Promoção de Saúde Mental na atenção primária: o papel dos grupos de saúde na perspectiva de usuários e profissionais

Mental health promotion in primary health care: the role of health groups from the perspective of patients and professionals

Promoción de la salud mental en la atención primaria: el papel de los grupos de salud en la perspectiva de usuarios y profesionales

Viviane Nogueira de Zorzi Sharon da Silva Martins Danielle de Amaral Macedo Luís Antônio Sangioni Sobre os autores

Resumos

O objetivo do estudo foi descrever e analisar a percepção dos usuários e profissionais de uma equipe de Saúde da Família em relação à oferta de grupos como estratégia para promover a Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde (APS). Trata-se de uma pesquisa descritiva, exploratória e qualitativa realizada em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de Santa Maria, RS. Utilizou-se a análise de conteúdo e cinco categorias emergiram: 1) APS centrada no sujeito e na sua comunidade; 2) Acolhimento e construção de vínculo; 3) Efetivação da promoção de Saúde Mental em dispositivos comunitários e territoriais; 4) Cuidado em Saúde Mental: construindo caminhos e 5) Trabalho em rede: uma expectativa. Os grupos despontaram como potenciais promotores de Saúde Mental na APS. Por enfatizar o componente socioafetivo e a longitudinalidade do cuidado, eles favorecem o bem-estar físico e mental dos usuários, fortalecendo sua autonomia e independência.

Palavras-chave
Promoção de saúde; Atenção primária à saúde; Saúde mental


The aim of this study was to analyze and describe the perceptions of patients and family health team staff regarding the role of health groups as a strategy for promoting mental health in primary health care (PHC). We conducted an exploratory descriptive study in a primary care center in Santa Maria, Rio Grande do Sul. The data were analyzed using content analysis, resulting in the emergence of five categories: 1) Patient and community-centered PHC; 2) Welcoming and building bonds; 3) The effective implementation of mental health promotion in community and territorial services; 4) Mental health care: building pathways; and 5) Working in networks: an expectation. Groups emerged as potential promotors of mental health in PHC. By emphasizing the socio-affective component and longitudinality of care, groups promote patient physical and mental well-being, strengthening autonomy and independence.

Keywords
Health promotion; Primary health care; Mental health


El objetivo del estudio fue describir y analizar la percepción de los usuarios y profesionales de un equipo de salud de la familia, en relación a la oferta de grupos como estrategia para promover la salud mental en la Atención Primaria de la Salud (APS). Se trata de una investigación descriptiva, exploratoria y cualitativa realizada en una Unidad Básica de Salud (UBS) de Santa Maria, Estado de Rio Grande do Sul. Se utilizó el análisis de contenido y surgieron cinco categorías: 1) APS centrada en el sujeto y en su comunidad; 2) Acogida y construcción de vínculo; 3) Efectuación de la promoción de salud mental en dispositivos comunitarios y territoriales; 4) Cuidado en salud mental: construcción de caminos y 5) Trabajo en red: una expectativa. Los grupos surgieron como potenciales promotores de salud mental en la APS. Por enfatizar el componente socioafectivo y la longitudinalidad del cuidado, ellos favorecen el bienestar físico y mental de los usuarios, fortaleciendo su autonomía e independencia.

Palabras clave
Promoción de la salud; Atención primaria de la salud; Salud mental


Introdução

A Reforma Psiquiátrica no Brasil é resultado do Movimento Sanitário dos anos 1970, que propôs novas práticas terapêuticas para incluir os usuários de Saúde Mental na cultura e na sociedade. Essa transformação significou a transição de um modelo predominantemente hospitalocêntrico para uma rede de serviços comunitários11 Amarante P, Nunes MO. A reforma psiquiátrica no SUS e a luta por uma sociedade sem manicômios. Cienc Saude Colet. 2018; 23(6):2067-74.,22 Amarante P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2007.. Desde então, a Atenção à Saúde Mental tem sido foco de inúmeras discussões em virtude do impacto que os transtornos mentais e condições associadas têm ocasionado na sociedade de forma individual e/ou coletiva33 World Health Organization. World mental health report: transforming mental health for all [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [citado 29 Jun 2023]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1
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,44 Patel V, Saxena S, Lund C, Thornicroft G, Baingana F, Bolton P, et al. The Lancet Commission on global mental health and sustainable development. Lancet. 2018; 392(10157):1553-98..

