Vulnerabilidade no contexto da infecção por HIV e sífilis numa população de homens que fazem sexo com homens (HSH) no Município de Salvador, Bahia, Brasil

Sandra Brignol Inês Dourado Leila D. Amorim Lígia Regina Franco Sansigolo Kerr Sobre os autores

Resumo

A vulnerabilidade social, individual e programática dos homens que fazem sexo com homens (HSH), no contexto da epidemia do HIV e doenças sexualmente transmissíveis (DST) é uma realidade em muitos países. A pesquisa Comportamento, Atitudes, Práticas e Prevalência de HIV e Sífilis entre Homens que Fazem Sexo com Homens em 10 Cidades Brasileiras, selecionou, no Município de Salvador, Bahia, Brasil, 383 HSH via técnica respondent driven sampling (RDS). Vulnerabilidade individual: início precoce da vida sexual (51%), média de oito parceiros sexuais, sexo anal receptivo desprotegido com parceiro casual (32%) e fixo (45%), e teste rápido positivo: HIV (6,5%) e sífilis (9%). Vulnerabilidade social: adultos jovens (80%), negros (91%), renda familiar média de R$ 1.000,00 e sofreram algum tipo de discriminação (57%). Fatores programáticos: sem teste do HIV (63%), sem acesso ao gel lubrificante (88%). Observou-se um perfil de vulnerabilidade e urgente necessidade de ações de intervenção e prevenção às DST no município na população pesquisada, além de altas prevalências do HIV e sífilis.

Homossexualidade Masculina; HIV; Sífilis; Vulnerabilidade em Saúde


Introdução

A infecção por HIV na população de homens que fazem sexo com homens (HSH), em muitos países, apresenta taxas mais elevadas na comparação com outras populações vulneráveis, como evidenciado em recente pesquisa 1Beyrer C, Baral SD, van Griensven F, Goodreau SM, Chariyalertsak S, Wirtz AL, et al. Global epidemiology of HIV infection in men who have sex with men. Lancet 2012; 380:367-77.. Foram registradas altas prevalências do HIV nesta população no Caribe (25,4%), na África subsaariana (17,9%), na América do Norte (15,4%), no Sul e Sudeste da Ásia (14,7%) 1Beyrer C, Baral SD, van Griensven F, Goodreau SM, Chariyalertsak S, Wirtz AL, et al. Global epidemiology of HIV infection in men who have sex with men. Lancet 2012; 380:367-77.. Na América Latina as maiores prevalências são na Argentina (9% a 51%), Peru (10% a 22%), Uruguai (22%), Bolívia (21%), Colômbia (20%), México (15%) e Paraguai (13%) 2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.. No Brasil, estimaram-se recentemente prevalências do HIV entre 5,2% e 23,7%, com uma média de 14,2%, em dez cidades 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35., medida que contrasta com a da população geral, onde a prevalência estimada para a faixa de 13 a 49 anos é de 0,6% 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.. A sífilis também apresenta alta prevalência entre os HSH, sendo esta doença sexualemnte transmissível (DST) um importante fator biológico associado à infecção pelo HIV 1Beyrer C, Baral SD, van Griensven F, Goodreau SM, Chariyalertsak S, Wirtz AL, et al. Global epidemiology of HIV infection in men who have sex with men. Lancet 2012; 380:367-77.,2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.. Estudos recentes e revisões de literatura mostram um crescimento da prevalência da sífilis na população dos HSH 5Zou H, Fairley CK, Guy R, Bilardi J, Bradshaw CS, Garland SM, et al. Automated, computer generated reminders and increased detection of gonorrhoea, chlamydia and syphilis in men who have sex with men. PLoS One 2013; 8:e61972.,6Pando MA, Balán IC, Marone R, Dolezal C, Leu CS, Squiquera L, et al. HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men recruited by RDS in Buenos Aires, Argentina: high HIV and HPV infection. PLoS One 2012; 7:e39834.,7Zoni AC, González MA, Sjögren HW. Syphilis in the most at-risk populations in Latin America and the Caribbean: a systematic review. Int J Infect Dis 2013; 17:e84-92.,8Clark JL, Konda KA, Segura ER, Salvatierra HJ, Leon SR, Hall ER, et al. Risk factors for the spread of HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men infected with HIV in Lima, Peru. Sex Transm Infect 2008; 84:449-54.,9Chow EP, Wilson DP, Zhang L. HIV and syphilis co-infection increasing among men who have sex with men in China: a systematic review and meta-analysis. PLoS One 2011; 6:e22768., a prevalência está acima de 30% em alguns países da América Latina 2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.,6Pando MA, Balán IC, Marone R, Dolezal C, Leu CS, Squiquera L, et al. HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men recruited by RDS in Buenos Aires, Argentina: high HIV and HPV infection. PLoS One 2012; 7:e39834.,7Zoni AC, González MA, Sjögren HW. Syphilis in the most at-risk populations in Latin America and the Caribbean: a systematic review. Int J Infect Dis 2013; 17:e84-92.,8Clark JL, Konda KA, Segura ER, Salvatierra HJ, Leon SR, Hall ER, et al. Risk factors for the spread of HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men infected with HIV in Lima, Peru. Sex Transm Infect 2008; 84:449-54. e Ásia 9Chow EP, Wilson DP, Zhang L. HIV and syphilis co-infection increasing among men who have sex with men in China: a systematic review and meta-analysis. PLoS One 2011; 6:e22768.; esta tendência já havia sido revelada anteriormente 2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.. No Brasil a ocorrência de sífilis na vida (14%) entre HSH foi estimada recentemente pela pesquisa Comportamento, Atitudes, Práticas e Prevalência de HIV e Sífilis entre Homens que Fazem Sexo com Homens em 10 Cidades Brasileiras.

