Resumos
O estudo objetivou identificar os sentidos produzidos pela comunicação dirigida à população em situação de rua (PSR) durante a pandemia de Covid-19 na cidade de Belo Horizonte. Por meio da técnica de análise de conteúdo, analisaram-se 48 entrevistas realizadas com a PSR; gestores e trabalhadores do Sistema Único de Saúde e do Sistema Único de Assistência Social; e representantes da Pastoral do Povo da Rua e da Defensoria Pública. Cinco temáticas identificadas respaldam os resultados e a discussão: pandemia e seu surgimento; fechamento da cidade e consequências para PSR; desinformação e reprodução de estigmas; desinformação e vacinação; e infodemia. Os resultados indicaram que a comunicação relacionada à pandemia foi considerada como fator de menor importância no planejamento público, ocasionando impacto negativo no enfrentamento social da doença. Destaca-se a importância de estratégias de comunicação públicas, inclusivas, dialógicas – com identificação e escuta dos grupos populacionais vulneráveis – e adaptadas às suas necessidades.
Palavras-chave
Covid-19; População em situação de rua; Comunicação em saúde
This study aimed to identify meanings produced by communication directed at the homeless population during the Covid-19 pandemic in Belo Horizonte. Forty-eight interviews with homeless people, Brazilian National Health System and Brazilian National Social Assistance System managers and workers, and representatives of the Pastoral Ministry for the Homeless and Public Defender’s Office were analyzed using content analysis. The results and discussion are structured around five core themes: the pandemic and its onset; closure of the city and the consequences for homeless people; disinformation and reproduction of stigmas; disinformation and vaccination; and the infodemic. The results suggest that communication related to the pandemic was seen as a minor factor in public planning that negatively impacted coping with the disease. The findings highlight the importance of identifying and listening to vulnerable groups and promoting inclusive and dialogical public communication strategies tailored to their specific needs.
Keywords
Covid-19; The homeless population; Health communication
El objetivo del estudio fue identificar los sentidos producidos por la comunicación dirigida a la Población que Vive en la Calle (PSR) durante la pandemia de Covid-19 en la ciudad de Belo Horizonte. Por medio de la técnica de análisis de contenido se analizaron 48 entrevistas realizadas con esa población, gestores y trabajadores del Sistema Brasileño de Salud y Sistema Brasileño de Asistencia Social, representantes de la Pastoral de la Población que vive en la Calle y la Defensoría Pública. Cinco temáticas identificadas respaldan los resultados y la discusión: la pandemia y su aparición; cierre de la ciudad y consecuencias para la Población que vive en la Calle; desinformación y reproducción de estigmas; desinformación y vacunación; e infodemia. Los resultados indicaron que la comunicación relacionada con la pandemia se consideró como factor de menor importancia en la planificación pública, ocasionando impacto negativo en el enfrentamiento social de la enfermedad. Se destaca la importancia de estrategias de comunicación públicas, incluyentes y dialógicas, con identificación y escucha de los grupos poblacionales vulnerables y adaptadas a sus necesidades.
Palabras clave
Covid-19; Población en Situación de Calle; Comunicación en salud
Introdução
Três anos após o início da pandemia por Covid-19, os veículos de comunicação de todo o mundo divulgaram a declaração da Organização Mundial da Saúde (OMS)11 Organização Mundial da Saúde. OMS declara fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à Covid-19 [Internet]. Genebra: OMS; 2023 [citado 23 Jul 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saudepublica-importancia-internacional-referente
https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-202... sobre o fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII). No entanto, com sete milhões de mortes22 Ferrari L. OMS decreta fim da emergência de saúde da pandemia de Covid-19 após três anos [Internet]. São Paulo: Estadão; 2023 [citado 5 Jul 2023]. Disponível em: https://www.estadao.com.br/saude/oms-decreta-fim-da-pandemia-de-covid-19/
https://www.estadao.com.br/saude/oms-dec... , a disseminação mundial da doença continua sendo caracterizada como uma pandemia11 Organização Mundial da Saúde. OMS declara fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional referente à Covid-19 [Internet]. Genebra: OMS; 2023 [citado 23 Jul 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saudepublica-importancia-internacional-referente
https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-202... .
A emergência sanitária e a resposta a ela foram acompanhadas por uma enorme infodemia. Preocupada com esse fenômeno, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), em parceria com OMS, elaborou um comunicado conceituando a infodemia como “excesso de informações, algumas precisas e outras não, com dificuldade de se encontrar fontes idôneas e orientações confiáveis”33 Organização Pan-Americana da Saúde. Entenda a infodemia e a desinformação na luta contra a Covid-19 [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 5 Jul 2023]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/52054/Factsheet-Infodemic_por.pdf
https://iris.paho.org/bitstream/handle/1... (p. 2).
Nesse cenário, a infodemia tem seu aspecto mais nocivo na capacidade de propagar desinformação em larga escala, por meio de uma extensa variedade de ambientes midiáticos que conformam uma densa rede e com diversas perspectivas comunicacionais, interferindo nas possibilidades do enfrentamento social da pandemia44 Alzamora GC. Fixação de crenças em torno de desinformação no contexto da infodemia. In: Victor C, Sousa CM, organizadores. A pandemia na sociedade de risco: perspectivas da comunicação. Campina Grande: EDUEPB; 2021. p. 165-79..
Dessa forma, a comunicação assumiu uma dimensão central na pandemia da Covid-19 em função de sua capacidade de interferir simbólica e materialmente no desenrolar do evento sanitário55 Lerner K, Cardoso JM, Clébicar T. Covid-19 nas mídias: medo e confiança em tempos de pandemia. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 221-31.. A comunicação pode ser definida como um processo social de produção, circulação e apropriação dos sentidos66 Veron E. A produção do sentido. São Paulo: Cultrix; 1980., que exerce um grande poder de influência, pois, a partir da mensagem, o emissor pode despertar interesses, provocar expectativas e convencer o receptor, de acordo com suas intenções77 Santaella L. Comunicação e pesquisa: projetos para mestrado e doutorado. São Paulo: Hacker Editores; 2001..
