Sistema de saúde em um contexto de crise humanitária: o caso do Haiti

Health System in a context of humanitarian crisis: the case of Haiti

Bertune Salomon Thereza Christina Bahia Coelho Sobre os autores

Resumo

O objetivo desta pesquisa é analisar a organização do sistema de saúde do Haiti, entre 2010 e 2020, com base no Postulado de Coerência proposto por Mário Testa. O estudo utilizou fontes públicas que foram compiladas e codificadas com auxílio do software QSR NVivo 10.0.641.0, para posterior análise crítica de conteúdo. Os resultados revelaram que o manejo de infecções sexualmente transmissíveis (IST) constituía a maior oferta de serviços, porém de forma fragmentada, sendo que as principais causas de morbimortalidade eram as doenças isquêmicas do coração e demais doenças cardiovasculares, devido a uma transição epidemiológica não identificada como problema prioritário no país. Destaca-se que a eletricidade irregular, a falta de equipamentos para fornecer água e instalações sanitárias, nas instituições de saúde, despontaram como questões estruturais a serem enfrentadas. Identificou-se que doadores contribuíram com mais da metade das despesas em saúde em 2010-2019, evidenciando uma dependência de financiamento externo. Conclui-se que a situação de contínua instabilidade política afeta significativamente o desempenho e a melhoria do sistema de saúde haitiano, mas a colaboração efetiva entre os atores identificados pode aportar mudanças significativas.

Palavras-chave:
Sistema de saúde; Organização em saúde; Financiamento saúde; Haiti

Abstract

This research aims to analyze the organization of Haiti's health system between 2010 and 2020, based on the Postulate of Coherence proposed by Mário Testa. The study used public sources compiled and coded with the help of the QSR NVivo 10.0.641.0 software, for subsequent critical content analysis. The results revealed that the management of sexually transmitted infections (STIs) were the largest range of services, but in a fragmented manner, with the main causes of morbidity and mortality being ischemic heart disease and other cardiovascular diseases, due to an unidentified epidemiological transition as a priority problem in the country. It is noteworthy that irregular electricity, the lack of equipment to supply water and sanitary facilities in health institutions emerged as structural issues to be faced. It was identified that donors contributed more than half of health expenses in 2010-2019, highlighting a dependence on external financing. It is concluded that the situation of continued political instability significantly affects the performance and improvement of the Haitian health system, but effective collaboration between the identified actors can bring about significant changes.

Keywords:
Health System; Health organization; Health financing; Haiti

Introdução

O Haiti possui as maiores taxas de mortalidade de bebês e mulheres grávidas no Hemisfério Ocidental (UNICEF, 2014). No ano de 2015, o país confrontou-se com altas taxas de mortalidade infantil para menores de 5 anos (88/1.000), associadas à alta prevalência de patologias transmissíveis, entre as quais, malária, diarreia e infecções respiratórias agudas, agravadas pela má nutrição proteica e energética (Quadro 1). Essa taxa de mortalidade, no entanto, caiu ligeiramente para 81/1.000 nascidos em 2017. Por outro lado, o país contava com baixo índice de envelhecimento (21%) e taxa de fecundidade elevada (2,9 filhos por mulher).

O EMMUS-VI estimou o estado nutricional de crianças comparando medidas de altura e peso delas com os padrões globais de crescimento para bebês e crianças menores de 5 anos, tendo encontrado que 22% das crianças tiveram atraso no crescimento. A cobertura de imunização para sarampo, em 2016, foi de 53% das crianças de 12 a 23 meses, enquanto a cobertura de vacinação contra difteria, tétano e coqueluche (DPT) alcançou apenas 58% dessa mesma faixa etária.

A taxa de mortalidade materna foi de 732/100.000 nascidos vivos em 2017, destacando-se como principais causas: hemorragias graves, infecções, hipertensão arterial durante a gravidez (pré-eclâmpsia e eclampsia) e abortos inseguros (Stenberg, 2017). A prevalência de HIV/Aids na população entre 15 e 24 anos era de 2,0%, apresentando-se maior entre mulheres (2,3%) do que entre homens (1,6%), sendo que 49% das mulheres e 38% dos homens tinham pressão arterial elevada.

A malária é um importante problema de saúde pública na ilha de Hispaniola. No ano 2009, o Haiti e a República Dominicana desenvolveram um plano estratégico para sua eliminação até 2020. Esse objetivo não foi atingido; observou-se, entretanto, redução de 10,4% na incidência (por 1.000 pessoas em risco) desde 2010, que passou para 3,7% (Herrera, 2015).

Quadro 1
Indicadores de saúde, Haiti

O sistema de saúde do Haiti possui um subsistema público e outro privado. O sistema público é composto pelo Ministério da Saúde Pública e da População (MSPP)/Ministère de la Santé Publique et de la Population (MSPP) e pelo instituto de seguridade social denominado Caixa de Seguro de Acidentes de Trabalho, Doenças e Maternidade (Oftama)/Office d’Assurance Accidents du Travail, Maladie et Maternité. O setor privado é composto por agências de seguro privado e provedores.

