ARTIGO/ARTICLE

 

Paradoxos da humanização em uma maternidade no Brasil

 

The paradoxes of humanized childbirth care in a public maternity ward in Brazil

 

 

Carmen Susana Tornquist

Departamento de Fundamentos da Educação, Universidade do Estado de Santa Catarina. Av. Madre Benvenuta 2007, Florianópolis, SC 88035-001, Brasil
Programa de Pós-graduação em Antropologia Social, Universidade Federal de Santa Catarina. C. P. 476, Campus Universitário, Florianópolis, SC 88040-900, Brasil. carmentornquist@hotmail.com

 

 


RESUMO

A Maternidade do Hospital Universitário em Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, procura seguir as recomendações da Organização Mundial da Saúde no sentido da humanização da assistência ao parto, entre elas: o incentivo ao parto vaginal, ao aleitamento materno, ao alojamento conjunto, à presença de acompanhante e à redução do excessivo intervencionismo tecnológico no processo do parto. Neste artigo, são analisadas as diferenças relativas ao público que a ela acorre: mulheres de classes médias e de grupos populares. A análise busca observar as diferenças entre estas usuárias no que tange à escolha de acompanhante e experiências de dor e de amamentação.

Palavras-chave: Maternidade; Etnografia; Parto; Humanização da Assistência


ABSTRACT

The maternity ward of the University Hospital in Florianópolis, Santa Catarina, Brazil, attempts to follow World Health Organization guidelines for humanized childbirth care, including the encouragement of non-surgical delivery, breastfeeding, rooming-in, extended family visitation, and reduction of excessive technological intervention in the delivery process. The study focuses specifically on the choice of delivery procedure and on family presence during labor/childbirth, as well as women's experience with labor and breastfeeding.

Key words: Childbirth; Ethnography; Motherhood; Humane Assistance


 

 

Introdução

O modelo de atenção ao parto hegemônico no Brasil tem sido denunciado crescentemente por profissionais e movimentos sociais, articulados em torno de um conjunto de valores e práticas identificadas pela noção de humanização da assistência ao parto e ao nascimento. Entende-se aqui por ideário da humanização o conjunto de recomendações que a Organização Mundial da Saúde vem adotando nas últimas décadas, subscrito por organizações civis, como por exemplo, a Rede de Humanização do Parto e do Nascimento. Segundo Diniz (2001), estas diretrizes sintetizam um conjunto importante de pesquisas sobre parto no mundo inteiro e estão contidas em diversos documentos, entre eles: Care in Normal Birth: A Pratical Guide (WHO, 1996) e World Health Day: Safe Motherhood (WHO, 1998), e fazem uma importante crítica à excessiva medicalização do parto, orientado pelo modelo tecnocrático da assistência, no sentido que lhe atribui Davis-Floyd (1992). Este modelo é apontado como um dos responsáveis pelas altas taxas de mortalidade materno-infantil em vários países, pelo desrespeito aos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, e pela redução de um evento social, cultural e de saúde a um fenômeno patológico, médico e fragmentado. No bojo desta crítica, a epidemia de cesárea aparece como exemplo paradigmático da excessiva intervenção tecnológica sobre corpo e dinâmicas das mulheres.

No Sul do Brasil, uma das experiências vistas pelo movimento em prol da humanização como bem-sucedida é a Maternidade do Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Santa Catarina, situada em Florianópolis. Fundada em 1995, acumula dois títulos importantes, indicados pelo Ministério da Saúde: Hospital Amigo da Criança e Prêmio Galba Araújo, conferido àquelas Maternidades que prestam uma assistência humanizada, em função de critérios tais como: estímulo à amamentação e ao vínculo precoce, incentivo ao parto normal e vertical, presença de acompanhante escolhido pela mulher para o processo do parto, entre outros.

Foi nesta Maternidade-escola que realizamos a presente pesquisa, tendo como eixo as seguintes indagações: até que ponto a humanização da assistência garante os direitos humanos às mulheres, direitos que são sexuais e reprodutivos? Como a instituição trata as diferenças culturais e sociais das suas usuárias? E, finalmente, será realmente possível, num hospital público, marcado pelo peso da tradição higienista, efetivamente humanizar a assistência?

