ARTIGO ARTICLE

 

Fatores associados à duração do aleitamento materno em três municípios na região do Alto Jequitinhonha, Minas Gerais, Brasil

 

Factors associated with breastfeeding duration in three cities in the region of Alto Jequitinhonha, Minas Gerais, Brazil

 

 

Francisco José Ferreira da SilveiraI; Joel Alves LamounierII

IFaculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil
IIFaculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil

Correspondência

 

 


RESUMO 

O objetivo do estudo foi identificar e analisar as variáveis associadas à menor duração do aleitamento materno em três municípios da região do Alto Jequitinhonha, Minas Gerais, Brasil. Este foi um estudo do tipo transversal, com dados retrospectivos, em três municípios da região. Foram consideradas, para o estudo, todas as crianças com até 24 meses de idade. A análise estatística foi feita utilizando-se o método de Kaplan-Meier e o modelo de regressão de Cox. Foram estudadas 450 crianças. Três variáveis foram associadas com a duração do aleitamento materno: risco de interrupção precoce 1,59 [1,08;2,36] vez maior se a escolaridade paterna for maior ou igual ao segundo grau completo, 1,52 [1,00;2,34] vez maior quando o pai não reside com a criança e 3,07 [2,17;4,34] vezes maior quando as crianças usaram chupeta. Assim sendo, maior escolaridade paterna, uso de chupeta pela criança e o fato de o pai não residir com a criança foram os fatores associados com menor duração do aleitamento materno.

Aleitamento Materno; Desmame; Lactente


ABSTRACT

The objective of this study was to identify and analyze variables associated with shorter duration of breastfeeding in the Alto Jequitinhonha region, Minas Gerais, Brazil. This was a cross-sectional study, using retrospective data, in three cities of the region. All children up to 24 months of age were considered in the study, with a total sample of 450 children. Statistical analyses employed the Kaplan-Meier method and Cox regression model. Three variables were found to be associated with breastfeeding duration. Risk of premature interruption was 1.59 [1.08;2.36] times higher if the father had completed the second grade or greater in school, 1.52 [1.00;2.34] times higher if the father did not live with the child, and 3.07 [2.17;4.34] times higher if child had used a pacifier. Thus, greater education of fathers, use of pacifiers by children, and fathers not living with the children were factors associated with shorter duration of breastfeeding.

Breast Feeding; Weaning; Infant


 

 

Introdução 

O leite materno é o alimento ideal para o crescimento e desenvolvimento adequados de crianças, sendo indicado de forma exclusiva até o sexto mês e complementado com outros alimentos até, pelo menos, 24 meses de idade. Desde a antiguidade, o ser humano já procurava alternativas à alimentação de suas crianças com o leite da própria mãe. Nessa época, alguns povos já utilizavam as amas-de-leite. Além disso, alguns objetos, como xícaras com biqueiras, foram encontrados por arqueólogos em sepulturas infantis datando de 2000 a.C., o que sugere uma possível utilização, mesmo que ocasional, de outros alimentos que não o leite humano 1. Mas há evidências de que alguns povos, como os egípcios, amamentavam suas crianças, como em um estudo em fósseis humanos 2, mostrando a introdução de alimentos complementares no esquema alimentar de crianças aos seis meses e amamentação até aproximadamente três anos de idade. Os relatos sobre os benefícios da amamentação vêm desde Hipócrates, que descrevia maior mortalidade entre aqueles que não eram amamentados ao peito 3. Na Idade Média, a prática de utilização de amas-de-leite se difundiu pela Europa, inicialmente pelas famílias pertencentes à aristocracia, difundindo-se posteriormente para outras camadas sociais. Isso fez com que a prática de amamentar entre os indígenas que habitavam o Brasil causasse surpresa aos descobridores 4.

Mas foi no século XX que a prevalência e a duração do aleitamento materno diminuíram difusamente e de forma mais intensa, com o conseqüente aumento, principalmente nos países subdesenvolvidos, dos índices de mortalidade infantil. Alguns fatores contribuíram para o abandono da amamentação, como a industrialização promovida pelo capitalismo, ocasionando a inserção da mulher no mercado de trabalho. Além disso, a utilização de tecnologias modernas possibilitou a produção e conservação de leites e alimentos infantis industrializados. Esses alimentos foram amplamente divulgados pela indústria como substitutos eficazes do leite materno. As ações dos fabricantes, com divulgação de seus produtos junto à população e principalmente entre os profissionais de saúde, aliados à falta de políticas governamentais no sentido de regulamentar essas ações e estimular o aleitamento materno, além da mudança de hábitos na sociedade moderna, foram elementos que contribuíram decisivamente para o abandono da prática da amamentação 5.

