Excesso de peso entre menores de cinco anos em municípios do semiárido

Isabel Nunes Oppitz Juraci Almeida Cesar Nelson Arns Neumann Sobre os autores

Resumo

OBJETIVO:

Medir a prevalência e identificar fatores associados ao excesso de peso entre menores de cinco anos residentes em dois municípios do semiárido piauiense.

MÉTODOS:

Entrevistadores previamente treinados visitaram todos os domicílios desses municípios e aplicaram às mães das crianças um questionário padrão, buscando informações sobre características demográficas maternas e da criança, nível socioeconômico da família, assistência recebida durante a gestação e na hora do parto, e padrão de amamentação e dieta. O excesso de peso (>+ 1 desvio padrão em relação à mediana da população de referência) foi calculado transformando-se o índice de massa corpórea em escore Z, conforme as curvas da Organização Mundial da Saúde (OMS). Na análise estatística, utilizou-se a regressão de Poisson com ajuste robusto da variância.

RESULTADOS:

A prevalência de excesso de peso entre as 1.640 crianças estudadas foi de 30,2% (IC95% 27,9 - 32,4). Essa prevalência variou de 13,2% entre as nascidas com < 2.500 g a 43,4% entre aquelas com idade entre 12 e 23 meses. A análise ajustada mostrou que crianças com idade entre 48 e 59 meses mostraram RP = 1,42 (1,07 - 1,86) para excesso de peso em relação àquelas com idade entre 0 e 11 meses, enquanto para as pertencentes ao maior quartil de renda RP = 1,44 (1,17 - 1,76) quando comparadas àquelas do menor quartil. Por fim, crianças nascidas com peso ≥ 3.500 g apresentaram RP = 2,32 (1,33 - 4,05) para excesso de peso em relação às nascidas com baixo peso (< 2500 g).

CONCLUSÃO:

Mesmo no semiárido, a prevalência de excesso de peso é elevada, o que evidencia a necessidade de intervenção precoce para reversão do quadro.

Sobrepeso; Obesidade; Crianças; Prevalência; Fatores de risco; Estado nutricional


INTRODUÇÃO

O excesso de peso, além do componente hereditário, decorre do consumo excessivo de alimentos de alta densidade calórica e diminuição da atividade física1. WHO Multicentre Growth Reference Study Group. WHO child growth standards based on length/height, weight and age. Acta Paediatr Suppl 2006; 450: 76-85. , 2. Dietz WH. Health consequences of obesity in youth: childhood predictors of adult disease. Pediatrics 1998; 101(3 pt 2): 518-25.. Crianças com essas condições, particularmente as obesas, apresentam maior risco de desenvolver doenças como hipertensão arterial, acidente vascular cerebral e síndrome metabólica, incluindo hiperlipidemia e diabetes, já no início da vida adulta3. Berenson GS, Srinivasan SR, Wattigney WA, Harsha DW. Obesity and cardiovascular risk in children. Ann N Y Acad Sci 1993; 699: 93-103..

Publicação recente que incluiu 495 estudos de 144 países mostrou prevalência de excesso de peso entre menores de 5 anos de 21,1%, sendo 14,4% com risco de sobrepeso e 6,7% com sobrepeso ou obesidade, e estima que em 2020, 9,1% dos pré-escolares serão obesos4. de Onis M, Blössner M, Borghy E. Global prevalence and trends of overweight and obesity among preschool children. Am J Clin Nutr 2010; 92(5): 1257-64.. Não há dados para o Brasil quanto à prevalência de excesso de peso, exceto para sobrepeso/obesidade (>+2 escore Z). Entre 1996 e 2006, a prevalência desta condição no país manteve-se em 7,2%, enquanto na Região Nordeste foi de 7,0%5. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC, Lima ALL, Silca ACF, Benício MHD. Avaliação antropométrica do estado nutricional de mulheres em idade fértil e crianças menores de cinco anos. In: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS 2006. Dimensões do Processo Reprodutivo e da Saúde da Criança. Série G. Estatística e Informação em Saúde. Ministério da Saúde/Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Brasília, DF; 2009. p. 213-29..

