As corporeidades das identidades LGBTQIA+ a partir do território bucal: as prostéticas bocas-queer

The corporeities of LGBTQIA+ identities from the oral territory: the prosthetic queer-mouths

Luiz Eduardo de Almeida Valéria de Almeida Carlos Botazzo Fábio Luiz Mialhe Sobre os autores

Resumo

O presente estudo, um ensaio teórico, teve como objetivo analisar o papel e o potencial da cavidade bucal junto à pluralidade corpórea das identidades LGBTQIA+. Para tal, guiado por um percurso dialético, dois percursos bucais foram discernidos: um disciplinarizado pelos preceitos de uma hegemonia cristã, machista e cissexista; e o outro sob caráter de superação, questionando a unicidade da cisheteronorma. Por fim, com base nas premissas apresentadas, o território bucal, a partir de então, torna-se um possível caminho para se compreender o percurso histórico-social das identidades LGBTQIA+ - afinal, boca é corpo, e como todas as demais formas da corporeidade, guia-se pelas normatizações socialmente construídas com as quais tecemos nossa existência.

Palavras-chave:
Vida; LGBTQIA+; Boca; Construção Social do Gênero

Abstract

This study, a theoretical essay, aimed to analyze the role and potential of the oral cavity in the corporeal plurality of LGBTQIA+ identities. Thus, dialectically guided, two oral pathways were evidenced: the first disciplined by the precepts of a Christian, sexist, and cissexist hegemony; the other questioning the unison character of cisheteronormativity. Finally, based on the premises presented, the oral territory, from then on, becomes a possible way to understand the historical-social path of LGBTQIA+ identities - after all, the mouth is body, like all other forms of corporeality, guided by socially constructed norms which we weave our existence.

Keywords:
Life; LGBTQIA+; Mouth; Social Construction of Gender

Introdução

Como ponto de partida, torna-se mister compreender a vida com um processo de transformação (Oliva; Fonseca, 2023OLIVA, J. T.; FONSECA, F. P. A tripla transformação da vida humana. Rev. Inst. Estud. Bras., n. 84, p. 239-247, 2023. doi: 10.11606/issn.2316-901X.v1i84p239-247.
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). Uma dinamicidade pautada na contínua interação entre as demandas dos indivíduos (ator-social) e de suas coletividades (sociedade-Mundo) (Oliva; Fonseca, 2023).

Ademais, enquanto vivos, considerando-se apenas a etariedade, todos transitarão por múltiplas transformações: nascem bebês em direção para infância, adolescência, vida adulta, envelhecem e morrem - é justamente através deste contexto de trânsito que os percursos de vida deveriam ser criticados e refletidos, portanto, compreendidos (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Barbosa, 2010BARBOSA, R. H. S. A 'teoria da práxis': retomando o referencial marxista para o enfrentamento do capitalismo no campo da saúde. Trab. Educ. Saúde, v. 8, n. 1, p. 9-26, 2010. doi: 10.1590/S1981-77462010000100002.
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).

Entretanto, mesmo diante de todos os processos transformadores que ocorrem ao longo da vida, em função dos interesses capitalistas de uma contemporânea sociedade hegemonicamente cristã, machista11 Machismo: comportamento que rejeita a igualdade de condições sociais e direitos entre homens e mulheres. Enaltecimento do sexo masculino em detrimento da desqualificação do sexo feminino. Assim, a pessoa machista é aquela que acredita na inferioridade física, cultural e intelectual das mulheres (Ciasca et al., 2021). e cissexista22 Cissexismo ou cisnormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que desconsidera na sociedade a existência de pessoas que transitam ou rompem com o binarismo do sexo masculino ou feminino (Ciasca et al., 2021). - endossados e reforçados pelas premissas e/ou tabus das principais instituições de poder: a política, a economia, a cultura, a educação, a ciência, a religião e a família -, a cisheteronormatividade33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). emerge como um dos principais paradigmas44 Paradigma: “Um paradigma concebe um padrão a ser seguido no campo social ou científico; assim, em uma mesma comunidade científica, os paradigmas expressam as crenças, os valores e as técnicas partilhadas por seus membros e são influenciados por fatores culturais, políticos, econômicos e sociais. De uma forma mais genérica, o termo paradigma é usado como referência à forma como percebemos e atuamos no mundo” (Barbosa et al., 2015, p. 342). disciplinarizadores,55 Disciplinarizador: “processo de disciplinarização dos corpos para uma adequação ao capitalismo” (Kovaleski et al., 2006, p. 97). produzindo padrões, imposições e, até mesmo, fazendo-se agente de coerção no modo de experenciar a vida (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Santos ., 2021SANTOS, A. M. dos; CARMO, E. M.; MAGNO, L.; PRADO, N. M. de B. L. População LGBT+: demandas e necessidades para a produção do cuidado. Salvador: EDUFBA, 2021.; Foucault, 2020FOUCAULT, M. História da sexualidade: v. I (A vontade de saber), II (O uso dos prazeres), III (As confissões da carne) e IV (O cuidado de si). Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2020.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Barbosa, 2010BARBOSA, R. H. S. A 'teoria da práxis': retomando o referencial marxista para o enfrentamento do capitalismo no campo da saúde. Trab. Educ. Saúde, v. 8, n. 1, p. 9-26, 2010. doi: 10.1590/S1981-77462010000100002.
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; Butler, 2002).

E dentre as consequências deste percurso, pautado na compulsória binariedade66 Binarismo sexual ou binariedade: uma limitada perspectiva que dicotomiza os papéis sociais dos seres humanos em categorias masculinas/homem/macho e femininas/mulher/fêmea. Estas que são definidas no nascimento do sujeito e que produz a partir daí um corpo (Lucca; Passamani, 2018). (masculino-feminino), salienta-se o consubstanciamento da segregação das ditas “minorias sexuais e de gênero”,77 Minorias sexuais e de gênero: “Indivíduos incluindo lésbicas, gays, bissexuais, transgênero, queer, intersexo, pessoas com gênero em não-conformidade, e outras populações cuja orientação sexual ou identidade de gênero e o desenvolvimento reprodutivo são considerados fora das normas culturais, sociais ou fisiológicas” (DECS/MeSH, 2017). cujas existências remetem a intenso sofrimento, à tristeza crônica reproduzida na depreciação, na abjeção88 “A abjeção (do latim, ab-jectio) significa jogar fora, excluir. A noção de abjeção, ao contrário, designa uma condição degradada ou excluída dentro dos termos da sociabilidade. Em realidade, o foracluído (ou repudiado, dentro dos termos psicanalíticos) é precisamente o que não pode voltar a entrar no campo do social sem provocar a ameaça de psicose, quer dizer, de dissolução do sujeito mesmo. A sentença ‘prefiro morrer a fazer tal coisa’ seria o fantasma dessa dissolução atuando no sujeito” (Bento, 2021, p. 166). e, por vezes, na eliminação de suas vidas (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Santos ., 2021SANTOS, A. M. dos; CARMO, E. M.; MAGNO, L.; PRADO, N. M. de B. L. População LGBT+: demandas e necessidades para a produção do cuidado. Salvador: EDUFBA, 2021.; Foucault, 2020FOUCAULT, M. História da sexualidade: v. I (A vontade de saber), II (O uso dos prazeres), III (As confissões da carne) e IV (O cuidado de si). Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2020.; Rosa, 2020ROSA, E. B. P. R. Cisheteronormatividade como instituição total. PETFILO - UFPR, v. 18, n. 3, p. 59-103, 2020. doi: 10.5380/petfilo.v18i2.68171.
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; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Mbembe, 2018MBEMBE, A. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. São Paulo: n-1 Edição, 2018.; Bento, 2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017.).

Aqui as reflexões de Almeida . (2022ALMEIDA, L. E. de; OLIVEIRA, J. M. de; OLIVEIRA, V. de; MIALHE, F. L. Scientific production on LGBTQIA+ health: a critical analysis of the Literature. Saúde Soc., v. 31, n. 4, p. e210836en, 2022. doi: 10.1590/S0104-12902022210836en.
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), Rosa (2020ROSA, E. B. P. R. Cisheteronormatividade como instituição total. PETFILO - UFPR, v. 18, n. 3, p. 59-103, 2020. doi: 10.5380/petfilo.v18i2.68171.
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), Sodré (2005SODRÉ, M. Por um conceito de minoria. In: PAIVA, R.; BARBALHO, A. (Orgs.). Comunicação e cultura das minorias. São Paulo: Paulus, 2005.) e Louro (2001LOURO, G. L. Teoria queer: uma política pós-identitária para a educação. Rev. Estud. Fem., v. 9, n. 2, p. 541-553, 2001. doi: 10.1590/S0104-026X2001000200012.
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) ganham forma e sentido, uma vez que os estudiosos refutam a designação de “minorias sexuais e de gênero”99 Pode assumir, sob perspectiva “foucaultiana”, duas formas: “uma anátomo-política do corpo e uma biopolítica da população. A primeira refere-se aos dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante o controle do tempo e do espaço, no interior de instituições, como a escola, o hospital, a fábrica e a prisão. Por sua vez, a biopolítica da população volta-se à regulação das massas, utilizando-se de saberes e práticas que permitam gerir taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias, aumento da longevidade” (Furtado; Camilo, 2016, p. 34). - aplicada, em interface à cisheteronorma, a corpos descritos como dissidentes1010 Dissidência: quando entendida como caminho único para se percorrer a vida, a cisheteronormatividade deve ser considerada como um regime autoritário/totalitário. Assim, aqueles que não estão “alinhados” ou não se encontram dentro dos padrões de “normalidade” - corpos não brancos-masculinos-cisgêneros-heterossexuais - são descritos como indivíduos dissidentes (Colling, 2016). ou “desalinhados”1010 Dissidência: quando entendida como caminho único para se percorrer a vida, a cisheteronormatividade deve ser considerada como um regime autoritário/totalitário. Assim, aqueles que não estão “alinhados” ou não se encontram dentro dos padrões de “normalidade” - corpos não brancos-masculinos-cisgêneros-heterossexuais - são descritos como indivíduos dissidentes (Colling, 2016). ou “não conformes”1010 Dissidência: quando entendida como caminho único para se percorrer a vida, a cisheteronormatividade deve ser considerada como um regime autoritário/totalitário. Assim, aqueles que não estão “alinhados” ou não se encontram dentro dos padrões de “normalidade” - corpos não brancos-masculinos-cisgêneros-heterossexuais - são descritos como indivíduos dissidentes (Colling, 2016). - em prol de “maiorias silenciadas”. De acordo com os autores, essa nova perspectiva tensiona a contradição entre a questionável limitação numérica com o necessário empoderamento1111 Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização da política (Kleba; Wendausen, 2009). de reivindicações no espectro das instituições políticas, vista a “minorização” não estar atrelada ao seu quantitativo, mas ao qualitativo do biopoder1212 Biopoder assume duas formas: “uma anátomo-política do corpo e uma biopolítica da população. A primeira refere-se aos dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante o controle do tempo e do espaço, no interior de instituições, como a escola, o hospital, a fábrica e a prisão. Por sua vez, a biopolítica da população volta-se à regulação das massas, utilizando-se de saberes e práticas que permitam gerir taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias, aumento da longevidade” (Furtado; Camilo, 2016, p. 34). de suas existências em cenário social (Almeida et al., 2022; Rosa, 2020; Sodré, 2005; Louro, 2001).

