A educação médica e a reforma sanitária
Luiz Antonio Santini R. da Silva
Professor-Adjunto da Faculdade de Medicina da UFF
INTRODUÇÃO
Quando a sociedade brasileira reassume as bandeiras de sua trasformações, de que foi expressão inequívoca o movimento pelas eleições diretas e o repúdio ao autoritarismo, todas as instituições nacionais são por ela colocadas sob questionamento e têm o dever de apresentar sua proposta de participação na reconstrução desta mesma sociedade.
Tal é pois o caso da Universidade, que até aqui não tem conseguido se desincumbir de forma satisfatória nem mesmo de sua tarefa mais elementar que é a formação de profissionais com competência técnica para continuar a desenvolver as tarefas rotineiras exigidas pela sociedade.
As tarefas de produção de conhecimento, criação de um ambiente cultural e de preocupação com o saber e de participação no processo de elaboração do projeto cultura da sociedade, que constituem no dizer de Anisio Teixeira, junto com a primeira, as 4 funções da universidade não têm sido objeto de sua preocupação de modo permanente. Se algo ocorre nestes campos é mais por conta de esforços pessoais e de grupos isolados, do que resultado de uma política global.
A chamada Reforma Universitária, implantada pela lei 5540/68, podendo não passar de uma tentativa modernizante, não teve força suficiente para fazer com que a universidade deixasse de ser uma federação de faculdades e escolas que segue sendo, onde predomina o corporativismo, o profissionalismo (no sentido da preocupação excessiva com a formação de profissionais) e a autarquização. Assim, a criação dos institutos básicos, dos centros profissionalizantes integrados não passa de uma ficção e só serviu para burocratizar e criar cargos úteis ao clientelismo, além de onerar os já poucos recursos disponíveis.
A questão da educação média guarda necessariamente estreita relação com este quadro geral, pois a escola médica está nele inserida. Até porque a educação superior no Brasil se iniciou exatamente pela criação da Faculdade de Medicina da Bahia, em 1908 com a vinda da Corte portuguesa para o Brasil.
Da mesma forma que as mudanças exigidas pela sociedade se colocam para a universidade, também se colocam para o setor prestador de serviços de saúde. O reconhecimento de sua precariedade, resultado de uma política de saúde excludente para os menos favorecidos, baseada na lógica do lucro que beneficia de um lado aos prestadores privados de assistência médica e de outro o chamado complexo médico-industrial (produtor de medicamentos e equipamentos), impõe a necessidade de sua profunda reformulação deste sistema de saúde.
Tal fato ficou evidente ao longo da VIII Conferência Nacional de Saúde, que termina por propor a Reforma Sanitária Brasileira. Dita reforma só será possível mediante o compromisso claramente assumido pelos setores responsáveis, quer pelos serviços de saúde quer pelos órgãos formadores de recursos humanos, com o projeto de transformação colocado pela sociedade.
Neste trabalho cujo objetivo é apontar uma contribuição ao debate, procuraremos analisar as principais características das escolas e da educação médica hoje no Brasil tendo em vista as seguintes categorias de análises: o contexto, a estrutura, a função e a integralidade.
A partir desta análise, procuraremos traçar uma imagem-objetivo, em direção a qual e com os conceitos e princípios da reforma sanitária, a educação médica deverá seguir.
CONTEXTO
Estudaremos por análise do contexto a identificação das relações estabelecidas entre escola, a educação médica e a realidade da sociedade na qual se insere: que compromisso guarda com as condições sócio-econômicas e de saúde da população. Que influência em seus planos de estudos determinam as mudanças demográficas e o perfil epidemiológico da população. Quais os graus de determinação que existem entre o modelo de atenção a saúde, as condições dos serviços e a organização do sistema educacional. Que influência determinam sobre o sistema educacional, o desenvolvimento científico e a tecnologia.