 

Metodologia

Trabalhou-se basicamente com observação participante, realizada dentro da Maternidade, fundamentalmente no Centro Obstétrico (CO) e Alojamento Conjunto (AC), e seguindo as exigências da Resolução 196/1996, incluindo o Consentimento Informado das parturientes, que aqui são referidas por meio de nomes fictícios. Observamos também as normas do Código de Ética da Associação Brasileira da Antropologia. A observação participante seguiu as diretrizes de Gilberto Velho (1987) e Roberto Da Matta (1974), ou seja, adaptando o método antropológico clássico para as sociedades urbanas modernas. Foram feitas entrevistas semidiretivas com estas parturientes, já no AC, além de duas entrevistas na perspectiva da história oral, estas realizadas fora da Maternidade e depois do puerpério, todas analisadas com base em análise de conteúdo temática, segundo Blanchet & Gotman (1992).

Foram considerados 27 casos, desde o trabalho de parto até o pós-parto. A observação participante foi feita durante nove meses no ano 2000, sendo que nos primeiros meses foram feitas observações gerais, abarcando múltiplos aspectos do cotidiano da Maternidade, a partir do quais foram selecionados os principais tópicos que no campo vinham ao encontro das indagações teóricas acima citadas. Procurou-se observar mulheres de diferentes origens sociais, com vistas a perceber em que medida a proposta da Maternidade atendia às expectativas de diferentes classes sociais que acorrem a este Hospital, notadamente camadas médias e classes populares, uma vez que a literatura antropológica tem apontado para significativas diferenças culturais entre estes setores, particularmente no que tange aos significados que atribuem à maternidade, à família e às crianças, à gravidez e parto, à saúde e à doença. Foram estabelecidos quatro temas centrais para comparar estes grupos: representações de maternidade, escolha do tipo de parto, escolha de acompanhante, e experiência e manifestações da dor.

 

A Maternidade

A Maternidade conta com 22 leitos e atende uma média de 1.700 partos por ano, sendo que, em 2000, ano em que realizamos a pesquisa, de um total de 1.767 partos, 31% foram cesáreas e 69% foram normais. Nesse ano, em que recebeu o Prêmio Galba Araújo, a média de partos verticais (em cadeira de cócoras) atingiu 50%.

Nesta maternidade estão institucionalizadas várias rotinas que fazem parte do ideário da humanização: cursos de preparação para o parto, direito da parturiente a um acompanhante de sua escolha (durante todo o processo do parto), opção de parto de cócoras, alojamento conjunto, estímulo a técnicas mecânicas de alívio da dor (massagens, banhos, deambulação), uso cauteloso de indução intravenosa (ocitocina), analgesia e episiotomia, bem como abolição da prática de enema e tricotomia.

Não entraremos aqui nas complexas questões que envolvem a organização do serviço, as diferenças relativas à formação profissional e às relações de poder e de gênero que atravessam a equipe de atendimento, uma vez que o foco deste artigo é tratar das experiências das parturientes e das diferenças culturais que se fazem presentes nas interações com a equipe. Deve-se registrar que, apesar da institucionalização de práticas humanizadoras, persistem heterogeneidades no atendimento, havendo significativas variações sobretudo entre o corpo médico, dotado de maior margem de autonomia e poder do que a equipe de enfermagem, esta mais permeável às modificações de tipo humanizador.

A organização do HU onde se situa esta Maternidade insere-se no padrão moderno da clínica médica, analisada por Foucault (1988), com sua hierarquia e divisão do trabalho, seu afã pela observação, pelo registro, pelo esquadrinhamento de mentes e de corpos. Também para Foucault (1985), a Clínica Médica é um lugar central do biopoder, lugar onde se produzem discursos sobre a sexualidade e o comportamento da população, com forte imbricação com os dispositivos de poder estatal na sociedade moderna.

 