As condições de Saúde Mental são altamente prevalentes, acometendo cerca de uma em cada oito pessoas globalmente33 World Health Organization. World mental health report: transforming mental health for all [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [citado 29 Jun 2023]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1
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. Porém, as políticas de Saúde Mental enfrentam lacunas em informações, pesquisas, governança, serviços e recursos55 Organização Pan-Americana da Saúde. La carga de los trastornos mentales en la Región de las Américas, 2018 [Internet]. Washington: OPAS; 2018 [citado 20 Dez 2021]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/49578/9789275320280_spa.pdf
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. Desse modo, a Saúde Mental frequentemente fica em segundo plano em relação a outras condições de saúde, e o suporte financeiro dos seus orçamentos é consistentemente insuficiente33 World Health Organization. World mental health report: transforming mental health for all [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [citado 29 Jun 2023]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1
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. Em países em desenvolvimento, por exemplo, mais de 70% dos recursos destinados à Saúde Mental são alocados em hospitais psiquiátricos33 World Health Organization. World mental health report: transforming mental health for all [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [citado 29 Jun 2023]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1
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, comprometendo a capacidade de oferecer uma abordagem abrangente e eficaz para a Saúde Mental em todos os níveis de cuidado. Além disso, não se leva em consideração a necessidade de intervenções que a promovam e protejam, as quais devem envolver diversos setores, exigindo suportes e serviços além do tratamento convencional33 World Health Organization. World mental health report: transforming mental health for all [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [citado 29 Jun 2023]. Disponível em: https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1
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,55 Organização Pan-Americana da Saúde. La carga de los trastornos mentales en la Región de las Américas, 2018 [Internet]. Washington: OPAS; 2018 [citado 20 Dez 2021]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/49578/9789275320280_spa.pdf
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.

Dentre esses serviços, as equipes de Atenção Primária à Saúde (APS) desempenham um papel importante na composição da rede comunitária de assistência em Saúde Mental22 Amarante P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2007.. A APS é responsável por ações que visam ao tratamento, à prevenção da doença, à promoção e à reabilitação da saúde, incluindo ações relacionadas à promoção de Saúde Mental66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de Setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 1 Jul 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
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, em que grande parte dos trabalhadores da APS ancora seus relatos com ênfase na abordagem às pessoas com diagnósticos de transtorno mental, o que remete ao conceito biologicista77 Moliner J, Lopes SMB. Saúde mental na atenção básica: possibilidades para uma prática voltada para a ampliação e integralidade da saúde mental. Saude Soc. 2013; 22(4):1072-83.,88 Santos SKZ, ROS MA. Ressignificando promoção de saúde em grupos para profissionais da saúde. Rev Bras Educ Med. 2016; 40(2):189-96.. Tal perspectiva contribui para que muitos profissionais de saúde neguem as questões subjetivas que envolvem os usuários, não reconhecendo a importância de promover a Saúde Mental de forma abrangente88 Santos SKZ, ROS MA. Ressignificando promoção de saúde em grupos para profissionais da saúde. Rev Bras Educ Med. 2016; 40(2):189-96., independentemente de um quadro de sofrimento mental instalado.

No Brasil, os grupos operativos têm sido empregados em várias áreas da saúde, principalmente na APS do Sistema Único de Saúde (SUS)99 Menezes KKP, Avelino PR. Grupos operativos na Atenção Primária à Saúde como prática de discussão e educação: uma revisão. Cad Saude Colet. 2016; 24(1):124-30., e podem compreender importantes estratégias para a promoção de Saúde Mental no contexto do território da APS. A abordagem do grupo operativo é um método interdisciplinar de trabalho com pessoas, visando estimular, dentre outras questões, um processo de aprendizagem para os participantes. Essa abordagem é centrada no sujeito, considerando sua relação com o objeto e o grupo, e fundamentada na estrutura de vínculos que molda a intervenção grupal1010 Pinho ES, Nunes FC, Vale RRM, Sousa JM, Silva NS. Grupo operativo como estratégia do processo de ensino aprendizagem. Rev Gepesvida. 2019; 5(11):14-29..

A investigação sobre os grupos operativos e a promoção da Saúde Mental na APS ainda se encontra em estágio inicial. Um estudo realizado em Ribeirão Preto (SP) avaliou as percepções dos usuários de Saúde Mental participantes dos grupos oferecidos por uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e revelou que eles expressaram o desejo de os profissionais de saúde ampliarem as atividades de promoção da saúde, destacando que os serviços de saúde deveriam ter uma abordagem mais ampliada, além das atividades técnicas e com fins curativos1111 Frateschi MS, Cardoso CL. Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde: avaliação sob a ótica dos usuários. Physis. 2014; 24(2):545-65.. Contudo, não foram identificados estudos que abordassem a percepção de ambos, profissionais e usuários, em relação à promoção da Saúde Mental por meio de grupos de saúde.