O quadro de saúde da população brasileira pode ser considerado dramático relativamente ao grau de desenvolvimento da economia. O sistema político autoritário que implantou e desenvolveu uma política econômica concentracionista da renda nacional ampliou de modo brutal as diferenças sociais. Praticamente 1/5 da população brasileira vive em condições de miséria absoluta. A recessão econômica da última década ainda agravou mais a situação das camadas mais pobres da população, pelo desemprego, por uma política salarial de arrocho. A falta de uma legislação social adequada, marginalizou enormes contingentes populacionais de qualquer benefício assistêncial por parte do Estado.
O perfil epidemiológico do país nos demonstra uma situação onde convivem lado a lado as doenças da chamada sociedade afluente como as cardiovasculares e degenerativas com aquelas doenças infecciosas e parasitárias, a maioria delas passíveis de eliminação através de vacinação ou de medidas preventivas elementares. A mortalidade infantil, sendo um escândalo nas classes de baixa renda da população, particularmente no nordeste e nas áreas periféricas dos grandes centros urbanos do país, atingindo a 130/1000 nestas áreas, enquanto que em outros países desenvolvidos e até mesmo em áreas de maior riqueza do próprio Brasil esta taxa desce a níveis de 13 por mil nascidos vivos.
O recrudescimento de doenças endêmicas como a malária nos últimos anos, o aparecimento de epidemias como recentemente o dengue no Estado do Rio de Janeiro são capazes de, por si só demonstrarem a incompetência do atual modelo de atenção médico-sanitária a população. Tal modelo de atenção caracterizado do ponto de vista organizacional pela multiplicidade de instituições atuando de forma desordenada, garantiu, a nível da atenção médica, práticas de natureza predominantemente privada, curativa e individual, intimamente articulada e a serviço do chamado "complexo médico-industrial". Este assegurou taxas de acumulação de capital para grandes empresas monopolistas internacionais, produtoras de medicamentos e equipamentos e determinou a necessidade de uma mão-de-obra especializada para a sua operacionalização.
Estes fatores determinados por decisões de natureza política e econômica, provocaram uma expansão no número de escolas médicas e no número de vagas nas já existentes.
Em duas décadas foram criadas 50 novas escolas médicas no Brasil, a maioria privadas, com uma taxa de expansão de 192%. Tais escolas vieram a se localizar preferentemente nas regiões Sudeste e Sul do país, que são as regiões mais industrializadas, onde proliferam as empresas médicas e, conseqüentemente as oportunidades de emprego. Em decorrência, conforme assinala documento aprovado no XXIII Congresso da ABEM, passou a ser lançado no mercado de trabalho uma quantidade crescente de médicos, distribuídos de forma desordenada pelo território nacional.
O mesmo documento aponta que nessa conjuntura aprofundou-se o processo de assalariamento dos médicos, cuja força de trabalho vem sendo espoliada e intensivamente utilizada, obrigando ao estabelecimento de múltiplos vínculos empregatícios para fazer frente aos baixos salários.
Dentro deste quadro, as escolas médicas apresentaram um comportamento extremamente "bem-comportado". Ajustaram-se rapidamente as necessidades impostas pelo modelo, sem oferecer qualquer questionamento mais profundo. Apesar de entidades como a ABEM, que congregam escolas médicas, terem desenvolvido esforços no sentido do questionamento do modelo de formação de médicos no país, através de inúmeras reuniões, publicações, seminários etc., tais esforços não tem representado estímulo suficiente para mudanças significativas no interior de cada escola ou faculdade de medicina.
Outros esforços como a criação dos Departamentos de Medicina Preventiva e Social nas escolas médicas, a despeito de resultados obtidos no desenvolvimento e formulação de propostas para o setor saúde como um todo, principalmente a partir da criação de ABRASCO, muito pouco puderam fazer no sentido de mudanças mais profundas na Escola Médica em particular e na Educação Médica como um todo. Assim também, projetos-piloto de integração docente-assistencial, estes contando inclusive com o beneplácito, pelo menos do discurso oficial, conseguiram demonstrar o modelo tão rapidamente cristalizado da estrutura vigente.
