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https://doi.org/10.1109/ACCESS.2020.2979... ), que se encontram em diferentes fases da pandemia; em outros estão diminuindo, como a China; e em outros, como o Brasil, além de estar batendo recordes atrás de recordes, iniciou-se agora a expansão para o interior dos estados (FIOCRUZ, 2020a,b,c).
Diante desse desejo de centralidade ou de retomada da centralidade do SUS, que realmente precisa crescer e submeter o privado ao seu controle e não o contrário, analisou-se uma das dimensões de maior impacto no combate ao vírus e na assistência à população, a oferta de leitos de UTI disponíveis no Brasil. Com as notícias de instalação de hospitais de campanha, de criação de leitos e de tentativas de reabrir ou disponibilizar leitos públicos não utilizados, criou-se uma metodologia para investigar a expansão desses leitos em todo o país, segmentando os resultados por região geográfica.
O mapa 1 exemplifica as desigualdades regionais na distribuição/alocação de leitos de UTI (SUS e não SUS) no Brasil. A Região Sudeste concentra (51,9%) dos leitos de UTI nacional, enquanto as regiões Norte (5.2%) e Centro-Oeste (8,5%) não alcançam 10 % dos leitos totais.
Proporção da distribuição de Leitos de UTI totais (SUS e não SUS) por regiões do Brasil - Competência abril/2020
Os resultados encontrados são surpreendentes e contrastam com os desejos dos sanitaristas, os quais compartilhamos, de fazer com que o SUS volte a definir os rumos da política de saúde, dando-lhe um caráter público, sanitarista, humanista-republicano (GUIMARÃES; SANTOS, 2019). A pergunta, portanto, está posta e ainda parece cedo para concluirmos definitivamente sobre qual setor (o público ou privado) sairá fortalecido dessa “coronacrise” (MELLO et al., 2020), que já infectou mais de 5 milhões de pessoas em todo o globo (JOHNS HOPKINS, 2020).
Buscou-se fazer, inicialmente, uma revisão bibliográfica em uma base científica, a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), a fim de encontrar artigos que tratassem da expansão de leitos de UTI no país, a partir dos termos “Covid-19”, “Brazil” e “Leitos de UTI”. Foram encontrados quatro resultados, sendo um artigo científico publicado no periódico J.Health NPEPS e os outros três estão classificados como “recursos multimídias” (multimídia). Entre esses há uma entrevista com o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, um vídeo de preparação de leitos de UTI divulgado pelo governo brasileiro, e uma coletiva de imprensa da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo (SESSP). Portanto, não foi possível fazer uma revisão bibliográfica sobre o tema, razão pela qual foi necessário ir em busca de bancos nacionais de dados de saúde e da população, o que nos remete ao ponto seguinte.
Para a construção dos dados apresentados no texto, foram consultados alguns bancos: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) - Estimativa populacional 2019; indicadores obtidos junto ao Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde do Brasil (CNES), do Ministério da Saúde - Competência abril/2020; e Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) - Competência abril/2020. Os leitos de UTIs11Leito de Unidade Terapia Intensiva (UTI) - são leitos destinados à internação de pacientes graves ou de risco, que requerem atenção profissional especializada de forma contínua, materiais específicos e tecnologias necessárias aos diagnósticos e terapêutica em consonância a PT/GM/MS nº 3.432/1998 e a RDC/ANVISA nº 07/2010. considerados foram: UTI adulto I, UTI adulto II, UTI adulto III,22Leito de Unidade de Terapia Intensiva - Adulto (Tipo I, II ou III) - são aqueles destinados à assistência de pacientes com idade superior a 15 anos. A faixa etária adotada para definir leitos de terapia intensiva adulto é referenciada pela Portaria GM/MS nº 1.631, de 1º de outubro de 2015; entretanto, a unidade hospitalar, em conjunto com os profissionais envolvidos no atendimento, deve definir a idade mínima para internação de acordo com as condições estruturais da unidade - físicas e de recursos humanos. Esta conduta deve ser normatizada