RESENHA REVIEW
Maria Cecília de S. Minayo
Departamento de Ciências Sociais
Escola Nacional de Saúde Pública
Cadernos de História e Saúde, Nº 2. Ruth B. Martins, (ediitora). Publicação da Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz: Rio de Janeiro, Brasil, 1992.
O Nº 2 dos Cadernos de História e Saúde editados pela Casa de Oswaldo Cruz, é um desses raros momentos de compilação científica onde se juntam visão acadêmica, reflexão teórica séria, oportunidade política e generosidade intelectual.
Este exemplar condensa, num clima de abertura, debates ocorridos, por iniciativa da Casa, no IV Encontro de História e Saúde, realizado em 1990. Na verdade, os Cadernos são conseqüência deste e de mais três encontros anteriores, onde, através de conferências, mesas-redondas, comunicações, painéis, vídeos e exposições fotográficas, os pesquisadores da Casa de Oswaldo Cruz reuniram cientistas sociais, médicos, historiadores todos investigadores num debate sobre história das doenças, das instituições médicas e biomédicas, das ciências biomédicas, das políticas públicas e constituição dos atores sociais na área de saúde, de metodologias científicas, de documentação e informação no campo, além de tratar da preservação do patrimônio histórico, artístico e institucional da saúde e biomédico.
Por ser composto de um acervo proveniente de debates, os Cadernos ultrapassam o clima solitário, fechado e acabado dos artigos científicos obrigatoriamente delimitados pelas exigências acadêmicas. Por outro lado, não caem na "chatice" da transcrição de conferências que repetem, sem nenhum respeito ao leitor, os "cacoetes"que todos temos numa exposição oral.
Os Cadernos nº 2 estão organizados dentro do seguinte roteiro;
1. História das doenças;
2. Institucionalização das ciências biomédicas e da medicina experimental no Brasil;
3. Grupos profissionais e propostas de atuação;
4. Ciências Sociais e Saúde;
5. Arquivo e documentação histórica;
6. História oral;
7. História da ciência;
Na sua primeira parte, os Cadernos registram um debate sobre o Estigma, juntando investigadores do porte de Moacyr Scliar, Luiza M. Rago, Zenaide Lessa, Cláudio Bertolli e Herbert de Souza, o qual aborda a constituição social do Estigma em relação à peste, à sífilis, à tuberculose, à loucura e a AIDS. Em seguida, Carrara e colaboradores dissertam sobre a história do combate às doenças sexualmente transmissíveis no Brasil; Delaporte apresenta a história da febre amarela; Bertolli escreve sobre perspectivas documentais da história social da tuberculose, e Fernandes et al., sobre o papel do Instituto de Tisiologia e Pneumonia no ensino e na pesquisa da tuberculose.
Na segunda parte, vários pesquisadores da Casa de Oswaldo Cruz, do Instituto Butantã e do Instituto Adolfo Lutz, da Unicamp, recuperam a história, a filosofia e as propostas das instituições pioneiras das ciências biomédicas e da medicina experimental que se constituíram a partir do século XIX no eixo Rio-São Paulo.
No terceiro capítulo, a revista recupera, através de pesquisadores da Casa de Oswaldo Cruz, a origem e a tragetória inicial do sindicato médico no Brasil, bem como a história da Previdência Social brasileira.
A seguir, a publicação destaca três artigos sobre Ciências Sociais e Saúde, de Nilson do Rosário Costa, Everardo Duarte Nunes e Edmundo Gallo. Os dois primeiros oferecem uma contribuição fundamental para a compreensão da constituição do campo científico da Saúde Coletiva, enquanto o terceiro desperta uma reflexão interessante sobre os impasses atuais na órbita da teoria e prática sanitárias, mas que transcendem ao campo.
O capítulo sobre arquivo e documentação histórica, em que pese seu componente técnico, interessa sobremaneira aos pesquisadores, pelo que disso resulta em riqueza ou deficiência nos materiais que constituem acervo para historiadores e cientistas.
Pela simplicidade e vividez das exposições, a parte relacionada à história oral tem importância relevante para os estudiosos que utilizam os instrumentos da chamada pesquisa qualitativa. Sobre a História da Ciência, Oliva traz uma contribuição importante para se pensar a teoria relacional da racionalidade científica com a metafísica e com as abordagens alternativas.
Obviamente, nem todas as comunicações, artigos ou depoimentos têm o mesmo peso e densidade científicos. Há, porém, para todos os gostos e interesses, tornando os Cadernos de História e Saúde nº 2 um presente, um ato de generosidade intelectual do grupo de pesquisadores da Casa de Oswaldo Cruz.