ARTIGO ARTICLE
A relação entre a iniciação do uso de drogas e o primeiro ato infracional entre os adolescentes em conflito com a lei
Relationship between first-time drug use and first offense among adolescents in conflict with the law
Mayra Costa Martins; Sandra Cristina Pillon
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, Brasil
RESUMO
Este estudo tem como objetivo analisar a possível relação entre a primeira experiência do uso de drogas e o primeiro ato infracional entre os adolescentes em conflito com a lei. Em 2006 foi realizado um estudo transversal nas unidades da Fundação Estadual do Bem Estar do Menor (FEBEM) de Ribeirão Preto e Sertãozinho, São Paulo, Brasil, perfazendo um total de 312 vagas. A amostra foi composta por 150 (48%) adolescentes do sexo masculino, com idades entre 12 e 21 anos, que estavam cumprindo medida sócio-educativa de internação pela primeira vez. Foi utilizado questionário individual, estruturado com perguntas fechadas. Os resultados apontaram que os índices do primeiro uso do álcool, cigarro e maconha são elevados e ocorrem concomitantemente com idade média de 12 anos. Com relação aos delitos, os mais praticados são roubo 61 (40,7%), seguido do tráfico de drogas 44 (29,4%) e o furto 14 (9,3%) e ocorrem com idade média de 13 anos. A associação dessas variáveis demonstrou que existe uma correlação significativa entre o uso do álcool e da maconha com os atos infracionais, exceto o homicídio. Esse dado confirma que o uso de drogas precede a prática infracional.
Abuso de Drogas; Adolescente; Comportamento do Adolescente
ABSTRACT
The aim of this study was to analyze a possible relationship between first experience with drugs and delinquency among adolescents in conflict with the law. In 2006, a cross-sectional study was conducted in facilities of the State Foundation for the Well-being of Minors (FEBEM), with a total occupancy of 312. The sample consisted of 150 male adolescents (48% of the total population) aged 12 to 21, confined for the first time in FEBEM detention centers for socio-educational rehabilitation in Sertãozinho and Ribeirão Preto, São Paulo State, Brazil. An individual questionnaire with closed questions was used. Results showed high rates of first-time alcohol, cigarette, and marijuana use, occurring concomitantly around 12 years. The most common offenses were robbery (44.7%), followed by drug traffic (29.4%), and theft (9.3%), occurring around 13. The data show that drug use occurs prior to offenses.
Drug Abuse; Adolescent; Adolescent Behavior
Introdução
Para compreender melhor a temática aqui apresentada, é necessário contextualizar a adolescência como um dos períodos mais importantes do desenvolvimento humano, em razão de várias transformações biopsicossociais. É uma fase em que a criança se transforma em adulto, delimita o potencial de crescimento psicológico do indivíduo 1. Além dessa mudança, um marco familiar também se desenvolve, caracterizando um período de risco em que podem ocorrer alterações da personalidade 2.
A psicanálise nos permite compreender parte dos distúrbios de comportamento na adolescência detectados na atualidade. Winnicott 3 apontou que durante a infância a relação com o mundo externo ainda não está firmemente integrada nem enraizada na personalidade. O amor primitivo tem propósito destrutivo, e a criança ainda não aprendeu a tolerar e enfrentar os instintos; ela tem necessidade absoluta de viver um vínculo de amor e força para não sentir medo excessivo de seus próprios pensamentos e dos produtos de sua imaginação, a fim de progredir em seu desenvolvimento emocional.
O contexto atual permite concluir que vivemos em uma sociedade carente de mãe e pai, na qual faltam limites e critérios norteadores das ansiedades cotidianas, que se exacerbam. As relações afetivas primárias estão tão deturpadas pela ausência ou má qualidade dos vínculos primários que terminam por comprometer a auto-estima da criança e do adolescente, assim como o desenvolvimento das potencialidades afetivas, cognitivas, criativas e reparadoras.
Quando os vínculos primários são fortes, as chances de o adolescente exibir comportamento anti-social são menores do que quando os vínculos com os pais não existem ou são fracos 4.
Os fatores associados a comportamentos anti-sociais na infância são: pertencer ao sexo masculino; receber cuidados maternos e paternos inadequados; viver em meio à discórdia conjugal; ser criado por pais agressivos e violentos; ter mãe com problemas de saúde mental; residir em áreas urbanas; ter baixo nível sócio-econômico 5. Adicionado a esses fatores, há estudo que aponta que os meninos apresentam maior tendência a aspectos patológicos, desvios de conduta, envolvimento com acidentes, suicídios, comportamentos anti-sociais e uso de álcool e de outras drogas 6.