Os fatores associados à ocorrência do excesso de peso são: residir em área urbana, possuir bom nível socioeconômico, boas condições de moradia, acesso e assistência em saúde adequados, boa escolaridade materna, peso ao nascer elevado, ser primogênito e apresentar crescimento acelerado no primeiro ano de vida6. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000; 34(6 Suppl): 52-61.

. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81.

. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26.

. Jesus GM, Vieira GO, Martins CC, Mendes CMC, Castelão ES. Determinants of overweight in children under 4 years of age. J Pediatr 2010; 86(4): 311-6.

10 . Ferreira, HS. Prevalence of extreme anthropometric measurements in children from Alagoas, Northeastern Brazil. Rev Saúde Pública 2010; 44(2): 377-80.

11 . Menezes RCE, Lira PIC, Oliveira JS, Santana SCS, Andrade SLLS, Batista-Filho M. Prevalence and determinants of overweight in preschool children. J Pediatr 2011; 87(3): 231-7.

12 . Victora CG, Barros FC, Cesar JA, Horta BL. Saúde e nutrição das crianças Nordestinas: diagnósticos estaduais 1987-1993. Brasília, DF, UNICEF; 1995.

13 . Ferreira S, Assunção ML, Florêncio TMMT, Lima MAA. Estado Nutricional De Pré-Escolares da Região Semiárida do Estado de Alagoas 2005. In: Chamada Nutricional: um Estudo Sobre a Situação Nutricional de Crianças do Semiárido Brasileiro. Desenvolvimento Social em Debate. Cadernos de Estudos No. 4. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Brasília, DF; 2006. p. 37-42.
- 1414 . Monteiro PO, Victora CG. Rapid growth in infancy and childhood and obesity in later life: a systematic review. Obes Rev 2005; 6(2): 143-54..

Há poucos estudos de base populacional sobre prevalência de excesso de peso nessa faixa etária. Isso porque, até muito recentemente, o interesse sobre o estado nutricional infantil era exclusivamente sobre déficits, sobretudo o de altura/idade6. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000; 34(6 Suppl): 52-61. , 1212 . Victora CG, Barros FC, Cesar JA, Horta BL. Saúde e nutrição das crianças Nordestinas: diagnósticos estaduais 1987-1993. Brasília, DF, UNICEF; 1995.. Estudos encontrados na literatura, além de restritos a sobrepeso e obesidade, são, na sua maioria, limitados a crianças institucionalizadas1515 . Nascimento VG, Schoeps DO, Souza SB, Souza JMP. Risco de sobrepeso e excesso de peso em crianças de pré-escolas privadas e filantrópicas. Rev Assoc Med Bras 2011; 57(6): 657-61., trabalham com amostras e não censos6. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000; 34(6 Suppl): 52-61. , 7. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81. , 9. Jesus GM, Vieira GO, Martins CC, Mendes CMC, Castelão ES. Determinants of overweight in children under 4 years of age. J Pediatr 2010; 86(4): 311-6.

10 . Ferreira, HS. Prevalence of extreme anthropometric measurements in children from Alagoas, Northeastern Brazil. Rev Saúde Pública 2010; 44(2): 377-80.

11 . Menezes RCE, Lira PIC, Oliveira JS, Santana SCS, Andrade SLLS, Batista-Filho M. Prevalence and determinants of overweight in preschool children. J Pediatr 2011; 87(3): 231-7.

