Geoffrey Rose e o princípio da precaução: para construir a prevenção quaternária na prevenção

Geoffrey Rose y el principio de la precaución: para construir la prevención cuaternaria en la prevención

Charles Dalcanale Tesser Armando Henrique Norman Sobre os autores

Resumos

A prevenção tem sido medicalizada gerando danos iatrogênicos frequentes. Isso demanda prevenção quaternária (P4): evitar medicalização/intervencionismo desnecessários e danos iatrogênicos correlatos. Apresentamos, neste artigo, uma articulação conceitual orientadora da P4 na prevenção. Geoffrey Rose distinguiu entre medidas preventivas “redutivas” (reduzem riscos derivados da vida moderna, como sedentarismo e ultraprocessados na alimentação) e “aditivas” (adicionam fatores artificiais protetores, como vacinações, rastreamentos, fármacos hipolipemiantes). O grande potencial de danos das medidas preventivas aditivas exige aplicação sistemática do princípio da precaução. Este orienta que, havendo dúvidas científicas sobre danos potenciais significativos de uma atividade, o Estado deve ativamente evitá-los, por meio de atribuição do ônus da prova de eficácia/segurança da atividade aos proponentes, exploração de alternativas inofensivas e aumento da participação pública na decisão. Tal aplicação, crucial para a P4 na prevenção, amiúde não ocorre em práticas preventivas de alta prevalência e iatrogenia.

Prevenção quaternária; Prevenção de doenças; Atenção primária à saúde


La prevención se ha medicalizado generando daños iatrogénicos frecuentes. Eso demanda prevención cuaternaria (P4): evitar medicalización/intervencionismo innecesarios y daños iatrogénicos correlacionados. En este artículo presentamos una articulación conceptual orientadora de la P٤ en la prevención. Geoffrey Rose distinguió entre medidas preventivas “reductivas” (reducen riesgos derivados de la vida moderna, como sedentarismo y ultraprocesados en la alimentación) y “adictivas” (añaden factores artificiales protectores como vacunaciones, rastreos, fármacos hipolipemiantes). El gran potencial de daños de las medidas preventivas adictivas exige aplicación sistemática del principio de la precaución. Este orienta a que, habiendo dudas científicas sobre daños potenciales significativos de una actividad, el Estado debe activamente evitarlos por medio de atribución del peso de la prueba de eficacia/seguridad de la actividad a los proponentes, exploración de alternativas inofensivas y aumento de la participación pública en la decisión. Tal aplicación, crucial para la P4 en la prevención, a menudo no ocurre en prácticas preventivas de alta prevalencia y iatrogenia.

Prevención cuaternaria; Prevención de enfermedades; Atención primaria de la salud


Introdução

A prevenção quaternária (P4) foi definida como identificar pessoas em risco de excesso de medicalização para protegê-las de novas intervenções médicas e sugerir-lhes ações eticamente aceitáveis11. Bentzen N, editor. Wonca dictionary of general/family practice. Copenhagen: Maanedsskrift for Praktisk Laegegerning; 2003.. Ela vem se desenvolvendo lentamente em vários países22. Jamoulle M. Prevenção quaternária: primeiro não causar dano. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2015; 10(35):1-3. e é um tipo peculiar de ação preventiva: não é voltada a doenças, às pessoas ou ao contexto social ou ambiental, mas ao agir profissional-institucional, visando reduzir o comum excesso de intervenções e seus danos iatrogênicos33. Tesser CD. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Rev Saude Publica. 2017; 51:116..

A P4 é importante na prevenção, especialmente na atenção primária à saúde (APS) e na saúde pública, por várias razões. Como pano de fundo, destaca-se o grande potencial de danos e de medicalização44. Illich I. Nêmesis da medicina: a expropriação da saúde. São Paulo: Nova Fronteira; 1975. das ações clínico-sanitárias55. Makary MA, Daniel M. Medical error-the third leading cause of death in the US. BMJ. 2016; 353:i2139.. Dentre estas, as ações preventivas em indivíduos assintomáticos são uma situação sui generis, em que grande número de pessoas é exposto a potenciais efeitos adversos sem potencial de benefícios66. Gray JAM. New concepts in screening. Br J Gen Pract. 2004; 54(501):292-8.. Ações de prevenção primária (como vacinas e redução de fatores de risco [estatinas e hipotensores]) e secundária (como rastreamentos) vêm proliferando tanto na saúde pública como na clínica; e, frequentemente, tratamentos preventivos são confundidos com cuidado aos doentes77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316..

Além disso, o disease mongering88. Moynihan R, Doran E, Henry D. Disease mongering is now part of the global health debate. PLoS Med. 2008; 5(5):e106.,99. Doran E, Hogue C. Potency, hubris and susceptibility: the disease mongering critique of pharmaceutical marketing. Qual Rep. 2014; 19(39):1-18. (tráfico ou marketing de doenças e riscos) transforma sadios em doentes – pessoas que se consideram doentes e são assim tratadas pelos profissionais –, transformando-os em consumidores crônicos de intervenções preventivas. Isso ocorre por meio do rebaixamento dos pontos de corte para alto risco e flexibilização dos critérios diagnósticos de doenças/transtornos, além da propaganda de tecnologias preventivas. Tal processo interfere na cultura e na produção do saber clínico e preventivo, aumentando a medicalização da prevenção e seus danos33. Tesser CD. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Rev Saude Publica. 2017; 51:116..