A vulnerabilidade, enquanto conceito utilizado na saúde pública, refere-se a um conjunto de fatores estruturados em três dimensões (individuais, sociais e programáticas), e vem sendo utilizado para descrever susceptibilidades de grupos populacionais diante de importantes problemas de saúde 1010 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: Czeresnia D, Freitas CM, organizadores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. p. 121-43.. No entanto, no contexto da epidemia do HIV/AIDS, este conceito que tem um forte referencial nos direitos humanos, aparece na literatura desde a década de 1990 1111 Mann JM, Tarantola D. AIDS in the World II. Oxford: Oxford University Press; 1996.. A vulnerabilidade de populações e indivíduos frente ao HIV/AIDS é, em parte, reflexo do estigma, preconceito, criminalização e desrespeito aos direitos humanos 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,1313 International AIDS Society. Declaração de Compromisso Washington D.C. Revertendo a maré em conjunto: uma declaração para acabar com a epidemia do HIV/SIDA. http://www.2endaids.org/lang/portugese.html (accessed on 21/Dec/2012).
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, que em muitos países dificultam o avanço das políticas de prevenção e o acesso oportuno aos serviços de saúde para diagnóstico e tratamento do HIV e outras DST 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,1313 International AIDS Society. Declaração de Compromisso Washington D.C. Revertendo a maré em conjunto: uma declaração para acabar com a epidemia do HIV/SIDA. http://www.2endaids.org/lang/portugese.html (accessed on 21/Dec/2012).
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,1414 Gruskin S, Tarantola D. Universal access to HIV prevention, treatment and care: assessing the inclusion of human rights in international and national strategic plans. AIDS 2008; 22 Suppl 2: S123-32.. Na população dos HSH esta é uma realidade reconhecida por órgãos e instituições internacionais e nacionais 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.,1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,1313 International AIDS Society. Declaração de Compromisso Washington D.C. Revertendo a maré em conjunto: uma declaração para acabar com a epidemia do HIV/SIDA. http://www.2endaids.org/lang/portugese.html (accessed on 21/Dec/2012).
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O cenário das infecções por HIV e das DST, na população dos HSH, pode ser avaliado a partir de uma perspectiva ampliada de fatores, ou seja, para as dimensões das vulnerabilidades (social, individual e programática) 1010 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: Czeresnia D, Freitas CM, organizadores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. p. 121-43.,1111 Mann JM, Tarantola D. AIDS in the World II. Oxford: Oxford University Press; 1996.,1414 Gruskin S, Tarantola D. Universal access to HIV prevention, treatment and care: assessing the inclusion of human rights in international and national strategic plans. AIDS 2008; 22 Suppl 2: S123-32., tais dimensões congregam aspectos socioculturais, político-institucionais, características individuais, experiências, interações, subjetividades, e trajetórias pessoais 1515 Delor F, Hubert M. Revisiting the concept of “vulnerability”. Soc Sci Med 2000; 50:1557-70., bem como características das redes sociais nas quais os indivíduos estão inseridos 1Beyrer C, Baral SD, van Griensven F, Goodreau SM, Chariyalertsak S, Wirtz AL, et al. Global epidemiology of HIV infection in men who have sex with men. Lancet 2012; 380:367-77.,1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013..

Sob esta perspectiva, este trabalho tem como objetivo analisar os fatores de vulnerabilidade individual, social e programática dos HSH soteropolitanos, no contexto da infecção por HIV/AIDS. Na Bahia e em Salvador são poucos os estudos que investigaram a infecção pelo HIV na população dos HSH, e pouco se sabe sobre o perfil sociodemográfico destes homens, suas susceptibilidades, comportamento sexual etc. Além disso, informações locais são importantes no contexto da epidemia do HIV, para descrever e apresentar as especificidades que não são observadas e se diluem em análises mais gerais.

Metodologia

Este trabalho utilizou dados coletados no Município de Salvador, que fez parte do estudo multicêntrico Comportamento, Atitudes, Práticas e Prevalência de HIV e Sífilis entre Homens que Fazem Sexo com Homens em 10 Cidades Brasileiras, realizado também em Manaus (Amazonas), Recife (Pernambuco), Campo Grande (Mato Grosso do Sul), Brasília (Distrito Federal), Curitiba (Paraná), Itajaí (Santa Catarina), Santos (São Paulo), Belo Horizonte (Minas Gerais) e Rio de Janeiro. O estudo foi do tipo corte transversal, com HSH residentes nos referidos municípios 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35.. Os resultados aqui apresentados fazem parte da Tese de Doutorado 1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013. da primeira autora deste trabalho e utiliza como eixo norteador das análises o conceito da vulnerabilidade 1111 Mann JM, Tarantola D. AIDS in the World II. Oxford: Oxford University Press; 1996..

Em Salvador, a coleta de dados ocorreu entre outubro de 2008 e outubro de 2009. Os participantes foram selecionados a partir da técnica respondent driven sampling (RDS) 1717 Heckathorn DD. Respondent-driven sampling: a new approach to the study of hidden populations. Soc Probl 1997; 44:174-99.. Esta técnica de recrutamento é uma das opções para a seleção de indivíduos de populações classificadas como de difícil acesso, como os HSH 1818 Salganik MJ, Heckathorn DD. Sampling and estimation in hidden populations using respondent-driven sampling. Sociol Methodol 2004; 34:193-240.,1919 Magnani R, Sabin K, Saidel T, Heckathorn D. Review of sampling hard-to-reach and hidden populations for HIV surveillance. AIDS 2005;19 Suppl 2:S67-72..

Na primeira fase da pesquisa foram realizados quatro grupos focais com HSH que possuíam diferentes características sociodemográficas e identidade sexual 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35.,1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013.. Ao identificar os HSH que tinham ampla rede de relacionamento social, e que estavam dispostos a colaborar com a pesquisa, estes foram convidados para serem as “sementes” do estudo, isto é, dar início ao recrutamento dos participantes. Todos os participantes receberam três convites numerados e com data de validade para distribuir entre os HSH da sua rede de relações social, permitindo controlar a participação dos HSH e conectar cada recrutado a seu recrutador (Figuras 1 e 2).

Figura 1
Distribuição da rede de recrutamento dos homens que fazem sexo com homens (HSH) de Salvador, Bahia, Brasil, 2008-2009, segundo o resultado do teste rápido para o HIV.

Figura 2
Distribuição da rede de recrutamento dos homens que fazem sexo com homens (HSH) de Salvador, Bahia, Brasil, 2008-2009, segundo o resultado do teste rápido para a sífilis.

A amostra prevista para Salvador de 350 HSH 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35. foi ampliada para 394 participantes. E 383 (97%) atenderam aos critérios de inclusão do estudo: idade igual ou superior a 18 anos, relato de pelo menos uma relação sexual com outro homem durante o ano anterior à entrevista, ter uma ampla rede de relações pessoais com outros HSH e residir na cidade de Salvador 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35..

O número de conhecidos dentro da rede de relacionamentos (grau), juntamente com a medida da “homofilia” 1717 Heckathorn DD. Respondent-driven sampling: a new approach to the study of hidden populations. Soc Probl 1997; 44:174-99. (grau de similaridade entre recrutador e recrutado, em relação ao HIV e sífilis), foram utilizados para calcular os “pesos amostrais individuais RDS”, que ajustaram as estimativas dos parâmetros de interesse 1717 Heckathorn DD. Respondent-driven sampling: a new approach to the study of hidden populations. Soc Probl 1997; 44:174-99.. Tais pesos foram calculados no programa Respondent Driven Sampling Analysis Tool 6.0.1 (RDSAT; http://www.respondentdrivingsampling.org).

As “sementes” foram incluídas nas análises visando reduzir a perda de unidades amostrais. Para preencher os dados faltantes referentes ao grau, utilizou-se a média aritmética do número de conhecidos dentro da rede social (28 indivíduos) empregando a técnica de imputação simples, visto que a frequência de dados ausentes foi menor que 5% para o grau.