Diante desse contexto comunicacional complexo, é importante indagar como ficaram as populações vulneráveis, como a população em situação de rua (PSR), a partir da infodemia que se generalizou nos últimos anos. A PSR se caracteriza pela pobreza extrema; vínculos familiares interrompidos e/ou fragilizados; inexistência de moradia convencional regular; e vivência de situações de trabalho, condições de vida e inserções sociais precárias88 Brasil. Presidência da República. Decreto nº 7.053, de 23 de Dezembro de 2009. Institui a política nacional para a população em situação de rua e seu comitê intersetorial de acompanhamento e monitoramento. Diário Oficial da União. 23 Dez 2009. . Ainda que protegidos por leis e pela Constituição Federal (CF), esse grupo continua a clamar pelo acesso aos direitos sociais, como saúde, educação, trabalho e moradia. Somar-se-ia a esse clamor o direito ao acesso à informação?
O presente artigo, recorte da pesquisa intitulada “Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a PSR frente à pandemia da Covid-19”99 Instituto René Rachou Fiocruz Minas. Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a população em situação de rua frente à pandemia da Covid-19. Belo Horizonte: Fiocruz-Minas; 2020., objetiva identificar os sentidos produzidos pela comunicação voltada à PSR a partir das percepções dos gestores e dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS); e dos representantes da Pastoral Nacional do Povo da Rua, da Defensoria Pública e da própria PSR, em razão dos acontecimentos da pandemia de Covid-19 em Belo Horizonte, BH, Minas Gerais.
Metodologia
O estudo utiliza a análise de conteúdo na abordagem teórica de Bardin1010 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011., com enfoque em entrevistas. Foram realizadas, entre 1º de junho de 2021 e 31 de maio de 2022, 48 entrevistas semiestruturadas, sendo dez com pessoas em situação de rua e as demais com gestores e trabalhadores do SUS e do SUAS; e representantes da Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte e da Defensoria Pública de Minas Gerais. Também foram realizados quatro grupos focais com a PSR, totalizando 86 interlocutores .
As entrevistas e os grupos focais com as pessoas em situação de rua foram realizadas presencialmente no Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop), em abrigos, em uma ocupação urbana, no Canto da Rua Emergencial e nas pousadas, sendo os dois últimos espaços de atenção e cuidado criados pela Pastoral de Rua de Belo Horizonte no período da pandemia.
Os interlocutores do SUS e SUAS foram selecionados após o reconhecimento do território municipal, a partir de visitas aos equipamentos considerados referência para a PSR. A Defensoria Pública de Minas Gerais foi convidada a participar em função do seu trabalho na promoção dos direitos humanos com a PSR. Já a Pastoral do Povo da Rua se colocou enquanto um importante componente da sociedade civil organizada (SCO) ao realizar um cuidado a esse público.
Cada transcrição foi realizada por uma dupla de pesquisadores. Após a transcrição, que também contribuiu para a realização da leitura flutuante dos documentos, houve uma etapa de revisão das hipóteses e dos objetivos da pesquisa em busca de delimitação das regras de recorte, categorização e codificação dos dados. A análise de conteúdo das entrevistas foi realizada com o auxílio do software ATLAS.ti.
Este artigo trabalhou com três categorias: Valores/ideologias/percepções; acontecimentos da pandemia; e companheirismo/amizade entre as pessoas em situação de rua (figura 1).
Categorias e códigos utilizados segundo a abordagem de Bardin1010 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011..
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com número de CAAE: 43259221.6.0000.5091.
Resultados e discussão
Surgimento da pandemia
Começou foi no final de 2019, começou a aparecer uns casos na China. Aí, né começou a morrer gente. Eu fiquei bastante preocupada! Porque a China é um país muito mais desenvolvido que o Brasil. Se lá já estava naquela situação totalmente preocupante, eu fiquei pensando como seria no resto do mundo. (Pessoa em situação de rua)
Eu fui ver televisão, a Covid-19 estava lá na China. Aí eu falei, vai vir o carnaval... [...] ninguém vai fechar a fronteira? Fiquei pensando, assim, porque China parece longe, mas está vindo o carnaval aí... (Gestor do SUAS)
Até o Carnaval ninguém falava nisso. A gente não sabia que na China já estava aquela confusão. [...] porque a mídia não deixou chegar isso para gente, então foi uma surpresa, né? Foi logo após o Carnaval. Tudo começou. (Pessoa em situação de rua)
A pandemia falou “fica em casa”, e quem não consegue ficar dentro de casa? É isso pra você falar pra uma pessoa em situação de rua? Pensam que rua é casa? Né, é uma coisa meio perversa. (Trabalhador do SUS)
A OMS foi notificada em 31 de dezembro de 2019 da ocorrência de casos de pneumonia na cidade de Wuhan1111 Organização Mundial da Saúde, Organização Pan-americana da saúde. Folha informativa – Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus) [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 15 Jul 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875
https://www.paho.org/bra/index.php?optio... , China, com suspeita de serem provocados por uma nova cepa de coronavírus. As notícias veiculadas pela televisão informaram sobre o caos causado pelo novo coronavírus – SARS-CoV-2 – resultando no fechamento da cidade.
Segundo uma pesquisa realizada durante a pandemia, nos Estados Unidos, dos 698 participantes do estudo, 97,6% relataram que buscaram informações em fontes de notícias como jornais, televisão e rádio1212 Nazione S, Perrault E, Pace K. Impact of information exposure on perceived risk, efficacy, and preventative behaviors at the beginning of the Covid-19 pandemic in the United States. Health Commun. 2021; 36(1):23-31. doi: 10.1080/10410236.2020.1847446.
https://doi.org/10.1080/10410236.2020.18... . No Brasil, quando se analisa as fontes de informação tradicionais, são consideradas as mais relevantes os jornais e/ou revistas, canais de televisão e emissoras de rádio, nessa ordem1313 Gonçalves CC, Barbosa RR. Relevância das fontes de informação no cenário brasileiro durante a pandemia de Covid-19. RECIIS. 2023; 17(1):67-83..
As informações causaram tanta preocupação que o gestor do SUAS, um dos receptores das mensagens acerca do início da pandemia, cogitou a necessidade do fechamento das fronteiras brasileiras. A OMS1111 Organização Mundial da Saúde, Organização Pan-americana da saúde. Folha informativa – Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus) [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 15 Jul 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875
https://www.paho.org/bra/index.php?optio... já havia declarado, em 30 de janeiro de 2020, que o surto do novo coronavírus constituía uma ESPII. A organização ressaltava que sua preocupação não era com o que estava ocorrendo na China, mas sim com o potencial de o vírus se espalhar por países com sistemas de saúde ainda em construção e sem preparo para lidar com ele.