Um sistema de saúde é a soma integrada de todas as organizações, instituições e recursos cujo objetivo principal é promover, recuperar e manter a saúde da população a que serve. Um sistema de saúde deve oferecer serviços que atendam às necessidades da população, articulando processos de natureza técnica, política e administrativa. Para que exista um sistema de saúde, as dimensões que provêm o cuidado devem articular o financiamento, a provisão e o consumo dos serviços, de modo a cobrir as necessidades e demandas de serviços, para cumprir com as funções de gestão dos recursos físicos, humanos e organizacionais que, no caso dos sistemas universais, são extremamente complexas (WHO, 2003; Coelho, 2016COELHO, T. C. B. Magnitude dos gastos em saúde, evolução e impacto social. In: COELHO, T. C. B.; TELES, A. S.; FERREIRA, M. P. S. (Org). Financiamento do SUS. Feira de Santana: UEFS Editora, 2016.).

Um sistema de saúde também pode ser definido como o conjunto de relações políticas, econômicas e institucionais responsáveis pela condução dos processos referentes à saúde de dada população. Para entender por que fracassam ou têm êxito determinados sistemas, é necessário analisar as dimensões que os estruturam, conhecer as características de cada um de seus componentes (pessoal, rede de serviços, insumos, financiamento, tecnologias, informações e conhecimentos) e como se relacionam entre si (gestão, regulação, prestação de serviços), ou seja, como é sua dinâmica (Lobato; Giovanella, 2012LOBATO, L. de V.; GIOVANELLA, L. Sistemas de Saúde: origens, componentes e dinâmica. In: GIOVANELLA, L. et al. (Org.). Políticas e sistemas de saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2012, p. 89-120.).

A análise de sistemas compreende o diagnóstico das necessidades, além da definição de todo o fluxo de atividades, entidades, atributos e estados possíveis (Miyagi, 2007MIYAGI, P. E. Controle programável: fundamentos do controle de sistemas a eventos discretos. São Paulo: Edgard Blucher, 2007.). As autoras Lobato e Giovanella (2012LOBATO, L. de V.; GIOVANELLA, L. Sistemas de Saúde: origens, componentes e dinâmica. In: GIOVANELLA, L. et al. (Org.). Políticas e sistemas de saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2012, p. 89-120.) descreveram três tipos de sistemas de saúde baseados nos modelos de: 1) seguridade social; 2) seguro social; e 3) assistência social ou residual.

A construção de sistemas públicos universais de saúde é central na busca por melhores condições de saúde e vida das populações. Essa construção está condicionada por lutas políticas e movimentos sociais fortalecidos e sustentados em valores de solidariedade e justiça social. Alguns países buscam ampliar a cobertura por meio de sistemas de saúde e, em outros, por seguros diversificados, produzindo novas segmentações com distintas repercussões sobre o direito à saúde. Na América Latina, existem duas experiências paradigmáticas de reformas difundidas como modelos de Cobertura Universal de Saúde/Universal Health Cover (CUS/UHC) que mostram o insucesso do alcance do acesso universal por meio de seguros: a do Chile e a da Colômbia. As metas de cobertura universal não foram atingidas, as cestas de serviços permanecem desiguais e a segmentação se aprofundou (Giovanella et al., 2018). Em síntese, as promessas de modelos baseados na UHC não se concretizaram e não há evidências de que tenham resultados mais efetivos do que os sistemas universais (OPS, 2007).

O Brasil é o único país capitalista da região que adotou um modelo de sistema público universal desde 1988, baseado em uma concepção abrangente de seguridade, que prevê cobertura e atenção integral e equitativa à saúde para toda a população, com desenho territorial e rede hierarquizada em níveis de atenção. A expansão de serviços de Atenção Primária em Saúde (APS), incluindo áreas remotas e desfavorecidas, ampliou o acesso à atenção coletiva e individual, produzindo impactos positivos na saúde da população (Giovanella et al., 2018).

Como no caso do Brasil, o artigo 19 da Constituição do Haiti (1987) diz que o Estado tem a obrigação imperativa de garantir o direito à vida, à saúde, para todos os cidadãos sem distinção, em respeito à pessoa humana em acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Ambos os países possuem o direito à saúde previsto constitucionalmente, enquanto diferenças de tamanho e recursos tornam os desafios enormes para ambos. Um estudo comparativo entre a gestão sanitária do Brasil e do Haiti informa que o modelo de gestão adotado no Haiti, apesar de possuir uma estrutura organizada em três níveis, dando impressão de descentralização, na prática, está voltado para uma abordagem de projeto, com as políticas de saúde sendo segmentadas em programas (Plancher, 2018PLANCHER, I. Análise comparativa dos sistemas de saúde do Haiti e do Brasil enquanto o modelo de gestão, modelo de atenção, modelo de financiamento e recursos humanos. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Saúde Coletiva) - Universidade Federal da Integração Latino-americana, Foz de Iguaçu, 2018.). Algo que também acontece no Brasil por influência do modelo sanitarista campanhista, hegemônico na primeira metade do século XX.

