REVISÃO REVIEW
Fatores de risco na recorrência do baixo peso ao nascer, restrição de crescimento intra-uterino e nascimento pré-termo em sucessivas gestações: um estudo de revisão
Risk factors for repetition of low birth weight, intrauterine growth retardation, and prematurity in subsequent pregnancies: a systematic review
Iândora Krolow Timm Sclowitz; Iná da Silva dos Santos
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Brasil
RESUMO
Com o objetivo de reunir evidências sobre a repetição de baixo peso ao nascer, restrição de crescimento intra-uterino e nascimento pré-termo em sucessivas gestações foi realizada revisão bibliográfica na MEDLINE, LILACS, PAHO e MedCarib referentes ao período 1965- 2004, usando os descritores: "low birth weight and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous LBW", "IUGR and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous IUGR", "prematurity and recurrence, repetition or previous" e "risk factors and repetition, recurrence or previous prematurity". De 24 estudos, 18 foram excluídos por inconsistência entre título e o real objeto do estudo (história obstétrica adversa como fator de risco ao invés de critério de seleção). Os principais fatores de risco associados com a repetição de baixo peso ao nascer foram idade materna > 30 anos, tabagismo, intervalo intergestacional mais curto e raça negra; com restrição de crescimento intra-uterino, idade < 20 ou > 35 anos, menor escolaridade materna, profissão paterna não especializada, hipertensão arterial e drogadição; e com nascimento pré-termo, ruptura prematura de membranas, corioamnionite, pré-eclâmpsia, trabalho de parto prematuro e intervalo intergestacional < 12 meses.
Recém-nascido de Baixo Peso; Retardo do Crescimento Fetal; Prematuro; Fatores de Risco
ABSTRACT
With the aim of collecting evidence on repetition of low birth weight, intra-uterine growth retardation (IUGR), and prematurity in successive pregnancies, a systematic review was conducted on MEDLINE, LILACS, PAHO, and MedCarib from 1965 to 2004, using as descriptors: "low birth weight and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous LBW", "IUGR and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous IUGR", "prematurity and recurrence, repetition or previous", and "risk factors and repetition, recurrence or previous prematurity". Of 24 studies, 18 were excluded due to inconsistency between the title and the actual subject investigated (obstetric history as a risk factor rather than a selection criterion). The most important risk factors associated with repetition of low birth weight were maternal age > 30 years, smoking, short inter-gestational interval, and black skin color; those associated with IUGR were maternal age < 20 or > 35 years, low maternal education, high blood pressure, drug addiction, and non-technical/non-professional paternal occupation; and with preterm birth, premature rupture of membranes, chorioamnionitis, preeclampsia, preterm labor, and inter-gestational interval less than 12 months.
Low Birth Weight Infant; Fetal Growth Retardation; Premature Infant; Risk Factors
Introdução
O baixo peso ao nascer é um importante preditor da mortalidade e morbidade infantis, sendo foco de muitas investigações epidemiológicas 1. A prevenção do baixo peso ao nascer depende de uma extensa investigação e determinação de seus fatores de risco, etiologia e patogênese 2.
Nas coortes de recém-nascidos de Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil, nos anos de 1982, 1993 e 2004, o baixo peso ao nascer teve aumento de 9%, em 1982, para 9,8% em 1993 3 e 10,4% em 2004 4. Quanto ao nascimento pré-termo, as taxas foram crescentes no mesmo período, de 6,3% em 1982, para 10,8% em 1993 3 e 16,2% em 2004 4. Achados semelhantes foram observados em Ribeirão Preto, São Paulo, tendo a prevalência de baixo peso ao nascer aumentado de 7,2% em 1978/1979 para 10,6% em 1994 5 e a de nascimento pré-termo de 7,2% para 13,6%, no mesmo período 6.