Outra razão é a grande tolerância aos danos das ações preventivas. Tais danos estão se diluindo no oceano tolerado dos comuns efeitos adversos dos tratamentos biomédicos. Além disso, há a impossibilidade de percepção de parte deles, como no caso dos sobrediagnósticos. O sobrediagnóstico acontece quando pessoas têm um diagnóstico corretamente confirmado de uma doença, mas não têm sintomas nem teriam sua vida ameaçada pela doença no futuro. Elas são tratadas (neste caso, sobretratadas) porque são indistinguíveis das pessoas diagnosticadas que adoeceriam1010. Carter SM, Barratt A. What is overdiagnosis and why should we take it seriously in cancer screening? Public Health Res Pract. 2017; 27(3):e2731722.. Isso ocorre em grandes proporções nos rastreamentos1111. Welch HG, Black WC. Overdiagnosis in cancer. J Natl Cancer Inst. 2010; 102(9):605-13.,1212. Tesser CD, D’Ávila TLC. Por que reconsiderar a indicação do rastreamento do câncer de mama? Cad. Saúde Pública. 2016; 32(5):e00095914., gerando o paradoxo da popularidade1313. Welch HG, Schwartz L, Wolosin S. Overdiagnosed: making people sick in the pursuit of health. Boston: Beacon Press; 2011.: pessoas sobrediagnosticadas e sobretratadas consideram que foram salvas pelo rastreamento, mas foram prejudicadas. Os danos são interpretados como benefícios (ou efeitos adversos supostamente compensados pela ‘cura’ da doença/risco, a qual, entretanto, é quimérica): iatrogenia/gastos dos fármacos e outros tratamentos – graves e mutilantes, no caso dos cânceres; transtornos/gastos/iatrogenia da investigação e seguimento a longo prazo; impactos relevantes frequentes na saúde mental e na subjetividade da pessoa e familiares (ansiedade, depressão, medo de recidiva etc.). O efeito disso no imaginário social é uma onda crescente autoalimentadora de crenças cegas na necessidade de exames e tratamentos preventivos. O sobrediagnóstico é um relevante problema de saúde pública1414. Moynihan R, Doust J, Henry D. Preventing overdiagnosis: how to stop harming the healthy. BMJ. 2012; 344:e3502.,1515. Bulliard JL, Chiolero A. Screening and overdiagnosis: public health implications. Public Health Rev. 2015; 36(1):1-5. a exigir P4.

A tolerância aos danos das ações preventivas também vem sendo induzida pelo poder dos Estados e, mais recentemente, da biotecnologia na promoção dessas ações, associada ao intenso processo de biomedicalização social1616. Rose N. Beyond medicalisation. Lancet. 2007; 369(9562):700-2.,1717. Clarke AE, Mamo L, Fosket JR, Fishman JR, Shim JK. Biomedicalization: technoscience, health, and illness in the U.S.. Durhan: Duke University Press; 2010..

A P4 na APS é uma necessidade1818. Norman AH, Tesser CD. Prevenção quaternária na atenção primária à saúde: uma necessidade do Sistema Único de Saúde. Cad Saude Publica. 2009; 25(9):2012-20.. No cuidado aos doentes, ela é operacionalizável na interpretação das situações clínicas e na negociação dos tratamentos, por meio do uso judicioso das palavras, da adoção de modelos explicativos dinâmicos na socialização com os usuários das interpretações profissionais (diagnósticos), da singularização de terapêuticas e da distinção entre cuidado ao adoecimento presente e futuro (prevenção)1919. Norman AH, Tesser CD. Prevenção quaternária: as bases para sua operacionalização na relação médico-paciente. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2015; 10(35):1-10.. Esta distinção é crucial para a P4 na prevenção77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316..

No cuidado ao adoecido, que pressiona por tratamento, é aceitável alguma tolerância ao intervencionismo, que supõe grande confiança no saber médico, nas suas tecnologias e na experiência dos profissionais. Ações preventivas em assintomáticos exigem, inversamente: resistência ao intervencionismo biotecnológico; desconfiança do saber e da experiência médico-científicos; exigência de evidências empíricas científicas de ótima qualidade e idoneidade sobre resultados finais da ação proposta, confrontando seus danos e benefícios77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316..

Na clínica do doente, a ação terapêutica não é obstruída pela ausência dessas evidências, embora cada vez mais elas sejam exigidas. Na prevenção, ao contrário, tal ausência, um balanço danos-benefícios duvidoso ou apenas fracamente favorável deve contraindicar a intervenção, em função da proeminência da não maleficência na prevenção, em relação à beneficência77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316.,2020. Segura A. Inducción sanitaria de los cribados: impacto y consecuencias. Aspectos éticos. Gac Sanit. 2006; 20 Supl 1:88-95. (Figura 1).

Figura 1
Diferenças entre o adoecimento e prevenção em assintomáticos

* Evidência = evidências científicas idôneas de ótima qualidade e convergentes sobre desfechos finais, mostrando significativos e amplos benefícios (revisões sistemáticas e metanálises) e poucos danos.

Visando contribuir para a orientação da P4 na prevenção, este artigo articula três conceitos. Dois foram propostos por Geoffrey Rose2121. Rose G. The strategy of preventive medicine. Oxford: OUP; 1993.,2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010., denominados medidas preventivas ‘redutivas’ e ‘aditivas’. As primeiras referem-se a “remover ou reduzir alguma exposição artificial de modo a restaurar um estado de normalidade biológica”2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010. (p. 148). As segundas significam “adicionar algum fator artificial na esperança de conferir proteção” (idem). O terceiro conceito é o princípio da precaução (PP), desenvolvido no direito ambiental, a partir dos problemas ecológicos contemporâneos2323. Raffensperger C, Tickner J, editors. Protecting public health and the environment: implementing the precautionary principle. Washington, DC: Island Press; 1999.,2424. Sands F. Principles of international environmental laws. 2nd ed. New York: Cambridge University Press; 2003.. Ele orienta que frente a perigos e danos potenciais significativos decorrentes de uma atividade ou produto, havendo dúvidas científicas sobre os mesmos, o Estado deve agir evitando-os2525. .Declaração do Rio de Janeiro. Estud Av. 1992; 6(15):153-9. doi: https://dx.doi.org/10.1590/S0103-40141992000200013.
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No próximo tópico, abordamos os conceitos de prevenção aditiva e redutiva a partir da concepção de Rose. Na sequência, destacamos as consequências dessa distinção para a prática da P4 na prevenção. Em seguida, apresentamos e discutimos o PP, para, ao final, o articularmos aos dois conceitos anteriores.