O Haiti possuía, em 2019, 11.263.077 habitantes, sendo que 13% das mulheres e 9% dos homens com idades compreendidas entre 15 e 49 anos não possuíam nenhum nível de escolaridade. A expectativa de vida ao nascer era de 64 anos, abaixo da média mundial, de 70 anos. A renda per capita anual era cerca de U$1.800 dólares, menos de um oitavo da brasileira, posicionando o país em 209º em ranqueamento de 230 países e territórios, ou seja, no decil inferior (Estados Unidos, 2017; Banco Mundial, 2019). Um aspecto muito importante é que a economia haitiana permanece extremamente dependente dos auxílios internacionais e do envio de dinheiro por expatriados (Freire, 2010FREIRE, V. T. Como se faz um Haiti? Folha de S.Paulo, v. 89, n. 29.509, 17 jan. 2010. Disponível em: <http:// www1. folha. uol. com. br/ fsp/ dinheiro/ G 1701201008.htm>. Acesso em: 16 jan. 2022.
http:// www1. folha. uol. com. br/ fsp/ ...
).

Segundo o Banco Mundial (2021), a economia haitiana tem enfrentado vários choques desde o segundo semestre de 2018 e, mesmo antes da pandemia de Covid-19, estava se contraindo e enfrentando desequilíbrios fiscais significativos. Após uma contração de 1,7%, em 2019, gerada por instabilidade política e agitação social, o produto interno bruto (PIB) diminuiu cerca de 3,8% em 2020, agravando o quadro. Nesse contexto desfavorável, a migração se tornou a forma de acesso a uma vida melhor, em particular, por meio do êxodo rural alimentado pela busca de melhores condições de vida, sendo considerado um dos países mais desiguais da região. O índice de Gini, que estima a desigualdade ao medir o desvio de uma distribuição de renda entre indivíduos ou famílias, em relação a uma distribuição perfeitamente igual, foi de 0,61, em 2012, com os 20% mais ricos detendo mais de 64% da renda total do país, em comparação com menos de 2% detida pelos 20% mais pobres (MEF, 2018; Banco Mundial, 2023).

Além disso, nas últimas três décadas, o Haiti experimentou uma multiplicidade de choques de origem climática, externa e sociopolítica, afetando a estabilidade macroeconômica. Em janeiro de 2010, um terremoto de magnitude entre 7.0 e 7.3 na escala Richter, com epicentro a cerca de 25 km da capital Porto Príncipe, atingiu o centro econômico, administrativo, político e populacional do país, que concentra 66% do PIB. As consequências humanas foram imensas, afetando, inclusive, a capacidade de governo de um país historicamente vulnerável aos desastres. O terremoto de 2010 mudou a dinâmica populacional (tamanho e estrutura etária), a economia e a vida dos haitianos (Bidegain, 2013BIDEGAIN, G. Haiti un autre regard. Infosante, v. 1, n. 6, Sept. 2013.). Em relação ao acesso aos serviços básicos de saneamento e saúde, apenas metade da população possuía acesso a serviços de saúde, água e saneamento, assim mesmo de baixa qualidade (Freitas 2012FREITAS, C. M. de et al. Vulnerabilidade socioambiental, redução de riscos de desastres e construção da resiliência: lições do terremoto no Haiti e das chuvas fortes na Região Serrana, Brasil. Cien Saúde Colet., v. 17, n. 6, p. 1577-1586, 2012.), cenário agravado após o evento sísmico.

Mais recentemente, em 14 de agosto de 2021, no contexto da pandemia de Covid-19, outro terremoto (magnitude 7,2) atingiu o país, deixando pelo menos 2,1 mil mortos. A tempestade tropical Grace, que se abateu sobre a região logo em seguida, dificultou o resgate das vítimas dos escombros (BBC, 2021).

Tendo em conta esse quadro, esta pesquisa objetivou analisar a coerência entre propósitos, métodos de governo e a organização do sistema de saúde do Haiti, com ênfase na sua estrutura e financiamento, entre 2010 e 2020.

Metodologia

As características do objeto da pesquisa e as limitações no acesso a dados de natureza primária levaram à realização de um estudo de caso descritivo-analítico. O estudo de caso permite a aquisição de conhecimento profundo, amplo e detalhado, assim como a geração de hipóteses (Yin, 2005).