Nesse contexto, considera-se que os grupos de saúde possuem grande potencial para serem utilizados como ferramenta terapêutica e estratégia de promoção da Saúde Mental no âmbito da APS. Portanto, o objetivo deste estudo foi descrever e analisar a percepção dos usuários e profissionais de uma equipe de Saúde da Família em relação à oferta de grupos como estratégia para promover a Saúde Mental na Atenção Primária à Saúde.

Métodos

Desenho de estudo e amostra

Foi conduzida uma pesquisa de natureza qualitativa, exploratória e descritiva no município de Santa Maria, no período de setembro de 2019 a janeiro de 2020. Santa Maria caracteriza-se como um município de médio porte localizado na região central do estado do Rio Grande do Sul, em que o último censo registrou uma população estimada de 285.159 pessoas1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Santa Maria (RS): cidades e estados - IBGE [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2023 [citado 4 Jul 2023]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/rs/santa-maria.html
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.

O estudo foi realizado com uma equipe de Saúde da Família (eSF) que pertence à região norte da cidade de Santa Maria (RS) e possui aproximadamente quatro mil e quinhentos usuários cadastrados em seu território de abrangência, compreendendo cinco microáreas. A equipe realiza as atividades voltadas à promoção da saúde integral66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de Setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 1 Jul 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
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, tais como: os grupos “Semeando arte”, de artesanato, e o “Semeando Saúde”, grupo de convivência, selecionados para o estudo.

Critério de inclusão e exclusão

O estudo incluiu profissionais da equipe de Saúde da Família selecionada e usuários que participam dos grupos de saúde oferecidos no território adstrito. Os profissionais de saúde matriciais foram excluídos do estudo, pois não participaram dos encontros dos grupos selecionados.

Coleta e análise de dados

As coletas de dados se operacionalizaram por meio de entrevista semiestruturada (Quadro 1) e da observação do pesquisador participante com registro em diário de campo (Quadro 2), obtido por um Roteiro de Campo adaptado1313 Oliveira RCM. (Entre) linhas de uma pesquisa: o diário de campo como dispositivo de (in) formação na/da abordagem (Auto) biográfica. Rev Bras Educ Jovens Adultos. 2014; 2(4):69-87.. A utilização desses métodos traz diferentes informações sobre o contexto e o fenômeno investigado, o que permite melhor compreensão e integralização dos dados para posterior processo de análise1414 Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 14a ed. São Paulo: Hucitec; 2014.,1515 Moré CLO. A “entrevista em profundidade” ou “semiestruturada”, no contexto da saúde: dilemas epistemológicos e desafios de sua construção e aplicação [Internet]. In: Anais do 3o Congresso Ibero-Americano de Investigação Qualitativa, CIAIQ; 2015; Badajoz (ES). Badajoz: Universidade da Extremadura; 2015 [citado 4 Jul 2023]. pp.126-131. Disponível em: https://proceedings.ciaiq.org/index.php/ciaiq2015/article/view/158/154CIAIQ 2015;
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.

Quadro 1
Roteiro da entrevista semiestruturada feita com os profissionais e usuários
Quadro 2
Diário de Campo.

A observação participante e os registros de campo ocorreram durante doze encontros dos grupos, e as entrevistas foram realizadas após os encontros, sendo previamente agendadas com os profissionais e usuários. As entrevistas foram audiogravadas e posteriormente transcritas. O método de análise de conteúdo foi utilizado para trabalhar as informações obtidas do processo de coleta de dados, apresentando as seguintes fases para a sua condução: 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação1616 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016..

Aspectos éticos

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Parecer [C.A.A.E.] n. 22293219.3.0000.5346). O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi fornecido aos participantes. Os procedimentos utilizados obedeceram aos princípios contidos na Declaração de Helsinque e às normatizações das Resoluções n. 466/2012, 510/2016 e 580/2018 do Conselho Nacional da Saúde do Ministério da Saúde (CNS/MS), garantindo respeito das suas respostas e anonimato dos participantes da pesquisa, assim como salvaguarda da instituição pesquisada1717 Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 466, de 12 de Dezembro de 2012, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [citado 1 Jul 2023]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/ultimas_noticias/2013/06_jun_14_publicada_resolucao.html
https://conselho.saude.gov.br/ultimas_no...
,1919 Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 580, de 22 de Março de 2018, que estabelece que as especificidades éticas das pesquisas de interesse estratégico para o Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília: Conselho Nacional de Saúde; 2018 [citado 4 Jul 2013]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2018/Reso580.pdf
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.