Diferentes escolhas: tipo de parto e acompanhante

A admissão da parturiente no CO obedece a um ritual bem demarcado: após a colocação do avental na nova hóspede e seu acompanhante, uma enfermeira ou auxiliar se encarrega de despi-los de suas roupas e paramentá-los com aventais, pró-pés e toucas apropriadas para então, iniciar o chamado "tour pelo Centro Obstétrico", onde serão mostrados espaços e procedimentos dos quais a parturiente será, em breve, protagonista. A visita começa nos quartos do Pré-parto e segue para a Área Restrita, onde existem duas salas de parto; em uma delas havendo apenas a mesa de parto normal, na outra, a cadeira de cócoras, a mesa convencional e um equipamento que permite fazer uma cesárea de emergência. Ao lado desta, situa-se a sala de neonatologia, que pode ser vista através de uma grande vidraça que a separa da sala de parto. A Sala de Cirurgia é apenas indicada, uma vez que o recurso à cesárea é limitado às situações excepcionais. A apresentação do espaço físico é acompanhada de explicações por vezes detalhadas dos procedimentos e de algumas de suas razões. É o caso da cadeira de parto de cócoras, sobre a qual é feita, em geral, franca publicidade, visando a incentivar sua escolha. É importante destacar que ainda que nem todos os profissionais, particularmente médicos, sejam adeptos do parto vertical (de cócoras, na acepção das enfermeiras e das parturientes), há uma adesão crescente a esta alternativa. O número de partos verticais, um dos importantes critérios de humanização, tem crescido significativamente: de 5,5% do total de partos em 1996, passou para 28,30% em 1998, chegou a 50% em 1999, atingindo 60,52% em 2001. Os médicos argumentam que a posição vertical é a mais fisiológica e facilitadora do período expulsivo, mas é efetivamente a equipe de enfermagem que traduz esta versão para a linguagem cotidiana, tradução esta que é feita de forma muito convincente, articulando razões médicas, metáforas e exemplos do senso comum, facilmente compreendidas pelas mulheres. Dos 18 partos verticais observados nesta pesquisa, nove foram fruto de escolha prévia e a outra metade feita após a visitação da sala de parto.

As mulheres de classes populares não demonstram maior preocupação quanto ao tipo de parto mesmo quando acatam a sugestão da equipe. Já as mulheres de classes médias, ao contrário; a forma de parir tem uma importância grande: o parto de cócoras aparece para elas como um ponto central no planejamento do parto, sendo um das razões mais referidas pela escolha pelo HU, como é o caso de Júlia: "quando eu soube que tinha a tal cadeira, decidi: vai ser no HU de qualquer jeito".

O parto e cócoras é visto tanto pela equipe quanto pelas mulheres de camadas médias como um ideal a ser atingido, um signo da mulher valente ou da boa parideira: suas protagonistas são congratuladas pela equipe pelo seu feito. Este parto é chamado pela equipe de saúde de "parto de livro", e corresponde ao que Fonseca (1997), denomina de "belo parto", um parto tido como exemplar. No entanto, nem sempre a escolha corresponde à realidade: não raro, em função de complicações diversas, a adepta do belo parto vê-se diante da urgência de uma cesárea, experiência que resulta invariavelmente em expressões de frustração e incapacidade: "ela não conseguiu ter de cócoras", lamenta, por exemplo, um acompanhante cuja mulher participara do curso de gestantes oferecido pelo HU. É o caso de Fabiana e de Zilda, que, apesar de terem se preparado ao longo da gestação para um parto de cócoras, viram-se surpreendidas pela urgência de um parto cirúrgico, o que lhes provocou muita frustração. Para as mulheres de camadas médias, a cesárea significa o revés do belo parto, um fracasso a ser lamentado, observação que aparece também nas etnografias feitas por Fonseca (1997), na França e por MacCallum (1997), na Bahia. Entre as mulheres de classes populares, o recurso à cesárea apenas é malvisto em função do medo e desconfiança da cirurgia e pelas dificuldades que acarreta no pós-parto.

Outro direito das parturientes é a livre escolha de um acompanhante, institucionalizada desde sua inauguração, e que atende às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS): "uma parturiente deve ser acompanhada pelas pessoas em quem confia e com quem se sinta à vontade: seu parceiro, sua amiga, uma doula ou enfermeira-obstétrica" (WHO, 1998:13).

Se inicialmente esta iniciativa foi vista com reservas por parte dos profissionais, esta resistência foi rapidamente desfeita e hoje a presença do acompanhante leigo no cotidiano da Maternidade é mesmo incentivada pela equipe, que vê neste personagem uma fonte segura de suporte emocional e apoio na facilitação do trabalho de parto (massagens, banhos, respiração), muitas vezes assumindo pequenas tarefas que caberiam às auxiliares. Na sala de parto, sua atuação é menor, porém, não inexistente, particularmente após o nascimento do bebê, quando é convocado a participar dos primeiros cuidados, incluindo aqueles relativos à amamentação, que já se iniciam no pós-parto imediato e se estendem até o AC.