O caso do sistema de saúde do Haiti utilizou revisão documental e de literatura. Para tal, foi realizada pesquisa preliminar de caráter exploratório, com rastreamento, identificação e seleção de documentos e textos bibliográficos em bancos de dados internacionais da Internet (SciELO, Bireme, PubMed e Lilacs), sites oficiais de entidades governamentais do Haiti (ministérios), estrangeiras, organismos multilaterais, e organizações não governamentais locais ou externas, referidos nos resultados e/ou nas referências, quando pertinente. Outros sites não oficiais, como por exemplo, o blog Le Nouvelliste, ou páginas de entidades locais participantes em atividades de planejamento das ações em saúde, contribuíram para contextualizar, interpretar, complementar ou checar informações. Foram utilizadas palavras-chave, em francês, português, inglês e espanhol: i) sistema de saúde; ii) Haiti; iii) estrutura saúde haitiano.

A partir das informações coletadas, foram identificadas categorias operacionais relacionadas com a estrutura do sistema de saúde, que fazem mediação entre o teórico e o empírico, tais como: a rede de serviços, a organização, força de trabalho, insumos, tecnologia, subsistema medicina tradicional e financiamento. A pesquisa exploratória determinou também o recorte temporal da pesquisa. O período de 2010-2020 foi estabelecido por critério referente a lacunas de pesquisa, mas também em decorrência dos desastres naturais e sociais já referidos, assim como pela epidemia de cólera e pela profunda instabilidade política que se estabelece nesse período.

Dos 42 documentos identificados, foram selecionados 15 para análise (Quadro 2), 14 dos quais de autoria do Ministério de Saúde Pública e da População/Ministère de la Santé Publique et de la Population (MSPP). O plano multissetorial, por exemplo (C13), contou com representantes dos ministérios da Educação e da Mulher. Priorizaram-se documentos de planejamento e avaliação voltados para a saúde e o sistema em geral, mas foram incluídos, em um segundo momento, planos que envolviam a saúde sexual, reprodução e planificação familiar, alvos de maior interesse das entidades internacionais doadoras, como se verá nos resultados. O caráter público dos documentos dispensou a entrada no Comitê de Ética e Pesquisa.

Quadro 2
Documentos por título, instituição autora, código e ano, 2005-2019

Os dados quantitativos foram constituídos de indicadores que permitiram medir algumas dimensões da saúde a serem consideradas neste estudo, enquanto os textos documentais selecionados foram analisados em seu conteúdo (Bardin, 1977), com o auxílio do software Nvivo.

O Postulado de Coerência proposto por Testa (1986TESTA, M. Estratégia, coherencia y poder en las propuestas de salud. Cuadernos Médico Sociales n. 38, Rosario, Argentina, 1986.), como abordagem teórica, permite analisar a relação necessária entre propósitos, métodos e organização das instituições, e compreender a distribuição de poder setorial. Desse modo, tomou-se como premissa a ideia de que o papel principal do Estado é garantir a continuidade do sistema e, na medida do possível, a resolução das contradições que existem entre gestores dentro dos grupos dominantes. Os propósitos de governo podem ser definidos como de continuidade, crescimento ou transformação, referentes à situação e às características da formação econômico-social que o sustentam, enquanto os métodos buscam resolver os problemas nas suas especificidades, mas podem ser contraditórios entre si. Por fim, a organização foi considerada como cristalização da história, que engloba todo o desenvolvimento ligado às determinações sociais, culturais, políticas e econômicas.

Resultados e Discussão

O Decreto-Lei de 5 de janeiro de 2005 detalha a missão e a estrutura organizacional do Ministério da Saúde Pública e da População, que é o órgão com o Poder Executivo. O MSPP é a entidade reguladora do sistema, que deve fornecer governança, financiamento, criação de recursos e coordenação das funções de prestação de serviços, sendo responsável pelas atividades regulatórias de serviços públicos e privados (C01).

O modelo de atenção por nível de resolutividade apresentado no Plano de Saúde 2012-2022 sistematiza a organização do sistema em termos de estrutura administrativa pública, tradicional e privada-mista. Na análise, foi possível perceber a ausência de instância administrativa para o subsetor de atenção tradicional na estrutura organizativa, o que mostra uma institucionalização incipiente das práticas tradicionais de saúde (C03).

Foi reconhecida a necessidade de fortalecimento do papel do MSPP no monitoramento de todo o sistema de saúde (C04), sendo que 38% das instituições de saúde eram geridas pelo MSPP e 20% conjuntamente pelo MSPP e ONGs, num total de 58%.

Organização do sistema de saúde

O sistema de saúde público haitiano está organizado em três níveis de complexidade: primário, secundário e terciário. O nível primário era composto por um microssistema formado pelas Unidades Comunitárias de Saúde (UCS) e pelos Hospitais Comunitários de Referência (HCR); o nível secundário possuía instituições como hospitais departamentais, bem como gabinetes médicos especializados; e o nível terciário era constituído por hospitais universitários e especializados (MSPP, 2016). O sistema contava, em 2016, com 1.007 unidades de saúde, passando, em 2022, para 1.033, distribuídas em 10 departamentos administrativos, sendo que o Departamento Oeste concentrava a maior parcela dos estabelecimentos (36%).