Resultados e discussão

O estudo coletou informações de 15 usuários participantes dos grupos e de sete profissionais da equipe de Saúde da Família, totalizando 22 entrevistados. Os grupos selecionados reuniam-se com frequência semanal nas dependências da associação de moradores do bairro. O grupo de convivência “Semeando Saúde” reunia 25 adultos (≥ 18 anos) e possuía uma técnica de enfermagem e dois agentes comunitários de saúde (ACS) como coordenadores. O grupo de artesanato “Semeando Arte”, coordenado por três ACS, reunia mulheres de diferentes idades, com 8 mulheres participantes.

Pela observação-participante e transcrições das entrevistas audiogravadas foram estabelecidas as seguintes categorias temáticas que serão discutidas: 1) APS centrada no sujeito e na sua comunidade; 2) Acolhimento e construção de vínculo; 3) Efetivação da promoção de Saúde Mental em dispositivos comunitários e territoriais; 4) Cuidado em Saúde Mental: construindo caminhos; e 5) Trabalho em rede: uma expectativa. Para fins de apresentação dos dados, os profissionais e usuários foram identificados por códigos, constituídos da palavra “usuário” ou “profissional” e o número correspondente à ordem de realização da entrevista.

APS centrada no sujeito e na sua comunidade

A ESF investigada apresenta características periféricas e escassez de iniciativas institucionais nesse contexto. A criação dos grupos foi justificada pelos profissionais de saúde devido à ausência ou à irregularidade de ações e serviços que promovessem integração e lazer para os usuários, que, por sua vez, destacaram a importância da continuidade desses grupos como parte das ações e serviços oferecidos pela APS.

Era uma coisa que fazia bastante falta porque aqui a gente era bem carente de lazer para o pessoal da comunidade [...] a gente sentia falta desse grupo de convivência né, até uns anos atrás nós tínhamos o grupo de hipertensos e diabéticos, mas que rotulava os usuários [...].

(Profissional 1)

Aqui na volta não tinha nada, tirando o posto, tu não tinha mais nada, lazer nenhum, eu larguei os outros grupos que era longe e eu estou bem aqui [...]que isso aí vá para diante, que não termine, porque é uma ajuda para a gente [...].

(Usuário 12)

De fato, o modelo de trabalho adotado pela equipe de Saúde da Família enfatiza a centralidade do sujeito, de sua família e da comunidade nas ações de cuidado, superando as práticas curativas e o paradigma fragmentado tradicionalmente observado2020 Kinker FS, Moreira MIB, Bertuol C. O desafio da formação permanente no fortalecimento das Redes de Atenção Psicossocial. Interface (Botucatu). 2018; 22(67):1247-56. doi: 10.1590/1807-57622017.0493.
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,2121 Brasil. Ministério da Saúde. Reforma Psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2005 [citado 1 Jul 2023]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf
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.

Nesse cenário, a equipe de saúde reconheceu a importância dos grupos de convivência e integração como promotores de saúde no território. Os profissionais destacaram a construção de relações de confiança e a troca entre equipe e comunidade como evidência desse impacto. Enquanto os usuários expressam suas demandas nos grupos, os profissionais compartilham aspectos relacionados aos serviços oferecidos à população. Dessa forma, a equipe adquire um conhecimento maior da comunidade e direciona suas ações de acordo com suas necessidades e interesses.

[...] a gente consegue ouvir melhor as pessoas que fazem parte do grupo, a gente consegue integrar melhor os problemas sociais e de saúde que as pessoas têm passado[...] até mesmo a visão que muitas pessoas não sabem o que a gente faz aqui, muda em relação às pessoas que frequentam os grupos.

(Profissional 6)

[...] a gente já consegue na APS, muitas vezes, iniciar o manejo, as atividades que a gente sabe que ajudam na saúde mental como atividade física, ou fazer atividades de lazer que a gente sabe que distrai, entretém as pessoas, que são ofertados pelos grupos... e por ser em grupo e todos poderem estarem juntos [...] isso favorece o fortalecimento da população de usuários como comunidade também [...]

