95% = 83,2-88,8%). O aconselhamento se caracterizou como uma prática breve, realizada em consultas individuais, voltadas para adultos e idosos e pessoas com morbidades. A estratégia mais utilizada foi orientar usuários a participarem de grupos de atividade física no Centro de Saúde (89,5%), e em relação ao método 5As, dar algum “conselho” foi a estratégia mais utilizada (99,0%), e a menos utilizada foi seguir estratégias (22,6%). Aconselhamento para atividade física tem sido baseado em uma prática breve, realizada em consultas individuais e focada em pessoas com morbidades e em adultos e idosos. As estratégias utilizadas parecem não abranger o cuidado integral dos usuários aconselhados.

Palavras-chave:
Aconselhamento; Atenção primária à saúde; Pessoal de saúde; Atividade motora

Introdução

A atividade física representa um importante fator para o desenvolvimento humano e a promoção da saúde11 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Movimento é vida: atividades físicas e esportivas para todas as pessoas - Relatório Nacional de Desenvolvimento Humano do Brasil. Brasília: PNUD; 2017.,22 World Health Organization (WHO). WHO guidelines on physical activity and sedentary behaviour.. Genev: WHO; 2020.. Sua prática está vinculada a um direito que deve ser garantido a todas as pessoas ao longo da vida, por isso devem ser pensadas maneiras de promovê-la em níveis populacionais11 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Movimento é vida: atividades físicas e esportivas para todas as pessoas - Relatório Nacional de Desenvolvimento Humano do Brasil. Brasília: PNUD; 2017.. Uma das formas de promover atividade física nos serviços de saúde tem sido por meio da estratégia de aconselhamento33 Melvin CL, Jefferson MS, Rice LJ, Nemeth LS, Wessell AM, Nietert PJ, Hughes-Halbert C. A systematic review of lifestyle counseling for diverse patients in primary care. Prevent Med 2017; 100:67-75.

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-66 US Preventive Services Task Force. Behavioral counseling to promote a healthful diet and physical activity for cardiovascular disease prevention in adults without cardiovascular risk factors. JAMA 2017; 318(2):167-174..

O aconselhamento para atividade física pode ser entendido como uma tecnologia leve, de baixo custo, que se caracteriza como educação em saúde, baseada em uma processo de discussão dialogada entre indivíduo e profissional de saúde, na busca de capacitar o sujeito para que ele esteja empoderado para tomar decisões sobre seu comportamento em saúde, realizado de forma ativa e em consonância com o contexto e conhecimento do indivíduo77 Falkenberg MB, Mendes TD, Moraes EP, Souza EM. Educação em saúde e educação na saúde: conceitos e implicações para a saúde coletiva. Cien Saude Colet 2014; 19(3):847-852.,88 Poskiparta M, Kasila K, Kiuru P. Dietary and physical activity counselling on type 2 diabetes and impaired glucose tolerance by physicians and nurses in primary healthcare in Finland. Scand J Prim Health Care 2006; 24(4):206-210.. Nesse sentido, o aconselhamento poderia ser entendido para além do fato de fornecer uma orientação geral para a atividade física, pois requer que as estratégias empregadas sejam alinhadas ao cuidado integral à pessoa usuária. Todos os profissionais de saúde podem realizar o aconselhamento e, embora possa ocorrer de modo breve e mais genérico99 National Institute for Health and Care Excellence. Physical activity: brief advice for adults in primary care: public health guideline [Internet]. 2013. [cited 2023 ago 3]. Available from: www.nice.org.uk/guidance/ph44
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, estudos demonstram que o uso de estratégias sistemáticas e específicas têm maior sucesso nas ações de aconselhamento, a exemplo do modelo “cinco As” (5As)1010 Ainsworth BE, Youmans CP. Tools for physical activity counseling in medical practice. Obes Res 2002; 10(Suppl.1):69S-75S.

11 Tobacco Use and Dependence Guideline Panel. Treating Tobacco Use and Dependence: 2008 Update. Rockville: U.S. Department of Health and Human Services; 2008.

12 Smith BJ, Van der Ploeg HP, Buffart LM, Bauman AE. Encouraging physical activity: five steps for GPs. Aust Fam Physician 2008; 37(1-2):24-28.
-1313 Verwey R, van der Weegen S, Spreeuwenberg M, Tange H, van der Weijden T, de Witte L. Upgrading physical activity counselling in primary care in the Netherlands. Health Prom Int 2014; 31(2):344-354..

O modelo 5As corresponde a uma sistemática de aconselhamento reconhecida mundialmente, fundamentada em teorias de mudança de comportamento, baseada em evidências, aplicada para diversos comportamentos de saúde e exequível na APS1111 Tobacco Use and Dependence Guideline Panel. Treating Tobacco Use and Dependence: 2008 Update. Rockville: U.S. Department of Health and Human Services; 2008.,1414 Alexander SC, Cox ME, Turer CLB, Lyna P, Tulsky JA. Do the Five A's Work When Physicians Counsel About Weight Loss? Fam Med 2011; 43(3):179-184.