Observa-se, portanto, pequeno aumento no quantitativo dos serviços, que passa a ser composto por 131 hospitais, 161 centros de saúde com leitos, 361 sem leitos e 352 clínicas e centros de saúde.

O próprio MSPP avaliou que a oferta de saúde era fragmentada, com importantes problemas em todos os níveis, tanto na funcionalidade, organização, gestão, quanto no controle das práticas, resultando em oferta de saúde inacessível e de baixa qualidade (C05). Nas reflexões de Itagyba (2019), as organizações do Haiti aplicam os princípios da promoção de saúde de maneira incipiente e fragmentada, carecendo de um modelo estruturado e capaz de modificar o cenário haitiano em longo prazo.

A Política Nacional de Saúde (PNS) norteia as ações do governo e os demais instrumentos normativos detalham campos específicos de problemas. A PNS constitui a visão do Estado, para o setor, e fornece as orientações gerais às quais todos devem seguir, independentemente do seu estatuto (privado, público ou misto) (CO3). A PNS de 2012 resultou de um processo participativo da população haitiana por meio de consultas nas Assessorias Departamentais de Saúde (CO4). Um dos objetivos específicos da PNS foi estabelecer um sistema de saúde capaz de garantir a cobertura sanitária total do país e atender às necessidades básicas de saúde da população, promovendo a articulação da medicina moderna com a tradicional.

É preciso contextualizar que, desde os anos 75 do século XX, a promoção da saúde se reduzia a simples atividades de educação em saúde no âmbito dos centros de saúde e hospitais (C02). Por outro lado, o PMS (Pacote de Serviço Mínimo) de 1979 compreendia: atenção integral à saúde da criança; gestão da gravidez, parto e saúde reprodutiva; gestão de emergências médicas e cirúrgicas; luta contra doenças transmissíveis; assistência odontológica básica; educação participativa em saúde; saneamento ambiental e abastecimento de água potável; e disponibilidade e acesso a medicamentos essenciais.

Em relação à disponibilidade de serviços básicos (C02), pouco mais de duas em cada cinco instituições de saúde (42%) ofereciam todos, sendo os mais frequentes: manejo de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) (98%); atendimento curativo ambulatorial ao bebê (95%); e consultas de pré-natal (92%) (Tabela 1).

Tabela 1
Serviços mais oferecidos pelas instituições de saúde no Haiti

Cabe destacar que, com respeito à população geral, a principal causa de mortes são as doenças isquêmicas do coração, seguidas por doenças cerebrovasculares e infecções respiratórias inferiores. A queda da importância da mortalidade por Aids/HIV, de primeira causa, em 2009, para quarta, em 2019, indica menor presença de doenças infectocontagiosas, típicas de países “subdesenvolvidos”. A transição epidemiológica caracteriza-se por aumento das doenças crônicas não transmissíveis, mais especificamente, doenças cardíacas, mas mantendo presença significativa de infecções comuns, eventos reprodutivos e doenças relacionadas à desnutrição (DEFO, 2014DEFO B. K. Demographic, epidemiological, and health transitions: Are they relevant to population health patterns in Africa? Glob Health Action, v. 7, supl. 1, 2014.). Essa nova realidade epidemiológica traz a necessidade de serviços coerentes com o atual quadro de saúde.

Entretanto, o fornecimento irregular de eletricidade para mais de 3/4 (76%) das instituições de saúde e a falta de equipamentos para fornecer água e instalações sanitárias dificultam mudanças. Água de fonte potável era menos comum em clínicas/CCS e no setor público. Equipamentos para garantir o sigilo das consultas e exames estavam presentes em 9 entre 10 instituições (91%). Cerca de 61% das instituições de saúde tinham banheiros para pacientes. Elementos de infraestrutura, como equipamentos de comunicação, estavam presentes em 64% das instituições, enquanto 52% possuíam computador com acesso à Internet. Os hospitais estavam mais bem equipados, com 89% (C12).

Força de trabalho

O relatório de junho de 2017, do MSPP, indicou que o setor de saúde contava com 23.171 funcionários. Em 2018, as diversas instituições de saúde do país abasteciam a população com um total de 19.195 profissionais de saúde. Isso significa que o número de profissionais tem diminuído, sendo composto, principalmente, por 8.202 enfermeiras. Os médicos somavam 3.354, os agentes comunitários 3.972, enquanto as parteiras, espinha dorsal da Saúde para Todos, 219 (C12).

Insumos

O Ministério da Saúde Pública e População, por meio da Diretoria de Farmácia, Medicamentos e Medicina Tradicional em sua função reguladora, deve garantir que os medicamentos colocados no mercado apresentem o máximo de segurança. Considerando tais aspectos, o MSPP, em 2008, estabeleceu os princípios que regem as práticas relativas ao exercício da atividade farmacêutica, em particular, a fabricação de insumos, aprovação de medicamentos, importação, exportação, distribuição e comercialização, gestão de produtos farmacêuticos inutilizáveis (PPI), gestão de narcóticos e farmacovigilância. Segundo os dados do ministério, o Haiti tinha, em 2018, um total de 128 farmácias, 3 laboratórios e cerca de 300 farmacêuticos licenciados. O número de agências farmacêuticas era 40, além dos 39 depósitos de medicamentos autorizados nesta área (C12). É suficiente para cumprir as necessidades da população?