No Brasil, o carnaval do ano de 2020 teve recorde de movimentação de pessoas. Na Quarta-Feira de Cinzas, em 26 de fevereiro, o país registrou o primeiro caso da doença. Pouco tempo depois, em 12 de março, ocorreu a primeira morte por Covid-191414 Bueno FTC, Souto EP, Matta GC. Notas sobre a Trajetória da Covid-19 no Brasil. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 27-39..
Um representante da PSR, ao se surpreender com a chegada da pandemia após o carnaval, responsabilizou a mídia pelo seu desconhecimento. Entretanto, Lerner et al.55 Lerner K, Cardoso JM, Clébicar T. Covid-19 nas mídias: medo e confiança em tempos de pandemia. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 221-31. observaram a produção de notícias e postagens de diferentes fontes, em quantidade e alcance inéditos, em um mundo hiperconectado, em tempo real; e relataram que a exposição do tema acompanhou em intensidade e magnitude o avanço da disseminação do novo coronavírus.
Importante destacar que a PSR também se encontra em situação de exclusão digital, ou seja, existe impedimento para que essa população tenha acesso à internet. Para fazê-lo, é necessário possuir equipamentos como smatphones ou computadores. Além disso, ressalta-se a falta de capacidade técnica para manusear as tecnologias de informação. Dessa maneira, pode-se observar que a exclusão social e digital estão interligadas1515 Borges GS, Zanoni LOTC, Mayor RVS. Pessoas em situação de rua no Brasil, sua exclusão digital e as violações dos direitos humanos. Rev Direitos Cult. 2022; 17(42):89-105..
Com a propagação do vírus no país, as primeiras medidas de isolamento social começaram a ser tomadas por estados e municípios1414 Bueno FTC, Souto EP, Matta GC. Notas sobre a Trajetória da Covid-19 no Brasil. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 27-39.. Em Belo Horizonte, no dia 17 de março de 2020, foram confirmados casos de transmissão comunitária. No dia seguinte, o Decreto n. 17.304 viria a determinar a adoção do distanciamento físico por meio da suspensão, por tempo indeterminado, dos alvarás de localização e funcionamento emitidos para realização de atividades com potencial de aglomeração de pessoas1616 Belo Horizonte. Decreto Municipal nº 17.304, de 18 de Março de 2020. Determina a suspensão temporária dos alvarás de localização e funcionamento e autorizações emitidos para realização de atividades com potencial de aglomeração de pessoas para enfrentamento da situação de emergência pública causada pelo agente coronavírus, Covid-19. Diário Oficial [do] Município de Belo Horizonte. 18 Mar 2020.. Assim como grande parte da população brasileira1717 Bezerra ACV, Silva CEM, Soares FRG, Silva JAM. Fatores associados ao comportamento da população durante o isolamento social na pandemia de Covid-19. Cienc Saude Colet. 2020; 25 Supl 1:2411-21., os belo-horizontinos aderiram ao “fica em casa”, medida de isolamento social que visava reduzir a disseminação da Covid -19 e a sobrecarga dos sistemas de saúde.
Mas a orientação do “fica em casa” não fez sentido para a PSR. Nesse contexto, a pandemia trouxe para a pauta político-social o desafio técnico-operacional de tratar diferentemente os desiguais1818 Akerman M, Pinheiro WR. Covid-19: não estamos no mesmo barco [Internet]. São Paulo: Le Mond Diplomatique Brasil; 2020 [citado 3 Jun 2023]. Disponível em: https://diplomatique.org.br/covid-19-nao-estamos-no-mesmo-barco/
https://diplomatique.org.br/covid-19-nao... . Santos1919 Santos BS. A cruel pedagogia do vírus [Internet]. Coimbra: Almeida AS; 2020. [citado 3 Jul 2023]. Disponível em: https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/89207/1/A%20cruel%20pedagogia%20do%20virus_Livro_Almedina.pdf
https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/... apresentou os seguintes questionamentos relacionados à PSR:
Dadas as condições de habitação, poderão cumprir as regras de prevenção recomendadas pela OMS? Poderão manter a distância interpessoal nos espaços exíguos de habitação onde a privacidade é quase impossível? Poderão lavar as mãos com frequência quando a pouca água disponível tem de ser poupada para beber e cozinhar? O confinamento em alojamentos tão exíguos não terá outros riscos para a saúde tão ou mais dramáticos do que os causados pelo vírus?1919 Santos BS. A cruel pedagogia do vírus [Internet]. Coimbra: Almeida AS; 2020. [citado 3 Jul 2023]. Disponível em: https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/89207/1/A%20cruel%20pedagogia%20do%20virus_Livro_Almedina.pdf
https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/... (p. 18)
Pandemia, fechamento da cidade e consequências para a PSR
A população em situação de rua, no primeiro momento, a gente vê ela descrente, né? E tem ainda algumas questões, algumas pessoas descrentes da real, que de fato a pandemia existe. Que de fato, eu tenho que tomar esse cuidado. Como eu vou tomar este cuidado, sendo que eu não tenho os meios básicos?
(Trabalhador do SUAS)
A chegada da pandemia [...] trouxe para rua, é, primeiro uma sensação de desconhecimento, eu acho que a rua não se apavorou com a pandemia porque ela não sabia [...]. Quando a população de rua viu todo mundo de máscara, por exemplo, ela perguntou o que era aquilo, e porque tava todo mundo de máscara, cidade fechada.
(Pessoa em situação de rua)
De repente [...] o pessoal começou a olhar para aquele ponto onde lavava carro e os carros já não estavam lá mais, para aquele lugar onde coletava material reciclável e isso não estava lá mais. O povo ficou assustado! Sem recurso pra máscara, sem recurso pra álcool gel, sem acesso à água para fazer higienização das mãos e do corpo.