Assim, podemos em última análise dizer que a educação médica hoje no Brasil, encontra-se profundamente desvinculada da realidade sócio-econômica e sanitária do país, entretanto ela é absolutamente coerente com o modelo médico assistencial vigente e muito pouco ou nada mesmo tem feito em busca da correção dos desvios observados nos padrões da prática médica, ou da organização dos serviços de saúde.
A ESTRUTURA
Procuramos analisar a questão da estrutura sob dois aspectos: a estrutura acadêmica e a estrutura curricular.
No que diz respeito à estrutura acadêmica o que verificamos é uma estrutura rígida, burocrática e centralizada. Os órgãos de decisão colegiada não dispõem na prática de poder decisório, não passando quando muito de conselhos consultivos. Além disso, a superposição de atribuições a cada um destes órgãos como os colegiados de curso, colegiados de unidades, conselhos de centro, congregações etc., servem para obstaculizar a participação e conseqüentemente reforçar o centralismo.
A pretendida modernização da universidade, ditada pela lei da reforma universitária, que visava a implantação do sistema departamental, pelo artificialismo com que foi conduzida e não sendo capaz de resistir às pressões e ao poder de influência dos professores catedráticos tomou o caminho de farsa. O departamento foi concebido à imagem da cátedra, não permitindo qualquer avanço do ponto de vista organizacional. Mantém-se os fundos e privilégios com substancial redução de responsabilidade. O sistema de créditos jamais foi implantado de maneira correta, tendo servido apenas para desmobilizar a organização do movimento estudantil, que tinha sua base na representação das turmas as quais desapareceram no atual sistema.
Em última análise, a estrutura acadêmica permanece tão anacrônica quanto o início da universidade, mais voltada para o formal do que para as necessidades da população, e mais voltada para a garantia do "status quo" do que para a modernização do processo educativo.
Do ponto de vista do currículo, o que se observa é sua total fidelidade ao projeto educacional e ao modelo médico-assistencial vigente. O curso é artificialmente dividido em ciclos básico e profissional, aglomerando um grande número de disciplinas que correspondem no mais das vezes às especialidades médicas. Em termos de carga horária há um nítido predomínio do tempo dedicado ao "ensino" das especialidades clínicas e cirúrgicas em detrimento das áreas gerais da clínica médica, cirurgia, gineco-obstetrícia e pediatria, ciências sociais e a epidemiologia e psicologia.
Ademais, a escola médica não teve ainda a capacidade de entender a questão do ensino-aprendizagem como um processo, onde é fundamental a interação entre o objeto, o professor e o aluno. Todo o sistema é baseado numa concepção autoritária e autocrática da educação onde de um lado se coloca aquele que detém o conhecimento e portanto o poder, e de outro o que nada sabe, e cuja função é assimilar aquilo que lhe é e tal qual é transmitido.
Este modelo educacional acrílico, ahistórico e cienticifista corresponde à grande maioria, se não à totalidade das escolas médicas brasileiras.
Quanto às atividades práticas dos alunos, na área básica não passam no mais das vezes da exposição monótona dos alunos a modelos, experimentos, exaustivamente repetitivos e sem nenhuma criatividade, em laboratórios sucatados pelo uso ininterrupto sem qualquer manutenção ou modernização. Na área profissional, os hospitais universitários constituem o campo de prática preferencial (do ponto de vista da escola exclusivo). Tais hospitais, na maior parte dos casos, colocam-se em posição distante da realidade que cerca, buscando transformar-se em uma vitrine de casos demonstrativos de doenças raras. Além disto, persiste, no seio da comunidade acadêmica uma discussão bizantina a respeito do papel do H.U. no que diz respeito às suas funções primordiais. Grande número de docentes e de estudantes defendem a tese de que seja a atividade primordial do H.U. o ensino, como se fosse possível desvincular a boa assistência prestada da boa qualidade do ensino.
