Fatores associados à autoavaliação negativa da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos: resultados do projeto Bambuí

Antônio Ignácio de Loyola Filho Josélia de Oliveira Araújo Firmo Elizabeth Uchôa Maria Fernanda Lima-Costa Sobre os autores

Resumo

Objetivo:

O presente estudo teve como objetivo investigar os fatores associados à autoavaliação negativa da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos. Metodologia: Foram selecionados para o presente estudo todos os idosos integrantes da linha base da coorte do Projeto Bambuí, que sofriam de hipertensão e/ou diabetes e que responderam o questionário sem ajuda de informante próximo (n = 942). As covariáveis englobaram características sociodemográficas, recursos sociais, comportamentos relacionados à saúde, condições de saúde e de utilização de serviços de saúde.

Resultados:

A pior autoavaliação da saúde apresentou-se positivamente associada à insatisfação com as relações sociais (RP = 1,98; IC95% 1,42 - 2,76), frequência a cultos religiosos menor que uma vez ao mês (RP = 1,96; IC95% 1,44 - 2,68; ser tabagista (RP = 1,64; IC95% 1,24 - 2,17), presença de artrite (RP = 1,35; IC95% 1,07 - 1,71), sintomas depressivos (RP = 1,81; IC95% 1,37 - 2,39) e insônia (RP = 1,37; IC95% 1,06 - 1,78), ter consultado o médico duas ou mais vezes nos últimos doze meses (RP = 2,18; IC95% 1,14 - 4,19 e RP = 3,96; IC95% 2,10 - 7,48, respectivamente para "2-3" e "4+" consultas) e ser hipertenso e diabético (comparado à presença isolada de hipertensão, RP = 1,43; IC95% 1,07 - 1,92).

Conclusões:

Nossos resultados confirmaram o caráter multidimensional da autoavaliação da saúde e apresentaram-se consistentes com o observado em outros estudos nacionais e internacionais.

Idoso; Hipertensão; Diabetes; Auto-avaliação da saúde


Introdução

O envelhecimento populacional brasileiro nos anos recentes é inquestionável e vem ocorrendo rapidamente11. Carvalho JAM, Rodriguez-Wong LL. A transição da estrutura etária da população brasileira na primeira metade do século XXI. Cad Saude Publica 2008; 24(3): 597-605.. Como esse segmento populacional convive mais frequente e intensamente com doenças e incapacidade, e utiliza mais os serviços de saúde, cresce o interesse científico no impacto desse processo sobre o padrão de morbimortalidade da população brasileira22. Lima-Costa MF, Loyola Filho AI, Matos DL. Tendências nas condições de saúde e uso de serviços de saúde entre idosos brasileiros: um estudo baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (1998, 2003). Cad Saude Publica 2007; 23(10): 2467-78. , 33. Loyola Filho AI, Matos DL, Giatti L, Afradique ME, Peixoto SV, Lima-Costa MF. Causas das internações hospitalares brasileiras no âmbito do Sistêmica Único de Saúde. Epidemiol Serv Saúde 2004, 13(4): 229-38..

Hipertensão e diabetes são doenças comuns ao envelhecimento, e estão entre aquelas que têm sua prevalência aumentada significativamente com o avanço da idade44. Ferreira SRG; Moura EC; Malta DC; Sarno F. Frequência de hipertensão arterial e fatores associados: Brasil, 2006. Rev Saude Publica 2009; 43(Suppl 2): 98-106.. O seu curso sem controle contribui para o aparecimento de novas doenças e agravamento do quadro de saúde dos seus portadores: a hipertensão constitui um fator de risco para ocorrência de outras doenças cardiovasculares, como infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca e acidente vásculo-cerebral, além de doença renal55. Sociedade Brasileira de Cardiologia/Sociedade Brasileira de Hipertensão/Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Suppl.1): 1-51.; por sua vez, as complicações associadas à diabetes incluem retinopatias (com possibilidades de perda de visão), nefropatias (que podem levar à insuficiência renal) e neuropatias periféricas (que podem resultar em úlceras de membros inferiores e até mesmo amputações)66. American Diabetes Association. Diagnosis and classification of diabetes mellitus. Diabetes Care 2010; 33(Suppl 1): S62-S69..