É essencial para o adolescente estabelecer contatos com novos amigos e formar seu grupo de identificação, que influencia suas idéias e opiniões, passando a permanecer mais tempo com o grupo fora de casa do que com os pais em casa, diferentemente do que ocorre na infância ou na pré-adolescência. Esse relacionamento com o grupo pode conduzir a comportamentos inadequados como uso de drogas e a delinqüência, que se tornam normas em grupos da mesma faixa etária durante esse período 7,8,9,10,11,12.
Uso de drogas e a delinqüência
As literaturas nacional e internacional apresentam vários estudos com relação ao uso de drogas na adolescência. No Brasil, o álcool, o tabaco e a maconha são as drogas mais usadas pelos adolescentes 13.
Os problemas de comportamento grave podem estar relacionados com maior risco para o uso de todas as drogas, mas a associação com relação ao comportamento delinqüente pode ser mais forte para o uso da maconha que para o uso do álcool ou do tabaco 12. O uso precoce de tabaco, de álcool ou de ambos pode conduzir ao uso de maconha e de outras drogas, ou a outros problemas de comportamento 14. Os problemas graves de comportamento podem estar vinculados ao maior risco de uso de todas as drogas, mas o comportamento delinqüente parece ser o mais importante fator para o uso de maconha do que para o uso de álcool ou de tabaco 12,15.
A maconha é a terceira droga mais usada nos Estados Unidos depois do álcool e do cigarro, os dados revelam ainda que em 2004, 14,6 milhões de americanos com 12 anos de idade haviam usado maconha pelo menos uma vez no mês anterior 14. Os fatores que influenciam o uso dessa droga são: pertencer ao sexo masculino, ser jovem, usar outras drogas, ter baixa escolaridade, os quais aumentam o risco de uso precoce. Indivíduos de baixa condição sócioe-conômica têm maior probabilidade de desenvolver o uso e a dependência. A estrutura familiar apresenta uma relação significativa, o adolescente criado em família monoparental, por apenas um dos pais, em conseqüência da separação dos cônjuges, torna-se mais vulnerável ao uso de maconha 16,17.
Outros fatores que precedem o início do uso de maconha são a influência do grupo, a disponibilidade e a presença de drogas na comunidade de convivência, e podem facilitar seu uso por adolescentes, uma vez que o excesso de oferta facilita o acesso a elas 13.
No que concerne ao uso de álcool, Pechansky et al. 18 demonstram que é uma das substâncias psicoativas mais precocemente consumidas pelos jovens. O bom relacionamento com os pais e na escola diminui o risco de o adolescente apresentar problemas de comportamento e de usar álcool e outras drogas 19.
A experimentação inicial se dá quando o adolescente tem amigos que usam drogas, o que gera uma pressão de grupo na direção do uso 20. Estudo aponta que a agressividade predispõe ao uso de drogas e precede o comportamento delinqüente 21.
Para a psicanálise a delinqüência indica que alguma esperança subsiste. Quando a criança se comporta de modo anti-social, não se trata necessariamente de uma doença, e o comportamento anti-social é, por vezes, um pedido de socorro, solicitando o controle de pessoas fortes, amorosas e confiantes 3. Spagnol 22 esclarece que, no caso do Brasil, em referência à delinqüência, especialmente por parte da mídia, este termo define qualquer grupo de jovens que pratique diferentes infrações. A definição jurídica de delinqüente, que é o indivíduo que delinqüiu, ou seja, que é culpado por uma infração à lei penal, por um delito ou crime, que pode assumir a forma de roubo, homicídio ou de outro ato violento 23.
Adolescente em conflito com a lei no Brasil
Para um maior entendimento do perfil desta população, sentiu-se a necessidade de pesquisarmos na literatura nacional o que se refere às características do adolescente em conflito com a lei no Brasil, uma vez que este estudo foi realizado com adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa internados na FEBEM (Fundação Estadual do Bem Estar do Menor).
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 24 apontam que do total da população brasileira, o percentual de adolescentes em conflitos com a lei, entre 12 e 18 anos, representa 15%, ou seja, 0,2% de toda a população do país responsável pela prática dos atos infracionais. A Região Sudeste concentra a maior parte em termos proporcionais, da ordem de 40%.