Em Salvador foram distribuídos 1.149 cupons, dos quais 375 foram resgatados. A grande maioria dos recrutadores e seus convidados (284) receberam tíquetes-alimentação no valor de R$ 5 e R$ 10, para realizarem um lanche, isso porque o tempo de espera para completar todas as etapas da participação (recepção, entrevista, aconselhamento pré e pós testes rápidos) poderia ultrapassar três horas.

Para atender a outros objetivos 1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013. aplicou-se um questionário com 27 perguntas somente no Município de Salvador. Porém no presente trabalho foram utilizados apenas os dados que compuseram a variável: “usou ou costuma usar algum serviço de saúde do Sistame Único de Saúde (SUS)?”. A identificação da infecção por HIV e detecção de anticorpos para Treponema pallidum foram realizadas a partir dos testes rápidos Rapid Check HIV-1&2 (Núcleo de Doenças Infecciosas, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, Brasil) Bio-Manguinhos HIV-1&2 (Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil) e SD Bioline Syphilis 3.0 (Standard Diagnostics Inc., Yongin, Corea do Sul), respectivamente. Todos os procedimentos para a aplicação destes testes seguiram as orientações e recomendações das portarias do Ministério da Saúde (Portaria Normativa no 34 de 28 de outubro de 2005, Portaria Normativa no 3.242 de 30 de dezembro de 2011 e complementares) 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35..

As variáveis deste trabalho foram agrupadas segundo as dimensões da vulnerabilidade 1010 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: Czeresnia D, Freitas CM, organizadores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. p. 121-43.,1111 Mann JM, Tarantola D. AIDS in the World II. Oxford: Oxford University Press; 1996.: (1) individual: resultado dos testes rápidos do HIV e sífilis, relato de sintomas de DST (presença de feridas, bolhas, verrugas e corrimentos no pênis ou ânus), idade na data da entrevista, número total de parceiros sexuais nos seis meses anteriores à entrevista (homens, mulheres e travestis), sexo anal receptivo desprotegido com o último parceiro fixo e com o último parceiro casual, e idade da primeira relação sexual; (2) social: escolaridade, raça/cor da pele, renda familiar, situação de trabalho atual, categoria sexual, se sofreu algum tipo de discriminação (por raça/cor da pele, por condição social, pela idade, ou pela orientação sexual), histórico de xingamento na vida e no último ano, e se contou para pai ou mãe que sente atração sexual por homens; e (3) programática: resultado do teste rápido para HIV e sífilis, relato de teste prévio de HIV, relato de teste prévio de sífilis, conhecimento sobre algum serviço de saúde onde o teste de AIDS é feito gratuitamente, acesso a alguma informação ou insumo de prevenção de DST nos últimos 12 meses, recebimento de gel lubrificante nos últimos 12 meses, participação ou conhecimento em alguma atividade organizada por igreja, grupo religioso, organização não-governamental (ONG) de HIV/AIDS, ou ONG de Direitos Humanos, se usou ou costuma usar algum serviço de saúde do SUS 1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013..

Foram criadas novas variáveis a partir da agregação ou combinação de categorias, ou ainda de questões do instrumento da pesquisa multicêntrica. As categorizações utilizadas basearam-se em indicações da literatura e de tal forma que as frequências não fossem abaixo de 5%, o que poderia comprometer o uso de testes de hipóteses. As novas variáveis e fatores de interesse são: “número total de parceiros sexuais”, “sexo anal receptivo com último parceiro casual homem”, “sexo anal receptivo com último parceiro fixo homem”, “Sofreu algum tipo de discriminação no último ano?”, “contou para o pai ou mãe que sente atração sexual por homens”, “teve acesso a alguma informação ou insumo de prevenção de DST?”, e “participa ou conhece alguma atividade organizada por igreja/grupo religioso/ONG HIV/AIDS ou ONG de Direitos Humanos?” 1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013..

As análises das associações entre os fatores de vulnerabilidade, o resultado dos testes de HIV e sífilis foram realizadas com o uso do teste exato de Fisher, e o nível de significância foi 5%.

O protocolo de pesquisa foi conduzido de acordo os critérios éticos atendendo às exigências da Resolução no 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, para pesquisas envolvendo seres humanos e foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética e Pesquisa do Ministério da Saúde (CONEP) (protocolo no 14.494) e pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) (protocolo no 241/2008).

Resultados

O recrutamento dos participantes foi realizado por 18 “sementes”, entre as quais quatro produziram cadeias de recrutamento (Figura 1). A menor cadeia teve 12 participantes, seguidas de duas cadeias de tamanho intermediário, com 48 e 58 participantes, e a maior cadeia composta de 235 HSH. Entre os convites distribuídos 32,6% foram resgatados e 77,6% dos tíquetes-alimentação foram retirados pelos participantes.

Sessenta e nove por cento dos HSH relataram participar da pesquisa interessados em realizar o teste de HIV e 94% dos participantes aceitaram realizar o teste rápido para HIV e sífilis. O principal motivo para negar a realização do teste foi por tê-lo feito recentemente.

A heterogeneidade do recrutamento, considerando-se o resultado do teste rápido para o HIV, foi verificada a partir do coeficiente de homofilia. No grupo dos HSH soropositivos obteve-se uma medida de -0,274, e no grupo dos soronegativos de 0,011, ambas próximas de zero, indicando que não houve um viés para o recrutamento segundo a infecção pelo HIV e sífilis. A ausência de um padrão de recrutamento pode ser visualizada nas Figuras 1 e 2.

Segundo os fatores de vulnerabilidade individual (Tabela 1), 80% dos participantes tinham idade entre 18 e 29 anos, com média de idade de 25,3 anos (DP = 6,5 anos), e 51% iniciaram a vida sexual antes dos 15 anos. A prevalência da infecção por HIV foi de 6,5% (IC95%: 3,9; 9,0). O resultado do teste rápido para sífilis foi positivo para 8,8% (IC95%: 5,7; 11,7). Vinte e quatro por cento dos HSH relataram sintomas de DST nos 12 meses anteriores à participação na pesquisa e destes, 15% não buscaram tratamento. O número médio de parceiro(a)s sexuais foi de oito nos seis meses anteriores à participação na pesquisa. Nesse mesmo período, a porcentagem de sexo anal desprotegido receptivo com o último parceiro casual homem foi de 32% (IC95%: 25,8; 37,7), e esta prática com o último parceiro fixo homem foi relatada por 45% (IC95%: 37,6; 52,1) dos HSH.

Tabela 1
Análise descritiva da vulnerabilidade individual. Salvador, Bahia, Brasil, 2008-2009.