Geoffrey Rose, no livro “Estratégias da medicina preventiva”2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010., caracteriza e discute duas estratégias preventivas: de alto risco e populacional. Aponta vantagens e desvantagens de cada uma e conclui que a abordagem populacional é mais efetiva e radical. Ao analisá-la, o autor distingue dois tipos de intervenções: medidas preventivas redutivas e aditivas, em apenas uma página, não desenvolvendo, posteriormente, essa distinção. Devido à sua grande relevância, independente da estratégia preventiva considerada, ela merece ser generalizada e considerada à parte.

Medidas preventivas redutivas e aditivas

As medidas preventivas redutivas são ações que visam redução de exposições artificiais presentes no modo de viver, sabidamente patogênicas, de maior risco ou prejudiciais à saúde, sobretudo nas sociedades industrializadas2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010.: "parar de fumar, evitar a obesidade severa, praticar exercícios regulares, reduzir o consumo de gorduras saturadas e sal em nossa dieta [...], reduzir a contaminação química dos alimentos e do meio ambiente" (p. 148).

Rose2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010. (p. 148) diz que essas ações visam restaurar a normalidade biológica, definida como “as condições para as quais somos considerados geneticamente adaptados devido a nossa história evolutiva”. Elas se concretizam em ações clínicas (orientação, aconselhamento), de saúde pública e de organização social, tais como: redução de desigualdades econômicas2626. Pickett KE, Wilkinson RG. Income inequality and health: a causal review. Soc Sci Med. 2015; 128:316-26., promoção de mobilidade sustentável e atividade física (ciclovias, áreas verdes de passeio pedestre e lazer), políticas de promoção de cultivo e distribuição de alimentos sem agrotóxicos e sem multiprocessamento, saneamento urbano (habitação, água potável e coleta/tratamento de esgoto), seguridade social, escolarização universal, legislação e regulamentação sanitárias, etc. Tais medidas são teoricamente coerentes e corroboradas pelos conhecimentos científicos e evidências disponíveis2727. Porto MF, Martinez-Alier J. Ecologia política, economia ecológica e saúde coletiva: interfaces para a sustentabilidade do desenvolvimento e para a promoção da saúde. Cad Saude Publica. 2007; 23 Suppl 4:503-12.,2828. Buss PM, Carvalho AI. Desenvolvimento da promoção da saúde no Brasil nos últimos vinte anos (1988-2008). Cienc Saude Colet. 2009; 14(6):2305-16.. Por diminuírem riscos e fatores patogênicos, vários considerados determinantes sociais de adoecimentos, se fundem ou pelo menos convergem amplamente com a promoção da saúde2929. Chor D, Faerstein E. Um enfoque epidemiológico da promoção da saúde: as idéias de Geoffrey Rose. Cad Saude Publica. 2000; 16(1):241-4., em dimensão societal e individual. Trata-se do restabelecimento de condições ambientais e sociais e modos de viver favoráveis à saúde, relativamente não problemáticos quanto à fundamentação científica da sua recomendação. Além disso, de um modo geral, as medidas preventivas redutivas são convergentes com grande parte das tradições culturais dos povos do planeta3030. Tesser CD. Práticas complementares, racionalidades médicas e promoção da saúde: contribuições poucos exploradas. Cad Saude Publica. 2009; 25(8):1732-42..

As ações preventivas redutivas podem ser consideradas “como amplamente seguras e, da mesma forma, aceitas com base em um razoável e pressuposto benefício”2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010. (p. 148). São pouco problemáticas do ponto de vista do manejo da incerteza (inexistente), dos danos resultantes (nulos ou mínimos) e da garantia de resultados benéficos, necessária na prevenção. O consenso sobre elas sustenta uma postura afirmativa de sua desejabilidade e certa facilidade de estabelecer seu conteúdo.

As medidas preventivas aditivas são geralmente intervenções administradas profissionalmente no corpo ou no meio ambiente, estranhas à ecologia-economia-fisiologia da vida diária dos seres humanos. Compreendem a aplicação de fármacos, vacinas ou outros produtos biológicos, físicos ou químicos2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010.: "as drogas (para controle de colesterol e da pressão arterial), a imunização, o uso de doses artificiais de substâncias naturais (como ácido fólico para prevenir defeitos do tubo neural, cloretação do abastecimento de água e aditivos e conservantes ‘naturais’ alimentares)" (p. 148). Podem ser acrescentados, a esse grupo, vários rastreamentos, geradores de cascatas de intervenções dessa natureza.

Como a maioria das pessoas está saudável (assintomática) e só parte pequena delas adoecerá gravemente no futuro, as ações preventivas aditivas podem resultar em significativos e extensos danos sem potenciais benefícios para muitas pessoas66. Gray JAM. New concepts in screening. Br J Gen Pract. 2004; 54(501):292-8.,77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316.. “Isso efetivamente exclui o uso desse tipo de medida, exceto nos casos em que benefícios oferecidos são muito grandes”2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010. (p. 148). Por isso, elas não podem ser consideradas seguras e o ônus da prova deve recair nos seus propositores (profissionais e sistemas de saúde): “não pode haver pressuposição a priori de segurança, por isso, a exigida prova de benefício – e em particular da segurança – deve ser mais rigorosa”2222. Rose G. Estratégias da medicina preventiva. Porto Alegre: Artmed; 2010. (id.). Deve haver evidências científicas, idôneas, de boa qualidade e convergentes de que os benefícios superam amplamente os danos, nulos ou mínimos, mesmo que essas evidências demorem anos e /ou décadas para serem produzidas. Assim, uma forte assimetria se impõe na recomendação de medidas preventivas aditivas: um balanço danos-benefícios desfavorável ou duvidoso é suficiente para sustentar a suspensão da medida ou a recomendação contrária77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316. à sua implantação, o que é estritamente coerente com o princípio da precaução, abordado adiante.

