EDITORIAL
Implementação da Política Nacional de Redução de Acidentes e Violências
Dedico este editorial a apresentar os esforços que o Brasil tem feito para incorporar a violência e os acidentes na pauta da saúde pública. Este texto dá continuidade à reflexão elaborada para Cadernos de Saúde Pública em maio/junho de 2004. Nessa publicação eu falava, principalmente, das dificuldades de pautar o tema num setor cuja lógica de pensamento e ação é a biomédica. Hoje quero mostrar que, com apoio institucional, podemos fazer o possível e tentar o impossível. O tom otimista, no entanto, tem uma ressalva, pois se refere a um processo que vem se arrastando há anos e que apenas nos últimos três, tomou impulso.
Com o propósito de implementar a Política Nacional de Redução de Acidentes e Violências promulgada em 2001, a Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) estruturou, em 2004, a Rede Nacional de Prevenção de Acidentes e Violências formada hoje por 58 núcleos em locais onde as taxas de morbimortalidade por causas externas são elevadas. Deles fazem parte instituições municipais, estaduais, acadêmicas e ONGs. Essa incipiente estrutura visa ao investimento em estudos e propostas concretas de ação que se articulam a partir das diretrizes da política.
Em 2005, foi aprovada a Agenda Nacional de Vigilância, Prevenção e Controle dos Acidentes e Violências. Está sendo implantada pela SVS a Vigilância de Violências e Acidentes em Serviços Sentinela, visando a conhecer e a aprimorar informações sobre magnitude e gravidade de acidentes de trânsito, de trabalho, de quedas, afogamentos, intoxicações e de todas as expressões de violência. Esse programa está distribuído por 39 municípios nas 27 Unidades da Federação. O sistema já permitiu avaliação após um ano de sua implantação.
No início de 2007, em parceria com a SVS e com a Secretaria de Assistência à Saúde (SAS), o Centro Latino-americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Carelli (CLAVES/ENSP/FIOCRUZ) iniciará um curso de formação à distância sobre O Impacto da Violência sobre a Saúde, para profissionais dos serviços e gestores. Esse programa se soma ao do Laboratório da Criança do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, em nível de especialização e voltado para a reflexão teórico-prática e prevenção da violência contra crianças e adolescentes. Intensifica-se a oferta de formação de Mestres e Doutores e de cursos de curta duração na FIOCRUZ e em várias outras instituições de ensino.
Outros programas estão sendo implementados, concomitantemente, em relação a cuidados com grupos específicos como crianças e adolescentes, mulheres, idosos e portadores de deficiência. A significância das iniciativas citadas é real e simbólica, pois evidencia que é possível agir frente a esse fenômeno que aflige a sociedade brasileira, dentro da lógica de prevenção, promoção e valorização da vida.
O processo de implantação da Política Nacional de Redução de Acidentes e Violências no Sistema Único de Saúde (SUS) sem dúvida precisa continuar, pois esta é uma tarefa demorada, árdua e exige dedicação. Uma avaliação que a propósito estamos realizando no CLAVES vem mostrando que há gargalos importantes na articulação intra e intersetorial no que tange à política, à gestão, aos recursos humanos necessários e à prestação de serviços pré-hospitalares, hospitalares e de reabilitação. Também existem problemas quanto às iniciativas de redução de violências e acidentes. Mesmo no caso de programas e serviços onde há competência humana e condições materiais, tudo é absolutamente insuficiente para responder às demandas. Mas, os passos na direção certa aos poucos vão sendo dados, legitimando o tema na agenda do SUS.
Maria Cecília de Souza Minayo
Centro Latino-americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Carelli, Escola Nacional de Saúde
Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil.
cecilia@claves.fiocruz.br