Tecnologia e conhecimento

Em 2005, diante da maior prevalência de HIV na região do Caribe, o MSPP e os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, com o apoio do Centro Internacional de Treinamento e Educação for Health (I-TECH), fizeram parceria para desenvolver e lançar um sistema eletrônico de informação em saúde, incluindo prontuários médicos eletrônicos, Electronic Medical Records (EMR), conhecido como iSante, para o programa nacional de HIV (De Riel et al., 2018).

iSanté é o maior dos três EMR multi-site, no Haiti. É visto como uma pedra angular da arquitetura nacional de saúde planejada de forma mais ampla, eventualmente alimentando um sistema abrangente para relatórios de indicadores de saúde agregados chamado Sistema Único de Informação Sanitária, definido como uma prioridade pelo MSPP, em 2013 (C07; De Riel et al., 2018). Porém, na análise documental, foram encontrados poucos dados sobre o uso da tecnologia.

Subsistema de medicina tradicional

O Serviço de Medicina Tradicional está concretamente integrado na Diretoria de Farmácia, Medicamentos e Medicina Tradicional (DPM/MT), desde 2006. Foram realizados encontros com organizações, curandeiros tradicionais e diversos outros atores com vista a instaurar mecanismos que estruturam melhor a medicina tradicional e a gestão terapêutica, de modo a promover a farmacopeia tradicional (Bussières, 2015BUSSIÈRES, J. F. et al. État des lieux en pratique pharmaceutique à Haïti - mise en contexte d’un pharmacien. Annales de l’Unité de recherche en pratique pharmaceutique, v. 8, p. 1-19, 2015.).

A medicina crioula haitiana se desenvolveu e se espalhou oralmente a partir dessa herança, para se tornar medicina popular e medicina especializada. Por medicina popular, entende-se um conjunto variável e heterogêneo de conhecimentos, práticas e remédios socialmente compartilhados (Marilise; Dejean, 2012MARILISE N. R.; DEJEAN, L. Médecine familiale, point de jonction pour l’intégration de la médecine traditionnelle et de la médecine conventionnelle. Haïti Perspectives, v. 1, n. 3, 2012. Ministère de la Planification et de la Coopération externe, Plan stratégique de développement d'Haïti- Pays émergent en 2030, 2012. Disponible en: https://www.haiti-now.org/wp-content/uploads/2017/05/MPCE_Plan-De-developpment-Haiti-2030-2.pdf
https://www.haiti-now.org/wp-content/upl...
).

Num contexto de escassez de infraestruturas de saúde, a medicina tradicional apresenta-se como um sistema de saúde complementar à medicina moderna, face ao conhecimento acumulado ao longo dos séculos. As plantas medicinais, frutas e legumes presentes no território nacional constituem uma mais-valia em termos de oferta de produtos de saúde para milhões de indivíduos e oportunidade econômica para profissionais de saúde e benzedeiras. Com a Covid-19, a venda de folhas e vagens de plantas conhecidas por suas propriedades terapêuticas explodiu, pois aumentou a conscientização sobre o papel, os ativos e a importância da medicina tradicional no Haiti, um dos países mais ricos em termos de plantas medicinais caribenhas (Lalime, 2020).

Financiamento do sistema de saúde do Haiti

O financiamento do setor saúde é relevante não apenas pelo impacto na sustentabilidade dos sistemas, mas também no acesso da população aos serviços (Moina et al., 2000).

O Haiti é um país de democracia representativa com um parlamento nacional bicameral e diversas instituições descentralizadas em nível local (Haiti, 1987). A crise política das últimas décadas deteriorou a situação macroeconômica, paralisando a gestão da política social e a aprovação de projetos de investimento estrangeiro, empréstimos e doações, devido às sanções econômicas impostas pela comunidade financeira internacional, o que dificultou a melhoria das condições socioeconômicas da população (PAHO, 2003).

Verificou-se forte contração do PIB, não obstante uma ligeira melhoria, entre 1998 e 2002, com uma taxa média de crescimento de 2% (PAHO, 2003). Cabe destacar também que houve um processo de reforma do setor de saúde, com a adoção de nova política de saúde, em 1996 (revisada em 1998), no âmbito de um programa econômico que propunha reformas estruturais das funções governamentais, do setor financeiro, modernização de nove entidades estatais e descentralização. Esta política de saúde foi baseada em dois conceitos: Unidades Comunitárias de Saúde (UCS) e o Pacote Básico de Serviços (PBS), que fazem parte da Política Nacional de Descentralização. O processo de reforma foi interrompido, pois o financiamento externo destinado a apoiar mudanças na administração do Estado não foi obtido devido à crise política (MSPP, 1998).