Para as variáveis socioeconômicas e demográficas (Tabela 2) que compuseram a vulnerabilidade social dos HSH, verificou-se que a maioria dos entrevistados era negro, pardo ou preto (91,4%; IC95%: 88,5; 94,3) e 33% (IC95%: 27,7; 37,4) tinham até 8 anos de estudo. A renda familiar acima de R$ 600,00 (US$ 300,00) foi informada por 67% (IC95%: 61,4; 73,0) dos entrevistados. Trinta e oito por cento dos HSH (IC95%: 32,7; 42,7) relataram estar sem trabalho no momento da entrevista. Entre os que estavam desempregados, 59% referiram ter procurado trabalho, mas não encontraram, e 71% disseram serem chefes do domicílio onde moravam. Cinquenta e sete por cento (IC95%: 51,6; 61,8) sofreram algum tipo de discriminação no ano anterior à participação na pesquisa. A atração sexual por outros homens não foi revelada para o pai ou mãe por 43,5% (IC95%: 38,2; 48,8) dos HSH.

Tabela 2
Análise descritiva da vulnerabilidade social e programática. Salvador, Bahoa, Brasil, 2008-2009.

Na análise da vulnerabilidade programática (Tabela 2), 63% (IC95%: 57,8; 67,9) dos participantes relataram não ter realizado o teste para detecção do HIV, e 20% (IC95%: 16,0; 24,3) não fizeram o teste da sífilis alguma vez na vida. No ano anterior à participação no estudo, 45% (IC95%: 39,7; 50,2) não usaram serviços de saúde do SUS, 79% tiveram acesso a algum tipo de insumo de prevenção para DST, 88% não receberam gel lubrificante, e 41% relataram a participação ou conhecimento de alguma atividade organizada por igreja/grupo religioso, ONG HIV/AIDS ou Direitos Humanos.

Os fatores de vulnerabilidade, tais como o resultado do teste rápido para sífilis, idade na data da entrevista, idade da primeira relação sexual, número total de parceiros sexuais nos seis meses anteriores à entrevista, realização prévia de teste de sífilis, e recebimento de gel lubrificante no ano anterior à participação na pesquisa, associaram-se à infecção por HIV. Os fatores categoria sexual, resultado do teste de HIV, idade na data da entrevista, idade da primeira relação sexual, teste de HIV na vida, conhecimento sobre onde se pode fazer o teste para HIV gratuitamente, teste prévio de sífilis, recebimento de material educativo ou informações sobre DST e participação em alguma atividade organizada associaram-se à ocorrência de sífilis na vida (Tabela 3).

Tabela 3
Prevalência de HIV e sífilis segundo os fatores de vulnerabilidade. Salvador, Bahia, Brasil, 2008-2009.

Discussão

A análise dos fatores das dimensões da vulnerabilidade permitiu apresentar o contexto social onde os HSH que participaram da pesquisa se inserem, além de uma descrição das suas características individuais (cognitivas, biológicas, emocionais etc.), e do acesso aos insumos e ações de prevenção à infecção por HIV e outras DST.

Na análise dos fatores de vulnerabilidade individual, como o resultado do teste rápido para HIV e sífilis, verificou-se que a prevalência destas DST foi elevada entre os HSH recrutados em Salvador, porém abaixo da média das dez cidades brasileiras 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35. (HIV: 14,2% e sífilis: 14%). Por outro lado, estas estimativas são altas quando comparadas com as prevalências na população geral de homens no Brasil (HIV: 0,8% e sífilis: 1,3%) 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.,2020 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Sífilis no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2003., população de homens trabalhadores da indústria (HIV: 1,7% e sífilis: 1,9%) 2121 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Prevalências e frequências relativas de doenças sexualmente transmissíveis (DST) em populações selecionadas de seis capitais brasileiras. Brasília: Ministério da Saúde; 2008., conscritos (HIV: 0,1% e sífilis: 0,5%) 2222 Szwarcwald CL, Andrade CLT, Pascom ARP, Fazito E, Pereira GFM, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saúde Pública 2011; 27 Suppl 1:S19-26., bem como no Projeto Bela Vista entre HSH (HIV: 2,1% e sífilis: 13,5%) 2323 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Bela Vista e Horizonte: estudos comportamentais e epidemiológicos entre homens que fazem sexo com homens. Brasília: Ministério da Saúde; 2000.. Para a infecção por HIV, pesquisas recentes que também usaram a metodologia RDS realizadas entre HSH em diferentes países, mostraram prevalências acima dos 10% 6Pando MA, Balán IC, Marone R, Dolezal C, Leu CS, Squiquera L, et al. HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men recruited by RDS in Buenos Aires, Argentina: high HIV and HPV infection. PLoS One 2012; 7:e39834.,2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2525 Dahoma M, Johnston LG, Holman A, Miller LA, Mussa M, Othman A, et al. HIV and related risk behavior among men who have sex with men in Zanzibar, Tanzania: results of a behavioral surveillance survey. AIDS Behav 2011; 15:186-92.,2626 Price H, Gilson R, Mercey D, Copas A, Parry J, Nardone A, et al. Hepatitis C in men who have sex with men in London: a community survey. HIV Med 2013; 14:578-80.. Alguns resultados apontam ainda para prevalências acima dos 30% 2727 Wheeler DP, Lauby JL, Liu KL, Van Sluytman LG, Murrill C. A comparative analysis of sexual risk characteristics of black men who have sex with men or with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:697-707.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.,2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35..

Em relação à sífilis, a prevalência encontrada é próxima a ser apresentada em estudos na literatura internacional 2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.,5Zou H, Fairley CK, Guy R, Bilardi J, Bradshaw CS, Garland SM, et al. Automated, computer generated reminders and increased detection of gonorrhoea, chlamydia and syphilis in men who have sex with men. PLoS One 2013; 8:e61972.,7Zoni AC, González MA, Sjögren HW. Syphilis in the most at-risk populations in Latin America and the Caribbean: a systematic review. Int J Infect Dis 2013; 17:e84-92.,8Clark JL, Konda KA, Segura ER, Salvatierra HJ, Leon SR, Hall ER, et al. Risk factors for the spread of HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men infected with HIV in Lima, Peru. Sex Transm Infect 2008; 84:449-54.,9Chow EP, Wilson DP, Zhang L. HIV and syphilis co-infection increasing among men who have sex with men in China: a systematic review and meta-analysis. PLoS One 2011; 6:e22768., inclusive nas pesquisas RDS com HSH 6Pando MA, Balán IC, Marone R, Dolezal C, Leu CS, Squiquera L, et al. HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men recruited by RDS in Buenos Aires, Argentina: high HIV and HPV infection. PLoS One 2012; 7:e39834.,3030 Deiss RG, Brouwer KC, Loza O, Lozada RM, Ramos R, Cruz MAF, et al. High-risk sexual and drug using behaviors among male injection drug users who have sex with men in 2 Mexico-US border cities. Sex Transm Dis 2008; 35:243-9., evidenciando a alta prevalência da sífilis entre os HSH entrevistados.

