Homens trans que engravidaram e o exercício da parentalidade: desafios à Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem

Trans men who became pregnant and the exercise of parenthood: challenges to the National Comprehensive Men's Health Care Policy

Hombres trans gestantes y el ejercicio de la parentalidad: desafíos para la Política Nacional de Atención Integral a la Salud del Hombre

Daniela dos Santos Dantas Breno de Oliveira Ferreira Munique Therense Gabriel Ponce de Leão Lima Almeida André Luiz Machado das Neves Sobre os autores

Resumos

A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem não se mostra capaz de atender às necessidades específicas dos homens trans, especialmente em saúde reprodutiva e parentalidade. Assim, este estudo qualitativo, discute as limitações da política atual, problematizando gênero, masculinidade e paternidade. Como resultado, foram destacados três eixos baseados nas falas dos participantes: Gênero, sexo e sexualidade – fusões que contornam a construção parental, Construção da paternidade e do reconhecimento parental e Estigmatização e exclusão. Conclui-se que há necessidade urgente de educação contínua em saúde e sensibilização nas políticas de parentalidade, na Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem e nos profissionais de saúde, sendo crucial reconhecer e apoiar diversas estruturas familiares e experiências parentais, incluindo as de pais trans.

Palavras-chave
Homem trans; Parentalidade; Masculinidades; Políticas de Saúde


The National Policy for Comprehensive Men's Health Care has shown itself to be incapable of meeting the specific needs of trans men, especially when it comes to reproductive health and parenting. This qualitative study investigated the limitations of the current policy, problematizing gender, masculinity and parenting. We highlight three core themes based on the participants’ comments and observations: Gender, sex and sexuality – fusions that circumvent the parenting construct; Constructing parenting and parental recognition; and Stigmatization and exclusion. It is concluded that there is an urgent need for continuous health education and awareness raising regarding parenting policies and the National Policy for Comprehensive Men's Health Care, and among health professionals. It is crucial to recognize and support a variety of family structures and parenting experiences, including those of trans parents.

Keywords
Trans man; Parenting; Masculinities; Health Policies


La Política Nacional de Atención Integral a la Salud del Hombre no se muestra capaz de atender las necesidades específicas de los hombres trans, especialmente en salud reproductiva y parentalidad. Por lo tanto, este estudio cualitativo discute las limitaciones de la política actual, problematizando género, masculinidad y paternidad. Como resultado, se destacan tres ejes con base en las declaraciones de los participantes: Género, sexo y sexualidad –fusiones que contornan la construcción parental–; Construcción de la paternidad y del reconocimiento parental y Estigmatización y exclusión. Se concluye que existe la necesidad urgente de educación continua en salud y sensibilización en las políticas de parentalidad, en la Política Nacional de Atención integral a la Salud del Hombre y en los profesionales de salud, siendo crucial el reconocimiento y el apoyo de diversas estructuras familiares y experiencias parentales, incluyendo las de padres trans.

Palabras clave
Hombre trans; Parentalidad; Masculinidades; Políticas de Salud


Introdução

Historicamente, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH) surge com o objetivo de ampliar o acesso dos homens aos serviços de saúde, diante das altas taxas de morbimortalidade e dos consequentes agravos de saúde pela ausência de cuidados e ações de prevenção. Em sua formulação, a própria PNAISH revela que a recusa ao cuidado revela estereótipos de gênero associados à construção de saúde-doença na sua relação com o corpo e a masculinidade11 Separavich MA, Canesqui AM. Saúde do homem e masculinidades na Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem: uma revisão bibliográfica. Saude Soc. 2013; 22(2):415-28. doi: 10.1590/S0104-12902013000200013.
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,22 Leal AF, Figueiredo WS, Nogueira-da-Silva GS. O percurso da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde dos Homens (PNAISH), desde a sua formulação até sua implementação nos serviços públicos locais de atenção à saúde. Cienc Saude Colet. 2012; 17(10):2607-16. doi: 10.1590/S1413-81232012001000010.
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Nesse propósito, a PNAISH utiliza-se da paternidade como dimensão constitutiva da saúde do homem, intentando promover a equidade na assistência, considerando também o valor da parentalidade e o reposicionamento do lugar e das performances masculinas no cuidado aos filhos33 Pereira J, Klein C, Meyer DE. PNAISH: uma análise de sua dimensão educativa na perspectiva de gênero. Saude Soc. 2019; 28(2):132-46. doi: 10.1590/S0104-12902019170836.
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. Na política é possível encontrar referências à presença paterna no pré-natal da gestante, no episódio de parto, nos cuidados cotidianos com os filhos, na formação educacional e de socialização, dentre outras44 Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (princípios e diretrizes) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2008 [citado 10 Maio 2009]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_atencao_homem.pdf
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. Nelas, aparece – explícito ou implicitamente – a referência ao par parental construído pela dualidade homem-mulher, não havendo espaço para pensar em monoparentalidade masculina exercida por homens trans que geraram a prole.

A PNAISH, em seu diagnóstico, desconsidera as especificidades de cuidados com homens trans, especialmente em contextos de saúde reprodutiva e parentalidade55 Angonese M, Lago MCS. Direitos e saúde reprodutiva para a população de travestis e transexuais: abjeção e esterilidade simbólica. Saude Soc. 2017; 26(1):256-70. doi: 10.1590/S0104-12902017157712.
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. Isso ocorre devido ao movimento de naturalização da cisgeneridade. Nos termos de Cavalcante66 Cavalcanti CS. Sobre Nós (des)organizados: pesquisa-intervenção em psicologia e o processo de implementação de políticas para pessoas trans na UFPE [dissertação]. Recife: Universidade Federal de Pernambuco; 2016., a cisgeneridade é posicionada como o próprio lugar da normalidade, mobilizando uma série de aparatos para garantir a manutenção da fronteira entre o normal e o anormal. Nessa mesma linha, Vergueiro77 Vergueiro V. Por inflexões decoloniais de corpos e identidades de gênero inconformes: uma análise autoetnográfica da cisgeneridade como normatividade [dissertação]. Salvador: Universidade Federal da Bahia; 2016. parte da premissa de que a política de supremacia da condição cisgênera está estruturada em uma lógica na qual supostas características fisiológicas naturais do corpo determinam funções e papéis de gênero, estabelecendo fronteiras binárias que mantêm expectativas sobre os corpos e regulam suas performances por meio da imposição de roteiros previamente estabelecidos.