(Gestor da Pastoral)
A PSR entrou em pânico. Entrou em pânico porque as pessoas desaparecerem da rua, informação não é uma coisa fácil. As pessoas desaparecerem da rua [...], os comércios fecharam, os espaços que, eventualmente, a pessoa parava e via alguma informação, o jornal e etc. de vez em quando, fechou tudo. Então, as pessoas ficaram absurdamente desinformadas.
(Trabalhador da Defensoria Pública)
Apesar de todos serem suscetíveis à infecção causada pelo novo coronavírus, os recursos disponíveis para se proteger de sua exposição, “bem como das consequências sociais negativas da pandemia, não são igualitários, mas sim mediados pelas condições de vida e de acesso a bens, serviços e direitos sociais”2020 Marques ALM, Sorrentino IS, Rodrigues JL, Machin R, Oliveira E, Couto MT. O impacto da Covid-19 em grupos marginalizados: contribuições da interseccionalidade como perspectiva teórico-política. Interface (Botucatu). 2021; 25 Supl 1:e200712. doi: 10.1590/Interface.200712.
https://doi.org/10.1590/Interface.200712... (p. 20).
O fechamento da cidade de Belo Horizonte pode ser elencado como uma dessas “consequências sociais negativas”. A PSR ficou sem acesso à possibilidade de fazer pequenos serviços – como lavar carro, vender bala e catar material reciclável – ou seja, de executar alguma atividade que lhe permitisse a geração de recurso financeiro.
A falta de informação aparece em todas as narrativas apresentadas. Floss et al.2121 Floss M, Tolotti G, Rossetto AS, Camargo TS, Saldiva PHN. Linha do tempo do “tratamento precoce” para Covid-19 no Brasil: desinformação e comunicação do Ministério da Saúde. Interface (Botucatu). 2023; 27:e210693. doi: 10.1590/interface.210693.
https://doi.org/10.1590/interface.210693... observaram que o impacto sanitário, social, econômico e político causado pela pandemia contribuiu para o aumento da desinformação. Trata-se da desinfodemia2121 Floss M, Tolotti G, Rossetto AS, Camargo TS, Saldiva PHN. Linha do tempo do “tratamento precoce” para Covid-19 no Brasil: desinformação e comunicação do Ministério da Saúde. Interface (Botucatu). 2023; 27:e210693. doi: 10.1590/interface.210693.
https://doi.org/10.1590/interface.210693... , ou seja, uma variante da desinformação na infodemia. Para melhor entender a desinfodemia, faz-se necessário pensar o seu oposto, ou seja, a informação baseada no conhecimento. Dessa maneira, constata-se que a PSR não teve acesso à informação verificável, confiável e no tempo certo.
Em razão das medidas restritivas impostas, a população que vive em situação de vulnerabilidade social, por apresentar renda mais baixa e acesso limitado a uma alimentação adequada, vivenciou um agravamento dessa situação, refletido no aumento da insegurança alimentar2222 Silva-Neto LGR, Bueno NB, Santos TLF, Queiroz JCLS, Francelino JMA, Pureza IROM, et al. Avaliação da insegurança alimentar no contexto da Covid-19: associação com o auxílio emergencial e recebimento de doação de alimentos na população em vulnerabilidade social de uma capital do Nordeste do Brasil. Cienc Saude Colet. 2023; 28(3):721-30.. Inicialmente, os restaurantes populares de Belo Horizonte, nos quais a PSR goza do benefício da gratuidade, fecharam. A doação de comida realizada pela população e pelos restaurantes do centro da cidade cessou. O acesso à água potável ficou ainda mais difícil. No início de maio, os restaurantes populares reabriram, porém, apenas para a distribuição de marmitas, em alguns pontos externos, de forma a evitar aglomerações.
Os serviços prestados pelo SUS e pelo SUAS também foram impactados. O SUS/BH sofreu uma reorganização assistencial visando ao enfrentamento à pandemia. Em sua primeira Nota Técnica Assistencial (NT) do período pandêmico – NT 001/20202323 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Nota Técnica 001/2020. Belo Horizonte: SMSA; 2020. –, reafirmou a necessidade do isolamento social. Nesse sentido, destacou a importância do reforço das orientações à população sobre medidas de prevenção à infecção por Covid-19. “Uma das formas de controle e prevenção é o isolamento social”2323 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Nota Técnica 001/2020. Belo Horizonte: SMSA; 2020. (p. 1). Essa NT também restringiu o acesso dos usuários aos centros de saúde, por meio da suspensão, ainda que temporária, de várias atividades.
Algum tempo depois, o SUS/BH transformou nove centros de saúde (um por regional) em Unidades de Atendimento 24 horas não Covid-19. Essas unidades deveriam fornecer retaguarda para as Unidades de Pronto Atendimento (UPA), ampliando a capacidade assistencial aos usuários com quadro clínico agudo, sem queixas respiratórias. Essa ação ocorreu nos meses de março a agosto de 20212424 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de gestão 2021 [Internet]. Belo Horizonte: SMSA; 2022 [citado 5 Jun 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2022/rag2021.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa... . Entre os centros de saúde selecionados, estava o Centro de Saúde Carlos Chagas, um dos serviços com maior número de atendimentos à PSR. Se, por um lado, a iniciativa atingiu seu objetivo “de diminuir o atendimento de porta das Unidades de Pronto Atendimento”2424 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de gestão 2021 [Internet]. Belo Horizonte: SMSA; 2022 [citado 5 Jun 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2022/rag2021.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa... (p. 39), por outro, forçou o encaminhamento da PSR para outros centros de saúde, dificultando o acesso e propiciando a quebra do vínculo assistencial.
Por sua vez, o SUAS/BH permitiu o fechamento, de março a outubro de 2020, do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e do Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), transferindo seu atendimento presencial para o modo remoto, via telefone. Os Centros Pop tiveram redução do número de atendimentos, com alteração do tempo de permanência e da oferta de atividades coletivas; e os acolhimentos institucionais na modalidade casa de passagem, também chamados de abrigos e albergues, reduziram o número de vagas em função da necessidade de garantir o distanciamento físico99 Instituto René Rachou Fiocruz Minas. Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a população em situação de rua frente à pandemia da Covid-19. Belo Horizonte: Fiocruz-Minas; 2020..