Os fatores analisados e que se mostram associados às altas prevalências do HIV, sífilis e DST na população dos HSH, em diferentes países, evidenciam que não só fatores biológicos, mas também aspectos da vida social, saúde mental, experiências afetivas, discriminações sofridas, bem outros aspectos subjetivos (como percepções, expectativas, entre outros), influenciam uma maior exposição a estas infecções. Desta forma as ações de prevenção e intervenção direcionadas aos HSH devem ser amplas, incluindo desde políticas sociais visando melhorar as condições de vida dos indivíduos e redução do estigma, bem como permitir uma maior aproximação com os serviços de saúde.

Entre os fatores da vulnerabilidade individual, que se associaram à infecção pelo HIV e ao resultado positivo para o teste rápido de sífilis, identificamos que os HSH entrevistados têm idade média (25 anos) próxima a encontrada no conjunto dos HSH das dez cidades brasileiras (27,5 anos) 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35., porém são bem mais jovens em comparação com os HSH de pesquisas RDS em outros países, onde as idades médias estão entre 30 e 41 anos de idade 2Cáceres CF, Konda K, Segura ER, Lyerla R. Epidemiology of male same-sex behaviour and associated sexual health indicators in low- and middle-income countries: 2003-2007 estimates. Sex Transm Infect 2008; 84 Suppl 1:i49-56.,4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.,2525 Dahoma M, Johnston LG, Holman A, Miller LA, Mussa M, Othman A, et al. HIV and related risk behavior among men who have sex with men in Zanzibar, Tanzania: results of a behavioral surveillance survey. AIDS Behav 2011; 15:186-92.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.,3030 Deiss RG, Brouwer KC, Loza O, Lozada RM, Ramos R, Cruz MAF, et al. High-risk sexual and drug using behaviors among male injection drug users who have sex with men in 2 Mexico-US border cities. Sex Transm Dis 2008; 35:243-9.,3131 Mimiaga MJ, Goldhammer H, Belanoff C, Tetu AM, Mayer KH. Men who have sex with men: perceptions about sexual risk, HIV and sexually transmitted disease testing, and provider communication. Sex Transm Dis 2007; 34:113-9.. Isso pode ser considerado um viés de recrutamento na pesquisa, mas também pode refletir aspectos da população de homens de Salvador, que tem maior percentual na faixa etária entre 15 e 39 anos, segundo o Censo Demográfico de 2010 3232 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores sociais municipais: uma análise dos resultados do universo do Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2011..

A idade do início da vida sexual, antes dos 15 anos foi um fator que se associou ao HIV e sífilis. A porcentagem de infecção pelo HIV nesta faixa etária (50,8%) é maior do que a encontrada em outros estudos: homens com idade entre 15 e 64 anos (26,8%), população de homens na mesma faixa etária dos participantes (17%) 3333 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Pesquisa de conhecimentos, atitudes e práticas na população (PCAP) brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., em populações de jovens brasileiros 3434 Heilborn ML. Iniciação à sexualidade: métodos de socialização, interações de gênero e trajetórias individuais. In: Heilborn ML, Aquino EML, Bonzon M, Knauth DR, organizadores. O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais de jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Editora Garamond/Editora Fiocruz; 2006. p. 156-206.,3535 Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R. Idade e uso de preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública 2008; 42 Suppl 1:45-53., e mesmo entre homens jovens 3636 Heilborn ML, Cabral CS. As trajetórias homo-bissexuais. In: Heilborn ML, Aquino EML, Bonzon M, Knauth DR, organizadores. O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais de jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Editora Garamond/Editora Fiocruz; 2006. p. 361-97..

Este fator não foi explorado nas pesquisas acessadas, com HSH, mas outros resultados mostram sua importância e relação com aspectos da atividade sexual e saúde reprodutiva na população dos jovens brasileiros 3333 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Pesquisa de conhecimentos, atitudes e práticas na população (PCAP) brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.,3535 Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R. Idade e uso de preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública 2008; 42 Suppl 1:45-53., pois segundo alguns pesquisadores os comportamentos experimentados na primeira relação podem se manter por toda a vida sexual dos indivíduos. Além disso, baixa idade da iniciação sexual é um fator de risco para DST e infecção pelo HIV 3535 Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R. Idade e uso de preservativo na iniciação sexual de adolescentes brasileiros. Rev Saúde Pública 2008; 42 Suppl 1:45-53..

Alguns fatores relacionados às praticas sexuais dos HSH são apresentados como associados à infecção pelo HIV e DST, incluindo o número elevado de parceiros, que pode aumentar a exposição à infecção por HIV, principalmente se houver um uso inconsistente do preservativo na prática do sexo anal, o que pode ocorrer por causa do uso de álcool, substâncias psicoativas antes e durante as relações, ou como reflexo do estigma e discriminação sofrido por esses homens 3737 Baggaley RF, White RG, Boily MC. HIV transmission risk through anal intercourse: systematic review, meta-analysis and implications for HIV prevention. Int J Epidemiol 2010; 39:1048-63.,3838 Beyrer C, Sullivan PS, Sanchez J, Dowdy D, Altman D, Trapence G, et al. A call to action for comprehensive HIV services for men who have sex with men. Lancet 2012; 380:424-38.. Algumas pesquisas RDS mostraram um número médio de parceiros sexuais inferiores ao encontrado entre os HSH entrevistados 2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.,3939 Johnston L, O’Bra H, Chopra M, Mathews C, Townsend L, Sabin K, et al. The associations of voluntary counseling and testing acceptance and the perceived likelihood of being HIV-infected among men with multiple sex partners in a South African township. AIDS Behav 2010; 14:922-31.,4040 Reisner SL, Mimiaga MJ, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Problematic alcohol use and HIV risk among black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Care 2010; 22:577-87., porém nossos achados se aproximam de outros resultados também oriundos de pesquisas RDS com HSH 6Pando MA, Balán IC, Marone R, Dolezal C, Leu CS, Squiquera L, et al. HIV and other sexually transmitted infections among men who have sex with men recruited by RDS in Buenos Aires, Argentina: high HIV and HPV infection. PLoS One 2012; 7:e39834.,2525 Dahoma M, Johnston LG, Holman A, Miller LA, Mussa M, Othman A, et al. HIV and related risk behavior among men who have sex with men in Zanzibar, Tanzania: results of a behavioral surveillance survey. AIDS Behav 2011; 15:186-92.,2727 Wheeler DP, Lauby JL, Liu KL, Van Sluytman LG, Murrill C. A comparative analysis of sexual risk characteristics of black men who have sex with men or with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:697-707.,3030 Deiss RG, Brouwer KC, Loza O, Lozada RM, Ramos R, Cruz MAF, et al. High-risk sexual and drug using behaviors among male injection drug users who have sex with men in 2 Mexico-US border cities. Sex Transm Dis 2008; 35:243-9.. Todavia, tais diferenças podem ser devidas à falta de padrão no período em que se computou o número de parceiros, que varia muito na literatura, ou ainda a características como tamanho da rede social dos HSH, idade, escolaridade e classe social, fatores que podem se associar ao número de parceiros sexuais nesta população.