O baixo peso ao nascer é definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como o inferior a 2.500g. O peso ao nascer é determinado por dois processos: duração da gestação e taxa de crescimento fetal 7. O baixo peso ao nascer, deste modo, pode ser causado por período gestacional curto ou restrição de crescimento intra-uterino ou uma combinação dos dois fatores 7. Nascimento pré-termo é definido pela OMS como toda gestação com duração inferior a 37 semanas. A restrição de crescimento intra-uterino, ou seja, os chamados "pequenos para a idade gestacional" não apresentam um conceito padrão utilizado. Três definições podem ser usadas: peso ao nascer menor que o percentil 10 ou 5 para a idade gestacional, peso ao nascer menor que 2.500g e idade gestacional maior ou igual a 37 semanas ou peso ao nascer menor que 2 desvios padrões abaixo da média de peso para a idade gestacional 7.
A tendência de repetir similar idade gestacional e peso ao nascer em sucessivas gestações vem sendo reportada por muitos estudos, porém, ainda é controverso se isto se deve a uma inerente tendência a repetição ou pela persistência de fatores de risco 7.
A determinação dos fatores de risco envolvidos na recorrência do baixo peso ao nascer é um passo importante na tentativa de interromper a cadeia causal que torna algumas mães vulneráveis à ocorrência desse desfecho.
Este artigo é uma revisão das publicações que descrevem os fatores de risco para repetição de baixo peso ao nascer, restrição de crescimento intra-uterino e nascimentos pré-termo.
Metodologia
Realizou-se uma revisão bibliográfica na MEDLINE, LILACS, PAHO e MedCarib referente ao período de 1965 a 2004. Foram usados como descritores: "low birth weight and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous LBW", "IUGR and recurrence, repetition or previous", "risk factors and repetition, recurrence or previous IUGR", "prematurity and recurrence, repetition or previous" e "risk factors and repetition, recurrence or previous prematurity", bem como seus correspondentes em espanhol e português.
Não houve rejeição de artigos por limitações metodológicas.
Os artigos selecionados foram avaliados e pontuados conforme os critérios de Downs & Black 8, aplicáveis ao delineamento dos artigos. Os itens relacionados apenas a estudos de intervenção foram retirados, pois nenhuma publicação incluída era do tipo experimental. Sendo assim, analisaram-se os artigos com base em:
Hipóteses ou objetivos do estudo;
Principais desfechos a serem medidos;
Características dos pacientes incluídos;
Distribuição dos principais fatores de confusão em cada grupo de sujeitos a ser comparado;
Principais achados do estudo;
Se o estudo fornecia estimativas da variabilidade aleatória nos dados para os principais desfechos;
Se as características dos sujeitos perdidos durante o acompanhamento foram descritas;
Se constavam os valores de probabilidade para os principais desfechos;
Se a amostra de sujeitos convidados a participar do estudo era representativa;
Se a amostra de sujeitos incluídos no estudo era representativa;
Caso os resultados não tenham sido baseados em hipóteses estabelecidas a priori, se isto foi deixado claro;
Se, em ensaios clínicos e estudos de coorte, a análise ajustou para diferentes durações de acompanhamento, ou, em estudos de casos e controles o tempo entre a intervenção e o desfecho foi o mesmo para casos e controles;
Se os testes estatísticos utilizados para medir os principais desfechos foram apropriados;
Se as medidas utilizadas para os principais desfechos foram acuradas;
Se os pacientes em diferentes grupos foram recrutados na mesma população;
Se os pacientes nos diferentes grupos foram recrutados no mesmo período de tempo;
Se a análise incluiu ajuste adequado para os principais fatores de confusão;
Se foram consideradas as perdas de pacientes durante o acompanhamento;
Se o estudo tinha poder suficiente para detectar um efeito importante, com um nível de significância de 5%.
O total de itens avaliados segundo Downs & Black foi de 19, pontuando, no máximo, 20 pontos.
Resultados
Localizaram-se 24 estudos, dos quais 18 foram descartados por apresentarem objetivos diferentes do tema desta revisão bibliográfica, restando seis publicações. As definições de desfecho empregadas pelos autores dos artigos selecionados foram as recomendadas pela OMS 7.