Apesar de ter havido um crescimento nítido na freqüência e duração da amamentação nas últimas décadas 6,7, o quadro ainda é preocupante, e, sendo assim, deve-se estimular a manutenção e a intensificação dos esforços destinados a aumentar estes índices para níveis satisfatórios. Esses esforços são justificados pela associação entre amamentação e saúde infantil, principalmente devido a uma proteção contra doenças infecciosas, especialmente dos tratos digestivo e respiratório, com diminuição importante da morbi-mortalidade por diarréia 8,9 e pneumonia 10,11. Além disso, o leite materno tem várias vantagens nutricionais, sendo considerado o alimento ideal para um crescimento adequado nos primeiros meses de vida 12,13, e até psicológicas, auxiliando na formação de um melhor vínculo mãe-filho 14.

A duração da amamentação pode ser influenciada por diversos fatores, que não atuam de forma independente. No entanto, o efeito que cada um dos fatores pode exercer sobre a duração desse hábito é variável e, muitas vezes, até contraditório, de acordo com resultados de estudos recentes. As explicações mais prováveis para as diferenças encontradas são a utilização de diferentes metodologias e a diversidade das condições sócio-econômico-culturais das populações pesquisadas.

Assim, a identificação de fatores que influenciam a duração do aleitamento materno é importante e poderá auxiliar na elaboração e implementação de ações de incentivo, apoio e promoção da amamentação, principalmente em regiões mais carentes, onde os hábitos alimentares podem influir de forma decisiva nas taxas de mortalidade infantil.

O objetivo deste estudo foi identificar e analisar as variáveis associadas à menor duração do aleitamento materno em três municípios do Alto Jequitinhonha, Minas Gerais, Brasil, uma das regiões menos desenvolvidas do ponto de vista sócio-econômico no Estado.

 

Material e métodos

O estudo foi realizado nos municípios de Carbonita, São Gonçalo do Rio Preto e Datas, na região do Alto Jequitinhonha. Os três municípios pertencem ao Consórcio Intermunicipal de Saúde do Alto Jequitinhonha (CISAJE) e são subordinados à Diretoria Regional de Saúde de Diamantina, com localização, respectivamente, a 30, 50 e 120 quilômetros desta cidade. Eles foram selecionados para serem incluídos no estudo por terem cobertura total do Programa Saúde da Família (PSF) e por terem convênio para a realização de estágio curricular do Internato Rural, Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG), o que viabilizou a realização da pesquisa. A população dos municípios é de aproximadamente 11 mil habitantes em Carbonita, 3 mil habitantes em São Gonçalo do Rio Preto e 5.100 habitantes em Datas. O poder aquisitivo da população é baixo nos três municípios, sendo as atividades econômicas principais a exploração madeireira e carvoarias em Carbonita, e a agropecuária em São Gonçalo do Rio Preto e Datas.

O estudo foi do tipo transversal, com dados retrospectivos. Os dados incluíram respostas de fenômenos ocorridos com até 24 meses de antecedência, havendo a possibilidade da ocorrência de viés de memória. No entanto, vários estudos já confirmaram a confiabilidade de informações retrospectivas das mães em relação à duração do aleitamento materno 15,16.

Foram consideradas, para o estudo, todas as crianças com até 24 meses de idade nos três municípios. A estimativa era cerca de 580 crianças para serem incluídas no estudo, conforme dados fornecidos pelas secretarias municipais de saúde, baseados nos cadastros das equipes de PSF. Em Datas, durante o trabalho de campo, o número de crianças encontradas foi menor do que o previsto inicialmente. Provavelmente, isso pode ser atribuído à discrepância entre os dados oficiais decorrente da migração de famílias para o interior de São Paulo e outras regiões de Minas Gerais, para trabalhar na agricultura no período da pesquisa. Assim, foi possível a inclusão de 450 crianças nos três municípios.