Inferência que se coaduna com o percurso de vida da população LGBTQIA+, já que suas condições de sexo1313 “Sexo biológico: classificado de acordo com a anatomia, os cromossomos e os hormônios” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). (endossexo1414 “Endossexo é um termo mais recente utilizado pelos movimentos sociais para pessoas cujas características corporais (cromossomos, gônadas e genitália) se enquadram nas convenções de sexo ‘masculino’ ou ‘feminino’” (Ciasca et al., 2021, p. 13). e intersexo1515 “Intersexo é um termo usado para uma variedade de condições em que uma pessoa nasce como uma anatomia sexual e/ou reprodutiva que não se enquadra nas definições típicas e binárias de sexo masculino ou feminino” (Ciasca et al., 2021, p. 13).), de gênero1616 “Gênero: estrutura social e construção histórica do que é ser homem/masculino ou mulher/feminino nas diferentes épocas e sociedades” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). (cisgênero1717 “Cisgênero (cis): pessoa que se identifica com o gênero designado ao nascimento” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). e transgênero1818 “Transgênero (trans): pessoa que não se identifica com o gênero designado ao nascimento. É um termo guarda-chuva que engloba várias identidades: homens e mulheres transexuais, pessoas não binárias, travestis e outras” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII).) e de sexualidade1919 Sexualidade/“Orientação afetivo-sexual: refere-se à atração/desejo (ou não) física, afetiva/romântica ou emocional por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). (heterossexual,2020 “Heterossexual é uma pessoa que sente atração por um gênero “diferente” do seu (não se deve utilizar gênero ou sexo ‘oposto’, porque gêneros não são necessariamente binários)” (Ciasca et al., 2021, p. 15). homossexual,2121 “Homossexuais sentem atração por pessoas do mesmo gênero” (Ciasca et al., 2021, p. 15). bissexual,2222 “Bissexuais são pessoas que sentem atração por mais de um gênero” (Ciasca et al., 2021, p. 15). assexuado2323 “Assexuais são pessoas que estão em um espectro de sentirem pouca ou nenhuma atração/desejo sexual por pessoas, apesar de poderem ter resposta a estímulos sexuais. A concepção da atração sexual como capacidade tem sido criticada, pois pessoas assexuais poderiam ser consideradas pessoas com deficiência, pois não teriam atração/capacidade por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021, p. 15). e outras2424 Outras/mais/+: “São pessoas que sentem atração por pessoas independentemente do gênero” (Ciasca et al., 2021, p. 15).) materializam (“expressão de gênero”2525 “Expressão de gênero: forma como a pessoa deseja se expressar, em um determinado momento e contexto, em relação aos padrões sociais de gênero. Abrange imagem corporal, roupas, adornos e gestos. Não necessariamente está de acordo com os padrões de gênero e pode ser fluida” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII).) o expoente máximo das lutas pela conquista da cidadania plena destes indivíduos, que trazem a proeza, até mesmo a metamorfose, de romperem com o limitado e imposto determinismo biológico da relação entre o “ser homem” e o “ser mulher” (Figura 1) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b).

Todavia, contar com a mudança espontânea da comunidade e/ou do Estado na forma de se apreciar esses indivíduos seria uma parva expectativa (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Rosa, 2020ROSA, E. B. P. R. Cisheteronormatividade como instituição total. PETFILO - UFPR, v. 18, n. 3, p. 59-103, 2020. doi: 10.5380/petfilo.v18i2.68171.
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).

O Brasil exemplifica muito bem esse cenário, visto ser infelizmente reportado, mesmo sem a devida precisão de dados oficiais, como a nação mais “LGBTQIA+fóbica”2626 “LGBTQIA+fobia: medo, preconceito, discriminação, pensamentos negativos, violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+” (Ciasca et al., 2021, p. XXXV). do mundo, onde se estima que um LGBTQIA+ é agredido e morto, nessa ordem, a cada uma e 27 horas (Mendes; Silva, 2020MENDES, W. G.; SILVA, C. M. F. P. da. Homicide of Lesbians, Gays, Bisexuals, Travestis, Transexuals, and Transgender people (LGBT) in Brazil: a Spatial Analysis. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, n. 5, p. 1709-1722, 2020. doi: 10.1590/1413-81232020255.33672019.
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; Pinto ., 2020PINTO, I. V.; ANDRADE, S. S. de A.; RODRIGUES, L. L.; SANTOS, M. A. S.; MARINHO, M. M. A.; BENÍCIO, L. A.; CORREIA, R. S. de B.; POLIDORO, M.; CANAVESE, D. Profile of notification of violence against Lesbian, Gay, Bisexual, Transvestite and Transsexual people recorded in the National Information System on Notifiable Diseases, Brazil, 2015-2017. Rev. Bras. Epidemiol., v. 23, supl. 1, p. e200006, 2020. doi: 10.1590/1980-549720200006.supl.1.
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). Uma violência que, fortalecida com a interseccionalidade de outros fatores (cor da pele, transgeneridade e/ou questões socioeconômicas e demográficas) - afinal, ninguém é só LGBTQIA+ - coloca esse grupo populacional brasileiro em condição e/ou estado de vulnerabilidade2727 A vulnerabilidade da população LGBTQIA+ deve ser compreendida como uma condição socialmente criada e/ou imposta (Almeida et al., 2022). Ademais, “uma das características constitutivas do quadro conceitual da vulnerabilidade é justamente ser dinâmico, não ser uma estrutura conceitual que cristaliza a realidade, mas basear-se no pressuposto de que a ciência e a técnica só podem ser entendidas como parte de processos de trabalho” ou seja, “parte do movimento social e político, com todas as suas forças atuando, inclusive, muitas vezes, [de formas] contraditórias” (Ayres; Castellanos; Baptista, 2018). (Figura 1) (Mendes; Silva, 2020; Pinto et al., 2020).

E é neste contexto das “dispensáveis” e muitas vezes “matáveis” vidas LGBTQIA+ que diversos estudos vêm despertando sobre a importância de políticas públicas (sejam elas de educação, de saúde, de segurança, de direitos, em suma de cuidado) dialogarem sobre a compreensão e a inserção e/ou pertencimento social (“passabilidade”2828 “Passabilidade: é a possibilidade de uma pessoa ser socialmente reconhecida como membro de um grupo ou categoria identitária diferente da sua” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV).) das corporeidades desta população - um movimento dialógico que se faz ativo e crucial na luta contra a “LGBTQIA+fobia”,2626 “LGBTQIA+fobia: medo, preconceito, discriminação, pensamentos negativos, violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+” (Ciasca et al., 2021, p. XXXV). uma vez que o conhecimento é passo fundamental para se combater o preconceito, pois de um lado constrói na vítima os potentes sentimentos de positividade (empoderamento1111 Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização da política (Kleba; Wendausen, 2009).), do outro descontrói os frágeis argumentos negativos dos agressores (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Santos ., 2021SANTOS, A. M. dos; CARMO, E. M.; MAGNO, L.; PRADO, N. M. de B. L. População LGBT+: demandas e necessidades para a produção do cuidado. Salvador: EDUFBA, 2021.; Rosa, 2020ROSA, E. B. P. R. Cisheteronormatividade como instituição total. PETFILO - UFPR, v. 18, n. 3, p. 59-103, 2020. doi: 10.5380/petfilo.v18i2.68171.
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; Bezerra ., 2019BEZERRA, M. V. da R.; MORENO, C. A.; PRADO, N. M. de B. L.; SANTOS, A. M. dos. Política de saúde LGBT e sua invisibilidade nas publicações em saúde coletiva. Saúde debate, v. 43, n. 7, p. 305-323, 2019. doi: 10.1590/0103-11042019S822.
https://doi.org/10.1590/0103-11042019S82...
; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler 2019b; Caravaca-Morera; Padilha, 2018; Caravaca-Morera; Padilha, 2017; Bento, 2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017.; Costa; Nardi, 2015COSTA, A. B.; NARDI, H. C. Homofobia e preconceito contra diversidade sexual: debate conceitual. Temas psicol., v. 23, n. 3, p. 715-726, 2015. doi: 10.9788/TP2015.3-15.
https://doi.org/10.9788/TP2015.3-15....
; Vianna, 2015VIANNA, C. P. O movimento LGBT e as políticas de educação de gênero e diversidade sexual: perdas, ganhos e desafios. Educ. Pesqui., v. 41, n. 3, p. 791-806, 2015. doi: 10.1590/s1517-97022015031914.
https://doi.org/10.1590/s1517-9702201503...
; Ferreira; Aguinsky, 2013FERREIRA, G. G.; AUINSKY, B. G. Movimentos sociais de sexualidade e gênero: análise do acesso às políticas públicas. Rev. Katálysis, v. 16, n. 2, p. 223-232, 2013. doi: 10.1590/S1414-49802013000200008.
https://doi.org/10.1590/S1414-4980201300...
; Gomes ., 2013GOMES, A. M.; REIS, A. F.; KURASHIGE, K. D. A violência e o preconceito: as formas da agressão contra a população LGBT em Mato Grosso do Sul. Cad Espaço Fem, v. 26, n. 2, p. 30-43, 2013.; Butler, 2002).

Por fim, justificado pela importante necessidade de se ofertar novas possibilidades para se adensar sobre o entendimento, a valorização e o pertencimento coletivo do ser pessoa LGBTQIA+, o presente trabalho estruturou o seu objetivo, o de analisar, por meio de um ensaio teórico pautado na perspectiva do materialismo histórico-dialético2929 “O materialismo histórico-dialético investiga como transcorre o desenvolvimento da sociedade e do processo histórico através do regime social. Nesse sentido, o materialismo histórico necessariamente entrelaça-se com as questões específicas, fornecendo elementos (indicadores) científicos para seu estudo e investigação” (Pacheco; Dias, 2023, p. 267)., o papel e o potencial da boca (cavidade bucal) junto à corporeidade3030 “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019, p. 1). das pluralidades performáticas3131 Quando uma identidade corpórea conquista a compreensão da linguagem, que funciona como uma ação social voltada para a percepção de outras formas de se experienciar a vida que não a cisheteronorma (Butler, 2019a; Butler, 2019b; Borba, 2014). (“expressão de gênero”2525 “Expressão de gênero: forma como a pessoa deseja se expressar, em um determinado momento e contexto, em relação aos padrões sociais de gênero. Abrange imagem corporal, roupas, adornos e gestos. Não necessariamente está de acordo com os padrões de gênero e pode ser fluida” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII).) deste grupo populacional.

Figura 1
Sexo, gênero, sexualidade, expressão de gênero e interseccionalidades

Corporeidades3030 “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019, p. 1). LGBTQIA+: para além da cisheteronormatividade33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020).

O feminismo, aqui compreendido como um paradigma44 Paradigma: “Um paradigma concebe um padrão a ser seguido no campo social ou científico; assim, em uma mesma comunidade científica, os paradigmas expressam as crenças, os valores e as técnicas partilhadas por seus membros e são influenciados por fatores culturais, políticos, econômicos e sociais. De uma forma mais genérica, o termo paradigma é usado como referência à forma como percebemos e atuamos no mundo” (Barbosa et al., 2015, p. 342). de superação ao machismo,11 Machismo: comportamento que rejeita a igualdade de condições sociais e direitos entre homens e mulheres. Enaltecimento do sexo masculino em detrimento da desqualificação do sexo feminino. Assim, a pessoa machista é aquela que acredita na inferioridade física, cultural e intelectual das mulheres (Ciasca et al., 2021). ao (cis)sexismo,2,3232 “[...] normas sociais que estabelecem diferenças de valoração e expectativas entre os gêneros. Normalmente se vinculam à perspectiva binária cisgênero (cissexismo) e desvalorizam aqueles atributos considerados femininos (sexismo)” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV). à misoginia3333 Sentimento de repulsa, aversão e ódio contra um indivíduo por ser mulher (Ciasca et al., 2021). e ao racismo,3434 Preconceito, discriminação ou antagonismo por parte de um indivíduo, comunidade ou instituição contra uma pessoa ou pessoas pardas e pretas (Audebert et al., 2022). conforme Pacheco e Dias (2023PACHECO, E. M.; DIAS, M. T. G. A luta das mulheres por políticas sociais: avanços e retrocessos. Serv. Soc. Soc., v. 146, n. 1, p. 263-283, 2023. doi: 10.1590/0101-6628.313.
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, p. 268):

[...] é um movimento político que busca subverter as relações desiguais de poder historicamente nela constituídas. A luta feminista representa uma contestação ao sistema capitalista brasileiro e ao patriarcado3535 Sistema social em que homens mantêm o poder primário e predominam em funções de liderança política, autoridade moral, privilégio social e controle das propriedades. No domínio da família, o pai mantém a autoridade sobre as mulheres e as crianças (Marinho, 2018). e ao racismo estrutural que nele se reproduzem. A discussão de políticas sociais para as mulheres requer considerar a sociedade capitalista e a disputa de projetos societários no Estado.