A principal causa de exclusão dos artigos foi que, embora o título da publicação mencionasse a repetição de baixo peso ao nascer, restrição de crescimento intra-uterino ou nascimento pré-termo como objetivo do estudo, a leitura da metodologia deixava claro que, na verdade, os autores haviam investigado desfechos perinatais desfavoráveis (baixo peso ao nascer, restrição de crescimento intra-uterino e nascimento pré-termo) em gestações anteriores como fatores de risco para a recorrência desse desfecho na gestação atual.
A Tabela 1 apresenta um resumo dos seis estudos incluídos na revisão, com os aspectos metodológicos, resultados e escores conforme Downs & Black 8.
O escore metodológico foi, em média, de 11,5 pontos. O estudo que obteve a mais alta pontuação (14) foi o de Krymko et al. 9.
Estudo de base populacional foi realizado na Noruega com dados dos anos de 1967 a 1976, para verificar a recorrência de restrição de crescimento intra-uterino em sucessivos nascimentos 10. Os dados foram obtidos nos registros de nascimentos daquele país. A idade gestacional dos recém-nascidos foi calculada pela data da última menstruação. Foram excluídos os recém-nascido com idade gestacional ou peso ao nascer desconhecidos, com malformações congênitas e filhos de mães com doenças antes ou durante a gestação. Como referência os autores utilizaram a curva sexo-específica de peso para idade gestacional norueguesa, sendo considerados pequenos para a idade gestacional os recém-nascidos abaixo do percentil 10. As mães estudadas foram as 26.162 que tiveram seus três primeiros filhos nesse período. O risco bruto de recorrência de restrição de crescimento intra-uterino foi calculado de acordo com a idade da mãe no primeiro nascimento e com a paridade (dois partos anteriores). Os resultados mostraram que mulheres com menos de 20 anos ou com mais de 35 anos de idade tiveram RR = 1,2 para recorrência de restrição de crescimento intra-uterino, sendo a categoria base as mulheres com 20 a 34 anos. Houve relação inversa com a escolaridade: mulheres com sete anos de estudo tiveram RR = 2,6; as com nove anos tiveram RR = 2,0; e as com 12 anos RR = 1,5, comparadas com as que tinham mais de 12 anos de educação. Quanto à ocupação do pai, maiores riscos estiveram associados às profissões de agricultor ou pescador (RR = 1,2), vendedores ou pastores religiosos (RR = 1,3), trabalhadores da indústria, mineiros ou da construção (RR = 1,5) e desempregados (RR = 1,2), em comparação com técnicos ou profissionais com mão de obra especializada. As mães que tiveram recorrência de restrição de crescimento intra-uterino foram diferentes das que tiveram um só filho com o problema. A toxemia, o sangramento vaginal e as patologias de placenta foram problemas ocorridos nas mães com um único nascimento com restrição de crescimento intra-uterino, não sendo encontrada semelhante associação dessas complicações entre as mães com recorrência de restrição de crescimento intra-uterino. Porém, a menor escolaridade e o menor nível sócio-econômico foram fatores presentes nas mulheres com recorrência de restrição de crescimento intra-uterino.
Patterson et al. 11 estudaram 9.596 pacientes com o objetivo de avaliar a prevalência de recorrência de restrição de crescimento intra-uterino e fatores associados com a repetição. Os dados foram coletados entre 1972 e 1981, no Texas, Estados Unidos, com base em registros secundários. Foram selecionadas mulheres com sobrenome de origem hispânica, com dois nascimentos consecutivos, sem malformações congênitas, idade gestacional maior que 26 semanas e fetos vivos. Foram classificadas com restrição de crescimento intra-uterino moderado as crianças com peso ao nascer entre os percentis > 2,5 e < 10 e com restrição de crescimento intra-uterino grave as crianças com peso para idade getacional no percentil < 2,5. Embora não claramente explicitado pelos autores, haja vista a discussão do artigo, possivelmente a referência de peso para idade gestacional utilizada tenha sido a curva de Williams 12. Os fatores estudados para a recorrência de restrição de crescimento intra-uterino foram: hipertensão arterial materna e uso de drogas. Entre as 4.623 mulheres sem complicações nas duas gestações, o risco de recorrência de restrição de crescimento intra-uterino moderado foi de 2,1 e de 3,3 para restrição grave. Entre as 445 mulheres com toxemia somente na primeira gestação, o risco de recorrência de restrição de crescimento intra-uterino foi de 2,6. Mulheres com primeira gestação sem hipertensão e subseqüente gravidez com essa complicação, tiveram RR = 2,8 para recorrência de restrição de crescimento intra-uterino. Os autores não detectaram aumento do risco para a recorrência de restrição de crescimento intra-uterino quando a mãe foi hipertensa em ambas as gestações. Entre as mães com drogadição nas duas gestações, o RR foi de 2,9 para a recorrência 11.