Informações sobre aleitamento materno, hábitos alimentares, aspectos sócio-econômicos, saúde da criança, saúde materna e utilização de serviços de saúde foram obtidos através da utilização de um questionário, que havia sido empregado na pesquisa Diagnóstico de Saúde Materno-Infantil de Minas Gerais (realizada pela Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais), em 1993, com modificações necessárias para adaptar-se ao estudo. Em relação ao tempo de aleitamento materno, a resposta era se a criança ainda estava sendo amamentada, e se não estivesse, até quantos meses tinha sido amamentada.

A coleta de dados foi realizada em julho de 2000, em entrevistas com mães ou responsáveis pelas crianças, por alunos de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da FCMMG. Os alunos foram treinados em relação à utilização dos questionários nos dois meses anteriores ao estudo. Todo o trabalho de treinamento e coleta de dados foi realizado mediante supervisão do investigador, tendo sido realizado estudo piloto prévio dois meses antes do início da pesquisa.

Na área urbana, a coleta de dados foi feita no Centro de Saúde e, em alguns casos, nas próprias residências das crianças. Nas áreas rurais, as entrevistas eram feitas em locais previamente escolhidos, de acordo com as condições de cada localidade (postos de saúde, escolas, centros comunitários), sendo que o recrutamento das mães e crianças foi feito nos domicílios, com o auxílio dos agentes comunitários de saúde.

Os dados foram analisados em microcomputador, utilizando-se os programas Epi Info, versão 6.04b, e SPSS, versão 8.0.

A duração mediana do aleitamento materno foi estimada utilizando-se o estimador não-paramétrico de Kaplan-Meier para curvas de sobrevivência, que permite a inclusão de dados censurados, ou seja, as crianças que ainda estão amamentando.

A verificação da existência de associação entre as variáveis independentes e a variável dependente (tempo de aleitamento materno) foi feita em duas etapas. Consideraram-se 24 variáveis independentes, escolhidas por serem as mais descritas na literatura como fatores de risco para diminuição da duração da amamentação. Elas foram dicotomizadas em função de uma provável associação com o tempo de aleitamento materno, sendo o código 1 utilizado para a categoria associada a um possível menor tempo de aleitamento materno, e o código 2, a um possível maior tempo de aleitamento materno. As 24 variáveis independentes, com as denominações utilizadas e suas categorias, além das respectivas freqüências na população estudada, são descritas na Tabela 1. A variável dependente se manteve como uma variável contínua, medida em meses no presente estudo.

Na primeira etapa da análise estatística, foi utilizada uma análise bivariada, pesquisando-se a associação entre as variáveis independentes e o tempo máximo de aleitamento materno, empregando-se os testes de Logrank e Breslow, que comparam as curvas de sobrevivência em cada categoria da variável independente. A hipótese nula em ambos os testes é a igualdade das funções de sobrevivência. Optou-se pela utilização dos dois métodos devido à diferença na colocação do peso na estatística de teste, sendo que o teste Logrank reforça o enfoque nos tempos maiores, enquanto o teste de Breslow, nos tempos menores.

Essas técnicas não permitem a investigação de um efeito conjunto de covariáveis. Em estudos com muitas variáveis independentes, é necessária a utilização de técnicas estatísticas que possibilitem um ajuste no sentido de identificar as variáveis que explicam o fenômeno, neutralizando o efeito de confundimento. Neste estudo, foi utilizado o modelo de regressão de Cox, que permite a análise de dados em que a resposta é o tempo até a ocorrência de um evento (neste caso, o tempo de aleitamento materno), ajustando por covariáveis. Foram incluídas, na análise multivariada, todas as variáveis que obtiveram um valor p < 0,25 em qualquer um dos dois testes da análise bivariada. As etapas utilizadas no processo de seleção de variáveis no modelo de regressão de Cox foram seguidas de acordo com a estratégia proposta por Collett 17. Neste caso, o nível de significância não deve ser muito baixo, sendo recomendado um valor próximo de 0,10 para selecionar as variáveis que deverão ser incluídas, num primeiro momento, no modelo. O modelo final contempla as variáveis que foram estatisticamente significantes no nível de 0,10.

A pesquisa foi aprovada pela Câmara do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG, e a autorização das mães das crianças foi feita através da assinatura de um termo de consentimento esclarecido. Após o contato com as mães informando sobre o estudo, obteve-se consentimento na totalidade das famílias.