A autoavaliação de saúde constitui uma medida subjetiva, robusta e abrangente, da condição de saúde do indivíduo, que é de fácil operacionalização77. Idler E, Benyamini Y. Self-rated health and mortality: a review of twenty-seven community studies. J Health Soc Behav 1997; 38(1): 21-37.. Ela congrega e resume informações sobre a saúde e o contexto de vida do indivíduo, refletindo fatores biológicos, psicológicos e sociais88. Benyamini Y, Leventhal EA, Leventhal H. Elderly people's ratings of the importance of health-related factors to their self-assessments of health. Soc Sci Med 2003; 56(8): 1661-7.. Possivelmente, sua força como medida de saúde advém da possibilidade de capturar sintomas de doenças ainda não diagnosticadas, incorporar julgamentos sobre severidade da doença e evolução da condição de saúde77. Idler E, Benyamini Y. Self-rated health and mortality: a review of twenty-seven community studies. J Health Soc Behav 1997; 38(1): 21-37.. Em estudos epidemiológicos, ela tem sido um consistente preditor de mortalidade, independente da presença de condições de saúde definidas de maneira objetiva. Isso parece aplicar-se também a populações relativamente menos saudáveis, portadoras de doenças específicas. Por exemplo, entre indivíduos com doenças cardiovasculares99. Idler E, Leventhal H, McLaughlin J, Leventhal E. In sickness but not in health: self-ratings, identity, and mortality. J Health Soc Behav 2004; 45(3): 336-56., a autoavaliação negativa da saúde mostrou-se associado a um maior risco de mortalidade por todas as causas, independente da presença de outras condições de saúde. Associação semelhante foi encontrada entre indivíduos que desenvolveram diabetes tardiamente (com 30 ou mais anos de idade)1010. Dasbach EJ, Klein R, Klein BEK, Moss SE. Self-rated health and mortality in people with diabetes. Am J Public Health 1994; 84(11): 1775-9..

A autoavaliação da saúde pode refletir ainda a disponibilidade de recursos internos (motivações) e externos (recursos sociais) para lidar com a doença77. Idler E, Benyamini Y. Self-rated health and mortality: a review of twenty-seven community studies. J Health Soc Behav 1997; 38(1): 21-37.. Portanto, é plausível supor que conhecer as características associadas à autoavaliação da saúde entre portadores de condições crônicas (como hipertensão e diabetes), permite não só captar juízos sobre o próprio nível de saúde, mas também avaliar o grau de propensão ao controle da doença e seu enfretamento por parte dos indivíduos, e, por conseguinte, identificar aqueles que se encontram sob maiores riscos de piora do quadro da mesma.

Investigações epidemiológicas, de base populacional, focadas na autoavaliação da saúde entre idosos brasileiros ainda são escassas. Eles apontam para a existência de um caráter multidimensional1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. na estrutura da autoavaliação da saúde, tanto para os idosos residentes em metrópoles1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41. quanto para aqueles residentes em pequenas cidades1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. , 1313. Silva RJ, Smith-Menezes A, Tribess S, Rómo-Perez V, Virtuoso JS Jr. Prevalência e fatores associados à percepção negativa da saúde em pessoas idosas do Brasil. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(1): 49-62.. Na cidade de São Paulo, características sociodemográficas (sexo, idade, morar sozinho, situação conjugal, escolaridade e renda) e condições de saúde (número de condições crônicas e capacidade funcional) apresentaram-se associadas à autoavaliação da saúde. Características demográficas (idade, entre homens) e condições de saúde (risco de desnutrição entre homens, hipertensão arterial entre mulheres e incapacidade funcional, em ambos) estiveram positivamente associados à autoavaliação negativa da saúde entre idosos residentes em municípios interioranos de três regiões brasileiras distintas1313. Silva RJ, Smith-Menezes A, Tribess S, Rómo-Perez V, Virtuoso JS Jr. Prevalência e fatores associados à percepção negativa da saúde em pessoas idosas do Brasil. Rev Bras Epidemiol 2012; 15(1): 49-62.. Em Bambuí, Minas Gerais, a multidimensionalidade da estrutura da autoavaliação da saúde se revelou ampliada, incorporando, além de características socioeconômicas (renda) e de condições de saúde específicas (sintomas depressivos e distúrbios de sono), aspectos ligados a recursos sociais (grau de satisfação com os seus relacionamentos pessoais) e à utilização de serviços de saúde (número de consultas médicas e relato de problemas quando precisaram desse atendimento, consumo de medicamentos prescritos e histórico de internação hospitalar)1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34.. Um estudo adicional com idosos bambuienses demonstrou ainda que os componentes da estrutura da autoavaliação da saúde podem variar em função do contexto, pois entre os idosos de menor renda, a insatisfação com as relações sociais e a utilização de serviços de saúde foram mais importantes para a autoavaliação da saúde do que problemas de saúde vivenciados e dificuldades em acessar os serviços de saúde1414. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. Differences in self-rated health among older adults according to socioeconomic circumstances: the Bambuí Health and Aging Study. Cad Saude Publica 2005; 21(3): 830-9..

Contudo, ao nosso conhecimento, os determinantes da autoavaliação da saúde ainda não foram investigados entre idosos brasileiros portadores de hipertensão e/ou diabetes. Com base no exposto até aqui, o presente trabalho, de caráter exploratório, investigou quais características estariam associadas à avaliação subjetiva da saúde entre idosos com as doenças acima mencionadas.