Todavia, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), por meio de uma ação intersetorial entre a Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) e Secretaria Municipal de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania (SMASAC), implantou o Serviço de Acolhimento Provisório e Emergencial para a PSR, pessoas em situação de vulnerabilidade e pessoas em risco social. O serviço tinha como objetivo possibilitar o distanciamento físico de pessoas nessa condição que estivessem com suspeita e/ou diagnóstico de Covid-192525 Belo Horizonte. Secretaria de Assistência Social, Segurança Alimentar e Cidadania. Orientação Técnica DPES/SUASS nº 012/2020. Orientações técnicas aos serviços socioassistenciais de atendimento e acompanhamento à população em situação de rua sobre o acolhimento provisório e emergencial dos usuários com indicativo pela saúde de isolamento social domiciliar por suspeita e, ou, confirmação da Covid-19. Belo Horizonte: SMASAC; 2020.. A criação e o funcionamento desse equipamento foram bem avaliados pelos gestores, trabalhadores e PSR99 Instituto René Rachou Fiocruz Minas. Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a população em situação de rua frente à pandemia da Covid-19. Belo Horizonte: Fiocruz-Minas; 2020..
Pandemia, desinformação e reprodução de estigmas
Eu estava fazendo o encaminhamento pra ele [que fazia parte da PSR], e ele falou assim: “que que tá acontecendo, que ninguém tá dando a mão pra ninguém?” O que tá acontecendo? Eu não tô sabendo não! Ninguém tá dando a mão pra ninguém?”
(Gestor do SUAS)
Teve de tudo [...], gente que achava que por usar droga não pegaria, apareceu também a questão da exclusão social: “a gente não pega porque ninguém aproxima da gente”.
(Trabalhador do Consultório na Rua)
E as pessoas em situação de rua assim: “Nossa, ninguém tá chegando perto da gente”. Então eles achavam que a peste fosse eles, que a peste estava com eles porque ninguém estava chegando perto e eles estavam desinformados.
(Trabalhador da Defensoria Pública)
Ao analisar, nos três níveis de gestão, o modelo utilizado nas estratégias de comunicação, verificou-se o predomínio do modelo informacional, linear e unidirecional, marcado pela transferência de informações. Nenhuma das estratégias utilizou a comunicação dialógica2626 Santos MOS, Peixinho BC, Cavalcanti AMC, Silva LGF, Silva LIM, Lins DOA, et al. Estratégias de comunicação adotadas pela gestão do Sistema Único de Saúde durante a pandemia de Covid-19 - Brasil. Interface (Botucatu). 2021; 25 Supl 1:e200785. doi: 10.1590/interface.200785.
https://doi.org/10.1590/interface.200785... . Entretanto, no enfrentamento à pandemia da Covid -19, tão importante quanto comunicar o risco é analisar as percepções das pessoas, objetivando a troca de informações qualificadas2727 Moreno AB, Matta GC. Covid-19 e o dia em que o Brasil tirou o bloco da rua: acerca das narrativas de vulnerabilizados e grupos de risco. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 41-50..
Moreno e Matta2727 Moreno AB, Matta GC. Covid-19 e o dia em que o Brasil tirou o bloco da rua: acerca das narrativas de vulnerabilizados e grupos de risco. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 41-50. descrevem o ingresso do Brasil na pandemia como o dia em que o país encontrou a peste. Já a narrativa aqui apresentada descreve a PSR como sendo a própria peste. Identificar a peste como a si próprios reflete a identificação das representações sociais dirigidas a eles por eles mesmos, em um processo de reprodução de estigmas, afetando negativamente suas identidades2828 Brito C, Silva LN. População em situação de rua: estigmas, preconceitos e estratégias de cuidado em saúde. Cienc Saude Colet. 2022; 27(1):151-60..
Dessa maneira, o entrevistado da Defensoria Pública vê a PSR desinformada. Outra possibilidade da desinformação na infodemia, segundo a OMS1111 Organização Mundial da Saúde, Organização Pan-americana da saúde. Folha informativa – Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus) [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 15 Jul 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875
https://www.paho.org/bra/index.php?optio... , é a informação falsa ou imprecisa cuja intenção deliberada é enganar. Para Alzamora44 Alzamora GC. Fixação de crenças em torno de desinformação no contexto da infodemia. In: Victor C, Sousa CM, organizadores. A pandemia na sociedade de risco: perspectivas da comunicação. Campina Grande: EDUEPB; 2021. p. 165-79., a aceitação social de uma crença comum, ainda que esta possa ser nitidamente falsa, é que impulsiona a dinâmica da desinformação.
Lima2929 Lima ALM. A miséria moral da ralé. In: Souza J, organizador. Crack e exclusão social. Brasília: Ministério da Justiça e Cidadania; 2016. p. 39-74., em pesquisa com pessoas que fazem uso prejudicial de crack, ressalta que as vivências desses sujeitos são atravessadas por outros marcadores de vulnerabilidade relacionados à classe, raça e gênero, sendo permeados por processos de exclusão social. Diante disso, é importante observar que o uso de drogas se dá, muitas vezes, como forma de sustentar as condições de vida marginalizadas e precárias em que essas pessoas se encontram, as inserindo ainda mais em um ciclo de vulnerabilização, marginalização e desprezo social2929 Lima ALM. A miséria moral da ralé. In: Souza J, organizador. Crack e exclusão social. Brasília: Ministério da Justiça e Cidadania; 2016. p. 39-74.. Essa pontuação colabora para a compreensão da PSR como protegida do vírus devido ao distanciamento que esse grupo populacional é colocado socialmente e ao uso de substâncias estigmatizadas.