Bakewell et al. 13, em 1997, analisaram 10.701 registros de nascimentos, representando 5,9% dos 182.285 nascimentos ocorridos no período de 1978 a 1990, no Estado de Missouri nos Estados Unidos. Estes eram os segundos filhos de mulheres cujo primeiro bebê havia nascido com menos de 2.500g no mesmo período. Foram definidos como baixo peso ao nascer os recém-nascidos com menos de 2.500g, e pré-termo os nascidos com menos de 37 semanas de idade gestacional, de acordo com a data da última menstruação. Foram classificados como pequenos para a idade gestacional os recém-nascidos com peso para a idade gestacional abaixo do percentil 10 da curva sexo-específica para recém-nascidos de partos únicos de Missouri, de 1989-1994. Na análise multivariada foram fatores de risco para recorrência de baixo peso ao nascer as variáveis raça negra (OR = 2,02), intervalo intergestacional menor que nove meses (OR = 1,33) e idade materna no segundo nascimento maior ou igual a 30 anos (OR = 1,17). Além desses fatores, as mulheres que fumaram somente na segunda gravidez apresentaram risco de repetir baixo peso ao nascer 52% maior comparado às que nunca fumaram, e as que fumaram em ambas as gestações tiveram risco 85% maior para a recorrência do baixo peso ao nascer. Aproximadamente cada 4,5kg de incremento no peso materno na segunda gestação, comparativamente ao peso pré-gestacional na primeira gestação, associou-se com 11% de diminuição de risco para baixo peso ao nascer no segundo filho (OR = 0,89). Outros fatores como atenção pré-natal, estado marital e escolaridade materna não mostraram associação estatisticamente significativa com o risco de a mãe repetir um nascimento com baixo peso 13.
Basso et al. 14, na Dinamarca, analisaram os registros nacionais de 1980 a 1992. O objetivo do estudo era avaliar o efeito de variáveis paternas sobre a recorrência do baixo peso ao nascer e do nascimento pré-termo. Baixo peso ao nascer foi definido como peso ao nascer < 2.500g e pré-termo como idade gestacional < 37 semanas, de acordo com a data da última menstruação e confirmada por ultra-sonografia obstétrica. Inicialmente, todas as crianças nascidas com baixo peso e/ou pré-termo, naquele período, foram selecionadas e o pai identificado (N = 14.865). Dentre estes, foram incluídos no estudo os pais que tiveram o primeiro filho nascido vivo, pré-termo e/ou baixo peso ao nascer e após, um segundo filho com peso normal ou baixo peso ao nascer. Apenas quatro variáveis independentes associadas ao pai foram exploradas: mãe diferente da do primeiro filho, mudança de local de moradia (rural ou urbana), mudança de ocupação para atividades com maior ou menor risco ocupacional (exposição a substâncias químicas, pesticidas, metais pesados etc.) e mudança no status sócio-econômico. Análise por regressão logística foi realizada e a categoria base foram pais que não mudaram nenhum dos fatores em estudo durante o período dos dois nascimentos. Os resultados mostraram que somente a mudança de mãe apresentou associação estatisticamente significativa com a recorrência de nascimento pré-termo. Os autores não identificaram nenhum fator paterno na recorrência de baixo peso ao nascer ou parto pré-termo 14.