Assim, o feminismo, inclusive em cenário brasileiro, traz em seu bojo existencial - filosófico, social e político - seu papel como agente questionador e, principalmente, o de rompimento com a hegemonia do biopoder1212 Biopoder assume duas formas: “uma anátomo-política do corpo e uma biopolítica da população. A primeira refere-se aos dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante o controle do tempo e do espaço, no interior de instituições, como a escola, o hospital, a fábrica e a prisão. Por sua vez, a biopolítica da população volta-se à regulação das massas, utilizando-se de saberes e práticas que permitam gerir taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias, aumento da longevidade” (Furtado; Camilo, 2016, p. 34). atrelada a corpos masculinos e brancos (Figura 2) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Pacheco; Dias, 2023PACHECO, E. M.; DIAS, M. T. G. A luta das mulheres por políticas sociais: avanços e retrocessos. Serv. Soc. Soc., v. 146, n. 1, p. 263-283, 2023. doi: 10.1590/0101-6628.313.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Rosa, 2020ROSA, E. B. P. R. Cisheteronormatividade como instituição total. PETFILO - UFPR, v. 18, n. 3, p. 59-103, 2020. doi: 10.5380/petfilo.v18i2.68171.
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; Fraccaro, 2018FRACCARO, G. C. C. Uma história social do feminismo: diálogos de um campo político brasileiro (1917-1937). Estudos Históricos, v. 31, n. 63, p. 7-26, 2018. doi: 10.1590/S2178-14942018000100002.
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; Mbembe, 2018MBEMBE, A. Necropolítica: biopoder, soberania, estado de exceção, política da morte. São Paulo: n-1 Edição, 2018.; Pinto, 2010PINTO, C. R. J. Feminismo, História e Poder. Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 18, n. 36, p. 15-23, 2010. doi: 10.1590/S0104-44782010000200003.
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).

Ademais, alinhado às reflexões de Facchini . (2020FACCHINI, R.; CARMO, I. N. do; LIMA, S. P. Movimentos feminista, negro e LGBTI no Brasil: sujeitos, teias e enquadramentos. Educ. Soc., v. 41, p. e230408, 2020. doi: 10.1590/ES.230408.
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), com o passar do tempo houve “descentramento” do feminismo, que passou a abarcar outras questões, dentre elas o aumento e a ampliação da potencialidade do movimento LGBTQIA+ (Figura 2).

Figura 2
Feminismo, Movimento LGBTQIA+ e Boca (território bucal)

Entretanto, em um contexto hegemonicamente cisheteronormativo, a subjetivação e as interseccionalidades em torno das corporeidades3030 “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019, p. 1). LGBTQIA+ vão de encontro à imposição das identidades fixas - biopsicossocioculturalmente3636 Perceber o ser humano, em sua complexidade (vida, linguagem, sociedade e aspectos culturais) e sua interligação com o mundo (Oliva; Fonseca, 2023; Almeida et al., 2022; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Morin, 2000). legitimadas pelo estabelecimento de fronteiras entre a heterossexualidade legítima (exclusiva de corpos cisgêneros: “nós, a maioria, os normais”) e as sexualidades consideradas outras (práticas não heterossexuais: “os outros, a minoria, os não-normais”) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Facchini ., 2020FACCHINI, R.; CARMO, I. N. do; LIMA, S. P. Movimentos feminista, negro e LGBTI no Brasil: sujeitos, teias e enquadramentos. Educ. Soc., v. 41, p. e230408, 2020. doi: 10.1590/ES.230408.
https://doi.org/10.1590/ES.230408....
; Borba, 2014BORBA, R. A linguagem importa? Sobre performance, performatividade e peregrinações conceituais. Cadernos pagu, n. 43, p. 441-474, 2014. doi: 10.1590/0104-8333201400430441.
https://doi.org/10.1590/0104-83332014004...
; Machado, 2014MACHADO, L. Z. Interfaces e deslocamentos: feminismos, direitos, sexualidades e antropologia. Cadernos pagu, n. 42, p. 13-46, 2014. doi: 10.1590/0104-8333201400420013.
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).

E perpassando esse contexto, no âmbito das ciências sociais emergiu a Teoria Queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). (“Queer Theory”), trazendo em seu constructo a compreensão e o pertencimento de outras práticas performáticasXXXI que confrontam ou pelo menos questionam o caráter uníssono da cisheteronormatividade33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). (Figura 2) (Almeida ., 2022ALMEIDA, L. E. de; OLIVEIRA, J. M. de; OLIVEIRA, V. de; MIALHE, F. L. Scientific production on LGBTQIA+ health: a critical analysis of the Literature. Saúde Soc., v. 31, n. 4, p. e210836en, 2022. doi: 10.1590/S0104-12902022210836en.
https://doi.org/10.1590/S0104-1290202221...
; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Louro, 2020LOURO, G. L. Um corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Bento, 2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017.; Louro et al., 2019; Butler, 2002; Louro, 2001).

Aprofundando, “Queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). pode ser traduzido por estranho, talvez ridículo, excêntrico, raro, extraordinário” (Louro, 2020LOURO, G. L. Um corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020., p. 38). Partindo dessa prática linguística paradoxal, que essencialmente degrada os sujeitos aos quais ela se refere, Butler (2002BUTLER, J. Críticamente subversiva. In: JIMÉNEZ, R. M. M. Sexualidades transgresoras. Una antología de estudios queer. Barcelona: Icária Editorial, 2002, p. 55-81., p. 58) afirma que “queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). adquire todo seu poder precisamente através da invocação reiterada que o relaciona com acusações, patologias e insultos” - afinal, não se nega e/ou se repudia o que não existe.

Nessa lógica, o pensamento queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). potencializa o rompimento da diminuta certeza do ser (corpos puramente biológicos) em detrimento da plasticidade e/ou historicidade do estar (corpos socialmente generificados), achincalhando, portanto, com os estáticos e já referidos apontamentos de normalidade, de naturalidade, de pecado e de patologização (Louro, 2020LOURO, G. L. Um corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Louro et al., 2019; Bento, 2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017.; Butler, 2002; Louro, 2001). Tal reflexão vai ao encontro da lendária frase de Simone de Beauvoir (2019BEAUVOIR, S. de. O segundo sexo, v. 2: A experiência vivida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2019., p.11): “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”.

E foi alinhada aos preceitos queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). que Bento (2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017., p. 7) evidenciou o importante papel de corpos transgressores e rompedores com a dicotomia masculino-feminino, uma vez que

[...] O corpo-sexuado (o corpo-homem e o corpo-mulher) que dá inteligibilidade aos gêneros, encontra na experiência transexual os seus próprios limites discursivos, uma vez que aqui o gênero significará o próprio corpo, revertendo assim um dos pilares de sustentação das normas de gênero. Ao realizar tal inversão, depara-se com uma outra “revelação”: a de que o corpo tem sido desde sempre gênero e que, portanto, não existe uma essência interior e anterior aos gêneros. Quando se problematiza a relação dicotômica e determinista entre corpo e gênero, outros níveis construtivos da identidade também se liberam para comporem arranjos múltiplos fora do referente binário dos corpos.

Contudo, Lanz (2014LANZ, L. O corpo da roupa: a pessoa transgênera entre a transgressão e a conformidade com as normas de gênero. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Setor de Ciências Humanas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014. Disponível em: < https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/36800/R%20-%20D%20-%20LETICIA%20LANZ.pdf>.
https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/...
, p. 14) ressaltou que

Mesmo hoje em dia, com tantas expedições já realizadas a esse vasto território, o que se sabe e o que se diz sobre ele ainda é objeto de muita lenda e grandes controvérsias. A transgeneridade, enquanto fenômeno sociológico, continua dominada por imensos ‘vazios conceituais’, sem contar que muito do que se diz está fortemente impregnado das marcas da perversão, do estigma, do cissexismo22 Cissexismo ou cisnormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que desconsidera na sociedade a existência de pessoas que transitam ou rompem com o binarismo do sexo masculino ou feminino (Ciasca et al., 2021).,3232 “[...] normas sociais que estabelecem diferenças de valoração e expectativas entre os gêneros. Normalmente se vinculam à perspectiva binária cisgênero (cissexismo) e desvalorizam aqueles atributos considerados femininos (sexismo)” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV). e da doença mental.

Complementando, e partindo deste processo de generificação dos corpos, Preciado (2017PRECIADO, P. B. Manifesto contrassexual - Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: n-1 Edições, 2017., p. 29) afirmou que “gênero é, antes de tudo, prostético,3838 Faz alusão ao gênero e à sexualidade serem tecnologias sociopolíticas utilizadas para se construírem organicamente corpos sexuais (Augusto; Neira, 2021; Preciado, 2017). ou seja, não se dá senão na materialidade dos corpos. É puramente construído e ao mesmo tempo inteiramente orgânico”. O autor ainda complementa que não apenas os gêneros, e também as sexualidades são prostéticas,3838 Faz alusão ao gênero e à sexualidade serem tecnologias sociopolíticas utilizadas para se construírem organicamente corpos sexuais (Augusto; Neira, 2021; Preciado, 2017). afinal, segundo ele (p. 26):

A (hetero)sexualidade, longe de surgir espontaneamente de cada corpo recém-nascido, deve se reinscrever ou se reinstruir através de operações constantes de repetição e de recitação dos códigos (masculino e feminino) socialmente investidos como naturais.

Imbricado a essas reflexões que Preciado concebeu, através do queer,3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). a contrassexualidade, um movimento que reporta, em linhas gerais, a importância de se discutir sobre o poder dos desejos de outras tecnologias de gênero e sexuais, frequente e erroneamente descritas como desvios1010 Dissidência: quando entendida como caminho único para se percorrer a vida, a cisheteronormatividade deve ser considerada como um regime autoritário/totalitário. Assim, aqueles que não estão “alinhados” ou não se encontram dentro dos padrões de “normalidade” - corpos não brancos-masculinos-cisgêneros-heterossexuais - são descritos como indivíduos dissidentes (Colling, 2016). pelo sistema heterocentrado (Figura 2) (Augusto, Neira, 2021AUGUSTO, C. N.; NEIRA, M. G. (Um) Currículo cultural contrassexual? Movimentos que possibilitam corpos em trânsito. Rev Bras Ciênc Esporte, v. 43, p. e002221, 2021. doi: 10.1590/rbce.43.e002221.
https://doi.org/10.1590/rbce.43.e002221....
; Preciado, 2017).

E, de acordo com Preciado (2017PRECIADO, P. B. Manifesto contrassexual - Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: n-1 Edições, 2017., p. 27), para colocar isso em prática, ou seja, validar, reconhecer e, principalmente, respeitar todas as performatividades3131 Quando uma identidade corpórea conquista a compreensão da linguagem, que funciona como uma ação social voltada para a percepção de outras formas de se experienciar a vida que não a cisheteronorma (Butler, 2019a; Butler, 2019b; Borba, 2014). corpóreas LGBTQIA+, demanda-se

[...] sacudir as tecnologias da escritura do sexo e do gênero, assim como suas instituições. Não se trata de substituir certos termos por outro. Não se trata nem mesmo de se desfazer das marcas de gênero ou das referências à heterossexualidade, mas sim de modificar as posições de enunciação. [...] Dessa maneira, por exemplo, sapatona passa de um insulto pronunciado pelos sujeitos heterossexuais para marcar as lésbicas como “abjetas”,3939 “A abjeção (do latim, ab-jectio) significa jogar fora, excluir. A noção de abjeção, ao contrário, designa uma condição degradada ou excluída dentro dos termos da sociabilidade. Em realidade, o foracluído (ou repudiado, dentro dos termos psicanalíticos) é precisamente o que não pode voltar a entrar no campo do social sem provocar a ameaça de psicose, quer dizer, de dissolução do sujeito mesmo. A sentença ‘prefiro morrer a fazer tal coisa’ seria o fantasma dessa dissolução atuando no sujeito” (Bento, 2021, p. 166). para se transformar, posteriormente, em uma autodenominação contestadora e produtiva de um grupo de “corpos abjetos”3939 “A abjeção (do latim, ab-jectio) significa jogar fora, excluir. A noção de abjeção, ao contrário, designa uma condição degradada ou excluída dentro dos termos da sociabilidade. Em realidade, o foracluído (ou repudiado, dentro dos termos psicanalíticos) é precisamente o que não pode voltar a entrar no campo do social sem provocar a ameaça de psicose, quer dizer, de dissolução do sujeito mesmo. A sentença ‘prefiro morrer a fazer tal coisa’ seria o fantasma dessa dissolução atuando no sujeito” (Bento, 2021, p. 166). que, pela primeira vez, tomam a palavra e reclamam sua própria identidade.