15 Glasgow RE. Assessing delivery of the five 'As' for patient-centered counseling. Health Prom Int 2006; 21(3):245-255.
-1616 Mendes R, Nunes Silva M, Santos Silva C, Marques A, Godinho C, Tomás R, Agostinho M, Madeira S, Rebelo-Marques A, Martins H, Teixeira PJ, Cruz D. Physical activity promotion tools in the portuguese primary health care: an implementation research. Int J Environ Res Public Health 2020; 17(3):815.. A estrutura dos 5As correspondem ao acrônimo formado por cinco palavras na língua inglesa: ask, assess, advise, assist e arrange, que significam, respectivamente: perguntar, avaliar, aconselhar, auxiliar e acompanhar, e funcionam como uma estrutura para apoiar os profissionais da saúde a perguntarem sobre o comportamento (“perguntar”), avaliar a prontidão para mudar (“avaliar”), aconselhar uma mudança (“aconselhar”), auxiliar na definição de metas (“auxiliar”) e organizar o acompanhamento (“acompanhar”)1414 Alexander SC, Cox ME, Turer CLB, Lyna P, Tulsky JA. Do the Five A's Work When Physicians Counsel About Weight Loss? Fam Med 2011; 43(3):179-184.,1717 Carroll JK, Antognoli E, Flocke SA. Evaluation of physical activity counseling in primary care using direct observation of the 5As. Ann Fam Med 2011; 9(5):416-422.

18 Dosh SA, Holtrop JS, Torres T, Arnold AK, Baumann J, White LL. Changing organizational constructs into functional tools: an assessment of the 5 A's in primary care practices. Ann Fam Med 2005; 3(Suppl. 2):S50-S52.

19 Flocke SA, Clark A, Schlessman K, Pomiecko G. Exercise, diet, and weight loss advice in the family medicine outpatient setting. Fam Med 2005; 37(6):415-421.
-2020 Meriwether RA, Lee JA, Lafleur AS, Wiseman P. Physical activity counseling. Am Fam Physician 2008; 77(8):1129-1136.. Embora diversos estudos apoiem o uso do modelo 5As, pouco se sabe sobre o uso dessas estratégias para aconselhar atividade física aplicadas no contexto da APS no Sistema único de Saúde (SUS)1313 Verwey R, van der Weegen S, Spreeuwenberg M, Tange H, van der Weijden T, de Witte L. Upgrading physical activity counselling in primary care in the Netherlands. Health Prom Int 2014; 31(2):344-354.,2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
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22 Prochaska JO, Marcus BH. The transtheoretical model: applications to exercise. Med Sci Sports Exerc 1994; 26(11):1400-1404.
-2323 Shinn C, Salgado R, Rodrigues D. Programa Nacional para a promoção da atividade física: o caso de Portugal. Cien Saude Colet 2020; 25(4):1339-1348.. Estudo conduzido com profissionais da Equipe do Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (eNASF-AB) identificou que as estratégias de aconselhamento mais reportadas foram “aconselhar”, “auxiliar” e “perguntar”, sendo que “acompanhar” foi a estratégia menos reportada2424 Moraes SD, Loch MR, Rech CR. Estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas pelo Núcleo Ampliado de Saúde da Família em Florianópolis. J Phys Educ 2020; 32(1):e3210.

25 Florindo AA, Mielke GI, Gomes GA, Ramos LR, Bracco MM, Parra DC, Simoes EJ, Lobelo F, Hallal PC. Physical activity counseling in primary health care in Brazil: a national study on prevalence and associated factors. BMC Public Health 2013; 13:794.

26 Santos T, Guerra P, Andrade D, Florindo A. Práticas pessoais e profissionais de promoção da atividade física em agentes comunitários de saúde. Rev Bras Ativ Fis Saude 2015; 20(2):165.

27 Souza Neto JM, Florindo AA, Costa FF. Associated factors with physical activity counseling among Brazilian Family Health Strategy workers. Cien Saude Colet 2021; 26(1):369-378.
-2828 Souza Neto JM, Guerra PH, Rufino EA, Costa FF. Isolated and simultaneous perceived barriers to physical activity counseling. Rev Bras Ativ Fisica Saude 2020; 24:1-8.. Porém é preciso entender como essas estratégias são utilizadas pelas demais categorias profissionais que compõem a APS.

Assim, ao observar as características e estratégias de aconselhamento sob a perspectiva do modelo 5As, este estudo busca traçar um panorama do quanto a prática dos profissionais da APS está próxima de um modelo sistematizado ou não, e se contempla ações que considerem a complexidade do comportamento humano. Isso pode ajudar a entender melhor a prática do aconselhamento para a atividade física, identificar dificuldades e direcionar de modo mais assertivo a elaboração de estratégias para aperfeiçoamento dos cuidados em saúde no SUS. Desse modo, este estudo tem como objetivo caracterizar as práticas e estratégias de aconselhamento para atividade física realizado por profissionais da APS em Florianópolis, SC, Brasil.