Diante desse cenário, torna-se necessária uma reflexão fundamental sobre as limitações produzidas pela cisnormatividade na PNAISH. Portanto, as experiências reprodutivas narradas por homens trans que engravidaram oferecem um prisma para entender as transformações necessárias nas masculinidades e sua relação com o processo de saúde-adoecimento-cuidado.

Conceitualmente, compreende-se o pai como uma classificação de “tipo humano”. Segundo Hacking88 Hacking I. Looping effect of the human kinds. In: Sperber D, Premack D, Premack AJ, editors. Casual cognition: a multidisciplinary debate. Oxford: Oxford University Press; 1995. p. 351-83., tipos humanos são classificações que organizam as experiências pessoais e sociais, incluindo ações e comportamentos. As descrições de comportamentos, ações, sentimentos e tendências moldam a concepção de um tipo de pessoa que interage com indivíduos específicos. Utilizando a teoria do Efeito Looping88 Hacking I. Looping effect of the human kinds. In: Sperber D, Premack D, Premack AJ, editors. Casual cognition: a multidisciplinary debate. Oxford: Oxford University Press; 1995. p. 351-83., o autor propõe que as classificações influenciam as pessoas classificadas e, posteriormente, os efeitos sobre essas pessoas acabam alterando estas mesmas classificações. Dessa forma, podemos entender que a classificação “pai” produz alterações no modo de significar, pensar e sentir, que constroem o homem trans e suas performances da paternidade. Em movimento espiral (ou de looping), o pai – enquanto autor classificado – interage atualizando a classificação e o que se dispõe como performance paterna transmasculina. Ainda para Hacking88 Hacking I. Looping effect of the human kinds. In: Sperber D, Premack D, Premack AJ, editors. Casual cognition: a multidisciplinary debate. Oxford: Oxford University Press; 1995. p. 351-83., as instituições são as principais agentes de operacionalização desse movimento em looping, gerando feedbacks que norteiam as produções classificatórias e os indivíduos classificados.

Como definição, usamos os termos “monoparentalidade masculina” para se referir ao desempenho parental exercido por um homem trans solo, não inserido em relação conjugal; “parentalidade” para se referir ao exercício das responsabilidades parentais; e “paternidade” para compreender uma parentalidade estruturada/exercida baseada em um referencial classificatório mediado por papéis e/ou estereótipos de gênero.

Não obstante a variedade de entendimentos acerca do significado de parentalidade, há um consenso de que o conceito de parentalidade é quem visa promover o crescimento físico, psicológico e social de pessoas que assumem o status de filho, isto é, compreende-se parentalidade como os responsáveis garantirem, dentro de suas competências e recursos financeiros, as condições de vida essenciais para o desenvolvimento de outro ser humano99 Barroso RG, Machado C. Definições, dimensões e determinantes da parentalidade. Psychologica. 2010; 52(1):211-29. doi: 10.14195/1647-8606_52-1_10.
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. Quanto aos critérios que determinam o que é uma parentalidade “suficiente”, estes são construídos socialmente, variando conforme impressões subjetivas, crenças culturais e considerações específicas de cada contexto.

A terminologia “família monoparental” surgiu na França, em 1981, após um estudo do Instituto Nacional de Estatística e de Estudos Econômicos (INSEE) e se espalhou pela Europa. Hoje, é reconhecida no mundo ocidental como uma família composta por um dos genitores e seus filhos, vivendo juntos na mesma casa. A monoparentalidade pode ser permanente ou transitória, estabelecida quando um genitor cuida dos filhos sozinho, seja por escolha ou por circunstâncias, como o fim de uma família nuclear, levando em consideração que fatores socioeconômicos, demográficos e regionais influenciam diretamente em sua formação1010 Sousa AP. Estudo comparativo das famílias monoparentais masculinas e monoparentais femininas: a influência do genitor no desenvolvimento familiar [dissertação]. Franca (SP): Universidade Estadual Paulista; 2008..