A prática do sexo anal receptivo desprotegido foi analisada separadamente, com o último parceiro casual, e posteriormente com o último parceiro fixo. Observaram-se frequências elevadas desta prática entre os participantes deste estudo, quando comparados aos padrões observados em outros países 1Beyrer C, Baral SD, van Griensven F, Goodreau SM, Chariyalertsak S, Wirtz AL, et al. Global epidemiology of HIV infection in men who have sex with men. Lancet 2012; 380:367-77., no entanto, duas pesquisas RDS tiveram resultados com percentuais 2525 Dahoma M, Johnston LG, Holman A, Miller LA, Mussa M, Othman A, et al. HIV and related risk behavior among men who have sex with men in Zanzibar, Tanzania: results of a behavioral surveillance survey. AIDS Behav 2011; 15:186-92.,4141 Lauby JL, Millett GA, LaPollo AB, Bond L, Murrill CS, Marks G. Sexual risk behaviors of HIV-positive, HIV-negative, and serostatus-unknown Black men who have sex with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:708-19. menores do que Salvador, porém, para parceiros casuais. Outras pesquisas RDS apresentaram porcentagens similares às encontradas em Salvador 2727 Wheeler DP, Lauby JL, Liu KL, Van Sluytman LG, Murrill C. A comparative analysis of sexual risk characteristics of black men who have sex with men or with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:697-707.,3030 Deiss RG, Brouwer KC, Loza O, Lozada RM, Ramos R, Cruz MAF, et al. High-risk sexual and drug using behaviors among male injection drug users who have sex with men in 2 Mexico-US border cities. Sex Transm Dis 2008; 35:243-9., indicando uma maior exposição dos HSH entrevistados, visto que a probabilidade de infecção por HIV pode chegar a 40,4% por parceiro sexual, se a relação sexual anal receptiva for desprotegida 3737 Baggaley RF, White RG, Boily MC. HIV transmission risk through anal intercourse: systematic review, meta-analysis and implications for HIV prevention. Int J Epidemiol 2010; 39:1048-63..

A vulnerabilidade social também tem um papel relevante no contexto das DST, pois pode dificultar o acesso à educação, trabalho, serviços de saúde e outros processos de proteção a estas infecções. A categoria sexual mostrou-se associada ao resultado do teste de sífilis, sendo a prevalência da sífilis e HIV maior entre os homossexuais. Em geral, na literatura a identidade sexual se encontra associada às práticas sexuais de risco para a infecção por HIV 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35.,3838 Beyrer C, Sullivan PS, Sanchez J, Dowdy D, Altman D, Trapence G, et al. A call to action for comprehensive HIV services for men who have sex with men. Lancet 2012; 380:424-38.,4242 Berry M, Wirtz AL, Janayeva A, Ragoza V, Terlikbayeva A, Amirov B, et al. Risk factors for HIV and unprotected anal intercourse among men who have sex with men (MSM) in Almaty, Kazakhstan. PLoS One 2012; 7:e43071., ao estigma 2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35., dificuldade de acesso a serviços de saúde 3131 Mimiaga MJ, Goldhammer H, Belanoff C, Tetu AM, Mayer KH. Men who have sex with men: perceptions about sexual risk, HIV and sexually transmitted disease testing, and provider communication. Sex Transm Dis 2007; 34:113-9.,4343 Baral S, Burrell E, Scheibe A, Brown B, Beyrer C, Bekker LG. HIV risk and associations of HIV infection among men who have sex with men in peri-urban Cape Town, South Africa. BMC Public Health 2011; 11:766., e também à infecção pelo HIV 2626 Price H, Gilson R, Mercey D, Copas A, Parry J, Nardone A, et al. Hepatitis C in men who have sex with men in London: a community survey. HIV Med 2013; 14:578-80.,4343 Baral S, Burrell E, Scheibe A, Brown B, Beyrer C, Bekker LG. HIV risk and associations of HIV infection among men who have sex with men in peri-urban Cape Town, South Africa. BMC Public Health 2011; 11:766..

Outro fator que se associou ao resultado positivo para os testes de HIV e sífilis foi a revelação da identidade sexual para o pai ou mãe. Estes resultados podem indicar uma dificuldade dos HSH em assumir sua sexualidade na família, o que pode ser reflexo do preconceito e estigma observados na sociedade baiana. Salvador, assim como o Brasil, ainda é pouco tolerante com a população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais), e figura entre as cidades com maior número de crimes violentos e homicídios contra esta população 4444 Secretaria de Direitos Humanos, Presidência da República. Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2012. Brasília: Presidência da República; 2012.,4545 Venturi G. Diversidade sexual e homofobia no Brasil. Intolerância e respeito às diferenças sexuais. São Paulo: Fundação Perseu Abramo; 2010..

Nesse estudo, encontrou-se uma alta porcentagem de experiência com algum tipo de discriminação, seja relacionada a questões de raça/cor da pele, condição social, idade ou orientação sexual. Essa realidade também foi identificada em outras pesquisas RDS com HSH em outros países 2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35.,3131 Mimiaga MJ, Goldhammer H, Belanoff C, Tetu AM, Mayer KH. Men who have sex with men: perceptions about sexual risk, HIV and sexually transmitted disease testing, and provider communication. Sex Transm Dis 2007; 34:113-9., sendo um importante fator associado à violência e barreira para o acesso ao serviço de saúde. As experiências com o estigma e discriminação também são apontadas na literatura como associadas às práticas sexuais de risco para a infecção por HIV e outras DST, sobretudo em populações estigmatizadas 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,1414 Gruskin S, Tarantola D. Universal access to HIV prevention, treatment and care: assessing the inclusion of human rights in international and national strategic plans. AIDS 2008; 22 Suppl 2: S123-32.,3838 Beyrer C, Sullivan PS, Sanchez J, Dowdy D, Altman D, Trapence G, et al. A call to action for comprehensive HIV services for men who have sex with men. Lancet 2012; 380:424-38..

Fatores relacionados ao acesso a testes para HIV e sífilis, a insumos, informações e ações de prevenção e serviços de saúde, fazem parte da dimensão da vulnerabilidade programática. A realização do teste para HIV é uma importante ação de saúde pública na prevenção e diagnóstico precoce da infecção.