(Profissional 4)

Contrariamente ao exposto, estudos indicam que os profissionais de saúde têm uma concepção restrita de promoção da Saúde Mental, limitando-se a ações direcionadas apenas às pessoas que sofrem de transtornos mentais, como orientações gerais sobre suas necessidades e encaminhamentos para unidades especializadas2222 Silva GR, Reis HFT, Dos-Santos EM, Souza MPA, Azevedo RL. Saúde mental na Atenção Primária à Saúde: percepções da equipe de saúde da família. Cogitare Enferm. 2016; 21(2):1-8., além de se restringirem a consultas médicas e prescrição de medicamentos22 Amarante P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2007.,2323 Bezerra IC, Jorge MSB, Gondim APS, Lima LL, Vasconcelos MGF. “Fui lá no posto e o doutor me mandou foi pra cá”: processo de medicamentalização e (des) caminhos para o cuidado em saúde mental na Atenção Primária. Interface (Botucatu). 2014; 18(48):61-74. doi: 10.1590/1807-57622013.0650.
https://doi.org/10.1590/1807-57622013.06...
. Portanto, os resultados deste estudo são relevantes em relação à perspectiva comumente relatada na literatura científica sobre o assunto.

Acolhimento e construção de vínculo

Os profissionais de saúde destacaram o acolhimento como uma estratégia de cuidado, baseada na abertura, na confiança e na corresponsabilidade, presente nos diversos espaços de encontro com os usuários, orientando as intervenções de cuidado.

[...] várias pessoas que chegaram aqui chorando, destruídas...eu conversei, aconselhei, escutei, mais escutei do que falei, e a pessoa saiu aliviada[...] precisava que alguém a escutasse, precisava de um abraço sabe, alivia aquela angústia que ela tava sentindo[...] então os usuários veem os profissionais da equipe como referência, eles têm aquela confiança.

(Profissional 1)

Nesse contexto, a criação de relações próximas, comprometimento e confiança permite que o serviço seja reconhecido como uma referência nos cuidados em saúde9. A busca pela resolutividade dos problemas pelos profissionais de referência é uma forma de perceber o vínculo estabelecido com os usuários.

Porque as pessoas que às vezes não têm orientação, a quem procurar num caso assim (depressão, isolamento), de vir a se informar de diversas maneiras de como lidar com aquele momento de nervosismo, enfim de estresse... porque a pessoa não sabe se vai ao médico ou não... se aquilo é grave ou não. E vindo ali tem orientação que precisa [...]

(Usuário 1)

Durante as observações e entrevistas, os usuários demonstraram perceber a Unidade Básica de Saúde (UBS) como um local onde podem buscar ajuda em situações específicas relacionadas à Saúde Mental, considerando a equipe como um ponto de apoio para essas demandas.

Eu percebo um olhar sincero, honesto, um sorriso no rosto, parece que nós mudamos por vocês (equipe), graças a vocês. Desde a primeira vez que a gente veio participar, eu achei uma grande mudança tanto comigo quanto para o nosso grupo[...] a gente sente onde tem amigos, amizade, onde é bem recebido, a gente sente que é acolhido.

(Usuário 6)

Essa constatação evidencia a organização das práticas de saúde e das relações terapêuticas que priorizam as tecnologias leves e vão além dos saberes tecnológicos, possibilitando a expressão da subjetividade do indivíduo2424 Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. São Paulo: Hucitec; 2014. Merhy EE. A micropolítica do trabalho vivo em ato: uma questão institucional e território de tecnologias leves; p. 19-40.. Iniciativas com os grupos objetivam buscar os indivíduos em suas experiências cotidianas no território, a fim de garantir uma abordagem abrangente e holística.

Além disso, os profissionais consideram os grupos como uma estratégia complementar ao trabalho da equipe, ampliando suas ações como APS.

O ideal é que a gente tivesse muito tempo cada um pra poder ouvir[...] mas é difícil às vezes, as questões de saúde mental ficam subentendidas ou nem são ditas; o usuário acaba falando de outros sintomas orgânicos, mecânicos e mais relacionados a parte física porque acredita que isso tenha mais importância na hora da avaliação [...] o grupo é totalmente diferente de uma consulta, ali a pessoa vai estar se expressando de formas diferentes que podem mostrar alguma particularidade que nunca ela vai exibir numa consulta[...]

(Profissional 4)

A equipe em estudo reconhece que a oferta de serviços apenas dentro das instalações é insuficiente para compreender a dimensão psicossocial do usuário no contexto da comunidade. De fato, o cuidado integral se concretizará não apenas no nível individual, mas também por meio de ações que se estendem além das Unidades Básicas de Saúde (UBS)2525 Carnut L. Cuidado, integralidade e atenção primária: articulação essencial para refletir sobre o setor saúde no Brasil. Saude Debate. 2017; 41(115):1177-86..