Percebemos diferenças quanto ao significado atribuído ao parto: entre os casais de classes médias é usual o costume de registrar fotograficamente o parto, ou mesmo filmá-lo. A ênfase no registro do parto é expressão de uma centralidade do momento do nascimento como início de uma trajetória biográfica do bebê. Seu sexo já é conhecido e o nome está definido antes do parto, reforçando a idéia de que o feto já é uma pessoa com uma individualidade, o que não acontece senão como exceção entre as mulheres das classes populares. Dada uma concepção outra que não a do pai grávido, circunscritos entre as classes médias e entre os profissionais. Aqui, é quase sempre o homem, pai do bebê, o acompanhante eleito.

Para as mulheres populares, o acompanhante escolhido nem sempre é o pai do bebê, sendo preferida com freqüência uma mulher da rede de parentesco: mãe, cunhada, irmã, e, eventualmente, uma amiga. Do universo observado na pesquisa, e considerando as 18 parturientes de classes populares, encontramos 11 acompanhantes mulheres, mas também a presença dos companheiros (sete casos). Estas acompanhantes costumam estar presentes em todo o período do pré-parto e parto, permanecendo menos tempo e de forma descontínua no alojamento conjunto, tal como acontece quando o acompanhante é o companheiro.

O recurso à troca de lugar do acompanhante homem com outra mulher da rede de parentesco é muito comum entre as famílias populares ainda quando se está no Pré-parto. Em várias ocasiões ele entra com a mulher, e depois de um tempo, no Pré-parto, procuram se ausentar, alegando ter de ir buscar a sacola de roupas do bebê em casa, ou de cumprir com alguma tarefa ligada ao trabalho. Os homens argumentam não ter "estômago" para coisas de hospital, não suportar ver dor e sangue, admitindo ter medo e ficarem nervosos no ambiente hospitalar, depositando plena confiança nos médicos e nos procedimentos adotados pela equipe. Neste universo, gravidez, parto e bebês são um assunto de mulheres, como observam estudos sobre famílias populares no Brasil urbano atual. No entanto, percebe-se que mesmo neste universo popular, há casais mais identificados com o universo moral das camadas médias, particularmente aqueles que apresentam maior escolaridade.

É importante sublinhar o papel que têm as auxiliares de enfermagem, a quem cabem os encaminhamentos relativos ao acompanhante. Estas compreendem bem as dificuldades do cotidiano das famílias, com quem parecem compartilhar experiências e modos de vida similares: sensíveis às dificuldades de permanência do acompanhante oficial e suas desistências, por exemplo, colocam em prática a idéia de "flexibilizar rotinas quando necessário", presente na filosofia da Maternidade. Esta flexibilidade é o que permite a saída dos companheiros que, diante da iminência do parto, não raro solicitam a troca de acompanhante, apoiados pelas mulheres. O caso de Silvana é exemplar neste sentido: sua mãe substituiu o marido, que subitamente decidiu buscar a sacola de roupas do bebê em sua casa, distante cerca de 30km dali, sem levar em consideração as insistentes informações da equipe de que a maternidade costumava oferecer as primeiras mudas de roupa aos recém-nascidos. Mas esta flexibilidade prática não altera a concepção idealizada de quem deve ser o acompanhante, que é, sempre, o pai da criança. Quando um destes abandona seu posto, é alvo de comentários, piadas e chacotas: "diz pro teu marido que ele é um frouxo, não vir assistir um parto lindo destes", ou ainda "teu marido fugiu da raia, é?" e "O pai ficou com medo de ver o filho nascer, é?".

Mas as mulheres destes homens não esperam que eles assistam ao parto, manifestando estranheza quanto à excessiva preocupação da equipe com a presença do marido. Lisiane, por exemplo, explica à equipe porque não insiste para que o marido entre: "ele não ia agüentar, deixa ele esperando lá fora". Outro caso é o de Ana, que diante da pergunta da equipe sobre onde está o marido, explica: "deixa a mãe entrar, que isto não é coisa para homem".

Se as classes populares não compartilham da idéia de que o marido deva acompanhar o momento do parto, não significa que não esperem dele um outro tipo de envolvimento: buscar e levar a parturiente (e bebê) para casa, trazer visitas à Maternidade, buscar roupas, avisar os parentes. Já a escolha do acompanhante para o parto recai sobre mulheres da rede de parentesco, envolvendo a valorização da identidade de gênero e a experiência: são escolhidas mulheres que já tiveram filhos, experiência que é invocada e respeitada na hora do trabalho de parto e do parto.

