ANÁLISE
Mario B. Aragão
Pesquisador Titular do Deptº. de Ciências Biológicas da Escola Nacional de Saúde Pública
Le pillage de l'Amazonie. Jean Eglin e Hervé Théry. Francois Maspero, Paris, 1982.
Um livro pequeno mas precioso. Pena que pouca gente, hoje em dia, leia francês.
A obra se baseia, principalmente, em notícias saídas no que os autores chamam de pequena imprensa, isto é, na imprensa alternativa e que, portanto, não alcançam o grande público. Afora isso, parte dos dados foi obtida nos relatórios da FAO, SUDAM, Cia. Vale do Rio Doce e mais umas poucas fontes.
Pela primeira vez vimos uma informação sobre a origem da crença de que a Amazônia era o pulmão do mundo, isto é, a fornecedora de oxigênio. Curiosamente ela saiu de uma entrevista de um dos cientistas que mais conhecem a região. Nela o Dr. Harald Sioli falou que a queima de toda a floresta aumentaria, substancialmente, o teor de gás carbônico da atmosfera. Observação verdadeira, mas que gerou uma interpretação falsa. Infelizmente, o livro é anterior à divulgação dos trabalhos dos pesquisadores do Centro de Energia Nuclear para a Agricultura, que mostraram que cerca de 50% das chuvas que caem na bacia amazônica provêm da água evaporada pela floresta. Este sim é um problema seríssimo.
Os autores fazem um histórico dos planos do governo brasileiro para o desenvolvimento da Amazônia que é um dos pontos altos do livro.
Até o governo Getúlio Vargas a Amazônia vinha vivendo, prosperando ou regredindo, à custa do mercado para a sua produção extrativa. Nesse governo foi criada a Superintendência de Valorização da Amazônia, hoje SUDAM, que distribuía recursos a vários órgãos do governo, sem alterar significativamente a vida da região. No governo Juscelino Kubitschek a maior parte desses recursos foi concentrada na construção da rodovia Belém-Brasília. É aí que começam as grandes modificações. Foi o primeiro passo para a entrada do boi. Nos governos militares, Castelo Branco chamou o milionário Daniel Ludwig para instalar o Projeto Jari, que seria uma Fordlândia em tamanho grande. Vieram, em seguida, os projetos pecuários com os incentivos da SUDAM. Alguns deram certo, e Belém hoje é bem abastecida de carne. Entretanto, um levantamento feito com imagens de satélite, em 1976, não conseguiu descobrir onde estavam 85 desses projetos.
No governo Medici projetou-se conduzir o excedente populacional do Nordeste para os projetos de colonização, ao longo da Transamazônica. Foi a época das rodovias do Ministro Andreaza. A Transamazônica e a Cuiabá-Santarém foram terminadas, mas a Perimetral Norte ficou pelo meio.
Com o fracasso da colonização resolveu-se atrair grandes investidores. Foi o tempo da Volkswagen, da Liquigaz e diversos bancos. Pretendia-se obter divisas com a exportação de carne. Esgotado esse filão, passou-se aos grandes projetos industriais e de mineração. Construiu-se a hidroelétrica de Tucuruí, a Albrás, a Alunorte, culminando com o projeto Grande Carajás.
Segundo os autores do livro, tudo isso era para obter divisas e pagar a dívida externa. O que chama a atenção nessa seqüência de projetos é que, cada vez que um fracassava, imaginavam outro muito mais audacioso e, logicamente, mais caro. Porém, ao que se sabe, a cada ano a dívida fica maior.
É muito triste que esses chamamentos ao bom senso venham do estrangeiro.