Na prevenção aditiva, a segurança e o balanço danos-benefícios são obtidos por meio de avaliações de dois tipos de estudos: (a) experimentais ou de intervenção: ensaios clínicos randomizados e suas revisões e metanálises, antes da sua aplicação na população; e (b) observacionais: após a aplicação da medida na população. Ambos devem avaliar os resultados finais das intervenções, incluindo criterioso registro dos danos. É importante ressaltar que não são aceitas evidências sobre desfechos ou eventos intermediários, relativos a doenças, parâmetros fisiológicos, exames complementares etc. (evidências tipo DOE - disease oriented evidence3131. Shaughnessy AF, Slawson DC, Bennett JH. Becoming an information master: a guidebook to the medical information jungle. J Fam Pract. 1994; 39(5):489-99.,3232. Slawson DC, Shaughnessy AF, Bennett JH. Becoming a medical information master: feeling good about not knowing everything. J Fam Pract. 1994; 38(5):505-13.). Apesar de importantes para a produção de saberes, técnicas e tecnologias médicas e preventivas, esses desfechos são insuficientes para a avaliação da eficácia e da segurança na prevenção aditiva77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316.. Nesta, o alto risco de iatrogenia, o rigoroso manejo da incerteza e a intolerância aos danos (Figura 1) exigem desconfiança da experiência individual e coletiva, leiga e profissional, e, mesmo, dos modelos teóricos médico-científicos. Tais exigências da prevenção aditiva demandam evidências empíricas de ótima qualidade sobre resultados finais relativos às pessoas, sua qualidade de vida, mortalidade, morbidade (evidências tipo POEM - paciente oriented evidence that matterns3131. Shaughnessy AF, Slawson DC, Bennett JH. Becoming an information master: a guidebook to the medical information jungle. J Fam Pract. 1994; 39(5):489-99.,3232. Slawson DC, Shaughnessy AF, Bennett JH. Becoming a medical information master: feeling good about not knowing everything. J Fam Pract. 1994; 38(5):505-13.). Uma vez implantada uma medida preventiva aditiva (um rastreamento, um tratamento preventivo ou uma vacina, por exemplo), estudos observacionais devem avaliar sua efetividade, focando na redução da mortalidade geral e específica, morbidade (incidência e gravidade dos casos) e danos iatrogênicos.

Os dados primários sobre benefícios e danos nas avaliações (ensaios clínicos e estudos observacionais) de medidas preventivas aditivas devem estar disponíveis à comunidade científica. Isso é necessário para permitir a checagem dos procedimentos metodológicos, resultados e conclusões, de modo a aumentar a idoneidade da produção de conhecimento científico e reduzir conflitos de interesse (sabidamente comuns e prejudiciais)3333. Gøtzsche PC. Deadly medicines and organised crime: how big pharma has corrupted healthcare. London: Radcliffe Publishing; 2013.. Todavia, os danos das medidas preventivas aditivas têm sido menos estudados que os benefícios – o caso do rastreamento do câncer de mama é um bom exemplo3434. Heleno B, Thomsen MF, Rodrigues DS, Jørgensen KJ, Brodersen J. Quantification of harms in cancer screening trials: literature review. BMJ. 2013; 347:f5334.,3535. Rasmussen K, Jørgensen KJ, Gøtzsche PC. Citations of scientific results and conflicts of interest: the case of mammography screening. Evid Based Med. 2013; 8(3):83-9.. E eles ocorrem frequentemente, como os sobrediagnósticos nos rastreamentos e as cascatas de intervenções frequentemente geradas3636. Pérez-Fernández M, Gérvas J. El efecto cascada: implicaciones clínicas, epidemiológicas y éticas. Med Clin. 2002; 118(2):65-7..

Os resultados dos ensaios clínicos e dos estudos observacionais muitas vezes são anti-intuitivos e estão fora do alcance da experiência dos clínicos e usuários. Por isso, a opinião dos especialistas que tratam os doentes não deve ter posição privilegiada nas decisões sobre as ações preventivas aditivas. Devem ser consideradas as dificuldades e complexidades da avaliação dos efeitos dessas ações e os muitos vieses envolvidos nessa avaliação, como, por exemplo: nos rastreamentos, vieses de seleção, tempo de antecipação, de duração e de sobrediagnóstico3737. Gates TJ. Cancer screening in perspective. Am Fam Physician. 2001; 63(6):1039-43.,3838. Raffle AE, Gray JAM. Screening: evidence and practice. Oxford: Oxford University; 2007.. Isso é reforçado pela complexidade dos processos de saúde-doença, pelas limitações dos modelos teóricos biomédicos, e pela ignorância sobre a gênese e evolução de várias doenças, sobretudo doenças crônicas e cânceres, que suscitam muitas dessas medidas.

Consequências da distinção entre medidas redutivas e aditivas

A introdução da distinção entre ações aditivas e redutivas no universo das ações preventivas gera um importante divisor de águas: um operador conceitual e atitudinal que facilita a tomada de decisão sobre as ações preventivas redutivas e enrijece os critérios para recomendações de medidas preventivas aditivas, dificultando-as. Como as primeiras apenas reduzem riscos preexistentes, a consensual garantia de benefícios e de segurança e a inexistente ou desprezível incerteza tornam relativamente fácil sua recomendação. A situação é inversa nas segundas, quando são introduzidos produtos/fatores artificiais não previamente existentes na ecologia-economia-fisiologia das pessoas. Se as exigências técnicas e éticas para uma intervenção já são maiores na prevenção do que no cuidado ao adoecido77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316., para as medidas preventivas aditivas, essas exigências são ainda mais intensificadas, devido ao grande potencial de danos envolvido. Como destacado acima, estudos de intervenção devem balizar as decisões de implantação e, depois, evidências observacionais na população devem sustentar a medida, se (e apenas se) forem evidenciados amplos benefícios e mínimos/nulos danos em pesquisas de alta qualidade, idoneidade e transparência. Caso contrário (ou na dúvida), devido à precedência da não maleficência na prevenção, deve-se impedir a introdução da medida ou suspendê-la.