Metodologia

Esta investigação se insere no Projeto Bambuí, um estudo longitudinal sobre envelhecimento e saúde, desenvolvido no município de mesmo nome, localizada na região oeste do estado de Minas Gerais, e que contava em 1997 com uma população de 20.573 habitantes. A população de Bambuí permaneceu estável entre as décadas de 1971 e 1990; no mesmo período, a expectativa de vida passou de 59,9 para 70,2 anos. As doenças cardiovasculares eram a principal causa de morte em 1991 e a segunda causa de internação hospitalar pública em 1993. Em 1997, a população residente na cidade foi recenseada pela equipe de pesquisadores vinculada ao projeto, e todos com idade igual ou superior a 60 anos foram selecionados para compor a linha-base da coorte. O censo identificou 1.742 idosos elegíveis para o estudo, dos quais 1.606 (92,2%) foram entrevistados e 1.496 (85,9%) foram examinados (exames de sangue, exames laboratoriais, testes físicos e eletrocardiograma). A população idosa entrevistada e examinada apresentou-se semelhante à população idosa recenseada em termos de sexo, idade, situação conjugal, renda familiar e escolaridade. Maiores detalhes podem ser vistos em outra publicação1515. Costa MF, Uchoa E, Guerra HL, Firmo JOA, Vidigal PG, Barreto SM. The Bambuí Health and Ageing Study 9BHAS): methodological approach and preliminary results of a population-based cohort study of the elderly in Brazil. Rev Saude Publica 2000; 34(2): 126-35..

Foram selecionados para o presente estudo todos os idosos integrantes da linha-base da coorte do Projeto Bambuí, que sofriam de hipertensão e/ou diabetes e que responderam o questionário sem ajuda de informante próximo na linha-base do estudo1515. Costa MF, Uchoa E, Guerra HL, Firmo JOA, Vidigal PG, Barreto SM. The Bambuí Health and Ageing Study 9BHAS): methodological approach and preliminary results of a population-based cohort study of the elderly in Brazil. Rev Saude Publica 2000; 34(2): 126-35.. Foram considerados hipertensos os idosos que apresentaram valores iguais ou superiores a 140/90 mmHg para, respectivamente, pressão sistólica e diastólica, e/ou referiram uso de medicamentos anti-hipertensivos55. Sociedade Brasileira de Cardiologia/Sociedade Brasileira de Hipertensão/Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Suppl.1): 1-51.. As medidas de pressão arterial foram obtidas com o indivíduo sentado, após 5 minutos de descanso e considerando um hiato de consumo de cigarros e/ou cafeína de 30 minutos. Foram feitas três medidas de pressão arterial, tendo sido utilizado os valores resultantes da média aritmética entre a segunda e terceira medidas. Para classificar o idoso como diabético, foram utilizados valores de glicose plasmática iguais ou superiores a 126 mm/dL e/ou referência ao uso de medicamentos antidiabéticos6. Os valores para glicemia foram fornecidos por exames bioquímicos. Todas as informações sobre uso de medicamentos foram obtidas por meio de questionário1515. Costa MF, Uchoa E, Guerra HL, Firmo JOA, Vidigal PG, Barreto SM. The Bambuí Health and Ageing Study 9BHAS): methodological approach and preliminary results of a population-based cohort study of the elderly in Brazil. Rev Saude Publica 2000; 34(2): 126-35..

A autoavaliação da saúde (variável dependente) foi mensurada por meio da resposta à pergunta "No momento atual, você considera sua saúde: muito boa, boa, razoável, ruim ou muito ruim?". Para a etapa de análise dos dados, a variável foi dicotomizada: as respostas "ruim/muito ruim" foram agregadas na categoria avaliação negativa e as demais constituíram a categoria avaliação positiva.

Na investigação dos fatores associados à autoavaliação da saúde, foram consideradas características sociodemográficas, recursos sociais, comportamentos relacionados à saúde, indicadores de condições de saúde e de utilização de serviços de saúde. As características sociodemográficas foram sexo, idade (faixas etárias 60 - 69, 70 - 79 e 80+), situação conjugal (casado/mora junto; viúvo e solteiro/separado), escolaridade em anos de frequência à escola (nenhum, 1 - 3 e 4+) e renda familiar mensal em número de salários mínimos (< 2, 2 - 3,9 e > 4). Os recursos sociais investigados foram: o grau de satisfação com as relações sociais (satisfeito; indiferente; insatisfeito) e frequência a cultos religiosos (1 vez ou mais por semana; 1 - 3 vezes ao mês e menos de 1 vez ao mês).

No que diz respeito aos comportamentos relacionados à saúde, investigou-se a frequência de prática de exercícios físicos nos períodos de lazer nos últimos 90 dias (< 3 vezes por semana versus ≥ 3 vezes por semana), histórico de tabagismo (nunca fumou; ex-fumante; fumante atual) e frequência de consumo de bebidas alcoólicas (não bebeu/nunca bebeu; < 3 vezes na semana; ≥ 3 vezes na semana).

Os indicadores de condição de saúde incluíram: doença coronariana, artrite/reumatismo, presença de anticorpos para o Trypanosoma cruzi, sintomas depressivos e ansiosos (últimos 15 dias), insônia (últimos 30 dias) e disfunção cognitiva. Foi analisado também o status do participante em relação à hipertensão e diabetes, com base em três categorias: ser hipertenso apenas, ser diabético apenas e ser hipertenso e diabético. O relato de diagnóstico médico foi considerado para doença coronariana (angina e/ou infarto do miocárdio) e artrite/reumatismo.