A porcentagem de participantes que relataram teste prévio de HIV (37%) foi próxima a média da população geral (36,5%) 3333 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Pesquisa de conhecimentos, atitudes e práticas na população (PCAP) brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., e mais alta que na população de homens no Brasil (27%) 3333 Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Pesquisa de conhecimentos, atitudes e práticas na população (PCAP) brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., porém cerca de 50% menor do que o percentual encontrado numa população de HSH negros e latinos em cidades estadunidenses 2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,4141 Lauby JL, Millett GA, LaPollo AB, Bond L, Murrill CS, Marks G. Sexual risk behaviors of HIV-positive, HIV-negative, and serostatus-unknown Black men who have sex with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:708-19., ou ainda, entre HSH com práticas de alto risco para infecção por HIV 2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.. Também foi menor do que resultados apresentados no último relatório do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) (42%) 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013. e na pesquisa multicêntrica brasileira (49%) 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35. e outras populações de HSH 4242 Berry M, Wirtz AL, Janayeva A, Ragoza V, Terlikbayeva A, Amirov B, et al. Risk factors for HIV and unprotected anal intercourse among men who have sex with men (MSM) in Almaty, Kazakhstan. PLoS One 2012; 7:e43071.. Este é um dos indicadores mais importantes para monitorar a epidemia de HIV, visto que contribui para uma aproximação dos sujeitos com os serviços de saúde, e pode ser uma das principais portas de entrada para o cuidado e atenção à saúde via aconselhamento e acolhimento voltado para HIV e DST, o que possibilita o contato com informações e ações de prevenção.

O relato da realização prévia do teste de sífilis se associou à infecção por HIV e sífilis, assim como em outros estudos 2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92., mas também pode se associar às praticas sexuais de risco para DST 2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2727 Wheeler DP, Lauby JL, Liu KL, Van Sluytman LG, Murrill C. A comparative analysis of sexual risk characteristics of black men who have sex with men or with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:697-707.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.,4141 Lauby JL, Millett GA, LaPollo AB, Bond L, Murrill CS, Marks G. Sexual risk behaviors of HIV-positive, HIV-negative, and serostatus-unknown Black men who have sex with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:708-19..

Neste estudo observou-se uma alta frequência para o teste prévio de sífilis (79,9%) quando comparado com a frequência para o teste prévio de HIV (37,2%), apontando para as oportunidades perdidas para se realizar o teste do HIV por ocasião do teste da sífilis, contrariando a política nacional de enfrentamento da epidemia do HIV 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.. Lembramos que é consenso na literatura a necessidade de ampliar a testagem para DST e HIV, entre outras medidas que visam reduzir o risco de infecção do HIV e DST 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2525 Dahoma M, Johnston LG, Holman A, Miller LA, Mussa M, Othman A, et al. HIV and related risk behavior among men who have sex with men in Zanzibar, Tanzania: results of a behavioral surveillance survey. AIDS Behav 2011; 15:186-92.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92.,2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35.,3131 Mimiaga MJ, Goldhammer H, Belanoff C, Tetu AM, Mayer KH. Men who have sex with men: perceptions about sexual risk, HIV and sexually transmitted disease testing, and provider communication. Sex Transm Dis 2007; 34:113-9.,4141 Lauby JL, Millett GA, LaPollo AB, Bond L, Murrill CS, Marks G. Sexual risk behaviors of HIV-positive, HIV-negative, and serostatus-unknown Black men who have sex with men and women. Arch Sex Behav 2008; 37:708-19..

Somado à realização dos testes para HIV e sífilis, o uso dos serviços públicos de saúde pode diminuir a vulnerabilidade programática dos HSH, pois espera que, ao se entrar em contato com informações sobre redução do risco de infecção pelo HIV e DST, os indivíduos estejam mais preparados para práticas sexuais mais seguras. Os HSH entrevistados apresentaram uma porcentagem de uso dos serviços de saúde (59%) acima da média da população masculina brasileira (9%) 4646 Travassos C, Viacava F, Pinheiro R, Brito A. Utilização dos serviços de saúde no Brasil: gênero, características familiares e condição social. Rev Panam Salud Pública 2002; 11:365-73., visto que, no Brasil, outros resultados mostram que os homens buscam menos os serviços de saúde 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.7Zoni AC, González MA, Sjögren HW. Syphilis in the most at-risk populations in Latin America and the Caribbean: a systematic review. Int J Infect Dis 2013; 17:e84-92., sobretudo para a população de homens com prática homossexual 4848 Terto Jr. V. Homossexualidade e saúde: desafios para a terceira década de epidemia de HIV/AIDS. Horizontes Antropológicos 2002; 8:147-58., o que também ocorre em outros países 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35.. Vale ressaltar que nossos resultados mostraram porcentagens menores do que as encontradas em diferentes regiões pesquisadas nos Estados Unidos 2424 Mimiaga MJ, Reisner SL, Bland S, Skeer M, Cranston K, Isenberg D, et al. Health system and personal barriers resulting in decreased utilization of HIV and STD testing services among at-risk black men who have sex with men in Massachusetts. AIDS Patient Care STDS 2009; 23:825-35.,2828 Johnson CV, Mimiaga MJ, Reisner SL, Tetu AM, Cranston K, Bertrand T, et al. Health care access and sexually transmitted infection screening frequency among at-risk Massachusetts men who have sex with men. Am J Public Health 2009; 99 Suppl 1:S187-92..

O acesso ao gel lubrificante se associou à infecção por HIV e sífilis na vida, a dificuldade de acesso ao gel lubrificante foi registrada também em outros países na população de HSH 3838 Beyrer C, Sullivan PS, Sanchez J, Dowdy D, Altman D, Trapence G, et al. A call to action for comprehensive HIV services for men who have sex with men. Lancet 2012; 380:424-38.,4242 Berry M, Wirtz AL, Janayeva A, Ragoza V, Terlikbayeva A, Amirov B, et al. Risk factors for HIV and unprotected anal intercourse among men who have sex with men (MSM) in Almaty, Kazakhstan. PLoS One 2012; 7:e43071.. Este insumo é fundamental para a prevenção da infecção por HIV 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.. Embora a distribuição gratuita e prioritária destes insumos para as populações vulneráveis no Brasil tenha aumentado nos últimos anos, este acesso ainda é limitado, sendo um grande desafio para o SUS brasileiro, principalmente entre os grupos mais expostos ao HIV 4Programa Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde. Relatório de progresso da resposta brasileira ao HIV/AIDS (2010-2011)-UNGASS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010.,3838 Beyrer C, Sullivan PS, Sanchez J, Dowdy D, Altman D, Trapence G, et al. A call to action for comprehensive HIV services for men who have sex with men. Lancet 2012; 380:424-38..