A PBH, enquanto fonte de informação institucional, elaborou e divulgou cartazes para a população em geral, com orientações sobre autocuidado, higiene individual, medidas de prevenção e orientações sobre os sintomas da Covid -19. Produziu também material informativo específico sobre o novo coronavírus com um teor educativo3030 Prefeitura de Belo Horizonte. Materiais educativos [Internet]. Belo Horizonte: Prefeitura de Belo Horizonte; 2020 [citado 3 Jul 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/saude/coronavirus
https://prefeitura.pbh.gov.br/saude/coro... , para vilas, favelas, aglomerados, ocupações urbanas e proteção de idosos. Promoveu ações em locais de grande concentração de PSR, com orientações sobre doenças respiratórias e entrega de máscaras para proteção contra a Covid-19 e de kits de higiene3131 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de gestão 2020 [Internet]. Belo Horizonte: SMSA; 2021 [citado 3 Maio 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2021/rag-2020.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa... . Todavia, não foram encontrados materiais informativos direcionados à PSR. Ainda que existam algumas semelhanças em relação às vulnerabilidades, é necessário que as respostas atendam à singularidade de cada grupo populacional3232 Schmidt B, Noal DS, Melo BD, Freitas CM, Ribeiro FML, Passos MFD. Saúde mental e atenção psicossocial a grupos populacionais vulneráveis por processos de exclusão social na pandemia de Covid-19. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 87-98.. Desse modo, esse grupo ficou excluído de informações confiáveis e relevantes no combate à Covid -19 e à desinformação.
Pandemia, desinformação e vacinação
Tomei a vacina no Centro Pop, lá da (rua) Além Paraíba.
(Pessoa em situação de rua)
Fui no Carlos Chagas [centro de saúde] e fui vacinado, só que como a gente tá na rua, a gente não liga pra nada.
(Pessoa em situação de rua)
A gente foi quantificando sobre a quantidade de pessoas que não estavam aceitando a vacinação. Isso deixou a gente muito impressionada, assim, sabe? De muita recusa. E a maioria das recusas dizendo que o vírus não era real; “a gente está tanto tempo aqui na rua e não aconteceu nada”. Ou teve usuário também que falou assim: “Ah, não sei quem vacinou e depois morreu”. E teve gente inclusive trazendo questão de política, de ter uma retórica bolsonarista e dizer que não era isso tudo, sabe, assim?
(Gestor do SUS)
É a desinformação, isso que a gente vem combatendo no Brasil, muito largamente durante toda a pandemia. Ela consome muito a PSR. Então, pessoas com medo de vacinar, porque essa vacina é pra matar a população em situação de rua. É PSR, não precisa, pessoas em situação de rua não precisam vacinar porque são imunes...
(Trabalhador da Defensoria Pública)
A gente vem vendo a CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] da Covid e muita matéria sobre vacina. Aprendi muito sobre o que é a vacina, mas eu, até então, eu tô me resguardando com esse mínimo dessa higiene e tal e afastamento social. E aguardando pra ver o que é essa vacina. Claro que não indo contra toda ciência, mas sim tendo a paciência, tranquilidade, para entender mais. Não é porque, fala que pedra é pedra [...] que eu tenho que acreditar imediatamente.
(Pessoa em situação de rua)
O uso emergencial de vacinas contra a Covid -19 no Brasil foi autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro de 20213333 Silva GM, Sousa AAR, Almeida SMC, Sá IC, Barros FR, Sousa Filho JES, et al. Desafios da imunização contra Covid-19 na saúde pública: das fake news à hesitação vacinal. Cienc Saude Colet. 2023; 28(3):739-48.. O Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid -19, apresentado pela Secretaria Extraordinária de Enfrentamento a Covid -19, seria mais uma medida no combate à doença. O plano considerava a existência de grupos com alto grau de vulnerabilidade social e, consequentemente, suscetíveis a um maior dano causado pela doença, sendo a PSR considerada grupo prioritário para o recebimento da vacina3434 Brasil. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. 12a ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2022..
A vacinação teve início em fevereiro de 20212424 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de gestão 2021 [Internet]. Belo Horizonte: SMSA; 2022 [citado 5 Jun 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2022/rag2021.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa... . Em Belo Horizonte, aconteceu em todos os centros de saúde; nos locais de atuação dos Consultórios na Rua; no Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS); em ações da SMSA nas regionais administrativas, em locais de maior concentração da PSR; em ações da SMSA nos Centros Pop, abrigos e albergues; e no Canto da Rua Emergencial2424 Belo Horizonte. Secretaria Municipal de Saúde. Relatório de gestão 2021 [Internet]. Belo Horizonte: SMSA; 2022 [citado 5 Jun 2023]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2022/rag2021.pdf
https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/defa... .
Apesar das evidências científicas favoráveis à vacinação, houve resistência de alguns que questionaram a eficácia e segurança do imunizante, resultando em uma baixa adesão por uma parcela da população3232 Schmidt B, Noal DS, Melo BD, Freitas CM, Ribeiro FML, Passos MFD. Saúde mental e atenção psicossocial a grupos populacionais vulneráveis por processos de exclusão social na pandemia de Covid-19. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 87-98.. Infelizmente, parte dos brasileiros não compreendeu a vacinação como direito básico e necessário à continuidade da própria vida3535 Muchagata M, organizadora. Fique em casa? Desafios e experiências das comunidades de práticas em atenção primária em saúde para populações em situação de rua no contexto da Covid-19. Brasília: ComPAPS; 2023. Boas práticas de atendimento à população em situação de rua no contexto da pandemia voltadas à imunização, intersetorialidade e cuidados; parte 7.. Não é à toa que a OMS3636 Organização Pan-Americana da Saúde. Dez ameaças à saúde que a OMS combaterá em 2019 [Internet]. Washington: Opas; 2019 [citado 27 Nov 2023]. Disponível em: https://www.paho.org/pt/noticias/17-1-2019-dez-ameacas-saude-que-oms-combatera-em-2019
https://www.paho.org/pt/noticias/17-1-20... considerou a hesitação/recusa de parte da população para realizar a vacinação como uma das dez ameaças a serem enfrentadas na área da Saúde.
A atuação de grupos antivacina, até então sem grande mobilização no país, contribuiu com essa hesitação, assim como a falta de incentivo à vacinação pelo governo federal e, principalmente, a veiculação de notícias falsas, que distorcem a realidade e espalham a desinformação1414 Bueno FTC, Souto EP, Matta GC. Notas sobre a Trajetória da Covid-19 no Brasil. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 27-39..