 

Resultados

Foram estudadas 450 crianças com até 24 meses de idade, sendo que 234 (52,0%) eram do sexo masculino, e 216 (48,0%), do sexo feminino. Em relação à faixa etária, 21,3% tinham menos de seis meses de idade; 25,4%, de 6 a 11 meses; 24,4%, de 12 a 17 meses; 28,9%, de 18 a 24 meses. Em dez famílias, havia duas crianças na faixa etária estudada. Em relação ao local de residência, 65,9% residiam na área urbana, e 34,1%, na área rural.

A população é de baixo poder aquisitivo, sendo que 384 crianças (85,3%) pertenciam a famílias com renda per capita abaixo de meio salário mínimo, coerente com a situação sócio-econômica da região.

A mediana do tempo de aleitamento materno foi de 10,85 meses. A curva de sobrevivência é demonstrada na Figura 1.

Na análise bivariada, os resultados dos testes (Logrank e Breslow) revelaram que quatro variáveis (número de consultas no pré-natal, tipo de parto, com quantas horas de vida ficou com a mãe, pai influenciou na decisão de amamentar) tiveram o valor p > 0,25 em, pelo menos, um dos dois testes utilizados, não sendo incluídas na análise multivariada (Tabela 2).

 

 

Assim, permaneceram vinte variáveis explicativas potencialmente significantes. Essas variáveis foram incluídas para análise no modelo de regressão de Cox. A adequação do modelo foi verificada através da construção de gráficos envolvendo o logaritmo da função de risco versus o tempo, verificando-se a suposição deste modelo, que é a de riscos proporcionais. Os gráficos não demonstraram nenhuma indicação contra essa suposição.

O modelo final contém três variáveis explicativas: escolaridade paterna, situação da residência do pai biológico em relação à criança e uso de chupeta pela criança (Tabela 3).

 

 

O resultado final do ajuste mostra que escolaridade paterna, situação do pai biológico (em relação à moradia com a criança) e uso de chupeta estão associados com a duração da amamentação. Quantitativamente, essas associações podem ser descritas da seguinte forma:

• O risco de interrupção do aleitamento materno entre as crianças cujo pai possui escolaridade superior ao primeiro grau completo é 1,62 vez o risco em relação às crianças cujo pai possui escolaridade inferior ao primeiro grau completo;

• O risco de interrupção do aleitamento materno nas crianças que não residem com o pai biológico é 1,47 vez em relação às que residem com o pai biológico;

• O risco de interrupção do aleitamento materno nas crianças que usaram chupeta é 3,16 vezes em relação às que não usaram chupeta.

 

Discussão

Das variáveis analisadas, somente três tiveram significância estatística e influenciaram a duração do aleitamento materno: escolaridade paterna, pai biológico reside ou não com a criança e uso de chupeta.

Com relação ao tabagismo materno e menor duração da amamentação, não foi observada significância estatística. O número de cigarros consumidos diariamente por mães tabagistas e sua relação com o período de amamentação não foram pesquisados, limitando, portanto, maiores conclusões. Poderia haver também a possibilidade de que o mecanismo de interrupção precoce do aleitamento materno seja psicológico, devido à menor intenção de mães fumantes em amamentar seus filhos, e não fisiológico, o que foi sugerido por Amir & Donath 18. Nesse caso, os efeitos negativos do tabagismo materno sobre a duração da amamentação poderiam ser menores em alguns grupos populacionais.

Verificou-se uma associação significante entre uso anterior de chupeta e duração do aleitamento materno. Vários estudos mostraram a associação do uso da chupeta com menor duração da amamentação, tendo sido observado ainda efeito dose-resposta, com maior efeito no caso do uso contínuo 19. No entanto, ainda não foi comprovado o efeito de causalidade, sendo que o uso desse acessório poderia refletir a existência de problemas relacionados ao aleitamento materno. Nesse sentido, Kramer et al. 20 encontraram evidências de que o uso de chupeta pode estar relacionado a dificuldades na amamentação ou motivação reduzida para amamentar, e Victora et al. 21 concluíram que, em mães com menos dificuldades e maior confiança em relação ao aleitamento materno, o uso de chupeta foi menos associado com o desmame precoce, sugerindo que talvez seja apenas parte do processo, e não exatamente a causa da interrupção da amamentação. Considerando-se os resultados dessas pesquisas, a introdução da chupeta para crianças que estão nas primeiras semanas de vida deve ser um sinal de alerta para os profissionais de saúde, no sentido de que pode estar havendo dificuldades em relação ao aleitamento materno, e as mães podem estar precisando de apoio e orientações adequadas.