No Japão, foi estudado um grupo de 1.130 mulheres com dois partos únicos e sucessivos, ocorridos no mesmo hospital, no período entre janeiro de 1989 e dezembro de 1998 15, sendo excluídas as que deram à luz a crianças com malformação congênita. O estudo tinha como objetivo estudar a recorrência de fatores de risco em partos pré-termos. Foram considerados pré-termo os recém-nascidos com menos de 37 semanas de idade gestacional, sem referir o parâmetro (data da última menstruação, exame do recém-nascido ou ultra-sonografia) utilizado. Foi revisada a idade gestacional das 2.260 crianças no momento do nascimento, sendo 8,1% pré-termo no primeiro parto e 7,6% no segundo. Nas secundigestas que tiveram o primeiro parto pré-termo por ruptura prematura de membranas ou por corioamnionite, 25% apresentaram recorrência desse fator de risco na gestação pré-termo subseqüente e um risco relativo bruto de 5,5 (IC95%: 3,34-9,05) para recorrência de parto pré-termo. Entre as mulheres que tiveram o primeiro filho pré-termo devido à pré-eclâmpsia, houve recorrência deste fator de risco em 26,3% dos nascimentos pré-termo da segunda gestação, sendo o RR bruto igual a 54,4 15.
Krymko et al. 9 publicaram estudo com o objetivo de identificar fatores de risco na recorrência de parto prematuro. Parto pré-termo foi definido como ocorrendo entre 22 e 36 semanas, confirmado por uma série de parâmetros, que incluíam data da última menstruação, b-HCG urinário positivo antes de seis semanas de gestação, exame pélvico no primeiro trimestre e resultado de ultra-sonografia antes das 14 semanas consistente com outro realizado na vigésima. A população em estudo foram 300 mulheres que tiveram seu primeiro filho entre janeiro e dezembro de 1998, no Centro Médico de Soroka, em Israel. Os dados foram coletados de registros e incluíam: história pessoal e obstétrica, estilo de vida, hábitos antes e durante a gestação, variáveis sócio-econômicas, complicações da gestação e parto. Foram excluídas mulheres sem pré-natal, em gestações múltiplas, história de aborto prévio, hidrâmnios, corioamnionite, restrição de crescimento intra-uterino, fetos mortos, fetos malformados, pré-eclâmpsia e eclâmpsia, sofrimento fetal e trauma. Após as exclusões, restaram dois grupos, um com 81 mulheres que tiveram um segundo filho pré-termo e o grupo controle (N = 71) com sucessor a termo. A análise foi realizada por regressão logística ajustada para as variáveis de confusão. A ocorrência de trabalho de parto prematuro foi o único fator estudado associado estatisticamente com o parto pré-termo (OR = 8,25). Os autores realizaram análise ajustada em um subgrupo de mulheres (N = 36) que tiveram o segundo filho com idade gestacional menor que 34 semanas, e os fatores associados com a recorrência de nascimento pré-termo foram o trabalho de parto prematuro (OR = 4,98) e o intervalo intergestacional menor que 12 meses (OR = 5,13) 9.
Discussão
Esta revisão bibliográfica mostrou que a comparação entre os resultados dos seis estudos fica prejudicada devido à grande variação na metodologia, objetivos e desfecho de cada estudo. Devido às diferenças encontradas entre os estudos, não foi possível a realização de metanálise.
É ainda escasso o conhecimento sobre os fatores de risco envolvidos na recorrência do baixo peso ao nascer. Além do pequeno número de publicações disponíveis, todas elas foram baseadas em dados secundários, carecendo, portanto, de informações mais completas sobre todos os fatores de risco potencialmente envolvidos. Embora a maior parte dos nascimentos de baixo peso ao nascer ocorra em países em desenvolvimento, todos os estudos localizados foram realizados em países desenvolvidos. No entanto, uma vez que esta revisão foi feita em bases de dados oficiais, o viés de publicação não pode ser inteiramente descartado.