Portanto, nas decisões sobre recomendações/realizações de medidas preventivas aditivas, as diferenças apontadas exigem uma enfática atitude cética, resistente e anti-intervencionista, a ser sobrepujada apenas pela convergência de evidências científicas amplamente favoráveis, como acima especificado. Tal modulação atitudinal, deslocada eticamente para a resistência à intervenção, gera uma preferência explícita, na clínica e na saúde pública, pelas ações preventivas redutivas. Essa postura ético-sanitária deve ser assumida e disseminada na saúde pública, nos médicos e demais profissionais de saúde e populações77. Tesser CD, Norman AH. Differentiating clinical care from disease prevention: a prerequisite for practicing quaternary prevention. Cad Saude Publica. 2016; 32(10):e00012316.. (Tabela 1).

Tabela 1
Características, modulação atitudinal e exigências decorrentes da diferenciação entre ações preventivas aditivas e redutivas

Todavia, as medidas preventivas aditivas têm sido banalizadas e propagandeadas, na sociedade, na mídia e na profissão médica, como se o avanço biotecnológico tornasse as novas tecnologias preventivas aditivas generalizadamente mais seguras e mais eficazes. Esse imaginário quase disseminado é, em boa parte, enganoso3939. Gérvas J, Pérez-Fernández M. São e salvo (e livre de intervenções médicas desnecessárias). Porto Alegre: Artmed; 2016.. Ele carece de antídotos conceituais e simbólicos que ajudem a introduzir critérios facilitadores de sua desconstrução e reconstrução prudente, de modo a permitir um escrutínio rigoroso (mas relativamente acessível) dessas ações, facilitando identificar quais delas são justificáveis e seguras. Se a distinção entre medidas preventivas redutivas e aditivas é valiosa nesse sentido, ela é complementada com força e adequação pelo princípio da precaução.

Princípio da precaução

O princípio da precaução (PP) emergiu na década de 1970, na Alemanha, no enfrentamento de problemas ecológicos. Ele estabelece que agências reguladoras e governos devem se antecipar ao possível perigo e impedi-lo de ocorrer. O PP é aplicado quando a informação científica é insuficiente, inconclusiva e/ou incerta em atividades com indícios de que seus efeitos podem ser perigosos4040. Martuzzi M, Tickner JA. The precautionary principle: protecting public health the environment and the future of our children. Copenhagen: WHO; 2004.. Durante a década de 1980, ele foi incorporado em várias políticas ambientais nacionais. Na década seguinte, espalhou-se por vários acordos e tratados internacionais, envolvendo uma variedade de assuntos. O seu status legal está evoluindo e recebeu apoio suficientemente amplo para se afirmar que ele reflete um princípio de direito consuetudinário2525. .Declaração do Rio de Janeiro. Estud Av. 1992; 6(15):153-9. doi: https://dx.doi.org/10.1590/S0103-40141992000200013.
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O PP não é somente um princípio ambiental, ele se aplica à proteção da saúde humana4141. Harremoës P, Gee D, MacGarvin M, Stirling A, Keys J, Wynne B, et al. Late lessons from early warnings: the precautionary principle 1896–2000. Luxembourg: Office for Official Publications of the European Communities; 2001.. A saúde pública é considerada, aliás, pioneira. O fechamento de uma bomba d’água em Londres, no século XIX, proposta por John Snow como ação de combate a uma grave epidemia de cólera, é um exemplo citado. A ciência médica da época considerava que a doença era transmitida pelo ar (teoria miasmática). Snow mostrou que as pessoas que morreram em uma área em poucos dias bebiam de determinada bomba d’água e propôs interromper o seu abastecimento, o que foi aceito e exitoso. Nos meses seguintes, a Epidemiological Society of London, o Royal College of Physicians e o General Board of Health rejeitaram sua tese de transmissão pela água. A decisão de acatar a proposta de Snow foi tomada em ambiente de incerteza, baseada em um estudo de um cientista isolado, e é considerada um exemplo típico de decisão por precaução4141. Harremoës P, Gee D, MacGarvin M, Stirling A, Keys J, Wynne B, et al. Late lessons from early warnings: the precautionary principle 1896–2000. Luxembourg: Office for Official Publications of the European Communities; 2001.,4242. Bellotti ML, Benítez O, Drnas Z, Juliá MS, Manrique E, Rosenberg G, et al. El principio de precaución ambiental: la práctica Argentina. Córdoba: Lerner Editora; 2008..

O PP nasceu contrapondo-se aos danos ecológicos, ambientais e humanos das atividades econômicas e industriais que introduzem produtos químicos/físicos tóxicos no ambiente, na sociedade, nos alimentos e nos processos de trabalho humano. A maior parte das aplicações do PP defendidas dentro da saúde pública refere-se à exposição de pessoas a produtos usados em atividades geralmente externas à ação clínico-sanitária4343. Guggenheim R. Bringing the planet into the generalist practice: a form of preventive care. Lancet Planet Health. 2018; 2(5):e200-1.. Por exemplo, Wardman e Löfstedt4444. Wardman JK, Löfstedt R. Anticipating or accommodating to public concern? Risk amplification and the politics of precaution reexamined. Risk Anal. 2018; 38(9):1802-19. doi: https://dx.doi.org/10.1111/risa.12997.
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ilustram as complexidades da aplicação do PP no caso das tecnologias dos telefones celulares, discutindo as condições socioculturais e as dinâmicas políticas envolvidas no processo.