Efetivação da promoção de Saúde Mental em dispositivos comunitários e territoriais [sub-subtítulo]

As ações de promoção de saúde, como os grupos de saúde, são justificadas pela efetividade de custos e pelo maior controle da saúde pelas comunidades e indivíduos, promovendo a autonomia2626 Silveira LMOB, Grzybowski LS, Silva GR, Pires GB, Oliveira AT, Anderle F. Grupo de acolhida em saúde mental: a psicologia na atenção básica. Rev Conexão UEPG. 2017; 13(2):294-305.. Os momentos e espaços comunitários contribuem para o aprimoramento de todos os envolvidos, tanto pessoal quanto profissionalmente, ao valorizarem os diversos saberes2727 Sangioni LA, Patias ND, Pfitscher MA. Psicologia e o grupo operativo na Atenção Básica em Saúde. Rev SPAGESP. 2020; 21(2):23-40..

[...] vejo que muitas mulheres que não sabiam realizar essas atividades começaram a fazer também; é uma forma de estar trabalhando a saúde mental delas, uma forma de renda se elas quiserem seguir para esse caminho[...]

(Profissional 3)

[...] a pessoa participa e vem aqui, se sente bem, diz “ah como eu estou gostando” “não sabia nem pegar uma agulha e hoje eu sei crochê, fazer um bordado[...]

(Usuário 2)

[...] aprender isso é muito vantajoso, não só financeiramente, mas para minha mente, para os meus pensamentos, para o meu relacionamento de vida é muito bom.

(Usuário 3)

É relevante destacar que uma proporção significativa dos participantes dos grupos estudados é idosa, o que expressa que a aposentadoria desperta o sentimento de frustração e improdutividade. Nesse sentido, os grupos de artesanato podem ser considerados uma modalidade de intervenção psicossocial para o cuidado da Saúde Mental nas UBS, além de capacitar e possibilitar a produção de uma possível renda extra2828 Alves KVG, Aragão EIS, Almeida APF, Souza AC, Saggese BL, Andrade BG, et al. Grupos de artesanato na atenção primária como apoio em saúde mental de mulheres: estudo de implementação. Estud Psicol (Natal). 2020; 25(1):102-12..

O isolamento social e a presença de transtornos mentais comuns, como síndromes depressivas e ansiosas, foram identificados tanto pela equipe quanto pelos usuários como fatores que levavam muitos indivíduos a buscar a unidade de saúde. No contexto mencionado, os profissionais se mostraram ativos no processo de reconstrução do sofrimento e na reinvenção da vida dos usuários, convidando-os a participar dos grupos como uma estratégia para facilitar sua reintegração na comunidade.

[...] era uma forma de se arrumar, de saírem, de ir conversar com pessoas diferentes, buscar atenção de pessoas que dão atenção, porque muitos encontram aqui o afeto que não têm em casa, então foi uma forma que a gente pensou em juntar essas pessoas.

(Profissional 3)

[...] o fato deles estarem juntos, talvez facilite que eles lidem com algumas questões, vendo que talvez eles não sejam os únicos em alguma situação específica, relacionada a algum problema de saúde, um problema psiquiátrico, alguma questão familiar que esteja causando um transtorno mental, algum estresse[...]

(Profissional 4)

[...] eu estava meio doente da cabeça, com depressão, daí eu vim para o grupo, porque me disseram que era muito bom, tem exercícios, daí eu vim para cá, e eu estou me sentindo bem [...]

(Usuário 4)

[...] eu tinha dificuldade para dormir, por um monte de problema, ansiedade eu tinha... a pessoa que entrou no grupo no ano passado não é a pessoa que está hoje, completamente diferente... eu tenho muito mais disposição[...]

(Usuário 10)

Diante disso, os grupos de saúde podem complementar o tratamento ao oferecer um componente socioafetivo, fortalecendo a coletividade e preservando a individualidade2727 Sangioni LA, Patias ND, Pfitscher MA. Psicologia e o grupo operativo na Atenção Básica em Saúde. Rev SPAGESP. 2020; 21(2):23-40.. Além disso, esses grupos podem fomentar e estreitar os laços sociais e conferir aos seus integrantes um senso de empoderamento, tornando-os protagonistas de suas próprias trajetórias. Portanto, é crucial que as equipes de Saúde da Família incorporem ou aprimorem o cuidado em Saúde Mental, também por meio dos grupos, em sua prática diária.

Cuidado em Saúde Mental: construindo caminhos

Essa subcategoria objetiva refletir sobre os desafios dos processos de trabalho relacionados à Saúde Mental.

De acordo com as entrevistas, os profissionais de saúde utilizam dispositivos de cuidado, como o acolhimento e os grupos, para promover a vinculação e a corresponsabilização dos usuários. No entanto, ainda não conseguem identificar de maneira efetiva as potencialidades desses dispositivos no cuidado em Saúde Mental. Essa questão é evidenciada pela necessidade mencionada por psicólogos na UBS em obter resolutividade nos casos de Saúde Mental.