Métodos

Estudo transversal com profissionais da Estratégia de Saúde da Família e eNASF-AB da APS de Florianópolis, SC, Brasil. O estudo faz parte da pesquisa “Aconselhamento para atividade física na Atenção Básica à Saúde - AconselhaSUS, que objetivou investigar a prática de aconselhamento para atividade física na APS. Florianópolis tem cerca de 516.524 habitantes, com renda média per capita de R$ 1.798,12, coeficiente Gini de 0,5474 e IDH de 0,8472929 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Atlas do desenvolvimento humano nas regiões metropolitanas brasileiras. Perfil Florianópolis - SC [Internet]. [acessado 2023 jan 20]. Disponível em: https://atlasbrasil.org.br/perfil/municipio/420540
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Participantes

A APS de Florianópolis tinha, em 2018, aproximadamente 1.056 profissionais, distribuídos em 49 Centros de Saúde em quatro distritos sanitários. Devido à possibilidade de coletar dados em todos os locais, optou-se pela realização de um censo dos profissionais de saúde. As perdas foram consideradas quando o profissional não participou da reunião de planejamento, estava afastado para tratamento de saúde e por recusas quando não houve interesse do profissional em participar do estudo.

Coleta de dados

A coleta de dados ocorreu entre agosto e novembro de 2018, durante reuniões de planejamento dos Centros de Saúde e reuniões distritais dos eNASF-AB, e foi executada por uma equipe composta por quatro pesquisadores do projeto AconselhaSUS treinados para essa atividade. Realizou-se uma breve explicação sobre a pesquisa e as instruções para preenchimento do questionário. A fim de diminuir a taxa de perdas, foram realizados pelo menos dois momentos de coleta de dados em cada Centro de Saúde. Todos os procedimentos do estudo foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (parecer 2.693.520).

Instrumento e variáveis

O instrumento utilizado para pesquisa foi um questionário autoadministrado composto por 49 perguntas objetivas organizadas em cinco blocos respectivamente: bloco 1 - aconselhamento para atividade física; bloco 2 - conhecimento sobre as recomendações de atividade física; bloco 3 - nível de atividade física no lazer; bloco 4 - formação e atuação profissional; e bloco 5 - informações sociodemográficas.

O questionário foi elaborado pela equipe de pesquisadores a partir da realização de uma revisão sistemática2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
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, avaliado e aprovado por dois especialistas da área da educação física com expertise em APS, e testado com pós-graduandos e profissionais de saúde.

Aconselhamento para atividade física

A realização do aconselhamento para atividade física foi avaliada por meio da questão durante seus atendimentos, nos últimos 12 meses, você realizou aconselhamento para atividade física aos usuários?”, com a opção de resposta não ou sim.

Características da realização do aconselhamento

O tipo de atendimento em que o aconselhamento era efetuado foi avaliado por meio de uma escala composta por oito opções (atendimento individual, atendimento em grupos, interconsultas, durante o acolhimento, farmácia, visita domiciliar, recepção/sala de espera e outros). O tempo de aconselhamento foi avaliado em minutos para práticas de aconselhamento individual e coletivo. Avaliou-se qual o grupo etário mais frequente a receber aconselhamento pelo profissional (crianças, adolescentes, adultos e idosos), com quatro opções de resposta (nunca, raramente, frequentemente e sempre). A frequência que o profissional aconselha indivíduos com determinadas condições de saúde foi avaliado com base em uma escala de quatro pontos (nunca, raramente, frequentemente e sempre), para essa variável foram consideradas dez condições de saúde (diabetes, hipertensão, dislipidemias, doenças ósseas, doenças respiratórias, doença mental, deficiência física, neoplasia, gestante, excesso de peso/obesidade).

Estratégias de aconselhamento

As estratégias de aconselhamento sobre AF consideraram o que o profissional recomenda para os indivíduos em uma escala dicotômica (não ou sim), foram consideradas como estratégias: fornecer material educativo sobre atividade física, estabelecer metas com o usuário, escrever exercícios de prescrição, recomendar grupo de atividade física do Centro de Saúde, recomendar local específico para realização de atividade física. Para aqueles que efetuaram o aconselhamento sobre AF, foi questionado quais locais eram indicados para realizar a atividade física.

Estratégias de aconselhamento conforme modelo 5As

As estratégias de aconselhamento para atividade física foram avaliadas com base em estudos prévios do modelo 5As1414 Alexander SC, Cox ME, Turer CLB, Lyna P, Tulsky JA. Do the Five A's Work When Physicians Counsel About Weight Loss? Fam Med 2011; 43(3):179-184.,1717 Carroll JK, Antognoli E, Flocke SA. Evaluation of physical activity counseling in primary care using direct observation of the 5As. Ann Fam Med 2011; 9(5):416-422.

18 Dosh SA, Holtrop JS, Torres T, Arnold AK, Baumann J, White LL. Changing organizational constructs into functional tools: an assessment of the 5 A's in primary care practices. Ann Fam Med 2005; 3(Suppl. 2):S50-S52.

