CARTAS LETTERS

 

Cárie dentária em escolares de 12 anos de idade de Boa Vista, Roraima, Brasil

 

Dental caries in 12-year-old schoolchildren from Boa Vista, Roraima State, Brazil

 

 

Lauramaris de Arruda Régis-AranhaI; Maria Augusta Bessa RebeloII; Sheila Maria Ferraz Mendonça de SouzaIII; Rosana Cristina Pereira ParenteIV

IEscola Superior de Ciências da Saúde, Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, Brasil
IIFaculdade de Odontologia, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, Brasil
IIIEscola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil
IVDepartamento de Estatística, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, Brasil

Correspondência

 

 

No Brasil, estudos epidemiológicos têm demonstrado redução marcante na prevalência da cárie dentária 1,2,3. Em 1996, o país apresentava um CPO-D moderado, da ordem de 3,06, enquanto a cidade de Boa Vista, Roraima, com 6,3, registrava o maior índice entre as capitais brasileiras 1. O último levantamento de base populacional, por macrorregião, realizado no Brasil (Projeto SB, 2003), demonstrouque 68,92% dos brasileiros apresentaram um CPO-D > 1, aos 12 anos de idade, possuindo uma média de 2,78 dentes atacados pela cárie. Vale ressaltar que a Região Norte exibiua maior prevalência (75,85%) e um CPO-D de 3,13 2. Assim, as diferenças observadas em um mesmo país, e entre distintos grupos sociais, reforçam a importância de indicadores loco-regionais 4 para planejamento das ações na área de saúde bucal.

Diante disso, o objetivo do presente estudo foi avaliar a prevalência de cárie em escolares, aos 12 anos de idade em escolas municipais de Boa Vista. A população do estudo foi selecionada por conveniência, na rede municipal de ensino, num total de 217 crianças. Concordaram em participar do estudo 196 escolares, o que representou 90,3% do universo estudado. A rede municipal é responsável por 2,5% da população de escolares, aos 12 anos de idade. A série estudada referiu-se a escolares de 12 anos de idade matriculados na rede municipal de ensino. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (ENSP-FIOCRUZ; parecer nº. 92/2002). Em função da conveniência de estudar escolas municipais, as mesmas estavam distribuídas, majoritariamente, na zona oeste, que se caracteriza como a região de maior concentração da população urbana, menor renda e pior escolaridade 5, assim estamos ciente de que não descrevemos o perfil do município. Portanto, nossos resultados representam a condição de saúde bucal, em termos de cárie dentária, em uma população mais exposta às desigualdades sociais.

Os exames foram realizados nas próprias escolas por uma examinadora previamente calibrada 6 e de acordo com os critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS) 7, em novembro e dezembro de 2002. A estatística kappa foi de 0,99 e a concordância intra-examinador foi de 1,00. As informações de grau de instrução e renda familiar foram coletadas por meio de questionários enviados aos responsáveis. A classificação do grau de instrução foi: analfabeto, ensinos fundamental, médio e superior. A renda familiar foi expressa em salários mínimos.

Há que se considerar que o presente estudo foi realizado há seis anos, podendo assim diferir de dados atuais, entretanto são de grande importância para monitoramento da cárie dentária. Os resultados apresentados sugerem um declínio da cárie dentária aos 12 anos de idade. A prevalência de cárie, que em 1996 era considerada alta, com uma média de 6,3 dentes atacados pela cárie, foi reduzida em 51%, passando para 3,2 dentes em média, afetados pela doença. Tal como em outros locais previamente descritos na literatura nacional 3,6,8,9,10, em Boa Vista, a grave situação descrita anteriormente 1,6 parece estar sendo revertida. Vale observar algumas medidas que foram tomadas no âmbito do município, tais como instalação de consultórios odontológicos, bem como ações de atenção à saúde bucal, no período anterior ao estudo. A maioria das crianças examinadas reside em bairros não assistidos por água fluoretada de abastecimento público, o que pode representar fator agravante na prevalência de cárie, uma vez que esta medida sanitária tem efeito sobre os índices de cárie 10,11,12.

A maioria dos examinados (82,8%) provinha de famílias de baixo grau de instrução e de renda familiar muito baixa (91%). A maior parte dos questionários preenchidos (68,7%) referia pais cuja instrução não ultrapassava o ensino fundamental. Nenhum dos pais declarou ter nível superior completo. Tais dados confirmam o que mostra o censo demográfico de 2000 5 para aquela zona da cidade. Isso certamente poderia ter sido fator de dificuldade na reversão do quadro de saúde bucal, no entanto houve redução significativa do CPO-D, se comparada com o último levantamento realizado na região, fato que pode ser atribuído a outros fatores como a disponibilidade de dentifrício fluoretado.