Massarani et al.3737 Massarani LM, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da Covid-19. Liinc Rev. 2021; 17(1):e5689. observaram:
A hesitação vacinal é especialmente grave no contexto da pandemia, no qual diversas autoridades, incluindo o presidente da República, fizeram uso das redes para minimizar a gravidade da doença, atacar medidas de distanciamento e pôr em dúvida a segurança das vacinas. Isso se refletiu em um desinteresse do governo federal na aquisição de vacinas e na ausência de uma coordenação nacional para imunizar a população3737 Massarani LM, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da Covid-19. Liinc Rev. 2021; 17(1):e5689.. (p. 2)
Segundo Almeida3838 Almeida C. O uso político da desinformação e os meios para enfrentá-la. Coronavírus em xeque [Internet]. Luxembourg: Spotify; 2020 [citado 27 Ago 2023]. Disponível em: https://open.spotify.com/episode/6El7A5dZWc89JIFwSuYuNU
https://open.spotify.com/episode/6El7A5d... , vivenciamos uma onda de desinformação, cada vez mais aprimorada e com finalidades políticas. Dessa maneira, a sociedade está vulnerável à circulação de conteúdos falsos. Mărcău3939 Mărcău F-C, Purec S, Niculescu G. Study on the refusal of vaccination against Covid-19 in Romenia. Vaccines (Basel). 2022; 10(2):261. doi: 10.3390/vaccines10020261.
https://doi.org/10.3390/vaccines10020261... , ao buscar causas para a hesitação vacinal em um país do Leste Europeu, citou notícias falsas que consideravam a pandemia irreal e uma que associa as vacinas à redução populacional terrestre e ao extermínio de idosos.
Por um lado, circularam publicações nos grandes conglomerados jornalísticos de especialistas e instituições vinculadas à ciência e à saúde – com reconhecimento da OMS, da Anvisa, de hospitais e de unidades básicas de saúde – como fontes relevantes de informações sobre a Covid -19. Por outro lado, circularam também opiniões de indivíduos baseadas em suas vivências pessoais55 Lerner K, Cardoso JM, Clébicar T. Covid-19 nas mídias: medo e confiança em tempos de pandemia. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 221-31..
A disseminação de distorções e de calúnias sobre as vacinas tem causado preocupações, interferindo de maneira significativa na aceitação da vacinação por parte da população, que acaba optando por não se vacinar. É o caso do representante da PSR, que, apesar de ter tido acesso a uma fonte confiável de informação – a CPI da Covid -19 –, afirma que vai aguardar. Assim, ao desconfiar da vacina, as pessoas se tornam susceptíveis a desenvolver a forma grave da doença, em razão de resistirem à vacinação3333 Silva GM, Sousa AAR, Almeida SMC, Sá IC, Barros FR, Sousa Filho JES, et al. Desafios da imunização contra Covid-19 na saúde pública: das fake news à hesitação vacinal. Cienc Saude Colet. 2023; 28(3):739-48..
Assim como o presidente na época minimizou a gravidade da doença3737 Massarani LM, Leal T, Waltz I, Medeiros A. Infodemia, desinformação e vacinas: a circulação de conteúdos em redes sociais antes e depois da Covid-19. Liinc Rev. 2021; 17(1):e5689., parte da PSR também se envolveu na rede da desinformação e negou a existência do vírus, e, como outros indivíduos da sociedade brasileira, relataram suas vivências para justificar a hesitação vacinal. A constatada convergência de ideias e crenças induz ao seguinte questionamento: a PSR está mesmo à margem da sociedade, ou ela é considerada marginal apenas na garantia dos direitos sociais2828 Brito C, Silva LN. População em situação de rua: estigmas, preconceitos e estratégias de cuidado em saúde. Cienc Saude Colet. 2022; 27(1):151-60.?
Pandemia da Covid-19 e infodemia
Eu lembro que o primeiro resultado que eu dei, positivo, o moço [pessoa em situação de rua] começou a chorar [...]. “Eu vou morrer?” Eu falei: “Não calma, você não vai morrer”. Mas, no início, a mídia fez parecer que todo mundo ia morrer, principalmente idoso.
(Gestor do SUAS)
A gente não sabe pra que lado a mídia tá torcendo mais. Então eu fiquei muito pesarosa por ter vivido isso tudo assim. Me deu, sabe, uma angústia, uma dor no estômago. Faltou muita informação, por um lado, e teve um excesso, ah, não sei... teve um excesso.
(Gestor do SUAS)
O acompanhamento diário pela mídia dos números da pandemia buscava comprovar a gravidade da crise sanitária, sensibilizando a população. Desse modo, jornais utilizaram infográficos mostrando os “casos confirmados” e as “mortes”55 Lerner K, Cardoso JM, Clébicar T. Covid-19 nas mídias: medo e confiança em tempos de pandemia. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 221-31.. No início de junho de 2020, sob suspeita de falta de transparência do Ministério da Saúde, em função da alteração da metodologia da divulgação dos números da doença, os veículos de comunicação se uniram, com objetivo de compilar os números da doença no país, assegurando, assim, a fidedignidade dos dados e a empatia da sociedade55 Lerner K, Cardoso JM, Clébicar T. Covid-19 nas mídias: medo e confiança em tempos de pandemia. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 221-31..
Em paralelo, perfis populacionais foram sendo desenhados em um processo político, científico e social que vislumbrava prever as consequências negativas da Covid -19. Os idosos foram relacionados nesses perfis em função de uma associação desastrosa entre multimorbidade e Covid -192727 Moreno AB, Matta GC. Covid-19 e o dia em que o Brasil tirou o bloco da rua: acerca das narrativas de vulnerabilizados e grupos de risco. In: Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. p. 41-50..
Lidar com a sobrecarga informacional vivenciada no período da pandemia, resultado do aumento dos canais, mídias e redes sociais, representa um desafio para qualquer cidadão1313 Gonçalves CC, Barbosa RR. Relevância das fontes de informação no cenário brasileiro durante a pandemia de Covid-19. RECIIS. 2023; 17(1):67-83.. Desse modo, pode ocorrer uma sensação de falta de informação quando não se consegue acessar informações verdadeiras, confiáveis e úteis às necessidades.