O PP insere-se em uma perspectiva ética ampla, e visa gerar medidas para proteger a saúde pública diante da incerteza. Isso difere da abordagem de avaliação de risco, que pergunta: “Quais os danos de uma atividade podemos tolerar?” Em vez disso, o PP questiona: “Que ações podemos tomar para prevenir danos dessa atividade?”4545. Gilbert SG. Public health and the precautionary principle. Northwest Public Health [Internet]. 2005 [citado 15 Maio 2018]. Disponível em: http://archive.northwestpublichealth.org/docs/nph/s2005/viewpoint_s2005.pdf
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(p. 4). Porém, muitas vezes, o que vigora na saúde pública e na medicina preventiva é o que Kriebel4646. Kriebel D. The reactionary principle: inaction for public health. Occup Environ Med. 2007; 64(9):573-4. chama de princípio da reação, em que se deve aguardar até que se acumulem evidências de algum dano decorrente de uma atividade ou produto antes de se tomarem medidas que evitem o dano.

As ciências e as evidências têm um papel central a desempenhar para se atingirem os objetivos da aplicação do PP, mas têm sido usadas em direção diversa. Há, na medicina preventiva e na saúde pública, uma tradição e tendência de focar na avaliação de eficácia e nos riscos4747. Kriebel D, Tickner J. Reenergizing public health through precaution. Am J Public Health. 2001; 91(9):1351-5.. Martiuzzi4848. Martuzzi M. The precautionary principle: in action for public health. Occup Environ Med. 2007; 64(9):569-70. sintetiza razões pela quais a abordagem de avaliação de riscos baseada em evidências é potencialmente danosa: ela é destinada a sustentar decisões ‘comprovadas’, deixando vazio direcional na ausência dessas provas. Ela não é uma opção realista na governança moderna, em face dos perigos e incertezas, sobretudo em se tratando de novas (bio)tecnologias. A tradução das evidências em decisões sábias está repleta de dificuldades, dentre as quais se destacam: definir e enquadrar a questão da decisão é um processo social, e não uma tarefa especializada; a mesma evidência pode ter implicações diferentes, dependendo do ponto de vista ético subjacente – por exemplo, supremacia relativa para a beneficência ou para a não maleficência (caso da prevenção aditiva); evidências sobre o problema podem ser sólidas e abundantes (tipo DOE), enquanto evidências sobre os resultados das soluções e seus danos podem ser escassas (tipo POEM); o processo de identificação e processamento das evidências pelos especialistas é vulnerável à manipulação por interesses escusos4949. Heath I. Overdiagnosis: when good intentions meet vested interests: an essay by Iona Heath. BMJ. 2013; 347:f6361. (os exemplos são abundantes e repetidos3333. Gøtzsche PC. Deadly medicines and organised crime: how big pharma has corrupted healthcare. London: Radcliffe Publishing; 2013.). Um passo importante para mudar da lógica da reação para o PP é reduzir a influência dos interesses econômicos na produção e processamento das evidências na área da saúde-doença4949. Heath I. Overdiagnosis: when good intentions meet vested interests: an essay by Iona Heath. BMJ. 2013; 347:f6361.

50. Greenhalgh T, Howick J, Maskrey N. Evidence based medicine: a movement in crisis? BMJ. 2014; 348:g3725.
-5151. Every-Palmer S, Howick J. How evidence-based medicine is failing due to biased trials and selective publication. J Eval Clin Pract. 2014; 20(6):908-14..

O PP tem sido caracterizado por quatro componentes centrais, envolvidos na sua aplicação: (1) Evitar danos potenciais de uma atividade ou produto em face da incerteza. No nosso caso, evitar danos iatrogênicos das ações preventivas aditivas. (2) Os proponentes da intervenção têm o ônus de provar sua eficácia e segurança. (3) Explorar alternativas inofensivas, antes de chegar à avaliação indesejada de níveis aceitáveis de riscos da atividade. Exige-se a exploração completa das alternativas às ações potencialmente prejudiciais, antes de se aceitar um nível quantificado de danos mínimos. Na prevenção aditiva, provavelmente, haverá danos e o balanço benefícios-danos é incontornável, mas este componente indica forte preferência por alternativas preventivas redutivas. (4) Aumentar a participação pública na tomada de decisões (merece discussão específica, aqui inviável). Outro aspecto envolvido no PP é o da vigilância ativa. Atividades implantadas podem, com o avanço do conhecimento e das evidências científicas, serem consideradas posteriormente danosas ou duvidosas, o que deve gerar a sua suspensão imediata por precaução2424. Sands F. Principles of international environmental laws. 2nd ed. New York: Cambridge University Press; 2003.,4242. Bellotti ML, Benítez O, Drnas Z, Juliá MS, Manrique E, Rosenberg G, et al. El principio de precaución ambiental: la práctica Argentina. Córdoba: Lerner Editora; 2008.,4646. Kriebel D. The reactionary principle: inaction for public health. Occup Environ Med. 2007; 64(9):573-4.,4848. Martuzzi M. The precautionary principle: in action for public health. Occup Environ Med. 2007; 64(9):569-70.,5252. Goldstein BD. The precautionary principle also applies to public health actions. Am J Public Health. 2001; 91(9):1358-61.,5353. Commission of the European Communities. Communication from the commission on the precautionary principle. Bruxelas; 2000 [citado 15 Maio 2018]. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/PDF/?uri=CELEX:52000DC0001&from=EN
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.