19 Flocke SA, Clark A, Schlessman K, Pomiecko G. Exercise, diet, and weight loss advice in the family medicine outpatient setting. Fam Med 2005; 37(6):415-421.
-2020 Meriwether RA, Lee JA, Lafleur AS, Wiseman P. Physical activity counseling. Am Fam Physician 2008; 77(8):1129-1136.. Os itens se referiam a: a) perguntar sobre AF; b) avaliar o nível de atividade física e estágio de mudança de comportamento; c) comentar sobre os benefícios da atividade física; d) comentar sobre as recomendações de atividade física; e) aconselhar com base nas características de cada indivíduos (ex: idade, sexo, condições de saúde); f) identificar os motivos que dificultam ou impedem o usuário a não realizar atividade física; g) oferecer alguma solução para auxiliar o usuário quanto a essas dificuldades; h) utilizar alguma estratégia (ex: visitas, ligações, mensagem de texto) para saber se o usuário começou a realizar atividade física; e i) utilizar alguma estratégia (ex: visitas, ligações, mensagem de texto) para saber se o usuário está realizando atividade física.

Para identificar o atendimento às estratégias do modelo 5As, os itens foram assim agrupados: perguntar (item a), avaliar (item b), aconselhar (item c, d, e), auxiliar (item f, g) e acompanhar (item h, i). Caso um item tenha sido assinalado como sim, representou que essa estratégia era adotada pelo profissional. A partir dessa classificação, foi também gerada uma variável de número de estratégias do modelo 5As empregadas no aconselhamento pelo profissional de saúde.

Características dos participantes

Por fim, foram coletados dados sociodemográficos, de escolaridade e formação, e relacionados com o trabalho na atenção primária à saúde. As variáveis sociodemográficas foram sexo, idade (20 a 29 anos, 30 a 39 anos, 40 a 49 anos e ≥ 50 anos) e escolaridade (sem ensino superior, com ensino superior, com ensino superior e pós-graduação). Os profissionais reportaram se haviam concluído alguma pós-graduação na área de saúde pública (não ou sim). Em relação à atuação do profissional na APS, foi avaliado o vínculo (concursado - servidor público efetivo; temporário - cargo comissionado, contrato temporário, cooperativa ou profissional residente em saúde”), o tempo de atuação ( ≤ 3 anos, ≥ 3 anos), carga horária de trabalho semanal (≤ 30 horas/semana, ≥ 40 horas/semana), a participação em matriciamento de casos relacionados à atividade física, realização de ações técnico-assistenciais (discussão de casos clínicos) e/ou técnico-pedagógicas (educação permanente sobre temas relevantes para as equipes), tendo como categorias dicotômicas: nunca/raramente ou frequentemente/sempre.

Análise dos dados

Os dados foram digitalizados no software EpiData, versão 3.1, e realizada a dupla checagem para identificação de possíveis erros de digitação. Os erros foram verificados e corrigidos manualmente. Para as análises estatísticas, foi utilizado o software R, versão 3.5.3. As características da amostra de profissionais de saúde são apresentadas por meio de estatística descritiva. Por fim, as práticas e as estratégias de aconselhamento para atividade física são apresentadas do modo descrito, conforme as categorias profissionais. Optou-se por apresentar a descrição de acordo com as equipes de trabalho ou a proximidade da relação de trabalho entre os profissionais, de forma que as categorias foram: Equipe Estratégia Saúde da Família (agente comunitário de saúde, enfermeiro, técnico de enfermagem e médico), Equipe de Saúde Bucal (cirurgião-dentista e auxiliar/técnico em saúde bucal), eNASF-AB (assistente social, nutricionista, fisioterapeuta, psicólogo, farmacêutico e profissional de educação física).

Resultados

Participaram do estudo profissionais dos 49 Centros de Saúde de Florianópolis. A taxa de recusa foi de 25,8% (n = 273), e de perdas, 18,5% (n = 196). As perdas ocorreram por preenchimento incompleto dos dados (n = 23; 3,7%) e devido ao afastamento do trabalho (férias ou licenças) no período de coleta de dados (n = 173, 16,4%). Assim, a quantidade final de participantes foi de 587 profissionais (85,4% mulheres). A maior parte dos respondentes tinha entre 30-49 anos (65,9%) e ensino superior (66,1%). Em relação às características da atuação profissional, a maior parte apresentava vínculo efetivo (61,8%), atuavam na APS há mais de três anos (77,1%), com carga horária de trabalho igual ou maior que 40 horas semanais (80,6%) e referiram ter recebido/realizado frequentemente apoio matricial da eNASF-AB (62,5%). Quando observados sob a perspectiva das categorias profissionais, as características se mostraram semelhantes às dos profissionais em geral, diferenciando-se apenas no quantitativo, com enfermeiros (n = 193, 32,9%) e agentes comunitários de saúde (n = 161, 27,4%) constituindo as categorias profissionais com maior participação (Tabela 1).

Tabela 1
Características dos profissionais da atenção primária à saúde participantes do estudo AconselhaSUS. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2018 (n = 587).