Quanto à paternidade, esta vem sendo atualizada com frequência. É importante notar que, no sistema patriarcal, as estruturas familiares e sociais, com papeis delimitados e restritos, são internalizadas ao longo de gerações, consideradas naturais e inatas, moldando o imaginário social. Isso influencia a definição dos papeis de mãe e pai, homem e mulher, sem muitas vezes serem questionados, garantindo o desempenho esperado de cada um desses papeis1111 Meler I. La masculinidad. Diversidad y similitudes entre los grupos humanos. In: Burin M, Meler I, editors. Varones: género y subjetividad masculina. Buenos Aires: Paidós; 2000. p. 71-121.. A paternidade finda por manter muito de seu significado histórico resumido ao sustento financeiro, entretanto vem sendo ressignificado, com maior aproximação ao cuidado do lar e cuidado socioafetivo dos filhos1212 Freitas WMF, Silva ATMC, Coelho EAC, Guedes RN, Lucena KDT, Costa APT. Paternidade: responsabilidade social do homem no papel de provedor. Rev Saude Publica. 2009; 43(1):85-90. doi: 10.1590/S0034-89102009000100011.
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Estudos recentes mostram que homens trans que engravidam enfrentam desafios únicos e complexos, desde a falta de representatividade nos diferentes cenários de gravidez, pouca compreensão da demanda pela equipe de saúde até o preconceito institucional1313 Silva GC, Puccia MIR, Barros MNS. Homens transexuais e gestação: uma revisão integrativa da literatura. Cienc Saude Colet. 2024; 29(4):e19612023. doi: 10.1590/1413-81232024294.19612023.
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. Outros estudos com homens trans corroboram esta realidade, salientando que a experiência gestacional pode ser emocionalmente desgastante, exigindo estratégias e modos subjetivos de organização pessoal, incluindo a necessidade de suporte profissional para questões de saúde e ocultação da identidade transmasculina a fim de evitar as transfobias1414 Pereira DMR, Araújo EC, Silva ATCSG, Abreu PD, Calazans JCC, Silva LLSB. Scientific evidence on experiences of pregnant transsexual men. Texto Contexto Enferm. 2022; 31:e20210347. doi: 10.1590/1980-265X-TCE-2021-0347en.
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A parentalidade de homens trans abrange diversos contextos, como inseminação assistida; relações sexuais com homens cis, mulheres trans e travestis; gestação, parto e criação dos filhos, dentre outros, confrontando normas de gênero e redefinindo papéis parentais tradicionais1515 Dantas DS, Neves ALM. A parentalidade de homens trans: uma revisão integrativa. REBEH [Internet]. 2023 [citado 15 Jul 2024]; 6(20):60-82. Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/rebeh/article/view/15519
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. Nesta realidade, os principais desafios apresentam-se como a discriminação e o preconceito, a constante preocupação em proteger os filhos de possíveis ataques, a dificuldade em alinhar a performance de gênero com as noções normativas de paternidade, a necessidade de apoio jurídico, a falta de suporte emocional familiar e o comprometimento da saúde mental1616 Angonese M, Lago MCS. Família e experiências de parentalidades trans. Rev Cienc Hum. 2018; 52:e57007. doi: 10.5007/2178-4582.2018.57007.
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, ou mesmo a vulnerabilidade à depressão e ansiedade devido ao estigma e à violência1717 Moleiro C, Alarcão V, Giami A. Looking at resilience among transgender and gender diverse people in portugal: gender affirmation paths and parenting aspirations. Soc Sci. 2023; 12(2):68. doi: 10.3390/socsci12020068.
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Dessa forma, torna-se essencial que o sistema de saúde compreenda e integre a identidade de gênero como um determinante social da saúde. Isso implica não apenas reconhecer, mas também implementar estruturas de suporte que permitam o desenvolvimento de projetos, programas e ações específicas voltadas para a promoção da saúde sexual e reprodutiva dos homens trans. A PNAISH, se pensar em monoparentalidade masculina exercida por homens trans que geraram a prole, pode se tornar uma ferramenta poderosa nesse sentido, possibilitando não apenas o reconhecimento, mas também a efetiva inclusão dos homens trans em suas diversas realidades existenciais.

Isso envolve não apenas garantir acesso equitativo a serviços de saúde, mas também promover um ambiente acolhedor e respeitoso que reconheça as diferenças. Mediante políticas que considerem a diversidade de gênero e sexualidade, a PNAISH pode contribuir significativamente para a promoção da saúde integral dos homens trans, oferecendo um modelo inclusivo que valoriza e apoia suas diversas experiências de vida.

Ao debater-se como a política pública produz experiências institucionais de negação e marginalização para homens que engravidaram, na assistência ofertada nos serviços de saúde55 Angonese M, Lago MCS. Direitos e saúde reprodutiva para a população de travestis e transexuais: abjeção e esterilidade simbólica. Saude Soc. 2017; 26(1):256-70. doi: 10.1590/S0104-12902017157712.
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, buscou-se viabilizar caminhos por onde as estratégias de cuidado possam ser pensadas e articuladas em meio aos vazios da PNAISH. Portanto, este artigo tem como objetivo discutir as limitações da política atual, problematizando gênero, masculinidade e paternidade.

Método

Trata-se de um estudo qualitativo, do tipo compreensivo-interpretativo, elaborado com base nas experiências de homens que engravidaram, seu exercício parental em diferentes contextos sociais e as repercussões nas suas identidades.

As narrativas são exploradas à luz da Teoria Performativa de Gênero de Judith Butler1818 Butler J. O parentesco é sempre tido como heterossexual? Cad Pagu. 2003; (21):219-60. doi: 10.1590/S0104-83332003000200010.
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, que entende o gênero como algo continuamente construído e reproduzido por meio de ações, discursos e comportamentos, isto, uma performance, e não uma característica inata ou fixa1919 Connell RW, Messerschmidt JW. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Rev Estud Fem. 2013; 21(1):241-82. doi: 10.1590/S0104-026X2013000100014.
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. As análises baseadas nessa teoria enfatizam a subversão das normas de gênero, como exemplificado pela vivência de homens trans que engravidam, pois eles rompem com as expectativas tradicionais que associam a gravidez exclusivamente ao corpo feminino. Ao fazerem isso, não apenas desafiam as concepções normativas sobre o corpo e o gênero, mas também evidenciam a fluidez e a complexidade das identidades de gênero, revelando que essas identidades não seguem necessariamente os padrões binários ou cisnormativos.

Este enredo foi analisado mediante interlocuções da PNAISH. No que tange às questões teórico-analíticas, utilizou-se as noções do sistema sexo-gênero1818 Butler J. O parentesco é sempre tido como heterossexual? Cad Pagu. 2003; (21):219-60. doi: 10.1590/S0104-83332003000200010.
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frente as normas sociais que atuam e regulamentam a construção de atos performativos. Além disso, as discussões temáticas em torno da parentalidade99 Barroso RG, Machado C. Definições, dimensões e determinantes da parentalidade. Psychologica. 2010; 52(1):211-29. doi: 10.14195/1647-8606_52-1_10.
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foram cunhadas como um importante aspecto da conformação das masculinidades de homens trans.