De tudo, é fundamental dizer que o queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550). e o contrassexual (prostético3838 Faz alusão ao gênero e à sexualidade serem tecnologias sociopolíticas utilizadas para se construírem organicamente corpos sexuais (Augusto; Neira, 2021; Preciado, 2017).) não negam ou antagonizam a cisheteronormatividade;33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). pelo contrário, a complementam por meio do reconhecimento das múltiplas corporeidades LGBTQIA+, consecutivamente, demonstrando as incontáveis possibilidades no como se experienciar a vida (Figura 2) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Louro, 2020LOURO, G. L. Um corpo estranho. Ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Louro et al., 2019; Bento, 2017BENTO, B. A reinvenção do corpo - sexualidade e gênero na experiência transexual. Salvador: Editora Devires, 2017.; Butler, 2002; Louro, 2001).

Bucalizando4040 Compreender a partir da boca, que sob a perspectiva da “bucalidade” (arcabouço teórico que traz em seu escopo o entendimento da boca como corpo) deixa de ser apenas um espaço dentarizado e ganha concepção de um território corpóreo biopsicossociocultural35 onde são bucalmente consubstanciadas todas ações e atividades da vida humana - em síntese: tornar, mesmo para aqueles que não têm nada a ver, um assunto mais palatável, ou seja, bucalmente acessível à compreensão (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo 2000; Kovaleski et al., 2006). a corporeidade3030 “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019, p. 1).: contextualização das bocas-genital-generificadas4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021).

Em conformidade com Botazzo (2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 7), idealizador da “bucalidade”4040 Compreender a partir da boca, que sob a perspectiva da “bucalidade” (arcabouço teórico que traz em seu escopo o entendimento da boca como corpo) deixa de ser apenas um espaço dentarizado e ganha concepção de um território corpóreo biopsicossociocultural35 onde são bucalmente consubstanciadas todas ações e atividades da vida humana - em síntese: tornar, mesmo para aqueles que não têm nada a ver, um assunto mais palatável, ou seja, bucalmente acessível à compreensão (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo 2000; Kovaleski et al., 2006). (“uma teoria social da saúde, construída no campo da Saúde Coletiva, que encontra seu foco nas relações sociais e nos conflitos a elas articulado”; “expressão dos trabalhos sociais que a boca humana realiza”), boca é corpo (Botazzo, 2013a; 2013b; 2006; 2000).

E essa corporeidade bucal dá-se pela intensa carga relacional que circunscreve e configura este espaço, uma vez que, segundo Botazzo (2013bBOTAZZO, C. Bucalidade. Pro-odonto prevenção, v. 6, n. 4, p. 9-55, 2013b., p. 9),

Entre todos os órgãos e regiões do corpo humano, a boca é seguramente o mais distinguido, o que mais realiza atividades sociais ou por meio do qual um sem-número de atividades ou ações sociais é realizado. Além disso, a boca humana possui um papel ímpar na formação do psiquismo (ou da subjetividade), bem como da identidade do indivíduo, e é parte relevante das estruturas corpóreas ligadas ao desejo.

Contudo, Kovaleski . (2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 99) evidenciam que

A compreensão dessa “boca social” tem muito a ser desenvolvida. A visão naturalizada do homem, que vários ramos da ciência reproduzem - entre eles a odontologia -, empobrece a compreensão de inúmeros eventos cotidianos e aparentemente simples, mas carentes de uma leitura articulada com teorias sociais.

E foi imerso a compreender os papéis sociais da boca que Botazzo (2013aBOTAZZO, C. Diálogos sobre a boca. São Paulo: Hucitec Editora, 2013a., p. 290) descreveu suas inúmeras dimensões funcionais e simbólicas, sendo elas

[...] a um só tempo, produtos sociais e, por isso, dotados de historicidade, quer dizer, a boca humana é socialmente produzida e seus produtos - manducação4242 “[...] manducar, isto é, apreender, triturar, insalivar e deglutir, é consumo do mundo, a ação que põe em relação às estruturas visíveis localizadas na parte superior do aparelho digestório com as vísceras não-visíveis localizadas mais abaixo, e tudo isto garante a sobrevivência do homem naquilo que ele tem de natureza, a preservação ou reposição dos elementos que constituem sua unidade corpórea. [...] É, pois, como cultura, que a satisfação e o gozo bucais esbarram na razão e no desejo: frequentemente comemos o que não devemos ou o que certa racionalidade recomenda, ou mais ou menos ou, ainda, não do modo como devíamos, de sorte que tudo isto resulta atravessado pelo psiquismo o que põe o sujeito em conflito consigo e com os outros. [...] Por isso, sem que haja dispositivos reguladores, a manducação pode tornar-se deletéria para o próprio homem” (Botazzo, 2006, p. 13-14)., erótica4343 “[...] na relação amorosa produzimos atos bucais sexuais, a retomada da função genital primordial, o consumo e o deleite com o corpo do outro (agora consentido), e resulta igualmente outra vez o conflito entre razão e emoção (porque não raro esta boca fará o que não devia ou não do modo recomendado etc.)” (Botazzo, 2006, p. 13-14). e linguagem4444 “Produzimos palavras e as consumimos; somos obrigados a pensar naquilo que falamos, e não raro dizemos o que não queríamos dizer; também a palavra exagerada ou equivocada pode revelar-se deletéria” (Botazzo, 2006, p. 13-14). - são igualmente produtos sociais. Por isso, se pode dizer que a boca não é órgão, mas território, e assim o suporte mais evidente de todo o corpo do homem na realização da sua vida.

Em suma, imbricado pelo referencial teórico explorado, a cavidade bucal deixa de ser um espaço puramente dentarizado e torna-se um território corpóreo continuadamente construído e socialmente influenciado (Figura 2) (Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo, 2000).

E é justamente atravessado por esta corporeidade bucal - carregando na boca todas as objetividades e, principalmente, as subjetividades atreladas ao percurso da vida - que se salienta o papel dos trabalhos bucais (manducação,4242 “[...] manducar, isto é, apreender, triturar, insalivar e deglutir, é consumo do mundo, a ação que põe em relação às estruturas visíveis localizadas na parte superior do aparelho digestório com as vísceras não-visíveis localizadas mais abaixo, e tudo isto garante a sobrevivência do homem naquilo que ele tem de natureza, a preservação ou reposição dos elementos que constituem sua unidade corpórea. [...] É, pois, como cultura, que a satisfação e o gozo bucais esbarram na razão e no desejo: frequentemente comemos o que não devemos ou o que certa racionalidade recomenda, ou mais ou menos ou, ainda, não do modo como devíamos, de sorte que tudo isto resulta atravessado pelo psiquismo o que põe o sujeito em conflito consigo e com os outros. [...] Por isso, sem que haja dispositivos reguladores, a manducação pode tornar-se deletéria para o próprio homem” (Botazzo, 2006, p. 13-14). erótica4343 “[...] na relação amorosa produzimos atos bucais sexuais, a retomada da função genital primordial, o consumo e o deleite com o corpo do outro (agora consentido), e resulta igualmente outra vez o conflito entre razão e emoção (porque não raro esta boca fará o que não devia ou não do modo recomendado etc.)” (Botazzo, 2006, p. 13-14). e linguagem4444 “Produzimos palavras e as consumimos; somos obrigados a pensar naquilo que falamos, e não raro dizemos o que não queríamos dizer; também a palavra exagerada ou equivocada pode revelar-se deletéria” (Botazzo, 2006, p. 13-14).) na concepção de produtos afetivo-amorosos, que consubstanciam neste óstio seu papel genital (“agente a ser penetrado e/ou de penetração”), que na práxis dinamiza-se de forma indissociável junto às expressões de gênero2525 “Expressão de gênero: forma como a pessoa deseja se expressar, em um determinado momento e contexto, em relação aos padrões sociais de gênero. Abrange imagem corporal, roupas, adornos e gestos. Não necessariamente está de acordo com os padrões de gênero e pode ser fluida” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). dos corpos que a carregam (Figura 2) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021).

Sim, a cavidade bucal é mucosa, portanto, um aparato “genital-generificado” 4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). sensorialmente prevalente nas práticas sexuais (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021). A boca se abre molhada (saliva é lubrificante) e, dotada de diferentes texturas e com sua língua inquieta, desliza-se no corpo do outro, celebrando genitalmente (sexo bucal) outros encontros: boca-peito (para além do “Mammalia”), boca-boca (múltiplas facetas dos beijos frequentemente acompanhados por um vocabulário obsceno, ou melhor, “palavrões contextualizados”), boca-pele (singelos beijos nas bochechas, respeitosos beijos na testa ou nas mãos, até atrevidos beijos e/ou mordiscadas que percorre toda a pele, arrepiando-a), boca-genitálias (pênis/felação; vagina/“cunnilingus”) e boca-ânus (“beijos gregos/anilungus”) - caminhos esses que ampliam e provam que o território bucal apresenta diversas atividades e funções inerentes ao prazer de se experenciar a vida (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021).

Contudo, encerrando-se esta seção, mesmo diante de toda sua potência pulsátil e sensorial, e competente lugar para sentir e experimentar o mundo e o outro, será também a boca disciplinarizada55 Disciplinarizador: “processo de disciplinarização dos corpos para uma adequação ao capitalismo” (Kovaleski et al., 2006, p. 97). pela hegemonia dos interesses sociopolítico-econômicos (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Kovaleski ., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
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; Botazzo, 2000).

Isto significa pensar que todos os trabalhos bucais, principalmente os afetivo-amorosos (“boca-genital-generificada”4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021).), não são funções meramente fisiológicas, mas constituem práticas que ao longo da vida virão a ser objeto de regulação (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Kovaleski ., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
; Botazzo, 2000).

Tal reflexão se alinha ao firmado por Botazzo (2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 217) - “boca é corpo e é, como estrutura viva, dotada de capacidade nomativa” -, ou seja, sujeita aos interesses de uma sociedade capitalista alicerçada por uma hegemonia cisheteronormativa.

Bocas-genital-generificadas4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). e as corporeidades3030 “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019, p. 1). LGBTQIA+: da disciplinarização55 Disciplinarizador: “processo de disciplinarização dos corpos para uma adequação ao capitalismo” (Kovaleski et al., 2006, p. 97). cisheteronormativa33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). à emancipação das “prostéticas bocas-queer”4545 Alicerçado pelas concepções do queer36 (Teoria Queer, Butler) e do prostético37 (Contrassexual, Preciado), as “prostéticas bocas-queer” referendam o potencial dos trabalhos bucais (manducação41, erótica42 e linguagem43) para além da cisheteronormatividade. A partir de então, a boca tem papel sine qua non nas inúmeras performances30 corpóreas29 LGBTQIA+ (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021).

Ao nascimento, a boca humana é puro instinto: suga, baba, balbucia, sorri e se lambuza; e tão logo consiga, passará ela por um complexo processo de disciplinarização,55 Disciplinarizador: “processo de disciplinarização dos corpos para uma adequação ao capitalismo” (Kovaleski et al., 2006, p. 97). tendo seus atos e sentimentos ininterruptamente guiados pelos mesmos discursos que conferem regulação e normalização aos sujeitos (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Kovaleski ., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
; Botazzo, 2000). Assim, pode-se afirmar que a cisheteronormatividade33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). atinge as corporeidades que se perfazem na cavidade bucal (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Kovaleski et al., 2006; Botazzo, 2000).