[...] se a gente tivesse psicólogos nos postos de saúde seria bem mais fácil para a gente conseguir resolver os problemas e não precisasse chegar a um nível de estresse bem maior[...]

(Profissional 3)

De fato, o profissional psicólogo é frequentemente visto como um facilitador para melhorar o acolhimento e a atenção nas equipes das UBS. No entanto, é importante ressaltar que a Saúde Mental não é responsabilidade exclusiva da psicologia, uma vez que envolve não apenas atenção especializada, mas também apoio social, familiar e multiprofissional2929 Cezar PK, Rodrigues PM, Arpini DM. A psicologia na estratégia de saúde da família: vivências da residência multiprofissional. Psicol Cienc Prof. 2015; 35(1):211-24..

A relevância das discussões sobre Saúde Mental nos grupos foi destacada pelos usuários.

[...]de vez em quando alguém poderia nos ajudar (no grupo), como a psicóloga [...] porque “ah a psicóloga é para louco”, o psiquiatra também”. Não é para louco, é para tratar os problemas que a gente tem[...]

(Usuário 2)

[...]se tivesse uma pessoa que entendesse de psicologia para estar junto, se a gente conseguisse assim, que viesse dar uma assistência, conversar, seria legal[...]

(Usuário 8)

Mesmo se referindo à prática especializada, os usuários reconhecem a necessidade de melhor compreensão relacionada à Saúde Mental como elemento importante a ser trabalhado nos grupos. Nesse sentido, o Nasf-AB pode ser uma valiosa ferramenta de apoio às equipes da APS, contribuindo para o avanço da Atenção à Saúde Mental3030 Cury RS, Rodacoski GC, Santos CL. Ampliação das atividades das equipes NASF-AB em saúde mental. Rev Saude Pub Parana. 2019; 2 Supl 2:76-91.,3131 Nunes M, Landim FLP. Saúde mental na atenção básica: política e cotidiano. Salvador: Edufba; 2016.. Sua capacidade de interagir com o território, os usuários, a equipe das UBS e as políticas sociais pode ajudar na análise e na implementação de melhorias nos processos de trabalho da equipe matricial em Saúde Mental3131 Nunes M, Landim FLP. Saúde mental na atenção básica: política e cotidiano. Salvador: Edufba; 2016..

Trabalho em rede: uma expectativa

A efetivação do trabalho em rede na Saúde Mental foi apontada como desafiadora por todos os profissionais entrevistados.

Os profissionais relataram dificuldades em resolver casos específicos de Saúde Mental persistentes devido à demanda alta para uma equipe limitada, à falta de contrarreferência após encaminhamentos e à escassez de psicólogos na rede especializada. Além disso, mencionaram que a falta de convocação dos usuários para atendimento especializado pode levar à medicalização prematura, evidenciando a necessidade de uma retaguarda adequada na rede de Saúde Mental municipal22 Amarante P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2007..

[...] que talvez a gente não precisasse estar medicando tanto os pacientes, se a gente tivesse mais psicólogos disponíveis pela prefeitura para fazer esse tipo de acompanhamento [...] [...] eu acho que a gente está medicando demais, a gente medica para ser mais fácil e tentar já abreviar, mas aí a gente está criando uma demanda gigantesca de remédio pra prefeitura, está faltando muito remédio, isso implica que as pessoas que iniciaram um tratamento têm que interromper no momento que não conseguem retirar (os remédios), e está virando uma bola de neve.

(Profissional 4)

Resultados congruentes foram observados em estudos anteriores, nos quais os profissionais da UBS investigada mencionaram desafios na comunicação entre os serviços envolvidos no cuidado de pessoas com transtornos mentais, resultando em informações desencontradas entre os setores, o que afeta a referência e a contrarreferência do tratamento3232 Rotoli A, Silva MRS, Santos AM, Oliveira AMN, Gomes GC. Saúde mental na Atenção Primária: desafios para a resolutividade das ações. Esc Anna Nery. 2019; 23(2):e20180303.,3333 Salgado JW, Zanela LRM, Rocha LT, Calmeto MN, Meneguetti JA, Vidal CEL. Saúde mental na atenção básica: percepção dos Agentes Comunitários de Saúde. Cad Saude Colet. 2023; 31(2):e31020065..

