O planeta vive um momento crítico com guerras, profunda desigualdade social e econômica, ascensão da extrema direita mundial, questionamentos sobre os regimes democráticos, recuperando-se de uma pandemia que contribuiu para propagar graves ataques à ciência. Vemos o desenrolar de uma modernidade com esgarçamento das relações sociais, institucionais, de laços comunitários, precariedade do mercado de trabalho e desenvolvimento veloz de um novo mundo digital11 Bauman Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar; 2001.. Nesse contexto, constata-se a existência de 8.045 bilhões de pessoas, das quais, 24% adolescentes e jovens entre 10-24 anos. No Brasil, há 22% da população nessa faixa etária e nos países com menor desenvolvimento econômico, 31%22 Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Relatório Situação da População Mundial. 8 bilhoes de vidas, infinitas possibilidades: em defesa de direitos e escolhas [Internet]. 2023 [acessado 2023 nov 18]. Disponível em: https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2023-8-bilhoes-de-vidas-infinitas-possibilidades#:~:text=da%20popula%C3%A7%C3%A3o%20mundial.
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Adolescentes e jovens têm, em sua essência, o potencial de se criar e se transformar a cada instante do desenvolvimento, semeando com energia e esperança o meio em que vivem. Todavia há várias adolescências e juventudes, assim como diferentes experiências, sonhos, dificuldades, limitações e possibilidades dependendo do nível de escolaridade, do lugar social e econômico e do pertencimento a grupos hegemônicos ou minoritários, estigmatizados por gênero, cor/raça, dentre outras características em que as fragilidades são interseccionais. Para um grupo significativo de adolescentes e jovens brasileiros há privação de muitos direitos, de educação de qualidade, de trabalho, de mobilidade, de cultura, lazer e segurança pública.
A elevada variabilidade de questões que atingem a adolescência e juventude tem preocupado a comunidade científica e está refletida nos artigos deste número temático, que inclui imagem corporal e sua influência na saúde física e mental, cuidados com a saúde, abuso digital, violência de gênero, bullying, baixa qualidade de vida na escola, alta prevalência de policonsumo de álcool, tabaco e drogas ilícitas e invisibilidade dessa faixa etária no processo de formulação da política de saúde mental. Também se destaca, com agudeza, a iniquidade social brasileira que repercute na saúde, como por exemplo na desigualdade no crescimento - altura, peso e índice de massa corporal - em relação a padrões mundiais, entre as regiões brasileiras incluindo os povos indígenas; os desiguais clusters espaço-temporais de alto risco da mortalidade infantojuvenil em Mato Grosso (MT); e a desigual distribuição da mortalidade por COVID, atingindo especialmente crianças e adolescentes no Norte e Nordeste do país e em áreas distantes das capitais.
Temas inovadores abrem caminhos para novos tempos na prevenção e atenção de doenças e agravos à saúde, como a investigação de biomarcadores que possam orientar tratamentos específicos para doenças como câncer, para atributos individuais como resiliência ou para atenção aos traumas e violências. Um exemplo dos malefícios da segregação é apontado num estudo sobre manifestações de racismo estrutural nos Estados Unidos em escolares de 9 aos 15 anos; os negros que frequentavam escolas primárias segregadas e altamente desfavorecidas experimentaram aumentos na velocidade do envelhecimento epigenético; nos negros em escolas integradas e moderadamente desfavorecidas observou-se retardo no envelhecimento epigenético; os contextos escolares não foram associados a mudanças na aceleração epigenética da idade de jovens brancos, que frequentavam escolas integradas/desiguais ou predominantemente brancas/favorecidas33 Martz CD, Benner AD, Goosby BJ, Mitchell C, Gaydosh L. Structural racism in primary schools and changes in epigenetic age acceleration among Black and White youth. Soc Sci Med 2024; 347:116724..
A constatação de que há diversas adolescências e juventudes precisa orientar o desenvolvimento de ações preventivas, do cuidado, da atenção e do tratamento e das pesquisas. É necessário cobrir novos e velhos temas, especialmente frente ao recrudescimento do conservadorismo e da autocracia de muitos governos atuais que afastam os ventos de liberdade que circularam nos últimos anos do século XX.
Referências
- 1Bauman Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Editora Zahar; 2001.
- 2Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Relatório Situação da População Mundial. 8 bilhoes de vidas, infinitas possibilidades: em defesa de direitos e escolhas [Internet]. 2023 [acessado 2023 nov 18]. Disponível em: https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2023-8-bilhoes-de-vidas-infinitas-possibilidades#:~:text=da%20popula%C3%A7%C3%A3o%20mundial
» https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2023-8-bilhoes-de-vidas-infinitas-possibilidades#:~:text=da%20popula%C3%A7%C3%A3o%20mundial - 3Martz CD, Benner AD, Goosby BJ, Mitchell C, Gaydosh L. Structural racism in primary schools and changes in epigenetic age acceleration among Black and White youth. Soc Sci Med 2024; 347:116724.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
13 Maio 2024 - Data do Fascículo
Maio 2024