Afinal, em visão mais ampla, o consubstanciamento onto (origem)4646 Ontogênese/ontogenia: processo evolutivo acerca das alterações biológicas sofridas pelo indivíduo, desde o nascimento, até seu desenvolvimento final (Almeida 2023; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2000). e filogenético (evolução)4747 Filogenético/filogenésico/filogênico: refere-se à filogenia, à história da evolução das espécies, nomeadamente à história genealógica de uma espécie, destacando suas relações de ancestrais e descendentes (Almeida, 2023; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2000). das relações patriarcais3535 Sistema social em que homens mantêm o poder primário e predominam em funções de liderança política, autoridade moral, privilégio social e controle das propriedades. No domínio da família, o pai mantém a autoridade sobre as mulheres e as crianças (Marinho, 2018). de gênero no território bucal já se perfazem no amparo e no cuidado dos bebês, que já nos seios de suas mães não apenas vão experenciar, através da boca, o alimento, como também a percepção do mundo e a de si mesmos e, tão logo, tendo seus corpos disciplinarizados pelos ditames da cisheteronorma33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). poderão explicitar corpórea e bucalmente a falocracia,4848 Ideologia cuja base se sustenta na premissa básica de que o poder político/econômico, em diversos âmbitos, deva ser exercido somente por homens biológicos - corpos com pênis (Almeida, 2023; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2000). o androcentrismo4949 O masculino como sendo o único paradigma de representação coletiva, estando o pensamento masculino acima de todos os outros (Almeida 2023; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2000). e a primazia do masculino (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo, 2000).

Nesse ensejo, de acordo com Elias (1994ELIAS, N. O processo civilizador, v. 1: Uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 1994.), a justificativa para que essa positividade corpórea tenha se estendido à boca deve-se ao surgimento de regras polidas para o convívio social, especialmente à mesa - assim, todos os corpos serão bucalmente4040 Compreender a partir da boca, que sob a perspectiva da “bucalidade” (arcabouço teórico que traz em seu escopo o entendimento da boca como corpo) deixa de ser apenas um espaço dentarizado e ganha concepção de um território corpóreo biopsicossociocultural35 onde são bucalmente consubstanciadas todas ações e atividades da vida humana - em síntese: tornar, mesmo para aqueles que não têm nada a ver, um assunto mais palatável, ou seja, bucalmente acessível à compreensão (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo 2000; Kovaleski et al., 2006). (como se fala, a forma de se mastigar, o controle das palavras e muitas outras atividades) cobrados (em especial as bocas femininas: mulheres devem falar baixo - além de terem suas palavras muito mais controladas - e mastigar de boca fechada) de comportamentos publicamente decentes.

São, portanto, sempre treinados ao longo da vida, afinal, “nenhum ser humano chega civilizado ao mundo e o processo civilizador individual que ele obrigatoriamente sofre é uma função do processo civilizador social” (Elias, 1994ELIAS, N. O processo civilizador, v. 1: Uma história dos costumes. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 1994., p. 15). E esse processo de disciplinarização perfaz-se prévio ao nascimento ou da consciência da própria existencialidade, em que regras corpóreas e bucais são construídas, ditadas e compulsoriamente corporificadas (Kovaleski ., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
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).

Ademais, torna-se fundamental destacar o papel da Odontologia, afinal, conforme Kovaleski (2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 99):

Esse processo disciplinarizador conta, desde o final do século 19, com o auxílio da odontologia. Ela colabora neste processo quando situa sua prática num campo completamente acrítico e reprodutor dos interesses do capital, sem um compromisso efetivo com a saúde das pessoas e das coletividades. Chegamos ao auge da inversão: a boca que consome o mundo, agora deve ser consumida por uma área do saber (ou do mercado), materializada nas práticas profiláticas do dentista.

E assim, as ciências da saúde - sendo neste estudo evidenciada a Odontologia -, como instituições de poder que são, ganham papel central na validação do caráter uníssono da cisheteronormatividade (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo, 2000).

Ponderação essa que vai ao encontro das reflexões de Gomes e Fantinel (2022GOMES, R.; FANTINEL, L. D. Gênero-corpo-sexualidade no espacializar: produzindo corpos-em-campo na pesquisa. FGV EAESP ERA, v. 62, n. 4, p. e2021-0054, 2022. doi: 10.1590/S0034-759020220407.
https://doi.org/10.1590/S0034-7590202204...
, p. 2): “[...] o lugar do corpo que assume a autoria da pesquisa segue naturalizado pelo caminho do mito do pesquisador neutro, representado por uma compreensão da norma de quem observa como sendo sujeito masculino, branco, cis e heterossexual”. Os autores (2022, p. 2) ainda reverberam as consequências desse modus operandi científico: “[...] a naturalização do corpo pesquisador em torno de corpos, gêneros e sexualidades específicas também produz negligência quanto às relações entre diferentes corpos (não-)hegemônicos presentes em campo de pesquisa”.

Uma sistematização imbricada em diversas relações espúrias junto às corporeidades LGBTQIA+, frequentemente reduzidas e, até mesmo, invisibilizadas por apontamentos de normalidade, de naturalidade e, principalmente, de patologização (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Almeida et al., 2022; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Foucault, 2020FOUCAULT, M. História da sexualidade: v. I (A vontade de saber), II (O uso dos prazeres), III (As confissões da carne) e IV (O cuidado de si). Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2020.; Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Santos ., 2021SANTOS, A. M. dos; CARMO, E. M.; MAGNO, L.; PRADO, N. M. de B. L. População LGBT+: demandas e necessidades para a produção do cuidado. Salvador: EDUFBA, 2021.).

Logicidade essa duramente criticada por Canguilhem (2020CANGUILHEM, G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2020.), pois, segundo o estudioso, essa positividade, essencialmente adotada pelas ciências da saúde, apenas referenda uma variação quantitativa do que viria a ser normal, natural ou patológico - o que se torna inócuo frente a uma infinidade de possibilidades fisiológicas e contextuais. O autor ainda complementa que os referidos apontamentos são conceitos que partem de um tipo de ideal, portanto vagos, inalcançáveis e alheios ao processo, portanto histórico, de vida das pessoas (Canguilhem, 2020).

Contudo, a disciplinarização da compulsória cisheteronormatividade33 Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020). estende-se aos trabalhos bucais (manducação,4242 “[...] manducar, isto é, apreender, triturar, insalivar e deglutir, é consumo do mundo, a ação que põe em relação às estruturas visíveis localizadas na parte superior do aparelho digestório com as vísceras não-visíveis localizadas mais abaixo, e tudo isto garante a sobrevivência do homem naquilo que ele tem de natureza, a preservação ou reposição dos elementos que constituem sua unidade corpórea. [...] É, pois, como cultura, que a satisfação e o gozo bucais esbarram na razão e no desejo: frequentemente comemos o que não devemos ou o que certa racionalidade recomenda, ou mais ou menos ou, ainda, não do modo como devíamos, de sorte que tudo isto resulta atravessado pelo psiquismo o que põe o sujeito em conflito consigo e com os outros. [...] Por isso, sem que haja dispositivos reguladores, a manducação pode tornar-se deletéria para o próprio homem” (Botazzo, 2006, p. 13-14). erótica4343 “[...] na relação amorosa produzimos atos bucais sexuais, a retomada da função genital primordial, o consumo e o deleite com o corpo do outro (agora consentido), e resulta igualmente outra vez o conflito entre razão e emoção (porque não raro esta boca fará o que não devia ou não do modo recomendado etc.)” (Botazzo, 2006, p. 13-14). e linguagem4444 “Produzimos palavras e as consumimos; somos obrigados a pensar naquilo que falamos, e não raro dizemos o que não queríamos dizer; também a palavra exagerada ou equivocada pode revelar-se deletéria” (Botazzo, 2006, p. 13-14).) da população LGBTQIA+ - policiamento que se coaduna com o firmado por Kovaleski . (2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 99), “Coisas simples são tolhidas, limitadas, condicionadas, reprimidas, e a boca tornou-se alvo especial de repressão. Um centro de prazer e repressão”.

Daí, inerente à integralidade do ser LGBTQIA+, degringolam-se diversos prazeres bucais das referidas “bocas-genital-genirificadas”,4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). sendo eles corporificados em um processo dicotomizador (binárias bocas-“endossexo-cis-heteronormativa”:5050 “Norma social que valoriza e considera como única possibilidade aceitável a existência endossexo, cisgênero e heterossexual e que exclui e marginaliza aquelas pessoas que não seguem essa norma” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV). boca-masculina-homem e boca-feminina-mulher) que repulsa falas (efeminadas e/ou masculinizadas), linguagens (“pajubá5151 “Pajubá - dialeto utilizado, inicialmente, entre travestis e, posteriormente, apropriado também por outros grupos do universo LGBTT+” (Brancaleoni; Kupermann, 2021, p. 59).), práticas sexuais, e se potencializam ainda mais quando nessa cavidade é materializada a transição ou rompimento com as definições convencionais do binarismo66 Binarismo sexual ou binariedade: uma limitada perspectiva que dicotomiza os papéis sociais dos seres humanos em categorias masculinas/homem/macho e femininas/mulher/fêmea. Estas que são definidas no nascimento do sujeito e que produz a partir daí um corpo (Lucca; Passamani, 2018). masculino-feminino (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021).

E como se não bastasse a segregação social de seus trabalhos bucais, a boca é frequentemente local marcador das múltiplas agressões emocionais e/ou físicas sofridas por esse vulnerável2727 A vulnerabilidade da população LGBTQIA+ deve ser compreendida como uma condição socialmente criada e/ou imposta (Almeida et al., 2022). Ademais, “uma das características constitutivas do quadro conceitual da vulnerabilidade é justamente ser dinâmico, não ser uma estrutura conceitual que cristaliza a realidade, mas basear-se no pressuposto de que a ciência e a técnica só podem ser entendidas como parte de processos de trabalho” ou seja, “parte do movimento social e político, com todas as suas forças atuando, inclusive, muitas vezes, [de formas] contraditórias” (Ayres; Castellanos; Baptista, 2018). grupo populacional (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Botazzo et al., 2021). Violência, “LGBTQIA+fobia”,2626 “LGBTQIA+fobia: medo, preconceito, discriminação, pensamentos negativos, violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+” (Ciasca et al., 2021, p. XXXV). que também carrega seus aspectos orofaciais, materializados através de prevalentes bocas silenciadas, lábios ensanguentados, por ossos faciais quebrados e por dentes perdidos (Almeida, 2023; Almeida et al., 2022; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Mendes, Silva, 2020MENDES, W. G.; SILVA, C. M. F. P. da. Homicide of Lesbians, Gays, Bisexuals, Travestis, Transexuals, and Transgender people (LGBT) in Brazil: a Spatial Analysis. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, n. 5, p. 1709-1722, 2020. doi: 10.1590/1413-81232020255.33672019.
https://doi.org/10.1590/1413-81232020255...
; Pinto ., 2020PINTO, I. V.; ANDRADE, S. S. de A.; RODRIGUES, L. L.; SANTOS, M. A. S.; MARINHO, M. M. A.; BENÍCIO, L. A.; CORREIA, R. S. de B.; POLIDORO, M.; CANAVESE, D. Profile of notification of violence against Lesbian, Gay, Bisexual, Transvestite and Transsexual people recorded in the National Information System on Notifiable Diseases, Brazil, 2015-2017. Rev. Bras. Epidemiol., v. 23, supl. 1, p. e200006, 2020. doi: 10.1590/1980-549720200006.supl.1.
https://doi.org/10.1590/1980-54972020000...
; Efrem-Filho, 2016; Pimenta ., 2013PIMENTA, R. M. C.; MATOS, F. R. R. O.; SILVA, M. L. C. A. da; RODRIGUES, A. A. A. de O.; MARQUES, J. A. M.; M., J. de O. Levantamento de lesões na região bucomaxilofacial em vítimas de violência periciadas no Instituto Médico Legal (IML) de Feira de Santana-BA, entre 2007 e 2009. Arq. Odontol., v. 49, n. 4, p. 154-161, 2013. doi: 10.7308/aodontol/2013.49.4.01.
https://doi.org/10.7308/aodontol/2013.49...
).

Frente a esse duro contexto, facear novas possibilidades e permissividades corpóreas, trazer outras interpretações de desejos ganham apreço, o que se faz possível nos enfoques bucais trazidos nas reflexões de Botazzo (2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
), afinal, segundo ele:

[...] Primeira autonomia de uma boca que se imagina genitália, o sexo dela mesma. [...] o desejo há de se dar como linguagem, a vontade e o prazer podem agora ser falados (Botazzo, 2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 45).