Com base nas dificuldades identificadas, a equipe está explorando estratégias, como a implementação de um Grupo de Saúde Mental para os usuários atendidos no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e outros que necessitem desse cuidado. O grupo possibilitou uma proximidade maior dos profissionais com seus usuários de Saúde Mental, utilizando a modalidade de Grupo de Gestão Autônoma da Medicação (GAM) no âmbito da APS3434 Campos RO, Passos E, Palombini A, Gonçalves LL, Santos DVD, Melo SSJ, et al. Gestão autônoma da medicação: guia de apoio a moderadores. Campinas: UNICAMP; 2014..

[...] eu falei com a psicóloga, para ver se tinha o GAM já (no âmbito da APS no município), de tentar fazer um grupo para tentar abrir isso aqui, para tentar puxar os nossos usuários com problemas psiquiátricos para fazer um grupo de saúde mental... um grupo de saúde mental pode nos ajudar a evitar um pouco da sobremedicalização de pessoas.

(Profissional 4)

A Gestão Autônoma da Medicação (GAM) é uma abordagem que busca promover a autonomia e o protagonismo das pessoas que utilizam medicamentos psiquiátricos. A GAM possibilitaria a gestão compartilhada do cuidado em Saúde Mental no território da equipe de Saúde da Família, contribuindo para a redução da sobremedicação3535 Elwyn G, Frosch D, Thomson R, Joseph-Williams N, Lloyd A, Kinnersley P, et al. Shared decision making: a model for clinical practice. J Gen Intern Med. 2012; 27(10):1361-7..

Considerações finais

Os resultados apresentados remetem à necessidade de (re)pensar a inclusão de ações de promoção de Saúde Mental no território da APS, reconhecendo-o como espaço potente para produção de subjetividades relacionadas com o conceito ampliado de saúde e com a integralidade do cuidado.

Importante ressaltar que, para maior aproximação do tema e do entendimento sobre quais intervenções podem se configurar como de Saúde Mental, é necessário refletir sobre o que já se realiza cotidianamente e o que o território tem disponível como recurso aos profissionais de saúde para contribuir no manejo dessas questões. Ainda, diversas ações de Saúde Mental são realizadas sem que os profissionais as percebam em sua prática diária, como os momentos de escuta e a integração nos grupos locais.

O estudo apresenta como pontos fortes a realização da entrevista semiestruturada com profissionais e usuários do SUS. Essa abordagem proporcionou uma visão mais ampla do processo em grupo, enriquecendo a compreensão dos desafios e benefícios dessa estratégia de intervenção para ambas as partes. O cuidado metodológico empregado na coleta e na análise dos dados foi fundamental. A utilização de métodos apropriados garantiu a qualidade e a confiabilidade das informações obtidas, incluindo a triangulação das informações e a análise qualitativa dos relatos, o que enriqueceu a profundidade das conclusões alcançadas. Algumas limitações podem ser identificadas na análise qualitativa do estudo. Primeiramente, a amostra utilizada pode não ser totalmente representativa, o que limita a generalização dos resultados. Além disso, o viés do pesquisador pode influenciar na interpretação dos dados, conduzindo a conclusões subjetivas.

Destaca-se a importância deste estudo, especialmente diante da escassez de pesquisas sobre a promoção de Saúde Mental por meio dos grupos de saúde na APS. É imprescindível incentivar os profissionais de saúde a explorar e ampliar iniciativas extramuros, como os grupos de saúde focados na promoção da Saúde Mental. Essa abordagem pode ser eficaz, de baixo custo e contribuir para o bem-estar físico e mental dos usuários. Além disso, os grupos também desempenham um papel crucial na efetivação das políticas públicas voltadas para esse campo, visto que, ao incorporar os grupos de saúde como componentes essenciais das estratégias de Saúde Mental, as políticas não apenas fortalecem a promoção do bem-estar mental, mas também pavimentam o caminho para uma comunidade informada, empoderada e engajada. Por fim, a prevenção de transtornos mentais pode ser o resultado de uma vasta estratégia de promoção da Saúde Mental na APS.

Agradecimentos

À Prefeitura Municipal de Santa Maria pela autorização concedida para a realização da coleta de dados; ao Núcleo Ampliado de Saúde da Família da cidade de Santa Maria pelo apoio e acompanhamento prestado durante todo o processo de trabalho. Por fim, à Residência Multiprofissional de Saúde da Família da UFSM, cujos suporte e orientação foram fundamentais para o desenvolvimento desta pesquisa.

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  • Financiamento

    Este trabalho foi viabilizado por meio do apoio financeiro do Ministério da Educação (MEC) por bolsa concedida.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Set 2023
  • Aceito
    20 Mar 2024
UNESP Botucatu - SP - Brazil
E-mail: intface@fmb.unesp.br