O levantamento realizado pelo Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente (ILANUD) 25 demonstrou que é expressiva a quantidade de usuários de drogas entre os adolescentes privados de liberdade no país: em 2002, 85,6% faziam uso antes da apreensão, especialmente de maconha (67,1%), álcool (32,4%), cocaína/crack (31,3%) e inalantes (22,6%). Adolescentes infratores tendem a procurar amigos no próprio meio de infração, buscando estímulo e apoio em suas ações ilegais como roubos, tráfico ou uso de drogas 26.
As características do perfil do adolescente em conflito com a lei no Brasil são similares àquelas encontradas em estudos internacionais. Estudo realizado com adolescentes privados de liberdade nos Estados Unidos apontou que a maioria apresentava distúrbios de conduta, uso de drogas e estágios de humor negativos. Outras características dessa população apontadas pelo autor: impulsividade; hiperatividade; precário controle diante de frustrações; deficiência de atenção; incapacidade de planejamento e de fixação de metas; baixos níveis de inteligência 27.
Com base nos estudos apresentados neste trabalho, conclui-se que é expressivo o número de adolescentes que se envolvem com comportamentos de risco, como o uso de drogas e a prática de infrações, razão pela qual é indispensável a criação de programas preventivos direcionados especificamente para os adolescentes.
Material e métodos
Em 2006, foi realizado um estudo transversal nas unidades da FEBEM de Ribeirão Preto e Sertãozinho, Estado de São Paulo, Brasil, perfazendo um total de 312 vagas. A amostra foi composta por 150 (48%) adolescentes do sexo masculino, com idades entre 12 e 21 anos, que estavam cumprindo medida sócio-educativa de internação pela primeira vez.
Participaram deste estudo 47 (15%) adolescentes que estavam na Unidade de Internação e 24 (7,7%) que estavam na Unidade de Internação Provisória da FEBEM de Sertãozinho, perfazendo um total de 71 (22,7%) adolescentes, e mais 79 (25,3%) que estavam na Unidade de Internação de Ribeirão Preto, perfazendo um total nestas três unidades de 150 adolescentes.
A coleta de dados foi obtida usando-se um questionário estruturado com perguntas fechadas, dividido em três categorias: (i) contendo questões com relação às informações sócio-demográficas; (ii) contendo informações com relação à primeira experiência com as drogas e o uso de drogas entre os amigos e familiares; e (iii) contém informações da primeira experiência com relação à prática infracional.
Foi realizado um estudo piloto no qual foi testado o questionário. A um grupo de 11 adolescentes foi solicitado tecer críticas sobre a formulação das perguntas visando a testar a clareza da linguagem e a objetividade do instrumento. O questionário foi aplicado individualmente pela autora principal e dois profissionais que foram treinados para a coleta de dados que foi realizada em uma sala de aula com a presença do agente de segurança na porta.
As informações coletadas foram registradas em um banco de dados no programa de estatística SPSS for Windows, v. 10 (SPSS Inc., Chicago, Estados Unidos), o que possibilitou a análise descritiva das informações sócio-demográficas, o primeiro uso de drogas e o primeiro ato infracional dessa população. Foi utilizada para a análise univariada a metodologia não-paramétrica. As variáveis referentes às idades não apresentaram distribuição normal, portanto foi utilizado o coeficiente de correlação de Spearman. Também foram utilizados os testes não-paramétricos de Mann-Whitney (usado para as baixas amostragens), o teste de Kruskal-Wallis (ANOVA não-paramétrica) medindo apenas se existe diferença entres os grupos. O teste qui-quadrado foi utilizado para verificar se duas variáveis e seus níveis possuíam ou não uma associação estatística. A hipótese de associação estatística foi aceita quando se encontrou p igual ou menor que 0,05.
Este projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Resultados
A idade dos adolescentes internados na FEBEM variou entre 13 e 20 anos, a média encontrada foi de 16,32 anos e o desvio padrão de 1,21. Dos 150 entrevistados, a maioria 91 (60,7%) era pardo ou negro e 83 (55,3%) eram procedentes da região de Ribeirão Preto. Referente ao nível de escolaridade, a maioria 103 (68,7%) possuía o ensino fundamental incompleto e metade 75 (50%) não estava estudando quando foram internados (Tabela 1).
Foram apresentados neste estudo somente cinco tipos de drogas citadas por essa população, são elas: álcool, cigarro, maconha, cocaína e crack.
Os dados revelam que a maioria desses adolescentes já havia experimentado álcool 146 (97,3%); maconha 145 (96,7%) e cigarro 135 (90%) concomitantemente com idade média de 12 anos. Com relação ao uso da cocaína, 98 (65,3%) já haviam experimentado e a idade média foi de 14,1 anos, e com relação ao crack somente 14 (9,3%) já haviam experimentado esta substância (Tabela 2).