[...] É possível imaginar que se manduca (e se engole) agora como era feito há milênios? Seria esse gozo da boca humana tão somente uma função desse modo condicionada? Esses movimentos, contudo, não param por aí. As coisas e as palavras, ou palavras que não têm muito a ver com as coisas. Um vocabulário se encarrega de desvelar outros novos usos. Chupar: ato de sugar alguma coisa. Mammalia, todos vão dizer. É, posso repetir, mamar: a sucção bucal é definidora deste gênero. Víscera com víscera; mucosa com mucosa; saliva com saliva: bocas entrevorazes na manducação do mesmo e do outro. Chupar: sugar, sorver, extrair com a boca o suco de. A gramática nos revela outro tipo de gozo, outro trabalho bucal, outra forma de coordenação entre órgãos, os mesmos que antes (Botazzo, 2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
, p. 56).

A partir de então, as bocas “genital-generificadas”,4141 Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). instintivamente questionadoras (“Queer3737 “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001, p. 550).) e sagazes pela emancipação de suas tecnologias bucais (“prostéticas” 3838 Faz alusão ao gênero e à sexualidade serem tecnologias sociopolíticas utilizadas para se construírem organicamente corpos sexuais (Augusto; Neira, 2021; Preciado, 2017).) atreladas ao seus prazeres, tornaram-se “prostéticas bocas-queer”4545 Alicerçado pelas concepções do queer36 (Teoria Queer, Butler) e do prostético37 (Contrassexual, Preciado), as “prostéticas bocas-queer” referendam o potencial dos trabalhos bucais (manducação41, erótica42 e linguagem43) para além da cisheteronormatividade. A partir de então, a boca tem papel sine qua non nas inúmeras performances30 corpóreas29 LGBTQIA+ (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). - dotadas elas de suas “próteses bucossociais”,5252 Análogo ao “prostético”,37 remete às tecnologias bucais utilizadas para se construírem organicamente corpos generificados (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021). constituídas de material puramente humano e articuladas biopoliticamente através da materialização de seus desejos bucais, fundamentais no processo de composição e reconhecimento das identidades corpóreas do ser LGBTQIA+ (Figura 2) (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021).

Assim, neste trabalho emergem as plurais performances3131 Quando uma identidade corpórea conquista a compreensão da linguagem, que funciona como uma ação social voltada para a percepção de outras formas de se experienciar a vida que não a cisheteronorma (Butler, 2019a; Butler, 2019b; Borba, 2014). bucais, sendo elas: “boca-cis”, “boca-trans”, “boca-intersexo”, “boca-sapata/lésbica”, “boca-gay/viada”, “boca-bissexual”, “boca-travesti/trava/travestigênere”,5353 “Travestigênere: neologismo que propõe substituir o termo transgênero e ser mais inclusivo, por fundir as palavras transexual e travesti, além de terminar de forma neutra em alusão às pessoas não binárias” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV). “boca-assexuada”, “boca-transviada” e as ilimitadas possibilidades das “bocas-+/mais” (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
; Botazzo et al., 2021). Todas elas continuadamente desafiadas a alcançarem e, principalmente, a serem reconhecidas em seus respectivos “lugares de fala”,5454 Lugar de fala: “tem sido amplamente utilizado pelos movimentos sociais como delimitação da experiência do sujeito da enunciação enquanto produtora de sentidos” (Mattos, 2021, p. 170). “Possibilita um olhar sobre as experiências dos corpos subalternizados valorizando o lugar comum, compreendido como locus social que atravessa as experiências coletivizadas desses corpos” (Santos, 2019, p. 361). onde são bucalizados4040 Compreender a partir da boca, que sob a perspectiva da “bucalidade” (arcabouço teórico que traz em seu escopo o entendimento da boca como corpo) deixa de ser apenas um espaço dentarizado e ganha concepção de um território corpóreo biopsicossociocultural35 onde são bucalmente consubstanciadas todas ações e atividades da vida humana - em síntese: tornar, mesmo para aqueles que não têm nada a ver, um assunto mais palatável, ou seja, bucalmente acessível à compreensão (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo 2000; Kovaleski et al., 2006). (bucalmente dialogados), em interface com o empoderamento1111 Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização da política (Kleba; Wendausen, 2009). de suas resilientes existências, suas especificidades, necessidades e demandas por políticas públicas de cuidado (Figura 2) (Almeida, 2023; Almeida et al., 2022; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Mattos, 2021MATTOS, M. B. O “lugar de fala” e as “falas do lugar” na enunciação literária: o dilema pós-colonial. Literatura: teoría, historia, crítica, v. 23, n. 1, p. 161-184, 2021. doi: 10.15446/lthc.v23n1.90598.
https://doi.org/10.15446/lthc.v23n1.9059...
; Santos, 2019SANTOS, G. C.; RIBEIRO, D. O que é lugar de fala? Saúde Debate, v. 43, n. 8, p. 360-362, 2019. doi: 10.1590/0103-11042019S826.
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).

Políticas públicas de cuidado para “prostéticas bocas-queer4545 Alicerçado pelas concepções do queer36 (Teoria Queer, Butler) e do prostético37 (Contrassexual, Preciado), as “prostéticas bocas-queer” referendam o potencial dos trabalhos bucais (manducação41, erótica42 e linguagem43) para além da cisheteronormatividade. A partir de então, a boca tem papel sine qua non nas inúmeras performances30 corpóreas29 LGBTQIA+ (Almeida, 2023; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021).

As questões de gênero1616 “Gênero: estrutura social e construção histórica do que é ser homem/masculino ou mulher/feminino nas diferentes épocas e sociedades” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). e sexualidade,1919 Sexualidade/“Orientação afetivo-sexual: refere-se à atração/desejo (ou não) física, afetiva/romântica ou emocional por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). em interface com o cuidado bucal, são pouco ou nem mesmo consideradas na prática clínica odontológica (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Varotto ., 2022VAROTTO, B. L. R.; MASSUDA, M.; NÁPOLE, R. de C. D'O.; ANTEQUERA, R. LGBTQIA+ population: access to dental treatment and preparation of the dental surgeon - an integrative review. Revista da ABENO, v. 22, n. 2, p. e1542, 2022. doi: 10.30979/revabeno.v22i2.1542.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Raisin ., 2021RAISIN, J. A; ADKINS, D.; SCHWARTZ, S. B. Understanding and Caring for LGBTQD Youth by the Oral Health Care Provider. Dent Clin North Am., v. 65, n. 4, p. 705-717, 2021. doi: 10.1016/j.cden.2021.06.007.
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). Inclusive, em cenário brasileiro, desde sua implementação, em 2004, as diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, PNSB (Brasil Sorridente) não fazem quaisquer referências às especificidades, necessidades e demandas para o cuidado da população LGBTQIA+ (Almeida, 2023; Brasil, 2004).

Uma incongruência que aguça questões voltadas ao provimento, sob os preceitos da saúde bucal coletiva, de políticas públicas de cuidado voltadas para esse vulnerável2828 “Passabilidade: é a possibilidade de uma pessoa ser socialmente reconhecida como membro de um grupo ou categoria identitária diferente da sua” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIV). grupo populacional (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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; Botazzo ., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
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; Varotto ., 2022VAROTTO, B. L. R.; MASSUDA, M.; NÁPOLE, R. de C. D'O.; ANTEQUERA, R. LGBTQIA+ population: access to dental treatment and preparation of the dental surgeon - an integrative review. Revista da ABENO, v. 22, n. 2, p. e1542, 2022. doi: 10.30979/revabeno.v22i2.1542.
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; Botazzo et al., 2021; Ciasca ., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.; Raisin ., 2021RAISIN, J. A; ADKINS, D.; SCHWARTZ, S. B. Understanding and Caring for LGBTQD Youth by the Oral Health Care Provider. Dent Clin North Am., v. 65, n. 4, p. 705-717, 2021. doi: 10.1016/j.cden.2021.06.007.
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).

Ademais, segundo Almeida (2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
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, p. 20), o cuidado com o território bucal da população LGBTQIA+ deveria

[...] se iniciar, “da boca pra fora”, com um modelo de acolhimento que envolva, por parte dos profissionais da equipe de saúde bucal, o reconhecimento da identificação dos pacientes, que, além de ultrapassar a equivocada designação dicotômica de sexo (corpos endossexos1414 “Endossexo é um termo mais recente utilizado pelos movimentos sociais para pessoas cujas características corporais (cromossomos, gônadas e genitália) se enquadram nas convenções de sexo ‘masculino’ ou ‘feminino’” (Ciasca et al., 2021, p. 13). e intersexos1515 “Intersexo é um termo usado para uma variedade de condições em que uma pessoa nasce como uma anatomia sexual e/ou reprodutiva que não se enquadra nas definições típicas e binárias de sexo masculino ou feminino” (Ciasca et al., 2021, p. 13).), considere também a identidade de gênero (cis1616 “Gênero: estrutura social e construção histórica do que é ser homem/masculino ou mulher/feminino nas diferentes épocas e sociedades” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). ou transgênero1717 “Cisgênero (cis): pessoa que se identifica com o gênero designado ao nascimento” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII).), a sexualidade (alossexual5555 “Pessoa que sente atração e desejo sexual por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII). e assexual2323 “Assexuais são pessoas que estão em um espectro de sentirem pouca ou nenhuma atração/desejo sexual por pessoas, apesar de poderem ter resposta a estímulos sexuais. A concepção da atração sexual como capacidade tem sido criticada, pois pessoas assexuais poderiam ser consideradas pessoas com deficiência, pois não teriam atração/capacidade por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021, p. 15).) e o nome social (expressão de gênero2525 “Expressão de gênero: forma como a pessoa deseja se expressar, em um determinado momento e contexto, em relação aos padrões sociais de gênero. Abrange imagem corporal, roupas, adornos e gestos. Não necessariamente está de acordo com os padrões de gênero e pode ser fluida” (Ciasca et al., 2021, p. XXXIII).), retificado ou não por meio de certidões.

Tão logo, “da boca pra dentro”, o assistir odontológico passaria pela compreensão de que o percurso crônico de sofrimento existencial da população LGBTQIA+ impacta diretamente em fatores biopsicossocioculturais3636 Perceber o ser humano, em sua complexidade (vida, linguagem, sociedade e aspectos culturais) e sua interligação com o mundo (Oliva; Fonseca, 2023; Almeida et al., 2022; Botazzo et al., 2022; Botazzo et al., 2021; Morin, 2000). (ansiedade, depressão, estresse de minorias, tabagismo, alcoolismo, drogadização, uso de antidepressivos, distúrbios alimentares e de autoimagem, xerostomia, qualidade de higiene bucal, acesso a serviços odontológicos, sexo bucal e violência) atrelados ao processo saúde-doença bucal, portanto aumentando o risco desses pacientes para doenças e/ou sequelas e/ou manifestações bucais (cárie, doenças periodontais, perdas e desgastes dentários, câncer de boca, disfunção temporomandibular, manifestações orais para infecções sexualmente transmissíveis e traumas orofaciais).

Uma perspectiva que vai ao encontro da definição universal de saúde bucal: “[...] é multifacetada e inclui a capacidade de falar, sorrir, cheirar, saborear, tocar, mastigar, engolir e transmitir uma série de emoções por meio de expressões faciais com confiança e sem dor, desconforto e doenças do complexo craniofacial” (Glick ., 2017GLICK, M.; WILLIAMS, D. M.; KEINMANN, D. V.; VUJICIC, M.; WATT, R. G.; WEYANT, R. J. A new definition for oral health developed by the FDI World Dental Federation opens the door to a universal definition of oral health. Am J Orthod Dentofacial Orthop., v. 151, n. 2, p. 229-231, 2017. doi: 10.1016/j.ajodo.2016.11.010.
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, p. 229).

Considerações finais

Imbricado pelas premissas apresentadas nesta pesquisa, o território bucal, a partir de então, torna-se uma pista, ou melhor, um caminho para se compreender o percurso histórico-social das identidades LGBTQIA+. Afinal, boca é corpo, e como todas as demais formas da corporeidade, guiam-se pelas normatizações socialmente construídas com as quais são tecidas biopoliticamente as existências.5656 L. E. de Almeida, V. de Oliveira, C. Botazzo e F. L. Mialhe: elaboração do manuscrito, concepção, delineamento e discussão dos resultados; redação, revisão crítica e aprovação final do conteúdo.

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    » https://doi.org/10.1590/s1517-97022015031914.