O PP já foi aplicado em situações médicas de alta gravidade. Wilson et al5454. Wilson K, Atkinson KM, Fergusson DA, Brown A, Forster A, Murphy MSQ, et al. Problems with precaution: the transfusion medicine experience. J Risk Res. 2018; 2017:1-13. doi: https://dx.doi.org/10.1080/13669877.2017.1351478.
https://dx.doi.org/10.1080/13669877.2017...
discutem sua aplicação na medicina transfusional, em que houve uso médico pioneiro do PP, sem envolvimento ambiental5555. Wilson K, Ricketts MN. The success of precaution? Managing the risk of transfusion transmission of variant creutzfeldt-jakob disease. Transfusion. 2004; 44(10):1475-8.: o PP foi aplicado para proteção dos riscos de transmissão de doenças via sangue transfusional, e suas consequências tem sido debatidas na literatura, com críticas, defesas e desenvolvimentos5656. Wilson K, Atkinson K. Toward neo-precaution: a new approach to applying the precautionary principle to public health. Am J Bioeth. 2017; 17(3):44-6.. Martiuzzi4848. Martuzzi M. The precautionary principle: in action for public health. Occup Environ Med. 2007; 64(9):569-70. afirma que o PP está implicado nos princípios da medicina clínica, em particular no princípio da não maleficência. Mas os princípios bioéticos sempre foram apenas oralmente proclamados e relegados à consciência dos profissionais de saúde5757. Smith CM. Origin and uses of primum non nocere: above all, do no harm! J Clin Pharmacol. 2005; 45(4):371-7.. Entretanto, o cuidado aos doentes é uma situação eticamente complexa e tanto mais quanto mais grave o adoecimento, em que a aplicação do PP pode gerar situações difíceis5858. Foidart JM. The precautionary principle and the obligation of medical action. Bull Acad Natl Med. 2000; 184(5):937-43., muito mais difíceis que no caso da prevenção aditiva.

Goldstein5252. Goldstein BD. The precautionary principle also applies to public health actions. Am J Public Health. 2001; 91(9):1358-61. argumenta que o PP deve ser aplicado às ações de saúde pública. Nós destacamos e argumentamos que especialmente a abordagem das ações preventivas aditivas deve ser orientada sistematicamente pelo PP. Todavia, as discussões sobre o PP geralmente não focam ações preventivas comuns realizadas no cuidado clínico na APS e em programas de saúde pública, como: vacinações, rastreamentos e tratamentos preventivos. Chaudry5959. Chaudry R. The precautionary principle in public health and public health nursing. Public Health Nurs. 2008; 25(3):261-8., por exemplo, restringe-se à relação entre saúde ambiental, saúde ocupacional e enfermagem em saúde pública, sem tematizar as medidas preventivas aditivas em si mesmas.

Por outro lado, nas questões preventivas atuais, a subjetividade das pessoas e populações é moldada pelas informações e diretrizes da medicina e da saúde pública, além dos valores sociais e da mídia, em um contexto já criticado pelo excessivo healthism ou imperialismo sanitário, com obsessão por juventude e perfeição corporal (corpolatria ou higiomania), em que ações preventivas e promocionais individuais se tornaram imperativos sociais e morais quase irresistíveis6060. Crawford R. Healthism and the medicalization of everyday life. Int J Health Serv. 1980; 10(3):365-88.

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Embora as exigências dos protocolos das agências reguladoras aparentemente sejam coerentes com o segundo componente do PP (exigir dos proponentes provas de eficácia e segurança), como no caso dos ensaios clínicos para aprovação dos medicamentos e outros produtos, há várias ações preventivas em milhões de pessoas que, provavelmente, não teriam sido aplicadas ou não estariam sendo realizadas se o PP fosse aplicado à prevenção aditiva (veja-se a terapia de reposição hormonal como prevenção primária, adiante comentada).

O princípio da precaução articulado à prevenção aditiva

Pela sua própria definição, todas as ações preventivas aditivas são candidatas a rigorosa abordagem pelo PP. Ainda que a complexidade tecnológica e da saúde-doença possa produzir ocasionalmente uma zona cinzenta entre as medidas preventivas aditivas e redutivas, tal distinção é suficientemente consistente na orientação da P4 para uma focalização nas medidas preventivas aditivas: atividades com grande potencial de danos e nas quais há supremacia da não maleficência. Isso demanda fortemente a aplicação sistemática do PP.

Além disso, uma característica especial das medidas preventivas aditivas facilita a aplicação do PP: tal aplicação demanda ações simples de serem operacionalizadas, exige apenas a decisão de não autorizar, não recomendar e não implantar ações preventivas aditivas cujo balanço danos-benefícios é desfavorável ou duvidoso; ou não mantê-las em vigor (suspendê-las) se já implantadas. A prevenção aditiva não exige cursos alternativos de ação, embora a prevenção redutiva seja sempre preferível e possa cumprir esse papel de alternativa inofensiva. Adicionalmente, neste caso, os danos tendem a ser autolimitados, já que dependentes da repetição das medidas ao longo do tempo nas pessoas e gerações. Por último, não há custos financeiros envolvidos, ao contrário: a implantação e manutenção das medidas preventivas aditivas é que custam caro.

A aplicação do PP às medidas preventivas aditivas já implantadas deve produzir um sinal de alerta sobre as mesmas, para marcá-las de modo a que nunca sejam consideradas definitivamente estabelecidas, pois necessitam rigoroso escrutínio periódico para se provar que sua manutenção é justificada.

Quanto mais no futuro se encontrar um desfecho clínico a ser evitado por prevenção aditiva, maior a necessidade do PP e de P41919. Norman AH, Tesser CD. Prevenção quaternária: as bases para sua operacionalização na relação médico-paciente. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2015; 10(35):1-10.. A complexidade dos processos saúde-doença é grande e os modelos teóricos subjacentes a essas medidas são sempre, em algum grau, reducionistas e limitados. Como a intervenção é geralmente restrita a um ou poucos fatores ou riscos específicos, seus resultados finais podem se mostrar contrários ao previsto teoricamente.