O CPO-D, aos 12 anos de idade, em Boa Vista (Tabela 1), de média prevalência, foi semelhante às médias encontradas para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste em 2003, que foram 3,13 e 3,19 e 3,16, respectivamente; e superior àquelas encontradas nas regiões Sul (2,31) e Sudeste (2,30) 2, no levantamento nacional realizado no mesmo ano do presente estudo. Na composição do índice, observa-se predomínio do componente cariado, o que sugere dificuldade de acesso aos serviços de atenção odontológica.

 

 

Apesar da cautela que se deve ter para comparação de estimativas obtidas por outros estudos, porque a falta de padronização na aferição das variáveis assim como a obtenção de amostras não representativas podem comprometer essa análise 13, os dados sugerem um relevante declínio da cárie dentária na população estudada; contudo a prevalência ainda é moderada, não alcançando a meta preconizada pela OMS para o ano 2000. Recomenda-se, portanto, implementação de medidas de atenção à saúde bucal.

 

Colaboradores

L. A. Régis-Aranha participou da revisão da literatura, organização e coleta de dados, resultados e redação. S. M. F. M. Souza e M. A. B. Rebelo participaram da orientação, resultados e redação. R. C. P. Parente contribuiu na análise estatística, resultados e redação.

 

1. Ministério da Saúde. Levantamento epidemiológico em saúde bucal 1996: cárie dentária. http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sbucal/sbdescr.htm (acessado em 19/Fev/2007).         

2. Ministério da Saúde. Levantamento das condições de saúde bucal da população brasileira - SB- Brasil 2003. http://portal.saude.gov.br/portal/ aplicacoes/busca/buscar.cfm (acessado em 19/Fev/2007).         

3. Narvai PC, Frazão P, Castelhanos RA. Declínio na experiência de cárie em dentes permanentes de escolares brasileiros no final do século XX. Odontologia e Sociedade 1999; 1:25-9.         

4. Peres MAA. O declínio de cárie no Brasil e no Mundo. Jornal da ABOPREV 1998; 4 out.         

5. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Municípios do Estado de Roraima: resultados do censo 2000. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2000.         

6. Área Técnica de Saúde Bucal, Departamento de Gestão de Políticas Estratégicas, Secretaria de Políticas de Saúde, Ministério da Saúde. Condições de saúde bucal da população brasileira no ano 2000: manual de calibração de examinadores. Brasília: Ministério da Saúde; 2000.         

7. World Health Organization. Calibration of examiners for oral health epidemiology surveys. Geneva: World Health Organization; 1993.         

8. Peres MAA, Narvai PC, Calvo MCM. Prevalência de cárie dentária em crianças aos doze anos de idade, em localidades do Estado de São Paulo, Brasil, período 1990-1995. Rev Saúde Pública 1997; 31:594-600.         

9. Freysleben GR, Peres MAA, Marcenes W. Prevalência de cárie e CPO-D médio em escolares de doze a treze anos de idade nos anos de 1971 e 1997, região Sul, Brasil. Rev Saúde Pública 2000; 34:304-8.         

10. Maltz M, Silva BB. Relação entre cárie, gengivite e fluorose e nível socioeconômico em escolares. Rev Saúde Pública 2001; 35:170-6.         

11. Basting RT, Pereira AC, Meneghim MC. Avaliação da prevalência de cárie dentária em escolares do município de Piracicaba, SP, Brasil, após 25 anos de fluoretação das águas de abastecimento público. Rev Odontol Univ São Paulo 1997; 11:287-92.         

12. Cangussu MCT, Castellanos RA, Pinheiro MF, Albuquerque SR, Pinho C. Cárie dentária em escolares de 12 e 15 anos de escolas públicas e privadas de Salvador - BA, 2001. Pesq Odontol Bras 2002; 16:379-84.         

13. Narvai PC, Frazão P, Roncalli A, Antunes JL. Cárie dentária no Brasil: declínio, iniqüidade e exclusão social. Rev Panam Salud Pública 2006; 19:385-93.         

 

 

Correspondência:
L. A. Régis-Aranha
Escola Superior de Ciências da Saúde
Universidade do Estado do Amazonas
Av. Constantino Nery 2525, Parque dos Ingleses
Bloco 10B, apto. 402
Manaus, AM 69050-001, Brasil
laura_regis@hotmail.com
lauramaris.aranha@gmail.com

Recebido em 01/Abr/2008
Versão final reapresentada em 13/Ago/2008
Aprovado em 25/Ago/2008

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br