O método escolhido foi o narrativo2020 Mattingly C, Garro L, editors. Narrative and the cultural construction of illness and healing. Los Angeles: University of California Press; 2000. Narrative as a construct and construction; p. 1-49.. A narrativa é uma ferramenta intrinsecamente humana para atribuir significado à experiência. Quando as pessoas contam e interpretam histórias, criam uma ponte entre o mundo interior, repleto de pensamentos e sentimentos, e o mundo exterior, onde as vivências acontecem no cotidiano da vida2020 Mattingly C, Garro L, editors. Narrative and the cultural construction of illness and healing. Los Angeles: University of California Press; 2000. Narrative as a construct and construction; p. 1-49.. Dessa forma, as entrevistas narrativas são como conversas não estruturadas que buscam explorar aspectos profundos da vida das pessoas. Delas, emergem histórias pessoais, tanto da pessoa entrevistada quanto de outras relacionadas ao seu contexto. O objetivo desse tipo de entrevista é incentivar as pessoas a compartilharem experiências significativas de suas trajetórias2121 Jovchelovich S, Bauer MW. Entrevista Narrativa. In: Bauer MW, Gaskell G, editores. Pesquisa qualitativa com texto imagem e som: um manual prático. 7a ed. Petrópolis (RJ): Vozes; 2008. p. 90-113..

As entrevistas ocorreram individualmente com cinco pessoas que se autodeclararam homem trans, que gestaram antes da transição, considerando a necessidade de ressignificação de seu papel e as negociações nas esferas sociais subjacentes, que interagem e interferem na construção e fortalecimentos de suas identidades. No momento da pesquisa, todos realizavam acompanhamento da transição de gênero em um ambulatório de referência na cidade de Manaus, Amazonas. Homens trans que engravidam antes do processo de transição enfrentam desafios específicos e muitas vezes invisibilizados2222 Dantas DS, Almeida GPLL, Ferreira BO, Therense M, Neves ALM. Sentidos e significados de parentalidade entre homens trans que engravidaram antes da transição de gênero. Cienc Saude Colet. 2024; 29(4):e19532023. doi: 10.1590/1413-81232024294.19532023.
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Na ocasião das entrevistas, os interlocutores possuíam idade entre 26 e 37 anos, todos possuíam um/a filho/a com idade entre quatro e 17 anos e se relacionavam com mulheres cis; destes, três residiam com suas companheiras. Sobre a convivência com os filhos, apenas a filha de José não mora com ele, pois está sob os cuidados da mãe. Quanto à ocupação profissional, apenas Jorge possuía emprego formal; os demais prestavam serviços eventuais por conta própria ou em negócios da família, conforme o Quadro 1.

Quadro 1
Lista de Participantes

Vale pontuar que todos indicaram que possuíam interesse em retificar o próprio nome, e que no registro dos/as filhos/as constava o nome civil no campo de filiação materna. Já no campo de filiação paterna, Jonas registrou o filho com um amigo, a quem se refere como padrasto, Jorge registrou o filho com o padrinho da criança e os demais registraram os filhos apenas em seu nome, parentalidade ‘solo’.

Para organização do enredo narrativo, seguiu-se a proposta de Gomes e Mendonça2323 Gomes R, Mendonça EA. A representação e a experiência da doença: princípio para a pesquisa qualitativa em saúde. In: Minayo MCS, Deslandes SF, organizadoras. Caminhos do pensamento: epistemiologia e método. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2002. p. 109-32. que, em termos de sequência analítica, sugerem fases para esse processo: compreensão dos contextos nas narrativas; desvendamento dos aspectos estruturais nas narrativas; e construção final de um guia mediante uma síntese interpretativa.

No que se refere aos procedimentos éticos, a pesquisa foi aprovada sob o Parecer n.º 5.528.881, da Universidade Federal do Amazonas, estando de acordo com as Resoluções n.º 466/2012 e n.º 510/2016. Para garantia do anonimato, os nomes reais dos interlocutores foram alterados por nomes fictícios.

Resultados e discussão

Gênero, sexo e sexualidade – fusões que contornam a construção parental

O estudo revelou a paternidade de homens trans como uma experiência compreendida e classificada pela fusão de noções compulsórias relativas à linearidade entre sexo, corpo e gênero atribuído ao sexo e à sexualidade vivida pelo indivíduo classificado. Segundo Butler2424 Butler J. Gender trouble: feminism and the subversion of identity. New York: Routledge; 1990., a distinção entre sexo e gênero é absolutamente inexistente na sociedade. Nesse sentido, o gênero não pode ser desvinculado do corpo sexuado, que é interpretado por performances corporais moldadas e forjadas por práticas reguladoras da coerência do gênero. ‘Grosso modo’, o sexo é o próprio gênero e ambos são construções de uma dada realidade social.

Historicamente, diversas concepções sobre gênero e sexo foram formatadas e introjetadas por algumas vias de significação social e subjetiva, tais como a própria religião, a ciência e a política, e que estão imbricadas nos complexos processos de constituição das pessoas2525 Foucault M. História da sexualidade. A vontade de saber. 11a ed. Rio de Janeiro: Graal; 1993.. A inteligibilidade no esquadro da matriz heterossexual institui e mantém relações e modos de existir com base em elementos corporais, estéticos e discursivos2424 Butler J. Gender trouble: feminism and the subversion of identity. New York: Routledge; 1990.. Nas narrativas de João, José, Joaquim e Jonas, a inteligibilidade pode representar um grande esforço, mas também fonte de sofrimento:

Aí a pessoa [profissional de saúde] fica questionando: “Mas como é que é isso? Você teve ela?” Então sempre tem esse tipo de questionamento. Porque a sociedade em si, ela não sabe nem identificar o termo homem trans, só sabe quem é o Thammy [ator e político brasileiro trans].

(João, 25/08/2022)

No geral as pessoas não entendem, né? Porque por mais que você explique que você é o pai, pra quem tem a mente fechada, ele sempre vai te ver como uma mulher.