No que se refere ao ato infracional, os dados apontaram que os delitos mais praticados foram o roubo 123 (82%), tráfico 111 (74%), furto 89 (59,3%) e 121 (80,7%) já haviam portado arma de fogo. Todos esses delitos foram cometidos pela primeira vez com idade média de 13 anos de idade (Tabela 3).
Quanto à associação entre a idade do primeiro uso de drogas e o ato infracional, os resultados revelaram que há uma relação significativa entre o uso do álcool, da maconha e os atos infracionais. Constatamos que há correlação positiva e significativa da idade do primeiro uso do álcool com: idade do primeiro roubo (r = 0,38; p < 0,001); idade do primeiro furto (r = 0,45; p < 0,001); idade do primeiro tráfico (r = 0,30; p = 0,003); idade do primeiro porte de arma (r = 0,35; p < 0,001) e com idade que portou droga pela primeira vez (r = 0,64; p < 0,001) (Tabela 4).
Constatamos que há correlação positiva e significativa da idade do primeiro uso da maconha com: idade do primeiro roubo (r = 0,45; p < 0,001); idade do primeiro furto (r = 0,30; p = 0,006); idade do primeiro tráfico (r = 0,46; p < 0,001); idade do primeiro porte de arma (r = 0,45; p < 0,001) e com idade que portou droga pela primeira vez (r = 0,63; p < 0,001). Isso indica que quanto mais novo usou álcool e maconha pela primeira vez, mais novo cometeu esses delitos.
Não foi encontrada nenhuma relação significativa entre o uso do cigarro e da cocaína com os delitos citados neste estudo. Com relação ao uso do crack há correlação positiva e significativa da idade do primeiro uso de crack com a idade da primeira vez que traficou (r = 0,83; p = 0,006).
Discussão
Todos os adolescentes autores de infração apresentados neste estudo são do sexo masculino e, no que toca à faixa etária, o contingente mais expressivo, à época em que se realizou esta pesquisa, tinha idade mínima de 13 anos e máxima de 20, com idade média de 16 anos. Em sua maioria os adolescentes são pardos ou negros 91 (60,7%) e brancos 59 (39,3), e 83 (55,3%) procediam da região de Ribeirão Preto.
Mais de 50% dos adolescentes 103 (68,7%) tinham Ensino Fundamental incompleto, isto é, baixa escolaridade, e 50% deles não estavam estudando quando da internação na FEBEM. Tais resultados sugerem que a escolaridade seja um importante fator de proteção contra o envolvimento dos adolescentes com situações de risco. Esse fato faz supor que outros fatores possam estar associados ao abandono escolar ou ao desinteresse dos adolescentes pelo ensino. Embora os professores tenham formação acadêmica, podem não estar capacitados para lidar com problemas de comportamento que impelem os adolescentes a se envolverem com situações de risco, como o uso de drogas e a delinqüência. Conforme se verifica no presente estudo, quanto mais baixo é o nível de escolaridade, tanto mais cedo os adolescentes se envolvem com comportamentos de risco.
Quanto à escolaridade, é vasta a literatura em que se encontram resultados similares, e ainda revelam que o afastamento se deve à necessidade de trabalhar, à dificuldade de conciliar escola com trabalho, ao desentendimento com professores e colegas, ao desestímulo resultante de reprovações repetidas, à baixa qualidade do ensino e à pouca supervisão familiar no que se refere à freqüência escolar, contribuindo todos estes fatores para o início da prática de infrações 25,27,28,29.
Além desses fatores, a supervisão dos pais é muito importante, pois representa um reforço positivo para que os adolescentes se sintam protegidos e amados por eles, como esclarece Winnicott 3: os vínculos primários são fundamentais. Em consonância aos resultados apresentados, os adolescentes envolvidos com o uso de drogas e a prática de infrações viviam, em sua maioria, em famílias monoparentais, o que faz refletir sobre a importância da relação entre pais e filhos como reforço positivo contra o envolvimento dos adolescentes com tais comportamentos de risco.