O sistema de financiamento da saúde passou por profundas mudanças nas últimas duas décadas. O aporte público diminuiu acentuadamente, enquanto o externo aumentou. Dados do Banco Mundial mostram que, nos anos 1995, as famílias eram as principais financiadoras do sistema de saúde por meio de gastos diretos (46% das despesas totais em saúde), seguidos pelo governo (41%) e, depois, pelas ONG (14%). Entre 1995 e 2014, os gastos públicos, como parcela do gasto total com saúde, caíram pela metade, de 41% para 21%. A participação das ONG começou a aumentar, em 2004, após o golpe de Jean-Bertrand Aristide, chegando a 35% em 2006. O financiamento externo atingiu um nível recorde de cerca de 70% das despesas, em 2011, devido ao grande fluxo de assistência de emergência em resposta ao terremoto (Banco Mundial, 2017).

Ocorre que o PIB do Haiti subiu de USD$ 2,813 bilhões, para USD$ 14,79 bilhões, no mesmo período (1995-2014), o que não justifica a queda no financiamento próprio da saúde, ainda mais porque a proporção das receitas líquidas estrangeiras é pequena na composição do PIB, ficando, em 2014, 0,7% do PIB (Banco Mundial, 2020).

Por outro lado, ao considerar os gastos feitos, de 2010 até 2019, é relevante a diferença entre a despesa do governo e as doações externas ao setor da saúde. No Gráfico 1, pode-se observar que os recursos externos contribuem em mais da metade das despesas, nesse período, comparados a outros setores. Dada a importância dos recursos injetados pela cooperação internacional na saúde, a falta de coordenação do apoio financeiro leva à fragmentação do sistema haitiano.

Gráfico 1
Proporção do financiamento externo e despesas do Governo, na Saúde, no período 2010-2019

Da mesma forma, cabe destacar o alto nível dos gastos diretos das famílias, nos hospitais do país. O gasto privado representava 46% do gasto total com saúde, em 2016: 42% de desembolso direto e 4% de seguros privados (Fene 2020FENE, F. et al. Sistema de salud de Haití. Salud Publica Mex, v. 62, n. 3, p. 298-305, 2020.). As despesas de saúde abrangem gastos efetuados no momento em que a família se beneficia do serviço de saúde. Normalmente, são honorários médicos, compras de medicamentos e contas hospitalares. As despesas com medicina alternativa e tradicional estão incluídas no cálculo das despesas diretas, mas não as despesas de transporte ou aquelas relacionadas à nutrição especial (OMS, 2005). Essa situação expõe as famílias a despesas catastróficas.

Coerência entre propósitos, métodos de governo e a organização estrutural do sistema de saúde do Haiti

As relações de força entre os diferentes atores de um sistema articulam os propósitos, métodos e organização numa instituição, que devem ser coerentes, segundo o postulado de coerência de Testa (1989). Existem relações de determinação e condicionamento entre os três elementos do postulado, referentes à história, à teoria e ao papel do Estado. Cada uma dessas condições expressa a existência de atores que se opõem ou cooperam entre si, com os poderes técnicos, políticos e econômicos de que dispõem, orientam estratégias e formas de implementação das políticas que, por sua vez, são propostas sobre a distribuição de poder.

No caso do Haiti, observou-se um incremento da diversidade de atores sociais e políticos na participação das decisões e organização, expressas nas ações de planejamento. Mantém-se, porém, muito incipiente a participação de profissionais de saúde e população cidadão, ao contrário do que alguns documentos anunciam (Quadro 3). As entidades mais conhecidas são a Associação Médica Haitiana (AMH), a Associação de Saúde Pública do Haiti (ASPHA), Associação Nacional dos Enfermeiros Licenciados (ANILH) e a Associação de Hospitais Privados (AHPH). Esta sociedade civil multidimensional deve apoiar o governo na implementação dos sistemas de proteção social. É preocupante observar que em todo o processo que levou à PNS de 2012, tais associações não estivessem envolvidas (Laroche, 2012LAROCHE, R. V. Financement du système de santé en Haïti. Santé publique, v. 1, n. 3, p. 5, 2012.).

Quadro 3
Participação de atores conforme registro em documentos oficiais, 2005-2019

Entre os atores participantes em determinados processos de planejamento do MSPP, encontra-se o MSH, que faz capacitação profissional e “expatriação” de pessoal qualificado do Haiti. Esta empresa recebe doações de entidades estrangeiras como The Bill & Melinda Gates Foundation e laboratórios como a Merck e Pfizer, dentre outros. A participação parece ser entendida numa perspectiva muito mais estratégica de buscar remover obstáculos às ações planejadas do que de engajamento coletivo na busca de soluções, como se pode observar no leque de intervenções propostas para desenvolver uma estratégia de comunicação sobre o planejamento familiar, voltado para jovens, com o objetivo de reduzir a mortalidade materna e neonatal, descrito em C06.