Pesquisas socioantropológicas com classes populares urbanas como as de Sarti (1997), Fonseca (1996) e Paim (1998), mostram que neste universo a maternidade é um elemento decisivo de identidade feminina, o parto sendo um rito de passagem para a condição de adulta, no qual a mulher é investida de poder e autoridade, em função de ter adquirido um saber respeitável e inacessível aos homens. Dados similares aos encontrados nesta Maternidade aparecem em estudo recente sobre os partos ambulatoriais realizados na Favela Monte Azul, em São Paulo: lá, as acompanhantes preferidas pelas parturientes eram outras mulheres do seu círculo de parentesco, em contraste ao desejo das mulheres de camadas médias, que invariavelmente escolhiam o companheiro para esta função (Hotimski & Alvarenga, 2002).

 

Expressões da dor

Tentativas de diminuir as dores do parto não são novidade na obstetrícia: no século XIX, não raro se recorria ao ópio; já no século XX, à analgesia ou à cesariana. No campo das correntes críticas da obstetrícia convencional, nos anos 50, postulava-se o parto sem dor viabilizado pelo método psicoprofilático do Dr. Lamaze; nos anos 70, entraram em cena técnicas orientais, místicas e psicológicas de preparo para que o bebê nascesse sorrindo e para que a mulher sentisse prazer no momento de dar à luz. Dar à luz de uma forma não-violenta ficou conhecida pelos livros de Frederik Leboyer, médico que escreveu livros sobre o tema, até hoje referenciados pelos adeptos da humanização da assistência.

As propostas de humanização do parto recuperam uma parte do repertório de técnicas de alívio da dor, sobretudo aquelas consideradas mais naturais e menos invasivas: as propostas técnicas (mecânicas, psicológicas, espirituais) indicam o reconhecimento desta dor inerente ao processo fisiológico, e a necessidade da mulher saber enfrentá-la. A presença do acompanhante, o suporte emocional, as técnicas de alívio, o apoio da equipe, não são, contudo, suficientes para eliminar a experiência da dor, experiência esta que não apenas se relaciona com a subjetividade de cada mulher, mas, mais ainda, com a própria forma como esta dor é construída pela cultura.

Sabemos que a dor, como as doenças, não são apenas manifestações universais de processos orgânicos, mas construções simbólicas que variam conforme os contextos socioculturais e a própria subjetividade do doente, conforme sugere Le Breton (1995), entre outros. Se não é possível separar os aspectos culturais da dor dos aspectos orgânicos, também não se pode falar em uma mensuração universal da dor. Muitos antropólogos argumentam que se trata de uma expressão obrigatória dos sentimentos, no sentido proposto por Mauss (1979), um conjunto de expectativas sociais que constróem a própria forma com que cada indivíduo vivencia a morte, a surpresa, a guerra, o sofrimento, a alegria e as dores. Se partimos da concepção de que as manifestações das emoções são construções culturais, percebemos que, também na instituição hospitalar, diferentes concepções de dor estão em jogo, sendo que a parturiente está em estado liminar, pois é ela (e seu corpo) que atravessa esta experiência. No entanto, esta concepção da doença enquanto expressão sociocultural e variável das doenças (illness) não é compartilhada pela biomedicina, que tende a sublinhar as manifestações orgânicas, universais e quantificáveis, e esta é a concepção predominante entre a equipe de saúde da Maternidade.

Este estado é vivido no hospital, em geral, de forma bastante controlada: as mulheres demonstram uma grande preocupação com sua performance em termos do controle das emoções, procurando expressar sua dor dentro de parâmetros considerados adequados, que consistem em: não gritar, não entrar em desespero, obedecer às ordens médicas, acatar os conselhos da equipe. A expressão de certas emoções relativas ao parto tem contornos bem definidos dentro do CO: enfrentamento adequado da dor supõe a evitação do escândalo, da gritaria, das expressões de desespero, descontrole e descompensação, este último sendo o termo preferido pela equipe. Este comportamento ideal é compartilhado pela equipe e pacientes, no entanto nem sempre estas mantêm-se nos limites destas expectativas. É o caso de Camila, primípara, 23 anos, acompanhada da mãe: ela grita cada vez mais fortemente com o avanço das contrações, para, a cada intervalo entre uma dor e outra e diante dos olhares atentos e assustados da equipe, pedir perdão pelo seu descontrole: "Gente, vocês me desculpem, tá, eu sei que não devo gritar, desculpem, mas dói demais. Desculpem, desculpem!" (grifos meus).