A presença de anticorpos para o T. cruzi foi detectada por meio de reações de hemaglutinação e ELISA, considerando positivo o indivíduo que apresentou a reação nos dois testes1515. Costa MF, Uchoa E, Guerra HL, Firmo JOA, Vidigal PG, Barreto SM. The Bambuí Health and Ageing Study 9BHAS): methodological approach and preliminary results of a population-based cohort study of the elderly in Brazil. Rev Saude Publica 2000; 34(2): 126-35.. A presença de sintomas depressivos e ansiosos foi identificada por meio da aplicação da versão de 12 perguntas do General Health Questionnaire (GHQ)16, validado no Brasil1717. Mari JJ, Williams P. A comparison of the validity of two psychiatric screening questionnaires (GHQ-12 and SRQ-20) in Brazil, using Relative Operating Characteristic (ROC) analysis. Psychol Med 1985; 15(3): 651-9., tendo sido adotado o ponto de coorte ≥ 4 para classificação positiva do respondente. Em estudo prévio realizado nesta população, demonstrou-se que o GHQ-12 apresentou a mesma capacidade de rastreamento de sintomas depressivos que o GDS-301818. Costa E, Barreto SM, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF, Prince M. Is the GDS-30 better than the GHQ-12 for screening depression in elderly people in the community? The Bambuí Health Aging Study (BHAS). Int Psychogeriatr 2006; 18(3): 493-503.. Além disso, o GHQ-12 apresenta a possibilidade de rastreamento de outros transtornos mentais comuns como ansiedade e transtorno somatoforme1616. Goldberg DP, Hillier VF. A scaled version of the General Health Questionnaire. Psychol Med 1979; 9(1): 139-45.. Foi definida a presença de insônia no indivíduo que relatou dificuldade de iniciar ou manter o sono e/ou despertar precocemente, com uma frequência de 3 vezes por semana nos últimos 30 dias, e que resultou em prejuízo de suas funções1919. Rocha FL, Guerra HL, Lima-Costa MF. Prevalence of insomnia and associated socio-demographic factors in a Brazilian community: the Bambui study. Sleep Med 2002; 3(2): 121-6.. O participante que apresentou pontuação inferior a 22 para o exame Mini-Mental foi classificado como positivo para a disfunção cognitiva2020. Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. Mini-Mental State": a practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res 1975; 12(3): 189-98. , 2121. Castro-Costa E, Fuzikawa C, Uchoa E, Firmo JO, Lima-Costa MF. Norms for the Mini-Mental State examination: adjustment of the cut-off point in population-based studies (evidences from The Bambuí Health Aging Study). Arq Neuropsiquiatr 2008; 66(3-A): 524-8.. Ainda nas condições de saúde, o consumo de medicamentos prescritos foi incluído como marcador da presença de outras condições de saúde que não aquelas acima especificadas. Para avaliar a funcionalidade, considerou-se o relato de incapacidade para realizar pelo menos uma Atividade Básica de Vida Diária - AVD (entre vestir-se, alimentar-se, deitar/levantar da cama e/ou cadeira, usar banheiro e mover-se pelos cômodos da casa).

Em relação à utilização de serviços de saúde, foram consideradas as seguintes variáveis: histórico de internação hospitalar (sim versus não), número de consultas médicas nos últimos 12 meses (nenhuma; 1; 2 - 3; 4+), cobertura por plano de saúde (sim versus não) e relato do principal problema enfrentado quando necessitou de serviços médicos ("não teve problema"; "distância ou preço da consulta ou fila para agendamento" e "outros").

As características dos idosos que avaliaram negativamente a sua saúde foram comparadas às daqueles que a avaliaram positivamente, utilizando para tal, o teste do qui-quadrado de Pearson. Aquelas variáveis que, nesse nível de análise, apresentaram-se associadas à autoavaliação da saúde ao nível de significância estatística p < 0,20, foram selecionadas para inclusão no modelo multivariado. A análise multivariada foi feita com base no modelo de regressão de Poisson, que forneceu estimativas de Razões de Prevalências ajustadas e respectivos intervalos de confiança 95% robustos2222. Long JS, Freese J. Regression models for categorical dependent variables using Stata. 2nd ed. Texas: Stata Press, College Station; 2006.. Variáveis que, no modelo multivariado, permaneceram associadas ao evento ao nível de significância p < 0,05 foram mantidas no modelo final e consideradas independentemente associadas ao evento investigado. O pacote estatístico utilizado na análise foi o Stata(r), v. 10.

A presente investigação foi desenvolvida respeitando os preceitos éticos de pesquisas com seres humanos e foi aprovado pelo Comitê de Ética da Fundação Oswaldo Cruz. Não existem conflitos de interesses dos autores com as agências financiadoras ou de outra ordem.