A frequência de aconselhamento para atividade física foi de 86,2% (IC95% = 83,2-88,8%), sendo de 100% entre profissionais de educação física e médicos. Quanto às práticas do aconselhamento para atividade física, a maioria ocorre em atendimentos individuais (72,1%), empregando tempo entre um a cinco minutos (53,5%), e quando realizado de forma coletiva, observa-se que 46,8% usam entre 6 e 15 minutos. Profissionais de educação física e agentes comunitários de saúde reportaram em maior proporção usar mais de 16 minutos para aconselhar individualmente. Os grupos etários mais aconselhados foram adultos (90,5%) e idosos (94,2%), sendo que 37,6% e 53,6% reportaram aconselhar crianças e adolescentes, respectivamente. Os indivíduos com excesso de peso/obesidade (94,1%), diabetes (92,9%), hipertensão (92,6%) e dislipidemias (79,5%) foram os usuários mais aconselhados na percepção dos profissionais de saúde (Tabela 2).

Tabela 2
Práticas de aconselhamento para atividade física realizadas por profissionais da atenção primária à saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2018 (n = 587).

As estratégias de aconselhamento mais utilizadas entre os profissionais foram recomendar a participação em grupos de atividade física no Centro de Saúde (89,5%) e indicar locais específicos para fazer atividades (48,1%). Entre os indivíduos que reportaram receber a indicação de ir até um local, destacam-se o Centro de Saúde (89,7%), parques e praças (88,3%) e academias ao ar livre (83,0%). Ainda se observa que, em relação ao modelo 5As, a estratégia mais utilizada considerando todos os profissionais foi a de aconselhar” (99,0%), e a menos utilizada, a de “acompanhar” o indivíduo (22,6%). Todos os profissionais de educação física referiram utilizar as estratégias “perguntar”, “aconselhar” e auxiliar”, e metade dos agentes comunitários de saúde e profissionais de educação física referiu “acompanhar” (56,1% e 50,0%). Em relação à quantidade de estratégias utilizadas, 44,4% dos profissionais referiram utilizar quatro estratégias no aconselhamento, sendo que metade dos profissionais de educação física reportou utilizar as cinco estratégias de acordo com o modelo 5As (50%) (Tabela 3).

Tabela 3
Estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas por profissionais da Atenção Primária à Saúde. Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2018 (n = 587).

Discussão

Este estudo teve como objetivo caracterizar a prática e as estratégias de aconselhamento para atividade física realizada por profissionais da APS de Florianópolis, SC, Brasil. Os principais resultados apontam que aproximadamente oito em cada dez profissionais realizam algum tipo de aconselhamento para atividade física, sendo caracterizado como um aconselhamento breve (até cinco minutos), que ocorre em atendimentos individuais, direcionado para usuários adultos e idosos, com alguma morbidade (excesso de peso, diabetes e hipertensão, principalmente). A principal estratégia de aconselhamento foi recomendar aos usuários que participem de grupos de atividade física, e quanto ao modelo 5As, a estratégia mais utilizada foi a de aconselhar, e a menos reportada, a de acompanhar o indivíduo. Ressalta-se que este foi um estudo que envolveu profissionais de saúde de diferentes áreas de formação básica, incluindo os que compõem a equipe de Saúde da Família, de Saúde Bucal e NASF-AB, podendo apresentar um panorama mais real frente à dinâmica de trabalho no SUS. Além disso, o estudo avança no sentido de tentar entender quais são as características e estratégias de aconselhamento utilizadas pelos profissionais para além da afirmação de que esse aconselhamento é realizado.

A presente pesquisa considera algumas limitações: a) trata-se de um estudo transversal e descritivo, em que o foco principal foi descrever as práticas e estratégias de aconselhamento para atividade física, de modo que a extrapolação para outros contextos deve ser realizada com cautela, considerando a elevada taxa de cobertura da ESF no município, a presença de um quantitativo elevado de profissionais residentes e a efetiva participação da Escola de Saúde Pública de Florianópolis na gestão dos processos de trabalho e formação; b) a medida de aconselhamento para atividade física considerou a realização de algum aconselhamento nos últimos 12 meses. Esse fato pode ter contribuído para uma elevada frequência de aconselhamento, pois é provável que muitos profissionais falem sobre atividade física com algum de seus pacientes, especialmente aqueles com maior número de consultas individuais, como médicos; c) outra limitação pode ser o viés de desejabilidade social, que é a tendência a responder positivamente às questões por julgar ser uma prática esperada pelos profissionais de saúde. Por outro lado, este estudo tem caráter inédito por abordar características e estratégias de aconselhamento para atividade física por profissionais das diferentes equipes (eNASF-AB, eSF e eSB), com participação representativa de profissionais da APS de uma capital brasileira.