  • 1
    Machismo: comportamento que rejeita a igualdade de condições sociais e direitos entre homens e mulheres. Enaltecimento do sexo masculino em detrimento da desqualificação do sexo feminino. Assim, a pessoa machista é aquela que acredita na inferioridade física, cultural e intelectual das mulheres (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.).
  • 2
    Cissexismo ou cisnormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que desconsidera na sociedade a existência de pessoas que transitam ou rompem com o binarismo do sexo masculino ou feminino (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.).
  • 3
    Cisheteronormatividade: modelo sociopolítico-econômico e cultural que preconiza como norma, ou seja, natural, não-pecaminoso e saudável, corpos cisgêneros e heterossexuais (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.). É desta perspectiva que se consubstancia a supremacia (biopoder) de corpos brancos, masculinos, cisgêneros e heterossexuais (Foucault, 2020FOUCAULT, M. História da sexualidade: v. I (A vontade de saber), II (O uso dos prazeres), III (As confissões da carne) e IV (O cuidado de si). Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2020.).
  • 4
    Paradigma: “Um paradigma concebe um padrão a ser seguido no campo social ou científico; assim, em uma mesma comunidade científica, os paradigmas expressam as crenças, os valores e as técnicas partilhadas por seus membros e são influenciados por fatores culturais, políticos, econômicos e sociais. De uma forma mais genérica, o termo paradigma é usado como referência à forma como percebemos e atuamos no mundo” (Barbosa et al., 2015BARBOSA, L. B. A.; MOTTA, A. L. C.; RESCK, Z. M. R. Os paradigmas da modernidade e pós-modernidade e o processo de cuidar na enfermagem. Enfermería Global, v. 14, n. 1, p. 342-349, 2015. doi: 10.6018/eglobal.14.1.193101.
    https://doi.org/10.6018/eglobal.14.1.193...
    , p. 342).
  • 5
    Disciplinarizador: “processo de disciplinarização dos corpos para uma adequação ao capitalismo” (Kovaleski et al., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
    https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
    , p. 97).
  • 6
    Binarismo sexual ou binariedade: uma limitada perspectiva que dicotomiza os papéis sociais dos seres humanos em categorias masculinas/homem/macho e femininas/mulher/fêmea. Estas que são definidas no nascimento do sujeito e que produz a partir daí um corpo (Lucca; Passamani, 2018LUCCA, P. R.; PASSAMANI, G. R. O binarismo à deriva: as sexualidades performáticas de “Gêneros incríveis”. Revista Estudos Feministas, v. 26, n. 3, p. e53658, 2018. doi: 10.1590/1806-9584-2018v26n353658.
    https://doi.org/10.1590/1806-9584-2018v2...
    ).
  • 7
    Minorias sexuais e de gênero: “Indivíduos incluindo lésbicas, gays, bissexuais, transgênero, queer, intersexo, pessoas com gênero em não-conformidade, e outras populações cuja orientação sexual ou identidade de gênero e o desenvolvimento reprodutivo são considerados fora das normas culturais, sociais ou fisiológicas” (DECS/MeSH, 2017).
  • 8
    “A abjeção (do latim, ab-jectio) significa jogar fora, excluir. A noção de abjeção, ao contrário, designa uma condição degradada ou excluída dentro dos termos da sociabilidade. Em realidade, o foracluído (ou repudiado, dentro dos termos psicanalíticos) é precisamente o que não pode voltar a entrar no campo do social sem provocar a ameaça de psicose, quer dizer, de dissolução do sujeito mesmo. A sentença ‘prefiro morrer a fazer tal coisa’ seria o fantasma dessa dissolução atuando no sujeito” (Bento, 2021, p. 166).
  • 9
    Pode assumir, sob perspectiva “foucaultiana”, duas formas: “uma anátomo-política do corpo e uma biopolítica da população. A primeira refere-se aos dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante o controle do tempo e do espaço, no interior de instituições, como a escola, o hospital, a fábrica e a prisão. Por sua vez, a biopolítica da população volta-se à regulação das massas, utilizando-se de saberes e práticas que permitam gerir taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias, aumento da longevidade” (Furtado; Camilo, 2016FURTADO, R. N.; CAMILO, J. A. de O. O conceito de biopoder no pensamento de Michel Foucault. Revista Subjetividades, v. 16, n. 3, p. 34-44, 2016. doi: 10.5020/23590777.16.3.34-44.
    https://doi.org/10.5020/23590777.16.3.34...
    , p. 34).
  • 10
    Dissidência: quando entendida como caminho único para se percorrer a vida, a cisheteronormatividade deve ser considerada como um regime autoritário/totalitário. Assim, aqueles que não estão “alinhados” ou não se encontram dentro dos padrões de “normalidade” - corpos não brancos-masculinos-cisgêneros-heterossexuais - são descritos como indivíduos dissidentes (Colling, 2016COLLING, L. Dissidências sexuais e de gênero. Salvador: EDUFBA, 2016.).
  • 11
    Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização da política (Kleba; Wendausen, 2009KLEBA, M. E.; WANDAUSEN, A. Empoderamento: processo de fortalecimento dos sujeitos nos espaços de participação social e democratização política. Saúde Soc., v. 18, n. 4, p. 733-743, 2009. doi: 10.1590/S0104-12902009000400016.
    https://doi.org/10.1590/S0104-1290200900...
    ).
  • 12
    Biopoder assume duas formas: “uma anátomo-política do corpo e uma biopolítica da população. A primeira refere-se aos dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante o controle do tempo e do espaço, no interior de instituições, como a escola, o hospital, a fábrica e a prisão. Por sua vez, a biopolítica da população volta-se à regulação das massas, utilizando-se de saberes e práticas que permitam gerir taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias, aumento da longevidade” (Furtado; Camilo, 2016FURTADO, R. N.; CAMILO, J. A. de O. O conceito de biopoder no pensamento de Michel Foucault. Revista Subjetividades, v. 16, n. 3, p. 34-44, 2016. doi: 10.5020/23590777.16.3.34-44.
    https://doi.org/10.5020/23590777.16.3.34...
    , p. 34).
  • 13
    “Sexo biológico: classificado de acordo com a anatomia, os cromossomos e os hormônios” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 14
    “Endossexo é um termo mais recente utilizado pelos movimentos sociais para pessoas cujas características corporais (cromossomos, gônadas e genitália) se enquadram nas convenções de sexo ‘masculino’ ou ‘feminino’” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 13).
  • 15
    “Intersexo é um termo usado para uma variedade de condições em que uma pessoa nasce como uma anatomia sexual e/ou reprodutiva que não se enquadra nas definições típicas e binárias de sexo masculino ou feminino” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 13).
  • 16
    “Gênero: estrutura social e construção histórica do que é ser homem/masculino ou mulher/feminino nas diferentes épocas e sociedades” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 17
    “Cisgênero (cis): pessoa que se identifica com o gênero designado ao nascimento” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 18
    “Transgênero (trans): pessoa que não se identifica com o gênero designado ao nascimento. É um termo guarda-chuva que engloba várias identidades: homens e mulheres transexuais, pessoas não binárias, travestis e outras” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 19
    Sexualidade/“Orientação afetivo-sexual: refere-se à atração/desejo (ou não) física, afetiva/romântica ou emocional por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 20
    “Heterossexual é uma pessoa que sente atração por um gênero “diferente” do seu (não se deve utilizar gênero ou sexo ‘oposto’, porque gêneros não são necessariamente binários)” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 15).
  • 21
    “Homossexuais sentem atração por pessoas do mesmo gênero” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 15).
  • 22
    “Bissexuais são pessoas que sentem atração por mais de um gênero” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 15).
  • 23
    “Assexuais são pessoas que estão em um espectro de sentirem pouca ou nenhuma atração/desejo sexual por pessoas, apesar de poderem ter resposta a estímulos sexuais. A concepção da atração sexual como capacidade tem sido criticada, pois pessoas assexuais poderiam ser consideradas pessoas com deficiência, pois não teriam atração/capacidade por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 15).
  • 24
    Outras/mais/+: “São pessoas que sentem atração por pessoas independentemente do gênero” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. 15).
  • 25
    “Expressão de gênero: forma como a pessoa deseja se expressar, em um determinado momento e contexto, em relação aos padrões sociais de gênero. Abrange imagem corporal, roupas, adornos e gestos. Não necessariamente está de acordo com os padrões de gênero e pode ser fluida” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 26
    “LGBTQIA+fobia: medo, preconceito, discriminação, pensamentos negativos, violência contra pessoas da comunidade LGBTQIA+” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXV).
  • 27
    A vulnerabilidade da população LGBTQIA+ deve ser compreendida como uma condição socialmente criada e/ou imposta (Almeida et al., 2022ALMEIDA, L. E. de; OLIVEIRA, J. M. de; OLIVEIRA, V. de; MIALHE, F. L. Scientific production on LGBTQIA+ health: a critical analysis of the Literature. Saúde Soc., v. 31, n. 4, p. e210836en, 2022. doi: 10.1590/S0104-12902022210836en.
    https://doi.org/10.1590/S0104-1290202221...
    ). Ademais, “uma das características constitutivas do quadro conceitual da vulnerabilidade é justamente ser dinâmico, não ser uma estrutura conceitual que cristaliza a realidade, mas basear-se no pressuposto de que a ciência e a técnica só podem ser entendidas como parte de processos de trabalho” ou seja, “parte do movimento social e político, com todas as suas forças atuando, inclusive, muitas vezes, [de formas] contraditórias” (Ayres; Castellanos; Baptista, 2018AYRES, J. R.; CASTELLANOS, M. E. P.; BAPTISTA, T. W. de F. Entrevista com José Ricardo Ayres. Saúde e Sociedade, v. 27, n. 1, p. 51-60, 2018. doi: 10.1590/S0104-12902018000002.
    https://doi.org/10.1590/S0104-1290201800...
    ).
  • 28
    “Passabilidade: é a possibilidade de uma pessoa ser socialmente reconhecida como membro de um grupo ou categoria identitária diferente da sua” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIV).
  • 29
    “O materialismo histórico-dialético investiga como transcorre o desenvolvimento da sociedade e do processo histórico através do regime social. Nesse sentido, o materialismo histórico necessariamente entrelaça-se com as questões específicas, fornecendo elementos (indicadores) científicos para seu estudo e investigação” (Pacheco; Dias, 2023PACHECO, E. M.; DIAS, M. T. G. A luta das mulheres por políticas sociais: avanços e retrocessos. Serv. Soc. Soc., v. 146, n. 1, p. 263-283, 2023. doi: 10.1590/0101-6628.313.
    https://doi.org/10.1590/0101-6628.313....
    , p. 267).
  • 30
    “[...] compreender o ser humano em quatro dimensões indissociáveis: físico-motora, afetiva-relacional, mental-cognitiva e sócio-histórico-cultural” (João, 2019JOÃO, R. B. Corporeality and epistemology of complexity: through an experiential educational practice. Educ. Pesqui., v. 45, p. e193169, 2019. doi: 10.1590/S1678-4634201945193169.
    https://doi.org/10.1590/S1678-4634201945...
    , p. 1).
  • 31
    Quando uma identidade corpórea conquista a compreensão da linguagem, que funciona como uma ação social voltada para a percepção de outras formas de se experienciar a vida que não a cisheteronorma (Butler, 2019aBUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo, SP: n-1 edições/Crocodilo edições, 2019a.; Butler, 2019b; Borba, 2014BORBA, R. A linguagem importa? Sobre performance, performatividade e peregrinações conceituais. Cadernos pagu, n. 43, p. 441-474, 2014. doi: 10.1590/0104-8333201400430441.
    https://doi.org/10.1590/0104-83332014004...
    ).
  • 32
    “[...] normas sociais que estabelecem diferenças de valoração e expectativas entre os gêneros. Normalmente se vinculam à perspectiva binária cisgênero (cissexismo) e desvalorizam aqueles atributos considerados femininos (sexismo)” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIV).