A identificação de indivíduos em populações de difícil acesso ou “escondidas” 1818 Salganik MJ, Heckathorn DD. Sampling and estimation in hidden populations using respondent-driven sampling. Sociol Methodol 2004; 34:193-240.,1919 Magnani R, Sabin K, Saidel T, Heckathorn D. Review of sampling hard-to-reach and hidden populations for HIV surveillance. AIDS 2005;19 Suppl 2:S67-72., como os HSH, no contexto da epidemia do HIV, ainda permanece como um grande desafio para a pesquisa epidemiológica. Isso se deve, sobretudo, porque a relação afetiva ou sexual entre pessoas do mesmo sexo enfrenta um alto grau de discriminação social e violência tanto no Brasil 4444 Secretaria de Direitos Humanos, Presidência da República. Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2012. Brasília: Presidência da República; 2012.,4545 Venturi G. Diversidade sexual e homofobia no Brasil. Intolerância e respeito às diferenças sexuais. São Paulo: Fundação Perseu Abramo; 2010. como em outros países 1212 Joint United Nations Programme on HIV/AIDS. Global report: UNAIDS report on the global AIDS epidemic. Geneva: World Health Organization; 2013.,2929 Mizuno Y, Borkowf C, Millett GA, Bingham T, Ayala G, Stueve A. Homophobia and racism experienced by Latino men who have sex with men in the United States: correlates of exposure and associations with HIV risk behaviors. AIDS Behav 2012; 16:724-35.. Pesquisas que empregam a metodologia RDS são, atualmente, uma das opções para acessar essas populações diante da impossibilidade de obtenção de uma amostra aleatória 1818 Salganik MJ, Heckathorn DD. Sampling and estimation in hidden populations using respondent-driven sampling. Sociol Methodol 2004; 34:193-240.,1919 Magnani R, Sabin K, Saidel T, Heckathorn D. Review of sampling hard-to-reach and hidden populations for HIV surveillance. AIDS 2005;19 Suppl 2:S67-72.,4949 Malekinejad M, Johnston LG, Kendall C, Kerr LRFS, Rifkin MR, Rutherford GW. Using respondent-driven sampling methodology for HIV biological and behavioral surveillance in international settings: a systematic review. AIDS Behav 2008; 12:105-30.. O RDS apresenta uma relativa eficiência no acesso às redes de relacionamento pessoal das populações de difícil acesso 4949 Malekinejad M, Johnston LG, Kendall C, Kerr LRFS, Rifkin MR, Rutherford GW. Using respondent-driven sampling methodology for HIV biological and behavioral surveillance in international settings: a systematic review. AIDS Behav 2008; 12:105-30., por isso muitos pesquisadores têm usado esta técnica para recrutar indivíduos nestas populações classificadas como “escondidas” 4949 Malekinejad M, Johnston LG, Kendall C, Kerr LRFS, Rifkin MR, Rutherford GW. Using respondent-driven sampling methodology for HIV biological and behavioral surveillance in international settings: a systematic review. AIDS Behav 2008; 12:105-30..

Em Salvador se formaram quatro cadeias de recrutamento, porém para atingir esse resultado, o estudo utilizou um número elevado de “sementes”. Alguns dos recrutadores iniciais não deram segmento ao recrutamento, refletindo a dificuldade de acessar a população dos HSH nesta cidade e isto aconteceu especialmente entre os HSH de classe sociais mais elevadas e idade acima de 25 anos. Outra dificuldade no recrutamento foi convencer os homens das redes de relacionamentos a se deslocarem para uma unidade de saúde do SUS.

Limitações

A metodologia utilizada apresenta algumas limitações que são amplamente discutidas na literatura e dizem respeito ao cálculo do tamanho da amostra, à dependência entre as unidades amostrais e à definição dos estimadores 5050 White RG, Lansky A, Goel S, Wilson D, Hladik W, Hakim A, et al. Respondent driven sampling-where we are and where should we be going? Sex Transm Infect 2012; 88:397-9.. Embora algumas propostas de análises se mostrem otimistas, os problemas persistem e limitam as interpretações dos resultados que não podem ser generalizados para as populações alvo das análises 5050 White RG, Lansky A, Goel S, Wilson D, Hladik W, Hakim A, et al. Respondent driven sampling-where we are and where should we be going? Sex Transm Infect 2012; 88:397-9.. Além disso, na amostra estudada identificamos um viés de seleção para um conjunto de homens mais jovens, negros ou pardos e de classes sociais mais populares. Os resultados dos testes de hipóteses devem ser avaliados com cautela por conta da dependência entre as unidades amostrais (recrutador-recrutado) que estão inseridas numa mesma rede social. No entanto, mesmo tendo em conta as limitações descritas, acreditamos que estes resultados refletem aspectos importantes da vulnerabilidade individual, social e programática dos HSH no contexto da epidemia entre os participantes da pesquisa em Salvador.

Conclusão

Os resultados encontrados na análise dos fatores da vulnerabilidade 1010 Ayres JRCM, França Júnior I, Calazans GJ, Saletti Filho HC. O conceito de vulnerabilidade e as práticas de saúde: novas perspectivas e desafios. In: Czeresnia D, Freitas CM, organizadores. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. p. 121-43.,1111 Mann JM, Tarantola D. AIDS in the World II. Oxford: Oxford University Press; 1996. entre os HSH que participaram da pesquisa em Salvador 3Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AA, Mello MB, Guimarães MD, et al. HIV among MSM in a large middle-income country. AIDS 2012; 27:427-35.,1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013. mostram uma situação de alta vulnerabilidade individual, social e programática. Além disso, a sinergia destes fatores pode amplificar o quadro de vulnerabilidade apresentado 1515 Delor F, Hubert M. Revisiting the concept of “vulnerability”. Soc Sci Med 2000; 50:1557-70.. Relatos de experiências com discriminação e falta de emprego formal, baixo nível educacional e dificuldade de acesso a insumos e informações de prevenção a DST fazem parte da realidade e parecem marcar as “trajetórias pessoais” 1515 Delor F, Hubert M. Revisiting the concept of “vulnerability”. Soc Sci Med 2000; 50:1557-70. destes homens 1616 Brignol SMS. Estudo epidemiológico da infecção por HIV entre homens que fazem sexo com homens no município de Salvador [Tese de Doutorado]. Salvador: Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia; 2013.. Estes resultados corroboram achados da literatura em outras populações de HSH, indicando que a implantação de ações de prevenção e intervenção é urgente visando uma redução destas vulnerabilidades e da infecção pelo HIV e sífilis entre os HSH soteropolitanos.

Agradecimentos

Agradecemos ao Departamento de HIV/AIDS e HV do Ministério da Saúde do Brasil e às agências financiadoras, à coordenação do projeto Comportamento, Atitudes, Práticas e Prevalência de HIV e Sífilis entre Homens que Fazem Sexo com Homens em 10 cidades Brasileiras, Capes, CNPq, Grupo Gay da Bahia (GGB), aos homens participantes da pesquisa, ao Núcleo de Ensino e Pesquisa em AIDS e Outras Doenças Infecciosas, Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal da Bahia (NEPADI/ISC/UFBA), aos bolsistas de iniciação científica pelo apoio técnico, à equipe de entrevistadores, profissionais de saúde e indispensável supervisão de campo de Rafaela Santos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Maio 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2013
  • Revisado
    06 Jun 2014
  • Aceito
    24 Set 2014
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br