Resultados

Entre os idosos integrantes da linha-base do Projeto Bambuí (n = 1.606), 942 eram hipertensos e/ou diabéticos e foram incluídos no presente estudo. Deste total, 730 (77,5%) eram apenas hipertensos, 62 (6,6%) eram somente diabéticos e 150 (15,9%) eram hipertensos e diabéticos. A maioria dos participantes era do sexo feminino (618 ou 65,6%) e apresentaram idade média de 68,9 anos (variando entre 60 e 93 anos). Do total, 450 (47,8%) eram casados, 345 (36,6%) viúvos e 147 (15,6%) solteiros ou separados; a escolaridade e renda familiar baixas predominaram: 63,7% tinham menos de 4 anos de frequência à escola regular e ⅔ integravam famílias com renda mensal inferior a 4 salários mínimos vigentes à época da pesquisa (1 SM = R$ 120,00).

A proporção de idosos que avaliaram negativamente a sua saúde foi de 20,1% (n = 189). A Tabela 1 descreve os resultados das análises univariadas para as características sociodemográficas e os recursos sociais associadas à autoavaliação da saúde. Entre as características sociodemográficas, apenas a escolaridade e a renda familiar (ambas com p < 0,001) apresentaram-se significativamente associadas ao evento, sendo que os idosos de pior renda e mais baixa escolaridade avaliaram negativamente a sua própria saúde, em comparação com aqueles das maiores faixas de escolaridade e de renda. Idosos do sexo feminino, mais jovens (60 - 69 anos) e viúvos avaliaram pior a sua saúde, mas os resultados não foram significativos. No tocante aos recursos sociais, todas as variáveis apresentaram associação significativa (p < 0,05) com a autoavaliação da saúde, sendo a avaliação negativa significativamente mais prevalente entre aqueles insatisfeitos com as relações sociais e entre os que foram menos assíduos a cultos religiosos.

Tabela 1
- Distribuição da autoavaliação da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos, segundo características sociodemográficas e recursos sociais, Bambuí, Minas Gerais, 1997.

Todas as variáveis de comportamento de saúde apresentaram-se associadas à autoavaliação da saúde, ao nível de p < 0,05. Os idosos hipertensos e/ou diabéticos que praticavam exercícios físicos com maior frequência (p = 0,005) avaliaram positivamente a sua saúde, por outro lado, os fumantes e ex-fumantes (p < 0,001) avaliaram negativamente a sua saúde. O consumo de bebidas alcoólicas esteve associado à autoavaliação da saúde, mas a diferença foi marcante apenas em idosos com consumo inferior a 3 vezes na semana, que avaliaram positivamente a sua saúde em comparação àqueles que nunca beberam ou que não o fizeram nos últimos 12 meses (Tabela 2).

Tabela 2
- Distribuição da autoavaliação da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos, segundo comportamentos de saúde, Bambuí, Minas Gerais, 1997.

Os resultados relativos às análises univariadas para as condições de saúde e capacidade funcional podem ser observados na Tabela 3. Com exceção da doença coronariana e do status do participante em relação à hipertensão/diabetes, todas as demais condições de saúde apresentaram-se associadas (p < 0,05) ao evento investigado. A avaliação negativa da saúde foi mais prevalente ainda entre idosos com incapacidade para pelo menos uma AVD (p < 0,001).

Tabela 3
- Distribuição da autoavaliação da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos, segundo condições de saúde, funcionalidade física e status em relação à hipertensão e diabetes, Bambuí, Minas Gerais, 1997.

No tocante às características relacionadas à utilização de serviços de saúde, a prevalência da avaliação negativa da saúde foi significativamente maior entre aqueles com histórico de internação hospitalar nos últimos 12 meses e entre aqueles que consultaram um médico no mesmo período, bem como entre os que relataram ter enfrentado algum problema (distância do serviço, preço da consulta ou fila) quando necessitou de serviços médicos (em todos os casos, p < 0,001). Já aqueles com cobertura de plano de saúde apresentaram uma avaliação negativa da saúde menor, comparado àqueles sem cobertura (p = 0,002) (Tabela 4).

Tabela 4
- Distribuição da autoavaliação da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos, segundo algumas características relacionadas à utilização de serviços de saúde, Bambuí, Minas Gerais, 1997.