As ditas atividades práticas no mais das vezes não passam de atividades demonstrativas onde o aluno é espectador sonolento e desinteressado de uma exposição oral nas proximidades de um paciente.
Apenas no internato, última etapa do curso de graduação, os alunos são expostos efetivamente a atividades práticas, mas aí já voltados para a especialização (ao arrepio da legislação vigente) e freqüentemente sem supervisão adequada.
FUNÇÃO
Entendemos por função neste caso, a função social, ou seja o propósito da escola em relação ao seu produto e à sociedade. Ainda que na maioria dos regimentos das escolas médicas brasileiras esteja estabelecido o compromisso com a formação de um profissional técnico e eticamente preparado para atender aos problemas prioritários da comunidade, tal não acontece.
A análise anteriormente feita ao modelo educacional seu distanciamento da realidade do quadro de saúde da população, sem embasamento conceitual e metodológico, nos ajuda a identificar a função que cumpre hoje a educação médica no Brasil. Não faz mais que produzir um profissional cuja atuação garante a reprodução do modelo médico-assistencial vigente. A falta de formação científica sólida, aliada a frutificação tecnológica e ao descompromisso social, transformam o médico formado num elo fundamental na cadeia do consumo de produtos (medicamentos) e equipamentos.
A falta de preparo didático-pedagógico dos docentes, algumas vezes aliada também a falta de preparo técnico, faz com que eles adotem o predomínio da aula expositiva sobre qualquer outra atividade, assim mascarando suas deficiências e, ao mesmo tempo, impedindo o desenvolvimento do estudante no estudo independente e no exercício da análise crítica.
O modelo educacional vigente, também é responsável pela transmissão ao estudante de uma ideologia da medicina liberal e individualista, que determina um conflito básico entre o profissional formado e o mercado de trabalho real, cuja perspectiva é a do assalariamento.
Portanto, em relação ao seu produto, a escola médica cumpre uma função de através dele perpetuar um modelo médico-assistencial único, determinado por interesses industriais e mercantilistas.
Em relação à sociedade, o isolamento da escola médica a impede da aplicação dos conhecimentos científicos e técnicos disponíveis para colaborar na avaliação das ações de saúde tomando por base o impacto social, a eficiência e eficácia dos serviços, dos métodos e das técnicas utilizadas.
INTEGRALIDADE
A categoria integralidade é aqui compreendida como o conjunto de meios e métodos adotados pela escola médica para o desempenho de sua função social. Diante do que foi analisado anteriormente, podemos praticamente afirmar que o que se busca nesta cat. de análise fica bastante prejudicada diante da realidade da Educação Médica Brasileira. A ausência de um projeto educacional claramente formulado faz com que se defina o modelo educacional mais pelo que ele deixa de ser do que pelo que ele é. Assim os elementos que garantiriam a integralidade estão ausentes. Tal é pois o caso de uma política de investigação científica coerente e sistemática; de informação científica e biomédica acessível através de um acervo básico, complementado por amplo sistema de referência; de um processo educativo permanentemente avaliado e aperfeiçoado, e um financiamento adequado através de fontes orçamentárias e garantia de acesso a fontes extra-orçamentárias.
REFORMA SANITÁRIA CONCEITOS BÁSICOS
A VIII Conferência Nacional de Saúde estabeleceu os marcos políticos e conceitual para a orientação do processo de transformação do setor saúde no Brasil.
O marco político consiste no reconhecimento pela sociedade de que o direito à saúde se inscreve entre os direitos fundamentais do ser humano e que é dever do Estado a sua garantia.
Do ponto de vista conceitual, aquele foco buscou precisar o conceito de saúde como um bem do ser humano contextualizado historicamente numa dada sociedade e num dado momento do seu desenvolvimento. Assim, a VIII CNS afirmou como marco um conceito ampliado de saúde, resultado de condições de "habitação, alimentação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso a posse da terra e acesso a serviços de saúde" (Relatório final de VIII CNS).