Uma mulher que ultrapassa os limites do comportamento esperado será chamada de descompensada e responsabilizada pela promoção de estresse no ambiente. Estas situações geram forte tensão entre os profissionais e levam, não raro, a mudanças no andamento do parto: são tomadas decisões imprevistas, tanto em termos de aceleração do trabalho de parto, quanto ao tipo de parto. A descompensação remete a este estado de desequilíbrio e perda da consciência, fazendo eco a outra das categorias muito utilizadas pela equipe médica, que é o termo mãezinha. Este termo somente é utilizado nos momentos da tensão gerada pela descompensação, não sendo comum em outras situações, à exceção do AC, onde aparece como categoria comum no discurso da amamentação.

Entre a equipe de enfermagem, majoritariamente composta por mulheres, comenta-se bastante a situação de dor e acerca do que é ser uma mulher: "a mulher tem que ter uma certa idade para poder passar por esta dor", "dizem que a mulher regride, volta a ser criança na hora do parto". Também circula a idéia, bem conhecida entre grupos onde o catolicismo é forte, de que as dores do parto são parte intrínseca de sua identidade de gênero, e que seu enfrentamento resignado é parte das atribuições femininas. Alzira, auxiliar que costuma prestar muito apoio às mulheres no trabalho de parto, diz para a paciente: "eu não vou dizer que não dói que é mentira, mas é dor que logo se esquece (...) Mulher é que sabe o que é sofrer".

Quando a parturiente e profissionais partilham da idéia de que a dor é legítima, e há escuta desta dor, se estabelece uma negociação em torno do seu sentido. A legitimação da dor num contexto que a princípio lhe é adverso, estabelece uma comunicação de mão dupla, reverso do que acontece quando o profissional reduz a dor à sua dimensão orgânica, universal; não há negociação possível, mas sim, imposição e violência. O caso de Mariana é exemplar da ausência de uma negociação de sentido para as dores.

Após olhar o resultado da cardiotocografia, o médico o informa à parturiente:

Mas eu estou morrendo de dor! Não posso mais! Elas são fortes!" (Mariana).

Não, não são, é só olhar no aparelho que está tudo escrito aqui" (médico).

Logo depois, o médico anuncia à equipe: "vamos ter que fazer uma cesárea".

Mas ... Doutor!" (Mariana).

Tu quer saber o quê?" (médico).

Queria fazer uma pergunta..." (Mariana).

Tu quer saber o tamanho do corte?" (médico).

Não, não, eu não queria saber nada, não..." (Mariana).

Eu te avisei que ia doer, lembra?" (médico).

A desconsideração do médico pelo relato da dor desta parturiente revela a ausência da negociação da dor. É bem verdade que o médico em questão – assim como outros na mesma equipe – aceitam as particularidade da instituição, sem no entanto aderir totalmente a ela. O importante a reter aqui é que as situações de descompensação são justamente aquelas nas quais o respeito ao processo fisiológico da mulher e a suas decisões é substituído pela decisão médica convencional: sem explicações, sem margem de negociação, com desqualificações e infantilização das parturientes. São sempre as situações nevrálgicas que suscitam desrespeito aos diretos e violência simbólica.

As dificuldades de enfrentar as situações de descompensação (ou de expressões inusitadas de dor e de sofrimento) por parte da equipe, a dificuldade de reconhecimento das mesmas e a tomada de decisões precipitadas por dificuldades de negociação entre os sujeitos envolvidos, não é de modo algum insignificante para uma instituição que pretende respeitar os direitos das mulheres. Percebe-se o quão mais complexo do que mensurar o tipo de partos e as rotinas institucionalizadas é a avaliação qualitativa da assistência oferecida: a escuta da dor – ou seja, o respeito às suas expressões, certamente variáveis, é um dos pontos muito importantes da humanização da assistência, e que implica o respeito aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

 

Mãe que amamenta

Nos corredores e salas da maternidade encontramos uma profusão de cartazes e painéis relativos aos direitos da mãe de amamentar e ao direito da criança de mamar ao peito. A imagem recorrente é a de um bebê mamando ao seio da mãe, na qual se destaca a presença ativa do pai e a participação de um irmão ou irmã, retratando uma família nuclear branca, tipicamente de classes médias e o ideal do casal grávido e do pai cuidador, pautado por valores da família nuclear e moderna, de moral individualista, como sustenta Salem (1987).