Por outro lado, o plano que contou com maior participação social (43) foi o de fortalecimento da APS e da Vigilância Sanitária (C11), o que sugere participação seletiva e um tanto fragmentada, a partir de áreas de problema-intervenção. As políticas abrangendo toda a saúde contaram mais com a equipe do MSPP e entidades estrangeiras específicas; as relacionadas com a saúde sexual e reprodutiva congregaram grande quantidade de entes governamentais estrangeiros, multilaterais e ONG, enquanto caberia aos setores técnicos e à comunidade decidir sobre a APS.

Portanto, chama a atenção uma enorme produção de documentos formais de planejamento e avaliação, elaborados com o auxílio de entidades estrangeiras doadoras de recursos, ou seja, intensa atividade burocrática que reproduz diretivas desses países. Em meio a essa planificação frenética, desdobram-se problemas de saúde de maneira incompreensível, como acontece com os planos C10 e C15, elaborados com apenas um ano de diferença. Tais esforços parecem se concentrar mais no aspecto normativo-institucional do que no técnico-administrativo, que deveria estar voltado para os determinantes sociais e políticos dos problemas enfrentados. Ainda, os métodos privilegiam a planificação estatal em detrimento da execução, que depende de recursos materiais para sua implementação. Embora as avaliações contidas nos documentos tragam resultados positivos, o exame mais detalhado do conjunto permite pressupor que tais resultados ficam mais circunscritos ao controle populacional como mecanismo privilegiado para melhoria da saúde. Ou seja, a ênfase nessa dimensão pode estar refletindo uma agenda oculta que canaliza esforços técnico-políticos locais para objetivos finais não expressos nos documentos. Mesmo porque, toda ação estratégica possui lacunas de informação necessárias para alcançar êxito (Habermas, 1989HABERMAS, J. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.).

Assim, os traços tributários da estrutura colonial herdada (elemento história), presentes nas ações organizacionais do sistema de saúde, parecem se articular com um método que direciona a organização do sistema de saúde para os propósitos ocultos dos atores estrangeiros. Dentre eles, destacam-se o controle da fertilidade das mulheres haitianas e da transmissão da Aids/HIV.

Considerações finais

A partir da problemática de pesquisa apresentada, pode-se dizer que a situação de saúde da população haitiana tem obtido melhora em alguns indicadores, mas permanece preocupante o comportamento de taxas sensíveis às condições de saúde. Com relação aos problemas de gestão e organização, encontraram-se oferta insuficiente de serviços, baixa qualidade e acesso dificultado.

O sistema de saúde do Haiti prescreve uma assistência universal à saúde nos documentos oficiais com modalidade de proteção social do tipo seguridade social. Entretanto, é composto por um subsistema público e outro privado, centralizado no MSPP e com estrutura mais de projeto do que sistêmica. Além do mais, existe pouca articulação com setores econômicos, exceto para captação de recursos econômicos externos na forma de doação por meio de agências internacionais, especialmente dos Estados Unidos. Faz-se necessário instituir um modelo que atue na determinação social da saúde, ou seja, que leve em conta a situação do país, já que grande parte da população está desempregada (a taxa de desemprego é superior a 65% da força de trabalho) e isso influi na capacidade dos haitianos de pagar para receber atenção de saúde.

Conclui-se, assim, que os sistemas de saúde devem ser compreendidos como redes de produção de saúde e integrar os atores que fazem parte dela. O contexto político, econômico e cultural constitui, ou não, incentivo para que essa rede se desenvolva. Compromissos e metas claras, viáveis e factíveis, são necessários para uma boa produção de saúde.

Este estudo contribui para uma melhor compreensão da estrutura e organização do sistema de saúde haitiana, a partir da visão analítica que busca atravessar a oficialidade oferecida pelos documentos e fornece novas sínteses e interpretações. No entanto, pesquisas sobre a implementação das políticas que delineiem melhor as relações de forças sociais e estatais poderão identificar as condições concretas para organizar respostas capazes de alcançar uma saúde populacional coerente com o grau de conhecimento atual. Em poucas palavras, prestar serviços eficientes, de boa qualidade e permitir que a população tenha acesso equitativo a eles é uma aspiração já legitimada pela constituição do Haiti. Para tal, prover a participação ativa das forças trabalhadoras e populares é condição incontornável que passa pela real democratização do país.11 B. Salomon: concepção do projeto, coleta e análise de dados, redação do artigo. T. C. B. Coelho: concepção do projeto, supervisão da análise dos dados e redação do artigo.

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    B. Salomon: concepção do projeto, coleta e análise de dados, redação do artigo. T. C. B. Coelho: concepção do projeto, supervisão da análise dos dados e redação do artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2022
  • Revisado
    15 Out 2023
  • Aceito
    16 Nov 2023
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