  • 33
    Sentimento de repulsa, aversão e ódio contra um indivíduo por ser mulher (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.).
  • 34
    Preconceito, discriminação ou antagonismo por parte de um indivíduo, comunidade ou instituição contra uma pessoa ou pessoas pardas e pretas (Audebert et al., 2022AUDEBERT, C.; JARDIM, D. F.; JOSEPH, H.; PINHO, O. Negritude e relações raciais: racismo e antirracismos no espaço atlântico. Horiz. antropol., v. 28, n. 63, p. 7-37, 2022. doi: 10.1590/S0104-71832022000200001.
    https://doi.org/10.1590/S0104-7183202200...
    ).
  • 35
    Sistema social em que homens mantêm o poder primário e predominam em funções de liderança política, autoridade moral, privilégio social e controle das propriedades. No domínio da família, o pai mantém a autoridade sobre as mulheres e as crianças (Marinho, 2018MARINHO, S. Diversidade de gênero na sociabilidade capitalista patriarcal: as identidades trans em perspectiva. R. Katál., v. 21, n. 3, p. 602-610, 2018. doi: 10.1590/1982-02592018v21n3p602.
    https://doi.org/10.1590/1982-02592018v21...
    ).
  • 36
    Perceber o ser humano, em sua complexidade (vida, linguagem, sociedade e aspectos culturais) e sua interligação com o mundo (Oliva; Fonseca, 2023OLIVA, J. T.; FONSECA, F. P. A tripla transformação da vida humana. Rev. Inst. Estud. Bras., n. 84, p. 239-247, 2023. doi: 10.11606/issn.2316-901X.v1i84p239-247.
    https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X....
    ; Almeida et al., 2022ALMEIDA, L. E. de; OLIVEIRA, J. M. de; OLIVEIRA, V. de; MIALHE, F. L. Scientific production on LGBTQIA+ health: a critical analysis of the Literature. Saúde Soc., v. 31, n. 4, p. e210836en, 2022. doi: 10.1590/S0104-12902022210836en.
    https://doi.org/10.1590/S0104-1290202221...
    ; Botazzo et al., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
    https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
    ; Botazzo et al., 2021; Morin, 2000MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez; Brasília: UNESCO, 2000. Disponível em: <https://arquivos.info.ufrn.br/arquivos/2012133176826a1035842e1211faee999/setesaberesmorin.pdf.pdf>. Acesso em 30 jun. 2023.
    https://arquivos.info.ufrn.br/arquivos/2...
    ).
  • 37
    “A teoria queer permite pensar a ambiguidade, a multiplicidade e a fluidez das identidades sexuais e de gênero mas, além disso, também sugere novas formas de pensar a cultura, o conhecimento, o poder e a educação” (Louro, 2001LOURO, G. L. Teoria queer: uma política pós-identitária para a educação. Rev. Estud. Fem., v. 9, n. 2, p. 541-553, 2001. doi: 10.1590/S0104-026X2001000200012.
    https://doi.org/10.1590/S0104-026X200100...
    , p. 550).
  • 38
    Faz alusão ao gênero e à sexualidade serem tecnologias sociopolíticas utilizadas para se construírem organicamente corpos sexuais (Augusto; Neira, 2021AUGUSTO, C. N.; NEIRA, M. G. (Um) Currículo cultural contrassexual? Movimentos que possibilitam corpos em trânsito. Rev Bras Ciênc Esporte, v. 43, p. e002221, 2021. doi: 10.1590/rbce.43.e002221.
    https://doi.org/10.1590/rbce.43.e002221....
    ; Preciado, 2017PRECIADO, P. B. Manifesto contrassexual - Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: n-1 Edições, 2017.).
  • 39
    “A abjeção (do latim, ab-jectio) significa jogar fora, excluir. A noção de abjeção, ao contrário, designa uma condição degradada ou excluída dentro dos termos da sociabilidade. Em realidade, o foracluído (ou repudiado, dentro dos termos psicanalíticos) é precisamente o que não pode voltar a entrar no campo do social sem provocar a ameaça de psicose, quer dizer, de dissolução do sujeito mesmo. A sentença ‘prefiro morrer a fazer tal coisa’ seria o fantasma dessa dissolução atuando no sujeito” (Bento, 2021, p. 166).
  • 40
    Compreender a partir da boca, que sob a perspectiva da “bucalidade” (arcabouço teórico que traz em seu escopo o entendimento da boca como corpo) deixa de ser apenas um espaço dentarizado e ganha concepção de um território corpóreo biopsicossociocultural35 onde são bucalmente consubstanciadas todas ações e atividades da vida humana - em síntese: tornar, mesmo para aqueles que não têm nada a ver, um assunto mais palatável, ou seja, bucalmente acessível à compreensão (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo et al., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
    https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
    ; Botazzo et al., 2021; Botazzo, 2013a; Botazzo, 2013b; Botazzo, 2006; Botazzo 2000; Kovaleski et al., 2006KOVALESKI, D. F.; FREITAS, S. F. T. de; BOTAZZO, C. Disciplinarização da boca, a autonomia do indivíduo na sociedade do trabalho. Ciência & Saúde Coletiva, v. 11, n. 1, p.97-103, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100017.
    https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
    ).
  • 41
    Boca é corpo; portanto, nela também estão imbricados os inúmeros arranjos performáticos30 entre sexo, gênero e sexualidade (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo et al., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
    https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
    ; Botazzo et al., 2021).
  • 42
    “[...] manducar, isto é, apreender, triturar, insalivar e deglutir, é consumo do mundo, a ação que põe em relação às estruturas visíveis localizadas na parte superior do aparelho digestório com as vísceras não-visíveis localizadas mais abaixo, e tudo isto garante a sobrevivência do homem naquilo que ele tem de natureza, a preservação ou reposição dos elementos que constituem sua unidade corpórea. [...] É, pois, como cultura, que a satisfação e o gozo bucais esbarram na razão e no desejo: frequentemente comemos o que não devemos ou o que certa racionalidade recomenda, ou mais ou menos ou, ainda, não do modo como devíamos, de sorte que tudo isto resulta atravessado pelo psiquismo o que põe o sujeito em conflito consigo e com os outros. [...] Por isso, sem que haja dispositivos reguladores, a manducação pode tornar-se deletéria para o próprio homem” (Botazzo, 2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
    https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
    , p. 13-14).
  • 43
    “[...] na relação amorosa produzimos atos bucais sexuais, a retomada da função genital primordial, o consumo e o deleite com o corpo do outro (agora consentido), e resulta igualmente outra vez o conflito entre razão e emoção (porque não raro esta boca fará o que não devia ou não do modo recomendado etc.)” (Botazzo, 2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
    https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
    , p. 13-14).
  • 44
    “Produzimos palavras e as consumimos; somos obrigados a pensar naquilo que falamos, e não raro dizemos o que não queríamos dizer; também a palavra exagerada ou equivocada pode revelar-se deletéria” (Botazzo, 2006BOTAZZO, C. Sobre a bucalidade: notas para a pesquisa e contribuição ao debate. Ciência & Saúde Coletiva, v. 7, n. 17, p. 7-17, 2006. doi: 10.1590/S1413-81232006000100002.
    https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600...
    , p. 13-14).
  • 45
    Alicerçado pelas concepções do queer36 (Teoria Queer, Butler) e do prostético37 (Contrassexual, Preciado), as “prostéticas bocas-queer” referendam o potencial dos trabalhos bucais (manducação41, erótica42 e linguagem43) para além da cisheteronormatividade. A partir de então, a boca tem papel sine qua non nas inúmeras performances30 corpóreas29 LGBTQIA+ (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo et al., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
    https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
    ; Botazzo et al., 2021).
  • 46
    Ontogênese/ontogenia: processo evolutivo acerca das alterações biológicas sofridas pelo indivíduo, desde o nascimento, até seu desenvolvimento final (Almeida 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo, 2013bBOTAZZO, C. Bucalidade. Pro-odonto prevenção, v. 6, n. 4, p. 9-55, 2013b.; Botazzo, 2000).
  • 47
    Filogenético/filogenésico/filogênico: refere-se à filogenia, à história da evolução das espécies, nomeadamente à história genealógica de uma espécie, destacando suas relações de ancestrais e descendentes (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo, 2013bBOTAZZO, C. Bucalidade. Pro-odonto prevenção, v. 6, n. 4, p. 9-55, 2013b.; Botazzo, 2000).
  • 48
    Ideologia cuja base se sustenta na premissa básica de que o poder político/econômico, em diversos âmbitos, deva ser exercido somente por homens biológicos - corpos com pênis (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo, 2013bBOTAZZO, C. Bucalidade. Pro-odonto prevenção, v. 6, n. 4, p. 9-55, 2013b.; Botazzo, 2000).
  • 49
    O masculino como sendo o único paradigma de representação coletiva, estando o pensamento masculino acima de todos os outros (Almeida 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo, 2013bBOTAZZO, C. Bucalidade. Pro-odonto prevenção, v. 6, n. 4, p. 9-55, 2013b.; Botazzo, 2000).
  • 50
    “Norma social que valoriza e considera como única possibilidade aceitável a existência endossexo, cisgênero e heterossexual e que exclui e marginaliza aquelas pessoas que não seguem essa norma” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIV).
  • 51
    “Pajubá - dialeto utilizado, inicialmente, entre travestis e, posteriormente, apropriado também por outros grupos do universo LGBTT+” (Brancaleoni; Kupermann, 2021BRANCALEONI, A. P. L.; KUPERMANN, D. “No ar” e nas ruas: Pajubá e humor entre travestis do interior de São Paulo. Psic. Clin., v. 33, n. 1, p. 57-77, 2021. doi: 10.33208/PC1980-5438v0033n01A03.
    https://doi.org/10.33208/PC1980-5438v003...
    , p. 59).
  • 52
    Análogo ao “prostético”,37 remete às tecnologias bucais utilizadas para se construírem organicamente corpos generificados (Almeida, 2023ALMEIDA, L. E. de. Território bucal da população LGBTQIA+: a Odontologia em interface com corpos socialmente estigmatizados e negligenciados. Tese (Doutorado em Odontologia/Saúde Coletiva) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas, Piracicaba, 2023. Disponível em: <https://repositorio.unicamp.br/Acervo/Detalhe/1344029>.
    https://repositorio.unicamp.br/Acervo/De...
    ; Botazzo et al., 2022BOTAZZO, C.; CANAVESE, D.; ALMEIDA, L. E.; MOTA, R.; MORETTI, R.; WARMLING, C.; NETTO, O. Diversidade & Bucalidade, Youtube, 23 ago. 2022. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4cec9k&t=16s>.
    https://www.youtube.com/watch?v=35p0b4ce...
    ; Botazzo et al., 2021).
  • 53
    “Travestigênere: neologismo que propõe substituir o termo transgênero e ser mais inclusivo, por fundir as palavras transexual e travesti, além de terminar de forma neutra em alusão às pessoas não binárias” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIV).
  • 54
    Lugar de fala: “tem sido amplamente utilizado pelos movimentos sociais como delimitação da experiência do sujeito da enunciação enquanto produtora de sentidos” (Mattos, 2021MATTOS, M. B. O “lugar de fala” e as “falas do lugar” na enunciação literária: o dilema pós-colonial. Literatura: teoría, historia, crítica, v. 23, n. 1, p. 161-184, 2021. doi: 10.15446/lthc.v23n1.90598.
    https://doi.org/10.15446/lthc.v23n1.9059...
    , p. 170). “Possibilita um olhar sobre as experiências dos corpos subalternizados valorizando o lugar comum, compreendido como locus social que atravessa as experiências coletivizadas desses corpos” (Santos, 2019SANTOS, G. C.; RIBEIRO, D. O que é lugar de fala? Saúde Debate, v. 43, n. 8, p. 360-362, 2019. doi: 10.1590/0103-11042019S826.
    https://doi.org/10.1590/0103-11042019S82...
    , p. 361).
  • 55
    “Pessoa que sente atração e desejo sexual por outras pessoas” (Ciasca et al., 2021CIASCA, S. V.; HERCOWITZ, A.; LOPES-JUNIOR, A. Saúde LGBTQIA+: Práticas de cuidado transdisciplinar. Santana de Parnaíba: Manole, 2021., p. XXXIII).
  • 56
    L. E. de Almeida, V. de Oliveira, C. Botazzo e F. L. Mialhe: elaboração do manuscrito, concepção, delineamento e discussão dos resultados; redação, revisão crítica e aprovação final do conteúdo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    18 Jan 2023
  • Revisado
    09 Set 2023
  • Aceito
    16 Nov 2023
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