Um exemplo de fracasso desse tipo, com graves consequências práticas, foi o uso da terapia de reposição hormonal (TRH) em mulheres como prevenção primária. Em estudos preliminares publicados (de qualidade duvidosa), a TRH mostrou potencial efeito preventivo cardiovascular, ao melhorar o perfil lipídico (evidências tipo DOE) e ao não aparecerem danos significativos. No entanto, após anos de uso disseminado de TRH facilitado e induzido pela sua suposta ação preventiva, um ensaio clínico grande e de boa qualidade metodológica mostrou um aumento na mortalidade cardiovascular (evidência tipo POEM) no grupo tratado. Isso gerou uma diretriz clínica explicitamente contrária à TRH como medida preventiva6464. Sackett D. The arrogance of preventive medicine. CMAJ. 2002; 167(4):363-4.,6565. Boardman HMP, Hartley L, Eisinga A, Main C, Roqué i Figuls M, Bonfill Cosp X, et al. Hormone therapy for preventing cardiovascular disease in postmenopausal women. Cochrane Database Syst Rev. 2015; 10(3):CD002229. e, inclusive, um óbice relativo ao seu uso terapêutico.

A arrogância da medicina preventiva, de que falava Sackett6464. Sackett D. The arrogance of preventive medicine. CMAJ. 2002; 167(4):363-4., ainda necessita ser corrigida. O PP aplicado à prevenção aditiva é um importante e necessário recurso nessa tarefa. Várias atividades preventivas aditivas não resistem à aplicação do PP. Sem detalhamento ou discussão, inviáveis neste espaço, citamos alguns exemplos. O rastreamento mamográfico do câncer de mama apresenta balanço danos-benefícios desfavorável6666. Baum M. Harms from breast cancer screening outweigh benefits if death caused by treatment is included. BMJ. 2013; 346:f385. ou, no mínimo, duvidoso frente a extensos e graves danos1212. Tesser CD, D’Ávila TLC. Por que reconsiderar a indicação do rastreamento do câncer de mama? Cad. Saúde Pública. 2016; 32(5):e00095914.,6767. Brawley OW. Accepting the existence of breast cancer overdiagnosis. Ann Intern Med. 2017; 166(5):364-5.

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https://dx.doi.org/10.1586/17512433.2015...
, as evidências são recheadas de conflitos de interesses e há total ausência de transparência dos dados primários ao nível de pacientes sobre os danos7474. Abramsom J. Prescribing statins: time to rein it in. Pharm J. 2015; 294(7854/5). doi: https://dx.doi.org/10.1211/PJ.2015.20068145.
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,7575. Yerrakalva D, Griffin SJ. Statins for primary prevention in people with a 10% 10-year cardiovascular risk: too much medicine too soon? Br J Gen Pract. 2017; 67(654):40-1., que parecem ser muito mais frequentes que os relatados nos ensaios clínicos e em alguns casos graves7373. Diamond DM, Ravnskov U. How statistical deception created the appearance that statins are safe and effective in primary and secondary prevention of cardiovascular disease. Expert Rev Clin Pharmacol. 2015; 8(2):201-10. doi: https://dx.doi.org/10.1586/17512433.2015.1012494.
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,7676. Koslik HJ, Meskimen AH, Golomb BA. Physicians’ 39; experiences as patients with statin side effects: a case series. Drug Saf Case Rep. 2017; 4(1):3.. Na prevenção do câncer de colo uterino via vacinação anti-HPV, inexistem evidências de resultados finais sobre danos-benefícios para a população-alvo, apenas resultados intermediários para mulheres mais velhas (16-26 anos), com pouco tempo de acompanhamento nos ensaios clínicos, em um problema cuja evolução envolve décadas. Também há conflitos de interesse sistemáticos disseminados na produção das evidências e perigos potenciais significativos a longo prazo3939. Gérvas J, Pérez-Fernández M. São e salvo (e livre de intervenções médicas desnecessárias). Porto Alegre: Artmed; 2016.,7777. Arbyn M, Bryant A, Beutels P, Martin-Hirsch PP, Paraskevaidis E, Van Hoof E, et al. Prophylactic vaccination against human papillomaviruses to prevent cervical cancer and its precursors (Review). Cochrane Database Syst Rev. 2011; 2011(4):CD009069.,7878. Jørgensen L, Gøtzsche PC, Jefferson T. The cochrane HPV vaccine review was incomplete and ignored important evidence of bias. BMJ Evid Based Med. 2018; 23(5):165-8. doi: https://dx.doi.org/10.1136/bmjebm-2018-111012.
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. Situações essas que atingem milhões de pessoas assintomáticas expostas a perigos potenciais significativos, com relação benefícios x danos desconhecida, desfavorável ou duvidosa, a exigir o PP.

Considerações finais

A atividade clínica, sobretudo na APS, e a saúde pública precisam adotar e destacar a distinção entre medidas preventivas redutivas e aditivas e, nestas últimas, aplicar com rigor o princípio da precaução para orientar a P4 na prevenção. Essa distinção esboçada por Geoffrey Rose enfatiza a preferência por medidas preventivas redutivas, em sinergia com a promoção da saúde societal e individual, e requer a aplicação sistemática do PP às medidas preventivas aditivas. Todavia, a realidade clínico-sanitária mostra, ao contrário, a pouca aplicação do PP. Interesses escusos e práticas pouco cautelosas estão produzindo sérios danos para muitas pessoas por meio do uso excessivo de prevenção aditiva, induzindo sobrediagnóstico / sobretratamento. Desenvolvimentos conceituais, novas práticas clínicas e institucionais e pesquisas são necessárias para criar a legitimidade científica, profissional, institucional e social da aplicação do princípio da precaução às medidas preventivas aditivas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2018
  • Aceito
    17 Dez 2018
UNESP Botucatu - SP - Brazil
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