O aconselhamento foi caracterizado como uma prática predominantemente realizada em atendimentos individuais e, em relação ao tempo, do tipo breve (entre um e cinco minutos). Não foram encontrados estudos no Brasil sobre o tempo de aconselhamento, contudo, entre médicos americanos observa-se que o tempo de aconselhamento para atividade física foi entre dois e cinco minutos3030 Walsh J. Exercise counseling by primary care physicians in the era of managed care. Am J Prevent Med 1999; 16(4):307-313.. Porém, recomenda-se que não seja utilizado como uma estratégia única de intervenção, mas combinada com acompanhamento de mais profissionais de saúde3131 Pinto B, Goldstein M, Ashba J, Sciamanna C, Jette A. Randomized controlled trial of physical activity counseling for older primary care patients. Am J Prevent Med 2005; 29(4):247-255. e com estratégias de monitoramento1616 Mendes R, Nunes Silva M, Santos Silva C, Marques A, Godinho C, Tomás R, Agostinho M, Madeira S, Rebelo-Marques A, Martins H, Teixeira PJ, Cruz D. Physical activity promotion tools in the portuguese primary health care: an implementation research. Int J Environ Res Public Health 2020; 17(3):815.,3232 Madeira SG, Agostinho M. Aconselhamento breve em atividade física nos cuidados de saúde primários. Rev Factores Risco 2017; 12:51-58.,3333 van der Weegen S, Verwey R, Spreeuwenberg M, Tange H, van der Weijden T, de Witte L. It's life! Mobile and web-based monitoring and feedback tool embedded in primary care increases physical activity: a cluster randomized controlled trial. J Med Internet Res 2015; 17(7):e184.. O tempo destinado ao aconselhamento é um ponto fundamental para entender o potencial dessa estratégia em níveis populacionais, pois profissionais de saúde relatam que a falta de tempo é uma das principais barreiras para realizar o aconselhamento na APS2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073...
,2727 Souza Neto JM, Florindo AA, Costa FF. Associated factors with physical activity counseling among Brazilian Family Health Strategy workers. Cien Saude Colet 2021; 26(1):369-378.,3434 Hébert ET, Caughy MO, Shuval K. Primary care providers' perceptions of physical activity counselling in a clinical setting: a systematic review. Brit J Sports Med 2012; 46(9):625-631.,3535 Wattanapisit A, Petchuay P, Wattanapisit S, Tuangratananon T. Developing a training programme in physical activity counselling for undergraduate medical curricula: a nationwide Delphi study. BMJ Open 2019; 9(8):e030425..

O aconselhamento foi mais frequente em adultos e idosos, com excesso de peso/obesidade, diabetes e hipertensão. Esses achados corroboram outros estudos1212 Smith BJ, Van der Ploeg HP, Buffart LM, Bauman AE. Encouraging physical activity: five steps for GPs. Aust Fam Physician 2008; 37(1-2):24-28.,2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073...
,3636 Douglas F, Torrance N, van Teijlingen E, Meloni S, Kerr A. Primary care staff's views and experiences related to routinely advising patients about physical activity. A questionnaire survey. BMC Public Health 2006; 6:138.

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-3939 Morishita Y, Miki A, Okada M, Tsuboi S, Ishibashi K, Ando Y, Nagata D, Kusano E. Exercise counseling of primary care physicians in metabolic syndrome and cardiovascular diseases is associated with their specialty and exercise habits. Int J Gen Med 2014; 7:277. quanto ao perfil dos usuários e ao padrão de utilização dos serviços da APS, em que há predomínio de consultas ambulatoriais motivadas por doença e busca por medicamentos4040 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Vigitel Brasil 2015: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2015. Brasília: MS; 2016.

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As estratégias mais utilizadas no aconselhamento foram recomendar a participação em grupos de atividade física no Centro de Saúde e indicar local específico para fazer atividade física. Os grupos ofertados pelos Centros de Saúde têm se mostrado um recurso relevante para impulsionar a atividade física no contexto da saúde pública, pois propicia benefícios aos usuários e conduz os demais profissionais de saúde e gestores a reconhecerem o importante papel da atividade física4646 Rodrigues JD, Ferreira D, Silva P, Caminha I, Farias Junior JC. Inserção e atuação do profissional de educação física na atenção básica à saúde: revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2013; 18(1):5-15.. A recomendação de espaços públicos de lazer para prática de atividade física precisa considerar as barreiras ambientais, como falta de acessibilidade e segurança pública4747 Rech C, Camargo E, Almeida M, Bronoski R, Okuno N, Reis R. Barriers for physical activity in overweight adults. Rev Bras Ativ Fis Saude 2016; 21(3):272-279., e a disparidade na presença e qualidade dessas estruturas em áreas com renda per capita mais baixa4848 Manta SW, Reis RS, Benedetti TR, Rech CR. Public open spaces and physical activity: disparities of resources in Florianópolis. Rev Saude Publica 2019; 53:112.. Por isso é importante que essa recomendação sempre esteja associada ao conhecimento do território e a ações intersetoriais com foco no nível ambiental/comunitário, visto que intervenções dessa natureza têm elevado os níveis de atividade física em países de alta renda4949 Heath GW, Parra DC, Sarmiento OL, Andersen LB, Owen N, Goenka S, Montes F, Brownson RC. Evidence-based intervention in physical activity: lessons from around the world. Lancet 2012; 380(9838):272-281.,5050 Pratt M, Perez LG, Goenka S, Brownson RC, Bauman A. Can population levels of physical activity be increased? Global Evidence and Experience. Prog Cardiovasc Dis 2015; 57(4):356-367. e podem promover melhoria do acesso e do projeto urbano desses espaços. E também o uso de outras estratégias para aconselhar, como materiais educativos, tecnologias de acompanhamento, pactuação de metas com o usuário e prescrição de exercícios, que podem ser relevantes para fortalecer uma rede de apoio para mudança de comportamento do usuário.

