O Dossiê Temático Saúde da População Negra representa uma das ações do GT Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e propõe ampliar a visibilidade das iniquidades étnico-raciais em saúde a partir da produção científica de pesquisadoras e pesquisadores negras, negros e não negros, e fomentar redes de colaboração em nível nacional e internacional e, assim, fortalecer a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) e o SUS. Oportunamente, o GT registra agradecimentos ao Instituto Ibirapitanga que financiou este projeto, além de diversas outras ações que têm contribuído para ampliar os debates sobre as políticas públicas e a saúde da população negra.

As publicações científicas que tratam das iniquidades étnico-raciais na saúde ainda são incipientes, reflexo do “pacto da branquitude” e do racismo institucional. Desse modo, a publicação de um dossiê temático que reúne evidências dos efeitos do racismo na saúde da população negra brasileira constitui a resiliência cotidiana de pesquisadoras e pesquisadores, intelectuais e de movimentos sociais. Com efeito, o racismo, estrutural e estruturante, produz assimetrias sociais, impacta negativamente as condições de vida e saúde das populações discriminadas e dificulta ou impede a difusão do conhecimento científico e tecnológico.

Este dossiê é composto por 18 artigos e uma resenha. Os cinco primeiros artigos abordam aspectos epidemiológicos gerais como a incompletude do preenchimento do quesito raça/cor nos sistemas de saúde, fatores associados ao assassinato de mulheres no Brasil segundo o quesito raça/cor, disparidades étnico-raciais nos nascimentos prematuros, iniquidade racial na mortalidade pelo câncer de colo de útero, e anos potenciais de vida perdidos pela COVID-19 segundo a raça/cor e gênero no Brasil. Corroborando a atualidade temática, alguns desses aspectos foram recentemente apresentados em dois boletins epidemiológicos publicados pelo Ministério da Saúde, os primeiros a abordar, especificamente, a saúde da população negra.

Os artigos seis a nove versam sobre saúde bucal da população negra, temática ainda esparsa nas produções acadêmicas, incluindo: uma revisão sistemática sobre saúde bucal e iniquidades raciais, um artigo sobre o ethos antirracista em saúde bucal coletiva, outro sobre saúde oral e doença falciforme e, por fim, itinerários terapêuticos em saúde bucal de quilombolas. Estes são seguidos por três trabalhos que discutem os impactos do racismo estrutural na saúde de grupos quilombolas, os quais representam o segmento com piores indicadores epidemiológicos da população negra nacional. Essas produções abordam racismo e insegurança alimentar, a sindemia de COVID-19, a vacinação e as fake news. Os três seguintes discutem os impactos da COVID-19 na população negra, uma vez que esta foi desproporcionalmente afetada pela pandemia no Brasil¹1 Organização Grupo Temático Racismo e Saúde da ABRASCO. População Negra e Covid-19. Rio de Janeiro: ABRASCO; 2021.. Os quatro artigos consecutivos fazem abordagem qualitativa acerca de temas diversos relacionados às consequências do racismo estrutural em pessoas com doença falciforme, entre mulheres negras profissionais de saúde, na permanência de estudantes universitários e na relação entre agentes de segurança pública e jovens de periferia. O último trabalho discute formas de resistência negra e a luta antimanicolonial como estratégia de descolonização da Reforma Psiquiátrica. O dossiê se encerra com a resenha do livro Pacto da Branquitude de Cida Bento, elaborada pela presidenta da ABRASCO, Rosana Onocko Campos.

Se a história, os discursos, dados, narrativas e representações sociais seguem em disputa, o GT Racismo e Saúde assume posicionamento político e referenciado na defesa dos direitos humanos ao provocar a visibilização dessas produções com vistas à redução das vulnerabilidades, promoção da equidade e democratização da saúde.

Referências

Datas de Publicação