na instituição e publicizada para os gestores da rede e o limite etário deve ser o mesmo para atenção clínica e cirúrgica. UTI infantil I, UTI infantil II, UTI infantil III,33Leito de Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Tipo II e III - UTI destinada à assistência a pacientes com idade entre 29 dias e menor que 15 anos. Observação: a faixa etária adotada para definir leitos de terapia intensiva pediátrica é referenciada pela Portaria GM/MS nº 1.631/2015, entretanto, a unidade hospitalar, em conjunto com os profissionais envolvidos no atendimento, devem definir a idade máxima para internação de acordo com as condições estruturais da unidade - físicas e de recursos humanos Esta conduta deve ser normatizada na instituição e publicizada para os gestores da rede e o limite etário deve ser o mesmo para atenção clínica e cirúrgica. UTI neonatal I, UTI neonatal II, UTI neonatal III,44Leito de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) - conforme a PT/GM/M n° 930, de 10 de maio de 2012, considera-se como Unidade Neonatal o serviço de internação responsável pelo cuidado integral ao recém-nascido grave ou potencialmente grave, dotado de estruturas assistenciais que possuam condições técnicas adequadas à prestação de assistência especializada, incluindo instalações físicas, equipamentos e recursos humanos. UTI Neonatal são serviços hospitalares voltados para o atendimento de recém-nascido grave ou com risco de morte, destinada à assistência a pacientes admitidos com idade entre 0 e 28 dias. UTI de Queimados,55Unidade de Terapia Intensiva Especializada em Queimados Adulto e Pediátrico é um serviço hospitalar com no mínimo cinco leitos, destinado aos usuários queimados em situação clínica grave ou de risco, necessitando de cuidados intensivos, com equipe interdisciplinar e multiprofissional, 24 horas por dia. UTI coronariana tipo II - UCO tipo II, UTI coronariana tipo III - UCO tipo III66Leitos de Unidade de Terapia Intensiva Coronariana (UCO): é a UTI dedicada ao cuidado a pacientes com síndrome coronariana aguda. (BRASIL, 2017).
Após essas pesquisas, foi possível construir as tabelas e extrair os resultados acerca da temática dos leitos, especificamente da sua expansão a partir do evento pandêmico, que expressam, desde logo, um claro fortalecimento do setor privado/suplementar, que, pontue-se, está operando fortemente no sentido de expandir a sua rede, tendo conseguido liberar os recursos do ativo garantidor (SANTOS, 2020bSANTOS, R. T. Bolsonaro, a pandemia e o compromisso com o mercado. Le Monde Diplomatique Brasil, 27 mar 2020b. Disponível em: <https://diplomatique.org.br/bolsonaro-a-pandemia-e-o-compromisso-com-o-mercado/>. Acesso em: 27 mar 2020.
https://diplomatique.org.br/bolsonaro-a-... ), enquanto os avanços do SUS estão tímidos, ao menos neste tópico dos leitos de UTI.
Proporção de leitos de UTI SUS e Não SUS por região/UF. Momento pré-pandemia (dezembro/2019) e Pandemia (abril/2020)
Com base nos dados compilados, verificamos que houve um salto no número de leitos no país, saindo de 46.045 em dezembro de 2019 (momento pré-pandemia) para 60.265 (pós-pandemia) em abril de 2020. Ou seja, em quatro meses, aproximadamente, houve um incremento de 14.220 leitos, o que representa um aumento total de 23,59%, e que é bastante significativo.
Poder-se-ia pensar então que a população brasileira estaria agora bem mais assistida, já que o aumento foi expressivo, ao menos do ponto de vista nacional e sem considerar as desigualdades regionais nessa oferta. Entretanto, quando se consideram apenas os leitos de UTI SUS é que os resultados são ainda mais impressionantes: destes 14.220 novos leitos, apenas 3.104 são do SUS, ou seja, disponível para toda a população, inclusive para quem possui plano privado de saúde. Esse tímido avanço do SUS representa apenas 21,82% dos novos leitos UTI. Ou seja, a contrario sensu, o setor privado com seu crescimento conseguiu instalar mais 11.116 leitos, o que representou 78,18% das novas camas de tratamento intensivo em todo o país, expressando uma desigualdade sem precedentes na história recente do país, isto é, desde a implantação do SUS.