Considerando o modelo 5As, a estratégia mais reportada pelos profissionais foi “aconselhar”. De acordo com estudos internacionais, “aconselhar” está entre as estratégias mais mencionadas pelos profissionais1515 Glasgow RE. Assessing delivery of the five 'As' for patient-centered counseling. Health Prom Int 2006; 21(3):245-255.,1717 Carroll JK, Antognoli E, Flocke SA. Evaluation of physical activity counseling in primary care using direct observation of the 5As. Ann Fam Med 2011; 9(5):416-422.,1818 Dosh SA, Holtrop JS, Torres T, Arnold AK, Baumann J, White LL. Changing organizational constructs into functional tools: an assessment of the 5 A's in primary care practices. Ann Fam Med 2005; 3(Suppl. 2):S50-S52.,2424 Moraes SD, Loch MR, Rech CR. Estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas pelo Núcleo Ampliado de Saúde da Família em Florianópolis. J Phys Educ 2020; 32(1):e3210.,5151 Sherson EA, Yakes Jimenez E, Katalanos N. A review of the use of the 5 A's model for weight loss counselling: differences between physician practice and patient demand. Fam Pract 2014; 31(4):389-398.,5252 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Aconselhamento: um desafio para prática integral em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 1999.. Embora “aconselhar” contemple a importante função de comentar sobre os benefícios e as recomendações da atividade física para a melhora da saúde, utilizá-la de modo isolado pode não produzir resultados efetivos5353 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria no 2.979 GM/MS, de 12 de novembro de 2019. Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação no 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Diário Oficial da União 2019; 29 set., principalmente sabendo que os profissionais têm concentrado seu aconselhamento em recomendar um grupo ou local para atividade física, não diversificando recursos e estratégias para aconselhar. Isso também pode estar relacionado às barreiras frequentemente citadas pelos profissionais para aconselhar atividade física, como a falta de treinamento e materiais2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073...
,3434 Hébert ET, Caughy MO, Shuval K. Primary care providers' perceptions of physical activity counselling in a clinical setting: a systematic review. Brit J Sports Med 2012; 46(9):625-631.,3535 Wattanapisit A, Petchuay P, Wattanapisit S, Tuangratananon T. Developing a training programme in physical activity counselling for undergraduate medical curricula: a nationwide Delphi study. BMJ Open 2019; 9(8):e030425., além de sinalizar a existência de uma confusão na definição de aconselhamento5252 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Aconselhamento: um desafio para prática integral em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 1999..

Acompanhar foi a estratégia menos reportada entre os profissionais. Esse achado é similar em outros estudos1515 Glasgow RE. Assessing delivery of the five 'As' for patient-centered counseling. Health Prom Int 2006; 21(3):245-255.,1717 Carroll JK, Antognoli E, Flocke SA. Evaluation of physical activity counseling in primary care using direct observation of the 5As. Ann Fam Med 2011; 9(5):416-422.,2424 Moraes SD, Loch MR, Rech CR. Estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas pelo Núcleo Ampliado de Saúde da Família em Florianópolis. J Phys Educ 2020; 32(1):e3210.,5050 Pratt M, Perez LG, Goenka S, Brownson RC, Bauman A. Can population levels of physical activity be increased? Global Evidence and Experience. Prog Cardiovasc Dis 2015; 57(4):356-367. e sinaliza uma lacuna que tem impedido o acompanhamento e o registro dos resultados do aconselhamento para atividade física em níveis populacionais. É possível que a dificuldade na realização do “acompanhar” esteja atrelada às barreiras relatadas pelos profissionais, como falta de tempo, treinamento e recursos, e também devido à ausência de uma sistemática de aconselhamento2121 Moraes SD, Souza JH, Araújo PA, Rech CR. Prevalência de aconselhamento para atividade física na atenção básica à saúde: uma revisão sistemática. Rev Bras Ativ Fis Saude 2019; 24:1-12. Disponível em: https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073
https://doi.org/10.12820/rbafs.24e0073...
,2727 Souza Neto JM, Florindo AA, Costa FF. Associated factors with physical activity counseling among Brazilian Family Health Strategy workers. Cien Saude Colet 2021; 26(1):369-378.,3434 Hébert ET, Caughy MO, Shuval K. Primary care providers' perceptions of physical activity counselling in a clinical setting: a systematic review. Brit J Sports Med 2012; 46(9):625-631.,3535 Wattanapisit A, Petchuay P, Wattanapisit S, Tuangratananon T. Developing a training programme in physical activity counselling for undergraduate medical curricula: a nationwide Delphi study. BMJ Open 2019; 9(8):e030425.. De acordo com American College of Sports Medicine, programas comportamentais devem incluir diferentes estratégias, ajustadas às motivações individuais e baseadas em teorias, a fim de que aumente a adoção e manutenção da atividade física5050 Pratt M, Perez LG, Goenka S, Brownson RC, Bauman A. Can population levels of physical activity be increased? Global Evidence and Experience. Prog Cardiovasc Dis 2015; 57(4):356-367..

