EDITORIAL
Dez anos de informação sobre acesso e uso de serviços de saúde
Francisco Viacava
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil. viacava@icict.fiocruz.br
Com a liberação, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do componente saúde da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 2008) passa-se a dispor de uma série de dados obtidos por um mesmo instrumento de coleta, que já foi utilizado em 1998 e em 2003. Esses dados constituem importante fonte de informação para o monitoramento do desempenho das políticas de saúde e permitem obter um panorama do acesso e do uso de serviços de saúde pela população.
Na primeira versão, em 1998, elaborada por um grupo de pesquisadores da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO) e da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP), o questionário retomava o suplemento de saúde de 1981, acrescentando um bloco sobre cobertura por plano de saúde. Do ponto de vista metodológico, duas correções importantes foram feitas: os tempos de recordação, que eram fixos, passaram a considerar o tempo entre os eventos e a data da entrevista, e os blocos de morbidade e de uso de serviços passaram a ser respondidos por todas as pessoas, o que permitiu avaliar o uso de serviços independentemente da presença de algum problema de saúde. Para mensuração das necessidades de saúde foram acrescentadas perguntas sobre doenças crônicas e limitação física de atividade. Em 2003, foram incluídas perguntas sobre a realização de mamografia e Papanicolaou para as mulheres com 25 anos ou mais. A versão de 2008 traz perguntas sobre acidentes de trânsito e violência e um bloco sobre estilos de vida, com questões sobre tabagismo, atividade física e uso de cinto de segurança. Outro dado importante inserido em 2008 foi a cobertura pelo Programa Saúde da Família (PSF).
Os resultados da análise desses dez anos apontam para grandes variações no acesso e no uso dos serviços de saúde, provavelmente decorrentes de mudanças no contexto socioeconômico e na política de atenção à saúde. O acesso vem aumentando de forma importante em todos os níveis. Mais importante, o maior aumento no acesso é observado na população residente nas regiões mais carentes. Entretanto, ainda persistem desigualdades geográficas e sociais muito grandes, particularmente no acesso aos serviços odontológicos e de mamografia.
As diferenças no perfil do pagamento dos serviços para pessoas situadas no primeiro e no último quintil de renda familiar per capita indicam que, na prática, existem dois sistemas completamente distintos. Enquanto os planos de saúde financiaram a maior parte dos atendimentos dos mais ricos, cresceu a importância do SUS no pagamento dos serviços dos mais pobres. Mas, também entre os mais ricos, nota-se um aumento da participação do SUS e do desembolso no momento da utilização dos serviços.
Dados sobre a assistência farmacêutica mostram que, apesar do aumento no acesso aos serviços de saúde, ainda é preciso avaliar a qualidade dos atendimentos e a efetividade dos serviços. O indicativo de que em apenas 45% dos atendimentos com prescrição, feitos pelo SUS, os pacientes receberam todos os medicamentos revela uma possível baixa eficiência dos atendimentos.
O suplemento de saúde da PNAD tem limitações para gerar informações sobre a qualidade da atenção. Para 2013, espera-se poder contar com a continuidade da coleta desses dados pelo IBGE e com informações mais detalhadas sobre o desempenho do sistema de saúde, levando em conta a adequação, a continuidade do cuidado e o respeito aos direitos dos usuários dos serviços.