No que se refere ao uso de drogas, os resultados revelaram que, em média, 95% dos adolescentes já haviam experimentado álcool, tabaco e maconha concomitantemente. Os adolescentes tinham idade média de 12 anos quando experimentaram essas drogas pela primeira vez, e 63,3% relataram que, apesar de estarem na presença dos amigos, tinham experimentado por vontade própria. As drogas mais usadas pelos adolescentes eram, em primeiro lugar, a maconha 119 (82%), seguida pelo álcool 107 (73,3%) e pelo tabaco 104 (77%). O uso de drogas lícitas e ilícitas permeia a cultura da adolescência à velhice e, no caso do Brasil, isto é notado por meio do uso de álcool, tabaco e maconha 13,29.
Os delitos que os adolescentes citaram como os mais praticados foram o roubo (82%), o porte de arma (80,7%), o tráfico de drogas (74%) e o furto (59,3%). Resultado semelhante já havia sido apontado em estudo anterior 25,28. No que toca ao roubo, verificou-se a tendência estatística de os adolescentes com baixo nível de escolaridade terem maior probabilidade de participação em roubos em idade precoce.
Na comparação das variáveis "primeiro uso de drogas" e "primeiro ato infracional", com a finalidade de avaliar sua possível relação, os resultados apontam que os adolescentes iniciaram o uso de álcool, de tabaco e de maconha com idade média de 12 anos, ao passo que, na prática de infrações, a idade média foi de 13 anos, sugerindo que o uso destas drogas precede o uso de outras e a prática de infrações.
Tanto neste estudo quanto em outros similares da literatura, o álcool e a maconha, sendo esta apontada como a mais consumida por esses adolescentes, estão associados aos delitos praticados por essa população. Esse fato confirma que, quando o uso de drogas ocorre precocemente, existe uma chance maior de o adolescente se envolver mais cedo com as infrações, sugerindo que o uso de drogas o deixa mais vulnerável aos comportamentos de risco, como a prática de infrações 21,29,30,31.
Os resultados ainda revelam a associação de uso de álcool e de maconha com roubo, furto, tráfico de drogas, porte de arma e porte de drogas. Relativamente ao uso de crack, foi encontrada, nesta pesquisa, uma relação estatística significante somente com o tráfico de drogas, razão pela qual é necessário realizar novos estudos para confirmar se existe alguma associação entre o uso desta droga e delitos, uma vez que o número de adolescentes usuários de crack que participou (14 ou 9,3%) é insuficiente para confirmar esta relação.
Segundo estudos longitudinais realizados na França e na Suíça 21, as infrações geralmente precedem o consumo de substâncias psicoativas, e quanto mais os adolescentes cometem delitos, tanto mais usam drogas.
Em concordância com os dados citados na literatura internacional, Ferigolo et al. 14 reafirmam que a freqüência do uso de drogas era significativamente mais elevada entre os adolescentes já internados na FEBEM, e concluem não ser possível afirmar que as infrações acompanham o início do uso de drogas ou são posteriores a ele.
Outro achado demonstrado em estudo recente 32, é que os adolescentes que assumem comportamentos de risco tendem a manifestar sentimentos deficitários de empatia pelo próximo e ausência de culpa, que atuam como facilitadores da incursão no crime. Entre adolescentes em conflito com lei, também se encontrou associação entre esse comportamento e o uso de substâncias psicoativas.
O presente estudo não pretende esgotar essa temática em razão da amplitude e da complexidade do problema relativo ao uso de drogas e infrações. No entanto, os resultados encontrados são similares aos descritos na literatura já citada anteriormente, sugerindo que os principais fatores de risco para o envolvimento dos adolescentes com o uso de drogas e a prática de infrações talvez sejam a relação com os pais, a influência do grupo e o nível de escolaridade.
Por fim, com base nos resultados deste trabalho, sugere-se a realização de novas pesquisas centradas nessa população, as quais talvez possam contribuir para o planejamento de políticas públicas e programas preventivos contra o uso de drogas por adolescentes em conflito com a lei.
Colaboradores
M. C. Martins e S. C. Pillon realizaram a coleta de dados, o planejamento do estudo, a elaboração do banco de dados e a redação do artigo.
Agradecimentos
As autoras agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que por meio de seu programa de bolsistas permitiu a realização deste trabalho, ao Dr. Milton Roberto Laprega (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo) e ao Dr. Manoel Antonio dos Santos (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo), por suas valiosas contribuições a este texto.
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Correspondência
M.C. Martins
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto
Universidade de São Paulo
Av. Bandeirantes 3900, Ribeirão Preto, SP
14040-902, Brasil
maymartins@uol.com.br
Recebido em 13/Fev/2007
Versão final reapresentada em 18/Jul/2007
Aprovado em 27/Set/2007