Por isso é extremamente necessário que profissionais da APS possam ter acesso a mecanismos (estratégias e ferramentas) capazes de avaliar efetividade e alcance do aconselhamento para a atividade física2424 Moraes SD, Loch MR, Rech CR. Estratégias de aconselhamento para atividade física utilizadas pelo Núcleo Ampliado de Saúde da Família em Florianópolis. J Phys Educ 2020; 32(1):e3210.,5050 Pratt M, Perez LG, Goenka S, Brownson RC, Bauman A. Can population levels of physical activity be increased? Global Evidence and Experience. Prog Cardiovasc Dis 2015; 57(4):356-367.. Isso também contribuiria para ampliar o entendimento do aconselhamento para atividade física, passando de uma simples orientação genérica para uma prática que considera o indivíduo no centro do cuidado e por meio da criação de um vínculo que possibilite autocuidado apoiado de forma longitudinal, podendo gerar mais efetividade na adoção da atividade física em sua vida. Essas propostas têm sido testadas em outros sistemas de saúde, como na Holanda e em Portugal1616 Mendes R, Nunes Silva M, Santos Silva C, Marques A, Godinho C, Tomás R, Agostinho M, Madeira S, Rebelo-Marques A, Martins H, Teixeira PJ, Cruz D. Physical activity promotion tools in the portuguese primary health care: an implementation research. Int J Environ Res Public Health 2020; 17(3):815.,5151 Sherson EA, Yakes Jimenez E, Katalanos N. A review of the use of the 5 A's model for weight loss counselling: differences between physician practice and patient demand. Fam Pract 2014; 31(4):389-398..

Adicionalmente, mais da metade dos agentes comunitários de saúde e profissionais de educação física referiram ter utilizado o “acompanhar”. As peculiaridades da atuação de cada um desses profissionais parece ser um ponto forte para apoiar essa estratégia de aconselhamento para atividade física, uma vez que demonstram maior proximidade com usuários e ambiente comunitário2626 Santos T, Guerra P, Andrade D, Florindo A. Práticas pessoais e profissionais de promoção da atividade física em agentes comunitários de saúde. Rev Bras Ativ Fis Saude 2015; 20(2):165.. Esses dados destacam a importância de pensar um aconselhamento descentralizado do médico e disseminado por profissionais de saúde com formações diversas. Nesse quesito, APS brasileira tem potencial para explorar um modelo de aconselhamento descentralizado, pois conta com equipes multiprofissionais que ampliam os cuidados em saúde, porém mudanças recentes na política de financiamento da APS podem fragilizar esse modelo5252 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Aconselhamento: um desafio para prática integral em saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 1999.,5353 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Portaria no 2.979 GM/MS, de 12 de novembro de 2019. Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação no 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Diário Oficial da União 2019; 29 set..

Investimentos em formação continuada específica à temática aconselhamento para atividade física podem auxiliar no uso e na diversificação de estratégias. Um esquema baseado no modelo 5As ampliaria o leque de estratégias utilizadas para aconselhar atividade física, promovendo maior segurança para os profissionais e melhor organização dessa prática. O profissional de educação física inserido na APS representa uma potencialidade do sistema de saúde brasileiro, fomentando o aconselhamento para atividade física tanto entre as demais áreas profissionais da saúde quanto entre os usuários. Nesse sentido, é importante que as políticas públicas reconheçam a importância da atuação multiprofissional.

Adicionalmente, instrumentalizar a prática do aconselhamento com novas tecnologias e softwares que organizem e registrem essa prática no território pode consolidar sua inserção no SUS e aperfeiçoar os processos de assistência à mudança de comportamento dos usuários. A cultura do aconselhamento para atividade física pelos profissionais da APS, sem especificar área profissional, fortalece as políticas de sáude, sobretudo a PNPS. Além disso, recomenda-se a realização de pesquisas de intervenção no contexto da APS para o desenvolvimento de recursos de apoio aos profissionais com vistas à prática do aconselhamento para atividade física baseado em evidências.

Por fim, pode-se concluir que o aconselhamento para atividade física se apresenta como uma prática breve, realizada em atendimentos individuais e com foco em pessoas com condições crônicas e em adultos e idosos. Por não haver nenhuma sistemática aplicada ao SUS e apenas recomendações das políticas, o aconselhamento parece ocorrer sem o acompanhamento da mudança de comportamento dos usuários. O uso das estratégias como o modelo 5As, em conjunto com outras ações intersetoriais, poderá contribuir para fortalecer o aconselhamento para atividade física na cultura organizacional da APS e para propiciar o acompanhamento efetivo dos usuários e avaliações das ações, objetivando as melhorias advindas da promoção da atividade física no cenário do SUS.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    Jan 2024

Histórico

  • Recebido
    04 Fev 2023
  • Aceito
    17 Abr 2023
  • Publicado
    19 Abr 2023
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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