Os seis estudos da revisão bibliográfica tiveram como principal limitação a coleta de dados realizada com base em registros secundários disponíveis. Os estudos de Bakketeig et al. 10, Patterson et al. 11 e Koike et al. 15 apresentaram apenas análise bruta nos resultados. Somente os estudos de Bakewell et al. 13, Basso et al. 14 e Krymko et al. 9 apresentaram resultados baseados em análise ajustada.
Dentre os critérios de Downs & Black 8, as principais limitações dos estudos foram: não apresentar os principais fatores de confusão e não incluí-los na análise, não descrever características dos pacientes perdidos e o que isto acarretou de problemas para o estudo, não apresentar claramente como os estudos foram planejados, a não utilização de testes estatísticos adequados para a análise de dados e não apresentar o poder do estudo para detectar diferenças entre os grupos. O escore médio de 11,5, com o máximo de 14 pontos, espelha essas limitações, tornando fracas as evidências atualmente disponíveis sobre os fatores associados à repetição de desfechos perinatais desfavoráveis.
Em síntese, os fatores que se mostraram associados à recorrência de baixo peso ao nascer em sucessivas gestações foram o tabagismo materno 13, o intervalo intergestacional mais curto 9,13, a raça negra 9 e a idade materna maior que 30 anos 9. A recorrência não foi influenciada pela mudança do status sócio-econômico, do local de moradia (urbano/rural) ou da ocupação do pai 14. Os fatores protetores para a recorrência de baixo peso ao nascer foram o maior peso materno pré-gestacional em relação à gestação anterior 13 e serem irmãos filhos do mesmo pai mas de mães diferentes 14.
A recorrência de restrição de crescimento intra-uterino em sucessivas gestações esteve associada nas análises brutas com a idade materna menor que 20 anos ou maior que 35 10, a menor escolaridade da mãe 10, ocupação do pai com mão-de-obra não qualificada 10, hipertensão arterial materna 11 e drogadição materna 11.
A recorrência de parto pré-termo mostrou-se associada em um estudo, na análise bruta, com a recorrência de fatores de risco como ruptura prematura de membranas, corioamnionite e pré-eclâmpsia 15. Em outro estudo mostrou-se associada com trabalho de parto prematuro e intervalo intergestacional menor que 12 meses 9.
Os fatores investigados pelos autores que não mostraram associação estatisticamente significativa com a recorrência de baixo peso ao nascer, em análises ajustadas, foram: o cuidado pré-natal, a escolaridade materna menor que 12 anos e mães sem companheiro 13.
Em síntese, nenhum dos fatores de risco investigados foi comum aos três desfechos (recorrência do baixo peso ao nascer, pré-termo ou restrição de crescimento intra-uterino). A idade da mãe foi fator de risco comum para a repetição do baixo peso ao nascer (mães menores de 30 anos) e restrição de crescimento intra-uterino (mães menores de 20 e maiores de 35 anos). O intervalo intergestacional, entretanto, pareceu influenciar na repetição do baixo peso ao nascer (intervalo intergestacional "curto") e parto pré-termo (intervalo intergestacional menor que 12 meses). Nesse sentido, a anticoncepção e a promoção de intervalos intergestacionais maiores do que 24 meses são estratégias de saúde pública recomendadas entre mães com experiências perinatais desfavoráveis de forma a prevenir sua recorrência.
Colaboradores
I. K. T. Sclowitz estruturou o conteúdo do texto, avaliou os dados e redigiu a versão do artigo. I. S. Santos orientou a redação do artigo, revisou e implementou as modificações necessárias.
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Correspondência
I. K. T. Sclowitz
Programa de Pós-graduação em Epidemiologia
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Pelotas
Av. Duque de Caxias 250, Pelotas
RS 96030-000, Brasil
ikt.sul@terra.com.br
Recebido em 29/Jul/2005
Versão final reapresentada em 04/Jan/2006
Aprovado em 16/Jan/2006