Ainda que direito à saúde, no que diz respeito a aspectos específicos do setor, significa a garantia pelo Estado e "condições de vida digna e de acesso universal e igualitário às ações de serviços de promoção, proteção e recuperação de saúde, em todos os níveis, a todos os habitantes do território nacional, levando o desenvolvimento pleno ao ser humano, em sua individualidade" (Rel. VIII CNS).
A partir destes marcos, a VIII CNS estabeleceu as bases para a reformulação do Sistema Nacional de Saúde, a que denominamos hoje a Reforma Sanitária. Tais bases podem ser, resumidamente, assim formuladas:
a) Acesso universal e igualitário de qualquer pessoa a todos os níveis de complexidade dos serviços de saúde;
b) Gestão democrática do sistema de saúde;
c) Garantia de resolutividade por parte dos serviços de saúde.
Para tanto, são propostas as seguintes medidas principais.
1. Unidade de condução das políticas do setor;
2. Integração das Ações de Saúde;
3. Descentralização;
4. Regionalização e hierarquização dos serviços;
5. Acesso garantido a serviços auxiliares de diagnóstico e tratamento;
6. Garantia de suprimento de medicamentos;
7. Democratização das informações;
8. Garantia de participação popular na gestão;
9. Reorganização do trabalho profissional;
10. Reformulação do Sistema Formador de Recursos Humanos.
Como desdobramento da VIII CNS, recente portaria Interministerial envolvendo os Ministérios de Educação, Saúde e Previdência, cria a Comissão Nacional da Reforma Sanitária, que, com base nos princípios estabelecidos deverá elaborar, em um prazo de 180 dias, as propostas para a sua implementação.
Nesse sentido, passa a ser compromisso prioritário da escola médica aqui entendida, enquanto dirigentes, corpo docente, alunos e funcionários, estabelecer seu projeto educacional com vistas a atender as postulações já estabelecidas.
Com base nestas postulações e em conceitos claros relativamente a questão do processo de ensino-aprendizado é que procraremos traçar aqui o que estamos chamando de "imagem-objetivo" para a Educação Médica no Brasil.
IMAGEM OBJETIVO DA EDUCAÇÃO MÉDICA NO BRASIL
A CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
Antes de apresentar a nosa proposta de construção de imagem-objetivo de educação médica no Brasil, queremos registrar que, para a elaboração deste documento tomamos por base um texto de OPAS, da série "Desarrollo de Recursos Humanos nº 72" intitulado "Análise Prospectiva da Educação Médica" Metodologia de Auto-Avaliação. Tal texto propõe como categorias de análise aquelas que utilizamos neste trabalho e formula uma imagem objetivo para a educação médica para o ano 2000.
Propõe ainda um modelo-normativo para a formulação de "imagem-objetivo" sobre a qual também desenvolveremos a proposta aqui apresentada.
A construção de uma "imagem-objetivo" não pode ser fruto de uma visão apriorística, nem um exercício idealista produto da imaginação de alguns; bem ao contrário, tem que estar fortemente apoiada na realidade e constitui parte integrante da situação sócio-econômica e política do país. Portanto, é preciso ter claro que ela representa apenas uma possibilidade entre outras para o desenvolvimento da educação médica. Esta possibilidade no entanto, tem a força de guardar coerência com o processo de transformação por que passa a sociedade brasileira.
Assim, estamos admitindo como premissa, que a escola médica esteja, em conjunto com as demais instituições de saúde, empenhada nas transformações necessárias no setor saúde para atender aquelas exigências formulads pela sociedade, de tal maneira que seu projeto educacional esteja ajustado plenamente ao projeto da sociedade como um todo.
B PROPOSTA
CONTEXTO
1No momento a sociedade brasileira luta por trasformar as desigualdades que atingem as diferentes camadas da população, exigindo uma distribuição mais justa da renda nacional, maior participação no processo decisório, e desenvolvimento de projetos prioritários para as populações menos favorecidas.