(José, 29/08/2022)

Na minha cabeça, eu não tinha como ter um filho e dizer que eu era homem.

(Joaquim, 11/04/2023)

As pessoas falavam que nunca tinham visto um homem grávido. Ficavam falando que eu era machuda e como é que a machuda engravidou.

(Jonas, 23/12/2022)

O padrasto dele foi comigo, aí o pessoal ficou olhando para nossa cara, acho que eles pensavam são dois gays e uma criança. Ele começa a repensar, eu nem ligo, e o pessoal fica olhando, vê ele um homem e eu todo masculino e uma criança, aí ficam aqueles olhares.

(Jonas, 23/12/2022)

A heterossexualidade compulsória é um padrão normativo que, sustentado e perpetuado por instituições, reflete expectativas e pressões sociais que posicionam as identidades heterossexuais como as únicas reconhecidas como “naturais” e legítimas2525 Foucault M. História da sexualidade. A vontade de saber. 11a ed. Rio de Janeiro: Graal; 1993.. Quanto maior o rompimento com essa cadeia de pressões, maior a possibilidade de violências2424 Butler J. Gender trouble: feminism and the subversion of identity. New York: Routledge; 1990.. As narrativas, por sua vez, indicam que as experiências de homens trans são essenciais para desafiar e expandir as concepções cristalizadas de masculinidade e paternidade, consideradas “normais” ou “naturais”, mas deflagram a precariedade que está natural e diretamente ligada às normas de gênero dispostas nas histórias de vida, destacando as inúmeras formas de violência que têm levado os homens trans a uma vida precária2626 Butler J. Vida precária: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica; 2019..

A problematização das normas cisgêneras e da heterossexualidade compulsória, que produzem as classificações dos “tipos humanos” contribui para desestabilizar os processos de normalização, questionando os discursos de gênero que são produzidos e reproduzidos nos espaços sociais e institucionais2727 Bogéa AF, Nunes IML. Os discursos normativos de gênero configurando masculinidades no espaço escolar. Civitas Rev Cienc Soc. 2022; 22:e41072. doi: 10.15448/1984-7289.2022.1.41072.
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Observa-se que ora os interlocutores são invalidados por não representarem o modelo ideal de maternidade, ora por não exercerem a paternidade sob as tantas prescrições cis-heternormativas. A gravidez é culturalmente associada aos corpos femininos e aos papéis maternos, e a heterossexualidade compulsória tende a reforçar a visão de que o corpo gestante deve ser feminino e heterossexual. Nesse bojo, a heterossexualidade compulsória contribui para a marginalização e a falta de reconhecimento de homens trans grávidos, tornando sua vivência ainda mais invisibilizada e estigmatizada na sociedade.

Essas narrativas evidenciam também os interditos, os apagamentos e as violências dos profissionais de saúde ao se depararem com um homem grávido, mostrando o quão a gravidez é intensamente regulada e generificada pelo sistema heteronormativo. Nesse sentido, tais excertos indicam o quanto a PNAISH pode atuar fortalecendo ações e serviços em redes e cuidados da saúde e reforçando o papel das instituições enquanto produtoras de desdobramentos positivos em torno da paternidade. Em um dos objetivos específicos, o documento indica a urgência de formar e qualificar os profissionais da rede básica para o “correto” atendimento à saúde do homem. Nesse sentido, existiriam modos “corretos” de atendimentos frente às experiências de gravidez e parentalidade dos homens trans?

A PNAISH reitera a necessidade do reconhecimento da saúde como um direito social básico e de cidadania de todos os homens brasileiros. E em um duplo sentido, traz a paternidade como um momento de grande mudança e transição, implicando em novas responsabilidades, estimulando o acesso ao sistema de saúde, através do seu papel parental1111 Meler I. La masculinidad. Diversidad y similitudes entre los grupos humanos. In: Burin M, Meler I, editors. Varones: género y subjetividad masculina. Buenos Aires: Paidós; 2000. p. 71-121.. Contudo, ao parecer salientar a noção de conjugalidade e família heteronormativa e de saúde materno-infantil, esquiva-se do suporte ao homem trans nos eixos da paternidade e saúde reprodutiva.

Em suma, as narrativas de Jonas, João, José e Joaquim ilustram como a fusão das noções sexo, gênero e sexualidades subsidiam as fissuras da sociedade, das instituições e dos sistemas de saúde em reconhecer e validar a monoparentalidade masculina de homens trans, confinando-os a uma interpretação estreita de gênero, e que não contempla a diversidade real das experiências humanas. Estas questões não só perpetuam estereótipos prejudiciais, mas também impedem esses homens de acessarem cuidados de saúde adequados e apoio durante suas jornadas de paternidade2828 Trindade Z, Cortez MB, Dornelas K, Santos M. Pais de primeira viagem: demanda por apoio e visibilidade. Saude Soc. 2019; 28(1):250-61. doi: 10.1590/S0104-12902019170892.
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Tanto a paternidade derivada do efeito looping classificatório2929 Pontes MTCM. "Uma separação não acaba com a família, mas a transforma": a construção social da parceria parental como modelo familiar pós-divórcio [tese]. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Medicina Social; 2019. quanto o desenvolvimento das competências parentais da monoparentalidade masculina cisgênera3030 Ribeiro JP, Silva MRS, Cezar-Vaz MR. Compreendendo o exercício das competências parentais na família monoparental chefiada pelo pai. Cienc Cuid Saude. 2012;10(3):490-7. doi: 10.4025/ciencuidsaude.v10i3.11324.
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são elaboradas mediante um contexto regulador. As pesquisas mais recentes podem indicar que, para alguns homens trans, a experiência da gestação significa aquisições que se tornam parte da narrativa de construção de sua própria masculinidade1414 Pereira DMR, Araújo EC, Silva ATCSG, Abreu PD, Calazans JCC, Silva LLSB. Scientific evidence on experiences of pregnant transsexual men. Texto Contexto Enferm. 2022; 31:e20210347. doi: 10.1590/1980-265X-TCE-2021-0347en.
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.