De acordo com a OMS33 Organização Pan-Americana da Saúde. Entenda a infodemia e a desinformação na luta contra a Covid-19 [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 5 Jul 2023]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/52054/Factsheet-Infodemic_por.pdf
https://iris.paho.org/bitstream/handle/1... , a infodemia tem a capacidade de fazer com que as pessoas se sintam ansiosas, deprimidas, sobrecarregadas e emocionalmente exaustas, sendo nesse sentido que o gestor do SUAS desabafa. De fato, a mídia, na difusão da informação para a sociedade, atribui sentidos e emoções que obedecem a inúmeras lógicas, intencionalmente ou não, e podem produzir informações falsas ou distorcidas e/ou “promover o bombardeio de informações levando à exaustão, desinteresse e até mesmo adoecimento da população”4040 Matta GC, Rego S, Souto EP, Segata J, organizadores. Os impactos sociais da Covid-19 no Brasil: populações vulnerabilizadas e respostas à pandemia. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021. (p. 2).
Conclusão
Para além das consequências sanitárias, um dos efeitos da pandemia foi colocar em evidência a importância da esfera comunicacional para as medidas de enfrentamento de emergências e os efeitos negativos de sua negligência. Os resultados apontam que, efetivamente, a comunicação relacionada à pandemia foi considerada como um fator de menor importância no planejamento público, ou ainda como uma não questão, sendo apenas um meio de transferência das informações disponibilizadas publicamente pela prefeitura. Essa postura relegou a “tradução” das informações oficiais, por vezes complexas e oscilantes, tanto para a mídia quanto para as competências individuais dos trabalhadores da linha de frente enquanto uma função rotineira, sem coordenação ou capacitação, considerando as condições extraordinárias da pandemia e as diferenças de interpretação ou de locução entre esses trabalhadores. Dessa forma, não houve um planejamento estratégico ou monitoramento de como as informações de interesse público de saúde chegariam e seriam interpretadas pelo público.
Para agravamento do cenário, os efeitos da pandemia, que impactaram com maior intensidade os grupos mais vulnerabilizados, somaram-se aos efeitos psicológicos e psicossomáticos da desinfodemia. Foram induzidos processos de dúvidas relacionadas às figuras públicas e autoridades sanitárias; e foram reforçados os estigmas sociais vigentes e a internalização desses estigmas pela própria PSR, além da falsa sensação de “segurança” do vírus por experiências e comportamentos, como que o uso de álcool os protegeria contra o vírus, de parte desse grupo populacional.
Além disso, se houvesse um maior esforço comunicativo de ouvir as demandas e necessidades da própria PSR durante o período, o aumento da marginalização e o agravamento das vulnerabilidades desse grupo populacional devido aos efeitos colaterais das próprias medidas de enfrentamento da pandemia seriam percebidos. O fechamento da cidade potencializou a insuficiência das condições de garantia da dignidade humana, representada, por exemplo, pelas dificuldades de acesso à alimentação, à água potável, a instalações sanitárias e à moradia. O fechamento presencial de determinados equipamentos do SUAS e barreiras de acesso ao SUS também contribuíram para que impactos da pandemia atingissem a PSR de maneira desigual em relação ao restante da população.
Por consequência, a negligência pública comunicacional implicou na inobservância de uma dimensão do enfrentamento à pandemia que influi diretamente na sociabilização do comportamento sanitário da população. Assim, não foi uma surpresa a demora da identificação do alastro da desinfodemia, sendo o problema percebido apenas após a manifestação comportamental de negação às medidas de enfrentamento e a ausência de uma resposta municipal a tempo de contornar os efeitos negativos dessa negação na população. Isso indicou uma limitação de compreensão do poder municipal sobre a importância pública da comunicação e pouca responsabilidade governamental de garantir o direito ao acesso às informações de saúde e bem-estar enquanto bens públicos. Ainda, há aqueles que defendem a necessidade de revisão da atribuição de um papel de interesse público nas mãos majoritárias do setor privado de comunicação sem maior coordenação ou supervisão pública e/ou sem alternativas públicas de mesmo impacto populacional, especialmente em casos de emergências nos quais o processo comunicativo efetivo é essencial para a sua superação em tempo hábil.
É imperativo que as estratégias de comunicação pública sejam inclusivas; dialógicas; com identificação e escuta dos grupos populacionais mais vulneráveis; e adaptadas às necessidades específicas desses grupos. Esses esforços necessitam ser guiados pelo objetivo de prover acesso a informações precisas e confiáveis, essenciais para a tomada de decisões informadas em tempos de crise; e de mitigar os possíveis efeitos desiguais das emergências e de suas medidas de enfrentamento.
- Oliveira AMC, Dantas ACMTV, Souza AA, Marinho RA, Martins ALJ, Paes-Sousa R. População em situação de rua: comunicação e (des)informação no contexto da pandemia de Covid-19. Interface (Botucatu). 2024; 28: e230433 https://doi.org/10.1590/interface.230433
Financiamento
A pesquisa “Alcance das políticas de proteção social e de saúde do município de Belo Horizonte para a PSR frente à pandemia da Covid-19” foi financiada pelo Edital Inova do Programa Institucional de Territórios Sustentáveis e Saudáveis (PITSS). As autoras Ana Carolina de Moraes Teixeira Vilela Dantas e Rafaela Alves Marinho recebem apoio de bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) – Brasil.
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» https://www.paho.org/pt/noticias/5-5-2023-oms-declara-fim-da-emergencia-saudepublica-importancia-internacional-referente - 2Ferrari L. OMS decreta fim da emergência de saúde da pandemia de Covid-19 após três anos [Internet]. São Paulo: Estadão; 2023 [citado 5 Jul 2023]. Disponível em: https://www.estadao.com.br/saude/oms-decreta-fim-da-pandemia-de-covid-19/
» https://www.estadao.com.br/saude/oms-decreta-fim-da-pandemia-de-covid-19/ - 3Organização Pan-Americana da Saúde. Entenda a infodemia e a desinformação na luta contra a Covid-19 [Internet]. Washington: Opas; 2020 [citado 5 Jul 2023]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/52054/Factsheet-Infodemic_por.pdf
» https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/52054/Factsheet-Infodemic_por.pdf - 4Alzamora GC. Fixação de crenças em torno de desinformação no contexto da infodemia. In: Victor C, Sousa CM, organizadores. A pandemia na sociedade de risco: perspectivas da comunicação. Campina Grande: EDUEPB; 2021. p. 165-79.
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
13 Maio 2024 - Data do Fascículo
2024
Histórico
- Recebido
06 Set 2023 - Aceito
10 Jan 2024