Na Tabela 5 encontram-se descritos os resultados finais da análise multivariada dos fatores associados à autoavaliação da saúde. Em comparação com os idosos com renda familiar mensal inferior a 2 salários mínimos, aqueles com renda familiar mensal mais elevada apresentaram prevalências da avaliação negativa da saúde significativamente menores: RP = 0,68 (IC95% 0,53 - 0,88) para os de renda entre 2 - 3,9 salários mínimos e RP = 0,52 (IC95% 0,36-0,73) para os de renda igual ou superior a 4 salários mínimos. Associações positivas e independentes com autoavaliação negativa da saúde foram observadas para insatisfação com as relações sociais (RP = 1,98; IC95% 1,42 - 2,76), frequência a cultos religiosos menor que uma vez ao mês (RP = 1,96; IC95% 1,44 - 2,68) e fumantes (RP = 1,64; IC95% 1,24 - 2,17). Ter artrite ou reumatismo (RP = 1,35; IC95% 1,07 - 1,71), apresentar sintomas depressivos e ansiosos (RP = 1,81; IC95% 1,37 - 2,39) e ter insônia nos últimos 30 dias (PR = 1,37; IC95% 1,06 - 1,78) foram as condições de saúde que permaneceram independente e positivamente associadas à avaliação negativa da saúde. Ser hipertenso e diabético (em relação a ser hipertenso apenas) esteve independente e positivamente associado à pior autoavaliação da saúde (RP = 1,43; IC95% 1,07 - 1,92). No que diz respeito à utilização de serviços de saúde, apenas ter consultado o médico 2 ou mais vezes nos últimos 12 meses (RP = 2,18; IC95% 1,14-4,19 e RP = 3,96; IC95% 2,10 - 7,48, respectivamente para "2 - 3" e "4+" consultas) permaneceu independentemente associado à autoavaliação negativa da saúde.

Tabela 5
- Resultados finais da análise multivariada dos fatores associados à autoavaliação da saúde entre idosos hipertensos e/ou diabéticos, Bambuí, Minas Gerais, 1997.

Discussão

Os resultados da presente investigação mostraram que todas as dimensões investigadas - sociodemográficas, relações sociais, hábitos de vida, condições de saúde e utilização de serviços de saúde - integram a estrutura da autoavaliação da saúde da população idosa com hipertensão e/ou diabetes. Nesse aspecto, os resultados encontrados junto a esta população são algo semelhante àqueles verificados na população idosa total, que incluía também idosos sem essas doenças1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34..

Ter consultado um médico duas ou mais vezes foi a característica mais fortemente associada à avaliação negativa da saúde entre os idosos hipertensos e/ou diabéticos. A associação positiva entre pior autoavaliação da saúde e consultas médicas está presente em outras populações2323. Smith PM, Glazier RH, Sibley LM. The predictors of self-rated health and the relationship between self-rated health and health service needs are similar across socioeconomic groups in Canada. J Clin Epidemiol 2010; 63(4): 412-21.

24. Miilumpalo S, Vuori I, Oja P, Pasanen M, Urponen H. Self-rated health status as a health measure: the predictive value of self-reported health status on the use of physician services and on mortality in the working-age population. J Clin Epidemiol 1997; 50(5): 517-28.
- 2525. Damian J, Ruigomez A, Pastor V, Martin-Moreno JM. Determinants of self assessed health among Spanish older people living at home. J Epidemiol Community Health 1999; 53(7): 412-6. e na população total de idosos bambuienses1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34.. Essa associação parece ter um caráter bidirecional. Em um estudo longitudinal desenvolvido na Finlândia, a autoavaliação da saúde apareceu como um consistente preditor da utilização de serviços médicos2424. Miilumpalo S, Vuori I, Oja P, Pasanen M, Urponen H. Self-rated health status as a health measure: the predictive value of self-reported health status on the use of physician services and on mortality in the working-age population. J Clin Epidemiol 1997; 50(5): 517-28.. De outro modo, a autoavaliação da saúde pode ser determinada pelo que o paciente ouve do seu médico durante a consulta88. Benyamini Y, Leventhal EA, Leventhal H. Elderly people's ratings of the importance of health-related factors to their self-assessments of health. Soc Sci Med 2003; 56(8): 1661-7. e as experiências positivas com a atenção primária à saúde (especialmente no tocante ao acesso e à relação interpessoal) podem influenciar positivamente a autoavaliação da saúde, em particular quando a desigualdade socioeconômica é mais marcante2626. Shi L, Starfield B, Politzer R, Regan J. Primary care, self-rated health, and reductions in social disparities in health. Health Serv Res 2002; 37(3): 529-50.. O caráter transversal do presente estudo não permite definir se nesta população, a autoavaliação determina ou é determinada pela utilização de serviços de saúde. De qualquer maneira, para os gestores desses serviços, essa associação tem relevância: de um lado, o monitoramento da autoavaliação da saúde pode ser um importante indicador de mudanças nas necessidades de demanda por serviços de saúde, e de outro, garantir uma assistência à saúde de qualidade pode resultar em mudanças positivas nas expectativas de saúde por parte dos usuários. Essa questão ganha uma importância maior, se levarmos em conta que para os hipertensos e diabéticos, o acompanhamento constante por parte dos serviços de saúde é fundamental para o controle da doença e prevenção de piora no quadro de saúde.