Construção da paternidade e do reconhecimento parental

Considerando que um dos objetivos da PNAISH é promover a equidade em saúde pelo fortalecimento da paternidade e cuidado44 Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (princípios e diretrizes) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2008 [citado 10 Maio 2009]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_atencao_homem.pdf
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, foram destacados os excertos que denotaram os modos de construção do tornar-se pai, bem como as estratégias de demarcação dessa parentalidade. Os relatos remetem ao exercício do cuidado, manutenção e uso de estereótipos de gênero e ação deliberada em nomear e organizar a performance parental.

A parentalidade enquanto construção de “tipos humanos” é um dispositivo de formação e gerenciamento de pessoas3131 Souza FHO, Fontella C. Diga, Gérard, o que é a parentalidade? Clin Cult [Internet]. 2016 [citado 15 Jul 2024]; 5(1):107-20. Disponível em: https://periodicos.ufs.br/clinicaecultura/article/view/5375
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. Assim, ela se constrói por meio de atuações, nomenclaturas, moralidades, dentre outros elementos constitutivos. Nas narrativas, a construção da parentalidade apareceu associada ao ato de traduzir, isto é, decodificar uma mensagem ancorada em um esquema interpretativo “inicial/de partida” para outra compreensão de destino.

O que a gente tem que fazer: continuar defendendo o nosso ponto de vista. Que pai é pai, independente de ser cis ou trans. Traduzir, sabe, na cabecinha dela, que sou a pessoa que gerou ela, mesmo você tendo essa aparência masculina.

(José, 29/08/2022)

Normalmente tudo vai para cima da mãe. Até os comentários geralmente são: “o menino é assim por causa da mãe, ninguém vê o lado do pai”. Por isso que eu já pego isso e falo, eu sou mãe e pai. Mas ainda assim as pessoas ainda questionam, “e cadê a mãe dele”, e eu volto a afirmar: eu sou mãe e pai.

(Jonas, 23/12/2022)

José e Jonas destacam atos de nomeação e demarcação/defesa que alicerçam a inteligibilidade de suas parentalidades, exercidos em suas relações com os filhos e com outras pessoas que compõem a sociedade. Os atos atualizam a classificação sobre o pai, descontruindo a fixidez das identidades masculinas ao ampliar o argumento de que a masculinidade, e, em particular, a paternidade, não é uma expressão uniforme e imutável, mas sim diversa e adaptável3232 Connell RW, Messerschmidt JW. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Rev Estud Fem. 2013; 21(1):241-82. doi: 10.1590/S0104-026X2013000100014.
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. Para além das normatividades associadas ao termo pai, as parentalidades narradas abrangem diversas formas de exercer o cuidado e de se perceber dentro da lógica parental2626 Butler J. Vida precária: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica; 2019..

Destaca-se, porém, que diferente de outros estudos sobre monoparentalidade de homens trans, que evidenciaram desafios mais relacionados à manutenção do vínculo parental, a exemplo de casos de disputa judicial, e menos aos fatores financeiros3333 Benatti AP, Campeol AR, Machado MS, Pereira CRR. Famílias monoparentais: uma revisão sistemática da literatura. Psicol Cienc Prof. 2021; 41(3 Spec No):e209634. doi: 10.1590/1982-3703003209634.
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, nesta pesquisa, a construção da parentalidade apareceu permeada pelo imperativo do cuidado. Tal conceito mostrou-se entendido como zelo e responsabilidade rotineiros de realização imprescindível que possui custos financeiros.

As dificuldades foi mais a financeira. Tinha que deixar com uma pessoa pra poder ir trabalhar.

(Jorge, 04/10/2022)

Mas assim eu tenho um peso maior. Tem um peso maior de ter que prover, sabe, querendo ou não, eu fui criado assim, que a pessoa do sexo masculino, sempre vai ter uma responsabilidade maior, tem que correr atrás.

(João, 25/08/2022)

Nas narrativas, a inserção do custo financeiro do cuidado, enquanto desafio constituinte da parentalidade, aparece atravessada pelo papel de gênero, pela retomada do estereótipo do homem provedor do lar. Nesse sentido, tal conjugação parece assumir a intenção de construir não só a parentalidade genérica, mas aquela demarcada pela atuação da performance de gênero, o que remete à noção de paternidade. Essa realidade é agravada pela expectativa de que homens devem ser os principais provedores, estereótipo que não apenas reforça normas de gênero restritivas, mas também pode isolar ainda mais homens trans que lutam para se alinhar ou rejeitar essas expectativas.

Essa retomada mostrou-se relacionada aos questionamentos evidenciados na categoria temática anterior. Conforme discutido, o exercício da monoparentalidade ensejou falas que questionavam a performance masculina associada ao cuidado – “Mas, cadê a mãe dele?” As falas evidenciam os conflitos e negociações que existem em torno da tríade compulsória de ser homem-pai-heterossexual e fortalecem o uso estratégico da função da provisão direcionada exclusivamente ao pai3232 Connell RW, Messerschmidt JW. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Rev Estud Fem. 2013; 21(1):241-82. doi: 10.1590/S0104-026X2013000100014.
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.

Os relatos fornecidos ilustram desafios significativos enfrentados por homens trans na negociação de suas identidades enquanto pais, especialmente em contextos sociais que ainda estão fortemente ancorados em normas de gênero tradicionais e heteronormativas. A construção da paternidade, atribuída pelo PNAISH como uma experiência transformadora33 Pereira J, Klein C, Meyer DE. PNAISH: uma análise de sua dimensão educativa na perspectiva de gênero. Saude Soc. 2019; 28(2):132-46. doi: 10.1590/S0104-12902019170836.
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, é complicada pela intersecção de expectativas de gênero, responsabilidades parentais e identidades trans.