Entre todas as parturientes o desejo de amamentar está presente, ficando clara a satisfação diante da rotina de iniciar o processo ainda no CO. Em apenas dois casos observou-se um desinteresse inicial, no pós-parto, quanto a esta tarefa. Mas é no AC que se instaura definitivamente o tempo de amamentar; lá, enfermeiras e auxiliares serão incansáveis no ensino e no auxílio no manejo dos seios e mamilos, na ordenha, na posição adequada e nos cuidados adicionais quando há dificuldades na amamentação. Muitas dessas profissionais usam camisetas onde estão estampados "Os Dez Passos da Amamentação", presentes nos inúmeros painéis e cartazes ao longo dos corredores, repletos de recomendações e conselhos no mesmo sentido. A alta da mãe e do bebê estará condicionada, entre outras coisas, a um bom encaminhamento da amamentação.

Mas se boa parte das mulheres observadas compartilham do ideal da amamentação e fazem questão de mostrar sua concordância com as iniciativas da instituição nesta espécie de pedagogia da amamentação, nem sempre este desejo resulta numa experiência bem-sucedida ou prazerosa: não raro se vê mulheres atravessando problemas no aleitamento, que se transformam em verdadeiros dramas pessoais, como o caso de Zilda, que relata, um ano depois de seu parto: "eu estava cheia de dores e fissuras, não poderia suportar, os dias passavam, passava tudo que era coisa em mim para ver se vinha o leite, e nada. Um hospital não pode ter a pretensão de querer ensinar uma mulher a ser mãe e mamífera em três dias, não pode ser o doutrinador da mulher que pariu. Eu já não tinha conseguido parir de cócoras, agora não conseguia amamentar, e sempre aquela enfermeira passando na porta, me chamando de mãezinha, e dizendo banco de leite, banco de leite!" (grifos meus).

Maria, que prepara-se para um segundo parto nesta Maternidade, conta às colegas do Curso de Gestantes a dificuldade que teve em amamentar, sendo esta uma das suas piores lembranças da Maternidade, destacando os esforços da equipe para que ela amamentasse e envolvendo o marido ativamente no processo: "se eu não quero passar por aquilo de novo, que dirá o meu marido".

Outra experiência dramática é a de Marta, cujo leite empedrou após uma cesárea imprevista: "(...) Ninguém queria ouvir minha dor, eu urrava de dor para dar ao meu filho leite de conta-gotas, ao lado de uma camponesa que fazia jorrar leite seios abaixo. Era obrigada a fazer isto, e não tinha conversa.(...) o que me salvou foi uma mulher, enfermeira, uma anja do banco de leite, que me viu ali, acabada, desesperada, era uma anja, entendeu a minha dor. – Ei, calma, tu pensa que tu é uma Joana Darc? Perguntou o que eu tinha. – Eu só quero sossego, 15 minutos de sossego, por favor. Ela fechou o banco de leite eu fiquei ali, quietinha, dormi, me recuperei".

Estes depoimentos chamam a atenção a valores centrais do ideário do parto humanizado: as noções de amamentação natural e vínculo mãe/bebê/pai. Desde o século XIX, a amamentação foi vista como ponto crucial no processo de constituição da figura higiênica da mãe, e não foram poupados esforços de autoridades para viabilizar o aprendizado e o exercício deste dever cívico da mulher. No entanto, em que pesem os argumentos em contrário, a amamentação não é um instinto nem um ato puramente biológico, é também, e sempre, um processo social. As situações de dificuldades e conflitos na amamentação remetem a uma reflexão importante: se tomado como uma norma rígida, o incentivo à amamentação deixa de ser um direito da mulher, tornando-se um dever normativo e disciplinador. Estamos diante de dois sujeitos de direitos: o bebê, que tem direito à amamentação, e a mulher, que tem direito de decidir sobre seu próprio corpo. Como apontam França Júnior & Ayres (2000), não se pode perder de vista que a amamentação envolve pelo menos dois sujeitos de direito, o que é obscurecido pela ótica que privilegia a criança e vê a mãe como a única responsável pelo bom sucesso da amamentação.