Embora ainda não tenha sido comprovado o efeito causal da chupeta em relação ao desmame precoce, é importante considerar os elevados índices do uso desses objetos em nosso meio, além de outros prejuízos para a saúde infantil, como alterações das arcadas dentárias, maior risco de asma, vômitos, febre, diarréia, otalgia e parasitoses intestinais, demonstrados em vários estudos 22,23. Por isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) decidiu tornar obrigatório a inclusão, na embalagem desses produtos, de mensagens com advertências quanto aos prejuízos advindos do seu uso em crianças.

Maior escolaridade paterna foi associada à menor duração do aleitamento materno, confirmando os achados de outros estudos realizados em países subdesenvolvidos, principalmente nas regiões mais carentes, onde se observa uma tendência de maior duração do hábito em crianças de famílias de nível sócio-econômico mais baixo 24,25, ao contrário do que acontece em regiões mais desenvolvidas, onde a duração do aleitamento materno é maior em famílias de melhor nível sócio-econômico 26,27.

A associação entre o pai residir com a criança e maior tempo de aleitamento materno está de acordo com descrições da literatura em relação à importância da influência paterna sobre o início e duração da amamentação 28,29,30,31. Littman et al. 31 demonstraram que, quando os pais aprovavam intensamente a amamentação, 98,1% das crianças eram amamentadas, enquanto apenas 26,9% eram amamentadas quando o pai era indiferente. Por outro lado, algumas atitudes paternas contrárias podem surgir de reações desencadeadas durante o processo de amamentação, como o ciúme decorrente da maior proximidade emocional e física da mãe com o filho, e ao fato do pai não participar diretamente da alimentação da criança 32.

Deve-se considerar que a influência do pai sobre o aleitamento materno geralmente é subestimada. Profissionais de saúde não se preocupam com a preparação dos futuros pais, que normalmente não participam de consultas de pré-natal, grupos operativos e outras ações. Os resultados encontrados neste e em outros estudos são evidências da necessidade de um maior envolvimento do pai, e não somente da mãe, no acompanhamento da saúde da criança, desde a gestação até as consultas de seguimento. As razões que levam os pais ao pouco envolvimento nesse processo devem ser avaliadas. Serafim 33 relata a pouca participação dos pais durante o acompanhamento da gestação nos serviços de saúde. Constatou que apenas 25,0% dos futuros pais estavam presentes nas consultas de pré-natal. Alguns motivos alegados para o não comparecimento foram: impossibilidade de irem ao serviço de saúde, não solicitação pelos profissionais de saúde, embora estivessem presentes no serviço de saúde e "achou que o médico podia não gostar". Nos programas formulados para incentivo e apoio ao aleitamento materno, devem estar incluídas ações específicas para os pais e futuros pais, o que poderá contribuir para uma melhoria dos hábitos alimentares de recém-nascidos e lactentes.

O presente estudo apresenta limitações, como não ter havido uma construção de metodologia que permitisse avaliar o efeito do tabagismo materno e do uso de chupeta pela criança de acordo com o período e a intensidade do uso. No entanto, os resultados encontrados evidenciam a necessidade da conscientização dos profissionais de saúde e de todos os que trabalham na elaboração de políticas de saúde em relação aos prováveis efeitos negativos de alguns hábitos sobre a saúde infantil. Deve ser destacada a necessidade dos profissionais e serviços de saúde de estimularem e incentivarem uma maior participação do pai nas ações destinadas à manutenção da saúde da criança, desde a gestação, em consultas de pré-natal, grupos operativos, reuniões, cursos, até os comparecimentos posteriores para seguimento e monitorização de crescimento e desenvolvimento.

 

Colaboradores 

F. J. F. Silveira e J. A. Lamounier participaram em conjunto de todas as etapas da pesquisa e da elaboração do artigo.

 

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Correspondência
F. J. F. Silveira
Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais
Rua Galba Veloso 304, apto. 404
Belo Horizonte, MG 31015-080, Brasil
saujr@uol.com.br

Recebido em 02/Set/2004
Versão final reapresentada em 09/Jun/2005
Aprovado em 16/Jun/2005

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