As condições crônicas de saúde têm sido os fatores mais consistentemente associados à autoavaliação da saúde2525. Damian J, Ruigomez A, Pastor V, Martin-Moreno JM. Determinants of self assessed health among Spanish older people living at home. J Epidemiol Community Health 1999; 53(7): 412-6.. De fato, populações com diferenças socioculturais e de organização e oferta de serviços de saúde apresentam esse padrão de associação, seja em relação à comorbidades1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41. , 2525. Damian J, Ruigomez A, Pastor V, Martin-Moreno JM. Determinants of self assessed health among Spanish older people living at home. J Epidemiol Community Health 1999; 53(7): 412-6. ou a morbidades específicas1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. , 2323. Smith PM, Glazier RH, Sibley LM. The predictors of self-rated health and the relationship between self-rated health and health service needs are similar across socioeconomic groups in Canada. J Clin Epidemiol 2010; 63(4): 412-21. , 2727. Molarius A, Janson S. Self-rated health, chronic diseases, and symptoms among middle-aged and elderly men and women. J Clin Epidemiol 2002; 55(4): 364-70.. No presente trabalho, a autoavaliação negativa esteve associada à presença de sintomas depressivos, insônia e artrite/reumatismo, indicando que essas parecem ser as condições de saúde privilegiadas pelos idosos hipertensos e/ou diabéticos no julgamento da própria saúde. Esses achados assemelham-se ainda ao observado na população idosa total de Bambuí1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34.: também entre eles, os sintomas depressivos e a insônia apresentaram associações parecidas, em termos de intensidade e direção. A experiência prévia com a doença, ou aquelas advindas dos encontros com profissionais de saúde e da observação da saúde de familiares e amigos podem estar na base dessa associação. Como sustentam Idler et al.99. Idler E, Leventhal H, McLaughlin J, Leventhal E. In sickness but not in health: self-ratings, identity, and mortality. J Health Soc Behav 2004; 45(3): 336-56., essas experiências moldam o conhecimento do indivíduo sobre saúde e embasam os julgamentos subjetivos a respeito.

Não foi observada diferença na auto-avaliação da saúde entre idosos hipertensos não diabéticos e idosos diabéticos sem hipertensão, mas os idosos hipertensos e diabéticos avaliaram pior sua própria saúde em comparação aos primeiros: a prevalência da autoavaliação negativa da saúde foi 43% maior entre os últimos. É sabido que a associação entre hipertensão arterial e diabetes aumenta a mortalidade cardiovascular entre 40 e 70% e acelera o desenvolvimento da nefropatia2828. Espuny JLC. Diabetes e hypertension: uma epidemia creciente y costosa. Atención Primaria 2006; 38(10): 542-3.. Por outro lado, um rígido controle da pressão arterial pode significar um aumento nos intervalos de tempo sem complicações decorrentes dessas patologias, redução dos custos no seu controle e tratamento, bem como da mortalidade consequente a elas2929. UK Prospective Diabetes Study Group. Cost effectiveness analysis in improved blood pressure control in hypertension patients with type 2 diabetes. BMJ 1998; 317(7160): 720-6.. O controle da pressão arterial depende, por sua vez, da motivação para aderir a um estilo de vida saudável e cumprir o regime terapêutico55. Sociedade Brasileira de Cardiologia/Sociedade Brasileira de Hipertensão/Sociedade Brasileira de Nefrologia. VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão. Arq Bras Cardiol. 2010; 95(1 Suppl.1): 1-51.. Considerando a associação entre a autoavaliação da saúde e a motivação para lidar com os problemas de saúde experimentados77. Idler E, Benyamini Y. Self-rated health and mortality: a review of twenty-seven community studies. J Health Soc Behav 1997; 38(1): 21-37., os resultados do presente estudo preocupam, pois esses idosos que avaliaram negativamente sua saúde podem estar menos propensos ao enfrentamento dessas patologias e, portanto. sob maiores riscos de complicações.

Em diferentes estudos junto a populações idosas, renda e classe social apresentam-se associadas à autoavaliação da saúde, com os idosos menos favorecidos socioeconomicamente avaliando pior sua saúde1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. , 1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41. , 2525. Damian J, Ruigomez A, Pastor V, Martin-Moreno JM. Determinants of self assessed health among Spanish older people living at home. J Epidemiol Community Health 1999; 53(7): 412-6. , 2626. Shi L, Starfield B, Politzer R, Regan J. Primary care, self-rated health, and reductions in social disparities in health. Health Serv Res 2002; 37(3): 529-50. , 3030. Lima-Costa MF, Barreto S, Giatti L, Uchoa E. Desigualdade social e saúde entre idosos brasileiros: um estudo baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Cad Saude Publica 2003; 19(3): 745-57.. Nossos resultados mostram que o mesmo ocorre entre os idosos com hipertensão e/ou diabetes residentes em Bambuí. Essa associação pode refletir uma percepção mais acentuada da morbidade entre pessoas de renda mais baixa, ligada, por sua vez, ao receio de prejuízo na manutenção da força de trabalho, uma necessidade que é mais premente entre elas1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41..