2No campo da saúde, a luta pela sua melhoria passa pela garantia de um conjunto de direitos sociais como alimentação, habitação, transporte, emprego, salário etc., além de reestruturação do próprio sistema.
O reconhecimento do direito a saúde exige uma profunda reformulação do sistema que passa pelo compromisso do Estado na sua garantia, através de sua reorganização, de definição de políticas consistentes de financiamento e de garantia de gestão democrática.
3O desenvolvimento de uma política científica e tecnológica comprometida com os interesses maiores da sociedade, vem colocar para a universidade como um todo um grande desafio na definição e aplicação de uma política de vigilância tecnológica no setor.
4A política de desenvolvimento de recursos humanos para atender a estas novas exigências, tem que tomar em conta a quantidade, qualidade e a distribuição destes recursos, além de considerar suas inter-relações fora do setor e principalmente entre as diversas categorias que o constituem. As bases técnicas da prática médica devem ser reformulads seguindo o enfoque estratégico da atenção primária, aqui entendida não como medicina simplificada mas como o processo que visa garantir o acesso de todos a todos os níveis de atenção a saúde, através de um esforço para equilibrar a aplicação dos recursos no setor.
Para tanto é fundamental a adoção de uma política de pleno emprego compatibilizada com as prioridades políticas e socialmente justas, tomando como critérios as necessidades nacionais e regionais.
ESTRUTURA
5A necessidade de transformação da escola médica no sentido de formação profissional com competência e adequada base científica, gerar conhecimentos e participar do planejamento e operação dos serviços, exige a busca e definição de mecanismos concretos de integração. As ações integradas de saúde propiciam condições básicas para isto, fazendo com que a escola ao mesmo tempo em que participa ativamente da reorganização do setor, obtenha e desenvolva conhecimentos críticos para a sua própria reorganização.
6Desta maneira poderá reorientar sua programação de maneira coerente dando especial ênfase aos aspectos científicos e tecnológicos, a investigação biomédica, clínica, epidemiológica e operativa, considerando o conjunto dos serviços de saúde, e não apenas o Hospital Universitário.
7A estrutura organizacional necessita reformulação no sentido da garantia da gestão democrática, com a participação dos alunos, professores e funcionários.
É fundamental a participação dos serviços na elaboração dos programas e projetos da escola médica.
8A organização curricular deve ser reformulada de maneira a superar a pulverização atual, onde as disciplinas se confundem com as especialidades médicas.
9A base desta reformulação deverá ser a definição de compromisso de cobertura de base populacional e geográfica, constituindo-se a região, área ou distrito docente assistencial.
10A integração docente-assistencial permitirá o trabalho integrado de estruturação dos serviços e dará consistência maior entre programação docente e organização dos serviços.
11A capacitação técnica do pessoal docente do ponto de vista pedagógico e filosófico deverá estar objetivamente vinculada ao conceito de que "a formação é resultado da Relação didática entre a prática e a teoria, que começa e termina na primeira".
FUNÇÃO
12Nesse contexto de mudança a escola tem de estar preparada para:
Abordar os problemas médico-sociais individuais e coletivos, além de executar ações para sua solução com ênfase na programação e prevenção.
Avaliar as ações de saúde com base no impacto social, na eficiência na eficácia e na eqüidade dos serviços.
13 Ênfase na aprendizagem, superando o modelo acadêmico autoritário.
Ênfase na "formação" sobre a "informação" de modo a que o profissional, além de um corpo de doutrina, incorpore atitudes e habilidades.
14 Participação integral da escola num plano assistencial que cubra de forma equilibrada todos os níveis de atenção com participação de professores e alunos de graduação e pós-graduação.
Inserção precoce dos alunos de graduação nos programas assistenciais.