Ora, até dezembro de 2019, a diferença numérica absoluta entre os leitos de UTI SUS e não SUS era praticamente insignificante, e o número dos leitos públicos era ainda superior ao da oferta privada (23,049 frente a 22.996). Ou seja, havia uma parca diferença de 53 leitos, a favor do SUS. Com a pandemia os números foram muito invertidos e o país passou a ter uma oferta de 26.153 leitos públicos face a 34.112 leitos privados de UTI, resultando em uma diferença de 7.959, muito distinta dos antigos 53 leitos a maior no setor público. Importante ainda considerar que parte significativa dos novos leitos SUS criados para combater a Covid-19 não constituem patrimônios permanentes do sistema público, uma vez que dispostos nos hospitais de campanha, sabidamente temporários. Isso indica que, ao final da pandemia, se os rumos da expansão de leitos continuarem seguindo esta direção a diferença nacional será ainda maior.
A predominância do setor privado no quesito de expansão dos leitos de UTI é visível, o que é muito grave em um país no qual apenas 22,41% da população dispõem de plano privado, representando um total de 47.084.565 pessoas, e os outros 77,59% (ou 163.062.560 pessoas) dependem exclusivamente do SUS.
Está configurado expressamente o privilégio aqui instaurado, pois 22,41% da população disputam 34.112 leitos (agora com a pandemia), o que representa uma taxa proporcional de leitos no valor de 7,24 a cada 10 mil habitantes; ao passo que 77,59% da população disputam 26.153 leitos, sendo que, em verdade, 100% da população podem disputar esses leitos públicos, conforme garantia da Constituição Federal de 1988 e da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/1990), o que resulta em uma taxa de 1,24 leito SUS a cada 10 mil habitantes. Essa disparidade precisa ser sanada de alguma forma, tanto por medida de justiça quanto de igualdade, uma vez que todas as vidas importam e são dotadas do mesmo valor. Ou vamos dizer que algumas vidas importam mais que outras?
Quando se analisa essa situação por região, verifica-se que as iniquidades no acesso à saúde, especificamente aos leitos de UTI, são ainda mais brutais, e revelam a lógica privatista, que privilegia quem pode pagar por serviços suplementares de saúde, que, como visto, não é a maioria da população. Analisaremos as duas regiões que mais são dependentes do SUS, quais sejam, a Norte e a Nordeste, por serem as mais expressivas do fosso existente no acesso aos leitos existentes entre os usuários do SUS e os usuários dos planos privados.
A Região Norte possui um contingente populacional de 18,43 milhões de pessoas (8,77% da população nacional). Deste, 90,72% são dependentes exclusivos do SUS, e que disputam 1.793 leitos de UTI SUS, o que significa dizer que há aproximadamente um leito SUS a cada 9.325 pessoas. Ainda nesta região, percebe-se que 9,28% população possuem plano de saúde e disputam 1.335 leitos, resultando na proporção aproximada de um leito a cada 1.281 pessoas. Claramente, a situação é mais favorável para os setores privilegiados, que conseguem sustentar um plano suplementar de saúde.
A Região Nordeste, por sua vez, concentra 57,07 milhões de pessoas (27,15% da população do país). Destes, 88,43% dependem unicamente do SUS, disputando 5.968 leitos, perfazendo a proporção aproximada de um leito a cada 8.456 pessoas. Quanto aos beneficiários dos planos de saúde, nota-se que são 11,57% da população desta região disputando 6.512 leitos de UTI, o que resulta aproximadamente na proporção de um leito a cada 1.013 pessoas.
Desta concisa análise, é possível ainda extrair o fato de que a população dependente do SUS localizada na Região Norte possui as piores taxas de oferta de leitos por número de habitantes do país, o que talvez ajude a explicar o colapso no sistema sanitário da região, imersa nesta condição desde abril do presente ano.