O caráter multidimensional da estrutura da autoavaliação da saúde se completa na observação de associação desta variável com comportamentos de risco em saúde (no caso, tabagismo) e com aspectos de suporte social (no caso, insatisfação com as relações sociais e menor frequência a cultos religiosos). A associação entre tabagismo e avaliação negativa da saúde é consistente com a literatura3131. Manderbacka K, Lundberg O, Martikainen P. Do risk factors and health behaviours contribute to self-rating of health? Soc Sci Med 1999; 48(12): 1713-20. , 3232. Cott CA, Gignac MA, Badley EM. Determinants of self rated health for Canadians with chronic disease and disability. J Epidemiol Community Health 1999; 53(11): 731-6. e indica que ideias sobre comportamentos de risco em saúde são considerados na avaliação subjetiva da saúde, independente da presença de doenças ou problemas de saúde consequentes a elas3131. Manderbacka K, Lundberg O, Martikainen P. Do risk factors and health behaviours contribute to self-rating of health? Soc Sci Med 1999; 48(12): 1713-20.. Nossos achados que associam a insatisfação com relações pessoais e uma menor frequência a cultos religiosos ao julgamento negativo de sua própria saúde reforçam a importância do suporte social na determinação da autoavaliação da saúde, corroborando o observado em outras populações3333. Gorman BK, Sivaganesan A. The role of social support and integration for understanding socioeconomic disparities in self-rated health and hypertension. Soc Sci Med 2007; 65(5): 958-75. , 3434. Melchior M, Berkman LF, Niedhammer I, Chea M, Goldberg M. Social relations and self-reported health: a prospective analysis of the French Gazel cohort. Soc Sci Med 2003; 56(8): 1817-30.. Considerando algumas características da população estudada, como faixa etária (60 ou mais anos), nível de escolaridade predominantemente baixo e presença de doenças que demandam cuidado contínuo (hipertensão e diabetes), esse achado cresce de importância em função das evidências de que uma maior integração social pode melhorar a autoavaliação da saúde de pessoas com baixa escolaridade, aposentados e que enfrentam barreiras para o acesso ao cuidado à saúde3333. Gorman BK, Sivaganesan A. The role of social support and integration for understanding socioeconomic disparities in self-rated health and hypertension. Soc Sci Med 2007; 65(5): 958-75..

Uma importante limitação do presente estudo diz respeito ao seu caráter transversal, que restringe o alcance da interpretação dos resultados, especialmente se considerarmos as associações com utilização de serviços de saúde e presença de doenças. Dada a impossibilidade de estabelecer a diacronia entre exposição e evento, não é possível afirmar se as condições de saúde e a utilização de serviços de saúde determinam ou são determinadas pela autoavaliação da saúde. Por outro lado, a força da presente investigação reside no fato de ser de base populacional e nos cuidados metodológicos relativos à condução do trabalho de campo, como padronização dos instrumentos e processos da coleta de dados, e treinamento exaustivo dos coletores de dados1515. Costa MF, Uchoa E, Guerra HL, Firmo JOA, Vidigal PG, Barreto SM. The Bambuí Health and Ageing Study 9BHAS): methodological approach and preliminary results of a population-based cohort study of the elderly in Brazil. Rev Saude Publica 2000; 34(2): 126-35.. Outro ponto positivo consiste na discriminação das condições crônicas de saúde utilizadas como covariáveis. De maneira similar ao estudo que envolveu toda a população idosa bambuiense1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. e diferentemente de outros trabalhos que utilizaram a quantificação de doenças crônicas de forma indiferenciada1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41. , 3232. Cott CA, Gignac MA, Badley EM. Determinants of self rated health for Canadians with chronic disease and disability. J Epidemiol Community Health 1999; 53(11): 731-6., foi possível identificar quais condições de saúde, entre aquelas incluídas na investigação, impactavam de alguma forma a autoavaliação da saúde.

Em resumo, nossos resultados são consistentes com o observado em estudos nacionais1111. Lima-Costa MF, Firmo JOA, Uchoa E. A estrutura da auto-avaliação da saúde entre idosos: Projeto Bambuí. Rev Saude Publica 2004; 38(6): 827-34. , 1212. Alves LC, Rodrigues RN. Determinantes da auto-percepção de saúde entre idosos do município de São Paulo, Brasil. Rev Panam Salud Publica 2005; 17(5-6): 333-41. , 3030. Lima-Costa MF, Barreto S, Giatti L, Uchoa E. Desigualdade social e saúde entre idosos brasileiros: um estudo baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Cad Saude Publica 2003; 19(3): 745-57. e internacionais2323. Smith PM, Glazier RH, Sibley LM. The predictors of self-rated health and the relationship between self-rated health and health service needs are similar across socioeconomic groups in Canada. J Clin Epidemiol 2010; 63(4): 412-21.

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Correspondência: Antônio Ignácio de Loyola Filho Avenida Augusto de Lima 1715, 6o andar CEP: 30190-003, Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: aloy@cpqrr.fiocruz.br
Fonte de financiamento: Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) - processo 66940009-00.
Conflito de interesses: nada a declarar.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2013

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2011
  • Revisado
    15 Jun 2012
  • Aceito
    31 Out 2012
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br