Há que se considerar também que a valorização do leite materno como alimento ideal para os bebês também não é compartilhada por todas as culturas, nem por todos os grupos sociais. Na Ilha de Santa Catarina, onde se situa a Maternidade, o costume de oferecer outros alimentos ao recém-nascido, ou mesmo substituir ou complementar o leite materno era observado até recentemente, como em muitas outras regiões do país, não tendo desaparecido totalmente com o processo recente de medicalização, conforme pesquisa de Pinheiro et al., (1992). Não raro este costume se faz presente ainda hoje entre as mulheres, nas conversas de corredores da Maternidade, longe dos olhares vigilantes das enfermeiras, através da memória de uma mãe ou parente mais antiga. Se o aleitamento materno, visto como um dos indicadores da humanização e recomendado por seus defensores se torna uma regra rígida e generalizada, sem mediações, a todas as mulheres, acaba sendo o revés do que pretende.

Normatizações bem-intencionadas, se implementadas de forma descuidada e descontextualizadas, não raro acabam ferindo os próprios princípios relativos aos direitos humanos, como argumentam França Júnior & Ayres (2000), e isto se pôde observar nesta Maternidade. A obsessão em fazer toda mulher amamentar seu bebê, fruto da apropriação burocrática de normas e rotinas, quando se amalgama à persistência de um imaginário que ainda não livrou as mães do peso da herança higienista, pode facilmente transformar gestos aparentemente humanizadores em atos de violência simbólica, e, no limite, física. As rotinas, quando flexibilizadas diante de variantes socioculturais e pessoais, como também recomenda a filosofia da Maternidade, podem, então sim, garantir o que talvez seja a grande contribuição do ideário da humanização do parto no campo da saúde reprodutiva, a saber, o respeito aos direitos das mulheres sobre seu próprio corpo e o direito à diferença.

Não nos parece, no entanto, absurdo que tais representações se façam tão fortes neste contexto: trata-se, afinal, de uma Maternidade, instituição hospitalar na qual mulheres entram grávidas e saem mães, ou seja, lugar onde são alvo de um intenso processo de construção do modelo higiênico de mãe, pedagógico e medicalizado. O parto medicalizado é o momento inaugurador deste ideal de maternidade, forjado no ocidente nos últimos séculos, que construiu uma imagem da mulher intrinsecamente associada à maternidade, ao cuidado com os filhos e ao aleitamento. O peso da herança higienista se faz presente hoje, nas rotinas hospitalares e, sobretudo, nas práticas dos profissionais, ainda que articulados com valores de mudança e de humanização. A questão da amamentação e da negociação de dor nos coloca diante de um valor fulcral de nossa cultura: o mito da maternidade, tão bem analisado por Badinter (1980), no plano teórico, que segue pulsante no cotidiano e nas instituições centrais da sociedade moderna, como o hospital.

 

Considerações finais

As observações desta pesquisa pretendem sobretudo refinar o debate já em curso acerca da urgente modificação no modelo de atenção ao parto e puerpério, trazendo algumas ponderações que coloquem em perspectiva os próprios valores e representações que sustentam as iniciativas humanizadoras. Se as mulheres não são vistas como sujeitos, sujeitos estes que advêm de culturas diferentes e que têm emoções e desejos que não são universais nem meramente mensuráveis, as medidas humanizadoras poderiam resultar em meros procedimentos técnicos, produzindo efeitos tão deletérios quanto o tratamento tecnocrático que se pretende combater.

O ideário do parto humanizado, portanto, contém paradoxos: de um lado, advoga os direitos das mulheres no momento do parto, de outro, parece estar desatento às diferenças socioculturais entre estas mulheres. Se as experiências de humanização se concentram em aspectos técnicos isolados e num modelo universalista de família e de feminilidade, no contexto de uma cultura fortemente centrada no mito do amor materno e na pesada herança higienista da medicina, pode minimizar seu grande potencial que é o do empoderamento das diferentes mulheres no que tange à sua saúde reprodutiva e sexualidade.

 

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Submetido em 30 de abril de 2003
Versão final reapresentada em 28 de novembro de 2003
Aprovado em 5 de dezembro de 2003

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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