Neste sentido, a PNAISH destaca o aspecto “insalubre” da masculinidade, por meio de um discurso vitimário e paternalista que contribui mais para invisibilizar do que revelar possibilidades3434 Carrara S, Russo JA, Faro L. A política de atenção à saúde do homem no Brasil: os paradoxos da medicalização do corpo masculino. Physis. 2009; 19(3):659-78. doi: 10.1590/S0103-73312009000300006.
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. Para os homens trans, articular reivindicações de uma posição generificada e tornar-se visíveis enquanto “homens”, significa colocar-se numa circunstância negativa de autoafirmação e ter o desejo por uma masculinidade hegemônica inalcançável e ensejadora de sofrimento.

As reações públicas e questionamentos contínuos sobre sua legitimidade como pais refletem a dificuldade da sociedade em classificar homens trans como pais cuidadores competentes e afetuosos. Conforme Medrado e Lyra3535 Medrado B, Lyra J. Por uma matriz feminista de gênero para os estudos sobre homens e masculinidades. Rev Estud Fem. 2008; 16(3):809-40. doi: 10.1590/S0104-026X2008000300005.
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apontam, as estruturas sociais e as políticas de saúde frequentemente falham em reconhecer e acomodar outras identidades de gênero, o que pode resultar em exclusão e marginalização. Para Butler2626 Butler J. Vida precária: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica; 2019., há uma atualização das definições de quais vidas serão consideradas vivíveis.

Colocar a saúde dos homens como foco das políticas governamentais — o que inclui a PNAISH — exige considerar as especificidades das necessidades de saúde dos homens trans e questionar como as “novas” demandas nesse campo estão relacionadas a uma complexa interação de fatores sociais, econômicos, culturais, políticos e tecnológicos. Toma-se uma urgência no reconhecimento de que a precariedade compartilhada entre os corpos de homens trans institui obrigações éticas, de direitos humanos e que pressupõe lutas por representação e aparição pública.

Estigmatização e exclusão

Desde a gravidez, homens trans são submetidos a violências que se perpetuam nas esferas sociais, comprometendo a saúde e produzindo efeitos deletérios sobre as identidades. A PNAISH traz, no seu argumento, a invulnerabilidade fortalecida na masculinidade hegemônica para justificar o afastamento dos homens dos serviços de saúde1212 Freitas WMF, Silva ATMC, Coelho EAC, Guedes RN, Lucena KDT, Costa APT. Paternidade: responsabilidade social do homem no papel de provedor. Rev Saude Publica. 2009; 43(1):85-90. doi: 10.1590/S0034-89102009000100011.
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, contudo, é preciso considerar as interseccionalidades que afetam a construção de políticas e serviços que acabam corroborando a prática reiterada de violências.

Que diabo de machuda é tu? Para os demais era isso. Tu não gostava de homem, que diabo de machuda é tu?

(Joaquim, 11/04/2023)

Eu não existo mais! Às vezes, isso, ultimamente, tem me colocado assim, até duvidar de mim, sabe, de quem eu sou, então isso é bem, bem tenso [choro intenso].

(João, 25/08/2022)

Teve um tempo que eu me sentia muito impotente, sabe que eu ficava me culpando por tudo isso. A culpa me impediu muito de acordar e tomar alguma atitude.

(José, 29/08/2022)

Aí costumava questionar e “Por que que ele é assim?” Ele é assim, porque eu estou criando. E esse é o jeito dele.

(Jonas, 23/12/2022)

Conforme os relatos acima, verifica-se que os interlocutores do estudo enfrentam violências verbais e sociais, questionamento da legitimidade de sua masculinidade e até de sua existência. Esses relatos evidenciam a intersecção de discriminações baseadas no gênero e na sexualidade, ressaltando a necessidade de um olhar mais sensível e inclusivo nas políticas de saúde e sociais. A análise dessas narrativas revela como a marginalização e a estigmatização são processos sociais ativos que reforçam a exclusão e afetam adversamente a saúde mental e física dos indivíduos3636 Pereira LBC, Chazan ACS. O acesso das pessoas transexuais e travestis à atenção primária à saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comun. 2019; 14(41):1795. doi: 10.5712/rbmfc14(41)1795.
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. Questiona-se, assim, quais as condições sociais de sobrevivência ou de prosperidade são possíveis ou não para os homens trans2626 Butler J. Vida precária: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica; 2019..

Aponta-se também a família como grande núcleo gerador de discriminação, contribuindo amplamente com os ataques à saúde mental de pessoas trans. Novo3737 Novo ALC. Famílias em transição: uma etnografia sobre relacionalidade, gênero e identidade nas vidas trans [tese]. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte; 2021. disserta que a transição de gênero não afeta apenas o indivíduo em transição, mas também transforma relações, interações e significados dentro da família, desencadeando rupturas e mudanças em identidades, memórias e vínculos familiares. Estas mudanças advêm da quebra de expectativas de gênero, cujo processo de reequilíbrio perpassa por conflitos, diálogos e negociações. Butler3838 Butler J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2015. também relembra que as pessoas não constituídas de identidades fixas, ao contrário, são fruto de relações de jogos e formas de dominação. Ocorre que essas forças podem ser clivadas e reconstituídas, gerando novas configurações e possibilidades de rompimento.