15 Participação integral da escola num plano puramente de desenvolvimento do pessoal de saúde.
INTEGRALIDADE
O projeto educacional aqui formulado tem como base o compromisso social da escola médica, expresso pela sua inserção concreta na programação, execução, controle e avaliação dos programas de saúde pra uma determinada população numa dada região. Tal situação permite o seu desenvolvimento de forma integrada. Entretanto para que se desenvolva de forma integral ainda são necessários alguns requisitos:
16 O processo de investigação deve ter suas prioridades determinadas pelos problemas locais de saúde da população.
Garantia de acesso às informações de saúde, seja a nível da produção de conhecimentos ou de dados de fontes internacionais, nacionais e locais.
17 Racionalização da utilização do conhecimento biomédico, clínico e social com base nos problemas da população e necessidade dos serviços.
18 Investigação sobre o processo educacional buscando a melhoria da técnica.
19 Capacitação de estudantes, médicos e professores em esquemas de trabalho integrado e equipes multiprofissionais.
20 Busca de esquemas adequados de financiamento de fontes do estado e de outras agências nacionais ou internacionais.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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2. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA. Formação médica para a nova política de saúde. Rio de Janeiro, ABEM, 1986. 7 p. mimeo. (Documento apresentado no Congresso Brasileiro de Educação Médica, 23º. Uberlândia, 19-22 out. 1985).
3. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO MÉDICA. Situação atual da educação médica no Brasil. (Informe a Conferência Pan-Americana de Educação Médica, 10º, Bogotá, 1984).
4. BRASIL, Secretaria da Educação Superior. Comissão de Especialistas do Ensino Médico. Ensino Médico: bases e diretrizes para sua reformulação, s.1., MEC/SESu, 1986. 16 p. mimeo. (Documento nº 6).
5. CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE, 8º. Brasília, 17-21 mar. 198. Relatório final. Brasília, Ministério da Saúde 1986. 21 p.
6. GARCIA, JUAN C. La educación médica en la América Latina. Washington, OPS/OMS, 1973. 430 p. (Publicación cientifica, 255).
7. GONÇALVES, E.L. O ensino médico e os médicos no Brasil; aspectos quantitativos. Rio de Janeiro, ABEM, 1984. 90 p. (Série de documentos da Associação Brasileira de Educação Médica, 8).
8. NOGUEIRA, R. P. Dinâmica do mercado de trabalho em saúde no Brasil: 1970/1983. Brasília, OPS, 1986.
9. ORGANIZAÇÃO PANAMERICANA DA SAÚDE. Analisis prospectivo de la educación médica; metodologia de auto-avaliación. Washington, OPS/OMS, 1986. (Série desarrollo de recursos humanos, 72).
10. RIBEIRO, D. A universidade necessária. 3º ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.
1 ESTRUTURA DA POPULAÇÃO
2 SITUAÇÃO ECONÔMICA
3 DESENVOLVIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO
4 BASE ECONÔMICA DA PRÁTICA MÉDICA; BASE TÉCNICA DA PRÁTICA MÉDICA; ORGANIZAÇÃO DOS SERVIÇOS; MERCADO DE TRABALHO
5 MECANISMOS DE INTEGRAÇÃO
6 ARTICULAÇÃO COM SERVIÇOS
7 ORGANIZAÇÃO
8 FLEXIBILIDADE FUNCIONAL
9 BASE POPULACIONAL
10 PARTICIPAÇÃO DOS DOCENTES, ALUNOS E MÉDICOS.
11 CAPACITAÇÃO TÉCNICA DO PESSOAL DOCENTE.
12 ATENÇÃO INDIVIDUAL E COLETIVA
13 RENDIMENTO ACADÊMICO E FORMAÇÃO INTEGRAL
14 INTEGRAÇÃO DOCENTE-ASSISTENCIAL
15 EDUCAÇÃO CONTINUADA
16 INVESTIGAÇÃO DE PROBLEMAS LOCAIS DE SAÚDE
17 SISTEMA DE REFERÊNCIA
18 DESENVOLVIMENTO PEDAGÓGICO
19 INTEGRAÇÃO MULTIPROFISSIONAL
20 FINANCIAMENTO ADEQUADO