REGISTRO

 

Contribuição à memória da saúde pública

 

 

Maria Teresa de Oliveira

Coordenadora do PEC e professora da ENSP

 

 

Dr. Mário Aragão é pesquisador do departamento de ciências Biológicas da Escola Nacional de Saúde Pública e, além disso, especialista em questões de ecologia. Participou recentemente do Projeto RADAMBRASIL na parte referente à Amazônia. Sua vinculação à Fundação Oswaldo Cruz encontra raízes na sua própria história familiar. Nesta entrevista ele dá detalhes sobre alguns momentos importantes da evolução da Fiocruz.

 

— ... "repetir o fenômeno Manguinhos" ... o que está acontecendo atualmente?

— Repetir o fenômeno Manguinhos aqui não parece fácil.

Existe um fato para o qual a minha atenção foi despertada pelo Dr. Shelley, um entomologista que trabalhou aqui no tempo do Dr. Vinícius. Até a cassação dos pesquisadores, no chamado Massacre de Manguinhos, o Instituto era freqüentado por estudantes ou da Universidade Federal do Rio de Janeiro ou da Universidade Rural (Km 47). Depois disso, esses estudantes não mais vieram e passaram a ser substituídos pelos das faculdades particulares. Esse, a nosso ver, foi o maior dano causado pelo Massacre e está documentado no fato dos melhores pesquisadores, do Manguinhos atual ou terem sido formados antes do Massacre ou então em outras instituições científicas.

O que, no discurso, foi chamado de fenômeno Manguinhos existiu, se bem que em menor escala, no Instituto de Malariologia (atual Centro de Pesquisas Renê Rachou), onde as atividades do instituto estavam entrosadas com as do Serviço Nacional de Malária e depois com as do Departamento Nacional de Endemias Rurais. Uma instituição em moldes semelhantes teria que ser criada na Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (SUCAM) que, aliás, se ressente e muito, de um departamento de pesquisas.

— Não foi o "Serviço de Estudos das Grandes Endemias" o precursor da Fundação, pelo Dr. Amilcar Barca Pellon, dos três Centros Regionais de Pesquisa (Recife, Belo Horizonte, Salvador), hoje na FIOCRUZ?

— O Serviço de Estudos das Grandes Endemias foi criado e desenvolvido por Evandro Chagas e constituiu-se um marco no estudo das chamadas endemias rurais. A sua semente frutifica até hoje, como comprovam dois dos melhores pesquisadores da FIOCRUZ, o casal Maria e Leonidas Deane, originários desse serviço.

O extraordinário trabalho do Dr. Amilcar Barca Pellon foi a realização dos grandes inquéritos nacionais, como o feito com Isnard Teixeira sobre as verminoses, que ainda é consultado até hoje. Os centros de pesquisa referidos no discurso são anteriores a essa época e o único que continuou foi o de Bambuí, MG.

— Comentário sobre a parte industrial e a situação atual

— O instituto orginou-se de uma fábrica, o Instituto Soroterápico e sempre teve uma parte industrial. A fabricação de soros e vacinas sempre foi uma atividade corrente. Durante a guerra houve necessidade de ativar essa fabricação. Não posso dar detalhes porque não vivia no Rio de Janeiro nessa época. Sei de uma aparelhagem para o preparo de plasma, adquirida pelo exército, que andou em outras instituições e só aqui conseguiram colocá-la a funcionar.

Uma vez que aqui estive, visitei a fábrica de penicilina e me recordo, perfeitamente, de ter visto o Dr. Massao Goto, recentemente falecido, trabalhando no controle de qualidade.

A indústria atual da FIOCRUZ tem duas origens, a biológica que sempre foi de Manguinhos e a química, que é originária do Instituto de Malariologia. Da primeira não tenho nenhuma idéia e da segunda devo informar que já foi mais desenvolvida.

— Por que o Prof. H.B.R. Aragão deixou a Diretoria do IOC, na época?

— O problema não foi comentado porque as pessoas envolvidas já tinham falecido.

— Não vale a pena comentar a fase de agitação pela qual passou o IOC?

— A "fase de agitação" é o começo do que um general que fez um inquérito no Instituto, em 1964, classificou de "briga de comadres" e que, infelizmente, culminou com o Massacre de Manguinhos. Dos que tomaram parte nessas brigas, os poucos que estão vivos são pessoas insignificantes e não merecem ser citadas.

 

 

ENTREVISTA COM MÁRIO BEAURREPAIRE ARAGÃO

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br