Estes diversos aspectos que cerceiam a saúde de pessoas trans sublinham a urgência de políticas públicas que reconheçam e enderecem especificamente as experiências e desafios enfrentados por homens trans, promovendo um ambiente mais inclusivo e suportivo3939 Melo IR, Amorim TH, Garcia RB, Polejack L, Seidl EMF. O direito à saúde da população LGBT: desafios contemporâneos no contexto do sistema único de saúde (SUS). Rev Psicol Saude. 2020; 12(3):63-78. doi: 10.20435/pssa.vi.1047.
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. O reconhecimento e a inclusão dessas experiências nas políticas de saúde e sociais são essenciais para mitigar os efeitos negativos da estigmatização e para promover uma sociedade que respeita e valida todas as identidades de gênero. A integralidade da saúde a todos os homens, em um padrão cisnormativo, explicita a marginalização de outras masculinidades na política. É mediante os enquadramentos e normas que determinam o que seja uma vida vivível, que os homens trans – que escapam da moldura – incorporam a masculinidade e enunciam novos processos de construção política do gênero e dos papéis parentais3838 Butler J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2015..

Com base nos relatos, como citado por Joaquim, notou-se uma estratégia de espreitar o “armário” das pessoas que escapam das formas que se concebe as feminilidades e masculinidades. Por parte dos profissionais de saúde, há uma busca de classificação mediante estereótipos, moralidades e julgamentos próprios, impregnados de senso comum. Este dispositivo, que não permite por completo nem uma visibilização afirmativa nem uma ocultação defensiva, pode ser ainda uma estratégia de regulação e controle social dos corpos dissidentes.

As violências implicam sobretudo na produção de efeitos deletérios da identidade, como na fala de João “Eu não existo mais”, na preocupação exacerbada com os filhos e na consequente culpabilização dos pais pela manifestação de comportamentos dos filhos, destacando o que Teperman4040 Teperman D. Parentalidade para todos, não sem a família de cada um. In: Teperman D, Garrafa T, Iaconelli V, organizadoras. Parentalidade. Belo Horizonte: Autêntica; 2020. p. 89-108 traz como uma parentalidade ortopédica e normativa, capaz de doutrinar os comportamentos e produzir corpos dotados de docilidade e obediência, sob o argumento de garantir o bem-estar de seus rebentos.

O exercício da parentalidade muitas vezes destaca vulnerabilidades, que se ampliam com o peso do julgamento e da atual vigilância sobre os pais trans, potencializando assim adversidades no processo de construção identitária para além das responsabilidades do cuidado. A falsa dicotomia em relação à parentalidade performática revela erros de que a transmissão inconsciente entre pais e filhos pode e deve ser controlada pela vontade, cuja pretensão baseia-se na constante tentativa de “purificação” psíquica.

A transfobia tem relação com o controle social dos corpos, modo de patrulhamento cotidiano das (in)conformidades de gênero4141 Freire L. Em defesa da dignidade: moralidades e emoções nas demandas por direitos de pessoas transexuais. Mana. 2020; 26(2):e262205. doi: 10.1590/1678-49442020v26n2a205.
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. As formas de violências incluem um emaranhado de discursos, práticas culturais, sociais e as próprias políticas produzidas, como é o caso da PNAISH. Por isso mesmo, destaca-se a necessidade de reflexividade e problematizações nos serviços, nos espaços formativos e na gestão sobre os diferentes marcadores imbricados à saúde de homens trans e a necessidade de repensar o desenho cisnormativo de políticas públicas.

Considerações finais

A experiência de homens trans que engravidaram, articulada ao diagnóstico relacionado à saúde reprodutiva e à parentalidade contido na PNAISH, problematizando gênero, masculinidade e paternidade, mostrou uma urgente necessidade de educação permanente em saúde e sensibilização dentro das políticas de saúde. É premissa o reconhecimento da diversidade e de ações externas que interferem e estabelecem as condições de saúde para diferentes grupos sociais, possibilitando a sua inclusão na agenda de ações intersetoriais, que impliquem em mudanças na formatação de aparatos da saúde, tendo em vista a diversidade de questões que impedem ou dificultam o acesso desta população aos serviços. As narrativas destacam que fatores, como a empregabilidade, os arranjos familiares e os ambientes educacionais, influenciam diretamente a saúde do homem trans, tornando esta uma questão complexa e multifacetada, que exige uma abordagem mais ampla e integrada.

A PNAISH, enquanto política pública, tem a responsabilidade de adaptar-se e responder às necessidades de todos os homens, incluindo aqueles que são trans, compreendendo a vivência da identidade “homem” como diversa, presente em espaços variados e com configurações distintas. Este estudo sublinha a imprescindibilidade de reformular as políticas de saúde, para que elas reconheçam e integrem as diversas experiências de paternidade e reprodução, indo além dos limites dos desenhos cisnormativos de políticas públicas, que preconizam um cuidado estruturalmente binário. Isso pode ser alcançado por meio de educação continuada para profissionais de saúde, revisão das diretrizes clínicas e inclusão explícita de considerações sobre diversidade de gênero nas políticas públicas.

A PNAISH, ao buscar integrar os homens no sistema de saúde por meio do reconhecimento de suas funções parentais, ainda se baseia amplamente em um modelo de família e conjugalidade heteronormativa. Este foco pode inadvertidamente marginalizar experiências que não se enquadram nesse modelo, como as dos pais trans, e reforçar a percepção de que certos tipos de famílias e práticas parentais são menos válidos ou dignos de suporte.

Tendo em vista os 15 anos da PNAISH, sugere-se que sua juventude possa ser inaugurada com questões que reconheçam e validem uma variedade de estruturas familiares e experiências de paternidade, incluindo aquelas de pais trans, para garantir que todos tenham acesso a suporte e recursos adequados. Além disso, promover a formação continuada de profissionais de saúde, para melhor compreensão das identidades trans e das dinâmicas familiares não tradicionais. Deve, portanto, assegurar que seus princípios, diagnóstico e diretrizes reflitam e suportem a diversidade de experiências parentais, movendo-se além das noções pré-concebidas de gênero e sexualidade.

  • Financiamento

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Código de financiamento – 88881.695908/2022-0 e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Dez 2024
  • Data do Fascículo
    2025

Histórico

  • Recebido
    17 Jul 2024
  • Aceito
    31 Out 2024
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