Do breve estudo, é possível extrair as seguintes conclusões: (i) a regulação pública de leitos (fila única) parece ser uma medida de justiça que precisa urgentemente ser implementada, a menos que se valide, mais uma vez, que algumas vidas são mais importantes que outras; (ii) as diferenças regionais na oferta de leitos, antes de ser um argumento contra a unificação dos leitos, é, em verdade, um argumento a favor; (iii) 77,59% da população brasileira dependem exclusivamente do SUS, mas só dispõem de 26.153 leitos espalhados em todo o país, enquanto que a situação dos beneficiários dos planos de saúde é absurdamente mais confortável (com relação à oferta de leitos UTI, é claro); (iv) não obstante um pouco mais de três quartos da população serem dependentes do SUS, a grande expansão de leitos intensivos ocorreu no setor privado, perfazendo, até abril de 2020, 78,18% do crescimento nacional, enquanto que o aumento dos leitos SUS resultou em tímidos 21,82% do crescimento total. Isso, por sua vez, contrasta com os desejos e discursos dos sanitaristas, de que o SUS está se fortalecendo na pandemia, o que certamente ocorre no âmbito da percepção da sociedade, mas do ponto de vista concreto, de melhorias no sistema, como a expansão das UTIs, percebe-se um crescimento exponencial do setor suplementar.
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Notas
- 1Leito de Unidade Terapia Intensiva (UTI) - são leitos destinados à internação de pacientes graves ou de risco, que requerem atenção profissional especializada de forma contínua, materiais específicos e tecnologias necessárias aos diagnósticos e terapêutica em consonância a PT/GM/MS nº 3.432/1998 e a RDC/ANVISA nº 07/2010.
- 2Leito de Unidade de Terapia Intensiva - Adulto (Tipo I, II ou III) - são aqueles destinados à assistência de pacientes com idade superior a 15 anos. A faixa etária adotada para definir leitos de terapia intensiva adulto é referenciada pela Portaria GM/MS nº 1.631, de 1º de outubro de 2015; entretanto, a unidade hospitalar, em conjunto com os profissionais envolvidos no atendimento, deve definir a idade mínima para internação de acordo com as condições estruturais da unidade - físicas e de recursos humanos. Esta conduta deve ser normatizada na instituição e publicizada para os gestores da rede e o limite etário deve ser o mesmo para atenção clínica e cirúrgica.
- 3Leito de Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Tipo II e III - UTI destinada à assistência a pacientes com idade entre 29 dias e menor que 15 anos. Observação: a faixa etária adotada para definir leitos de terapia intensiva pediátrica é referenciada pela Portaria GM/MS nº 1.631/2015, entretanto, a unidade hospitalar, em conjunto com os profissionais envolvidos no atendimento, devem definir a idade máxima para internação de acordo com as condições estruturais da unidade - físicas e de recursos humanos Esta conduta deve ser normatizada na instituição e publicizada para os gestores da rede e o limite etário deve ser o mesmo para atenção clínica e cirúrgica.
- 4Leito de Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) - conforme a PT/GM/M n° 930, de 10 de maio de 2012, considera-se como Unidade Neonatal o serviço de internação responsável pelo cuidado integral ao recém-nascido grave ou potencialmente grave, dotado de estruturas assistenciais que possuam condições técnicas adequadas à prestação de assistência especializada, incluindo instalações físicas, equipamentos e recursos humanos. UTI Neonatal são serviços hospitalares voltados para o atendimento de recém-nascido grave ou com risco de morte, destinada à assistência a pacientes admitidos com idade entre 0 e 28 dias.
- 5Unidade de Terapia Intensiva Especializada em Queimados Adulto e Pediátrico é um serviço hospitalar com no mínimo cinco leitos, destinado aos usuários queimados em situação clínica grave ou de risco, necessitando de cuidados intensivos, com equipe interdisciplinar e multiprofissional, 24 horas por dia.
- 6Leitos de Unidade de Terapia Intensiva Coronariana (UCO): é a UTI dedicada ao cuidado a pacientes com síndrome coronariana aguda.
- 7A região norte é a única do país na qual o número de leitos de UTI SUS é superior ao número de leitos de UTI NÃO SUS.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
18 Set 2020 - Data do Fascículo
2020
Histórico
- Recebido
29 Maio 2020 - Aceito
09 Jun 2020 - Recebido
15 Jun 2020