12 . Victora CG, Barros FC, Cesar JA, Horta BL. Saúde e nutrição das crianças Nordestinas: diagnósticos estaduais 1987-1993. Brasília, DF, UNICEF; 1995.
- 1313 . Ferreira S, Assunção ML, Florêncio TMMT, Lima MAA. Estado Nutricional De Pré-Escolares da Região Semiárida do Estado de Alagoas 2005. In: Chamada Nutricional: um Estudo Sobre a Situação Nutricional de Crianças do Semiárido Brasileiro. Desenvolvimento Social em Debate. Cadernos de Estudos No. 4. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Brasília, DF; 2006. p. 37-42., são provenientes de inquéritos estaduais1212 . Victora CG, Barros FC, Cesar JA, Horta BL. Saúde e nutrição das crianças Nordestinas: diagnósticos estaduais 1987-1993. Brasília, DF, UNICEF; 1995., regionais1313 . Ferreira S, Assunção ML, Florêncio TMMT, Lima MAA. Estado Nutricional De Pré-Escolares da Região Semiárida do Estado de Alagoas 2005. In: Chamada Nutricional: um Estudo Sobre a Situação Nutricional de Crianças do Semiárido Brasileiro. Desenvolvimento Social em Debate. Cadernos de Estudos No. 4. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome. Brasília, DF; 2006. p. 37-42. ou centros urbanos maiores6. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000; 34(6 Suppl): 52-61. , 8. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26.. Não foi encontrada publicação indexada com metodologia adequada e que tenha tratado do excesso de peso entre menores de cinco anos em município brasileiro localizado em região pobre.

O objetivo deste artigo foi medir a prevalência e identificar fatores associados à ocorrência de excesso de peso entre crianças menores de cinco anos residentes nos municípios de Caracol e Anísio de Abreu, PI, ambos localizados na região do semiárido Nordestino.

MATERIAIS E MÉTODOS

Este estudo foi realizado nos municípios de Anísio de Abreu e Caracol, PI, localizados a cerca de 600 km da capital Teresina e com população estimada em 8,5 e 10,8 mil habitantes, respectivamente1616 . IBGE Cidades. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. (acessado em 28 de agosto de 2010).
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwind...
.

O Estado do Piauí é, atualmente, o terceiro mais pobre do País. A base da economia desses municípios é predominantemente a agricultura e o emprego público. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) avaliado no ano 2000 foi de 0,59 em Caracol e 0,63 em Anísio de Abreu1616 . IBGE Cidades. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. (acessado em 28 de agosto de 2010).
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwind...
, 1717 . Silva IS. Cancer epidemiology: principles and methods. Lyon: World Health Organization &amp; International Agency for Research on Cancer; 1999..

Todas as crianças com idade inferior a cinco anos residentes nas áreas urbana e rural desses municípios entre julho e setembro de 2008 foram elegíveis para o estudo. O delineamento utilizado foi do tipo transversal1818 . PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Brasil. Índice de Desenvolvimento Humano - Municipal, 1991 e 2000 - Todos os municípios do Brasil. Disponível em: http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/IDH-M%2091%2000%20Ranking%20decrescente%20%28pelos%20dados%20de%202000%29.htm. (acessado em 6 de setembro de 2010).
http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/IDH...
.

Para o cálculo do tamanho amostral, a prevalência de excesso de peso (>+1 escore Z para o indicador peso/altura) utilizada foi de 30% e os demais parâmetros utilizados foram os seguintes: erro alfa de 0,05, erro beta de 0,20, exposições variando de 20% a 80%, frequência de desfecho entre não expostos de pelo menos 13% e razão de risco de 1,7. Com base nessa matriz, o estudo deveria incluir pelo menos 1.293 crianças. Esse valor já se encontra acrescido de 5% para eventuais perdas e 15% para controle de potenciais fatores de confusão1919 . Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burton AH, et al. Epi-Info, Version 6: A Word Processing, Database, and Statistics Program for Epidemiology on Microcomputers. Atlanta: Centers of Disease Control and Prevention; 2002. .

Foram utilizados na coleta de dados dois questionários, ambos aplicados à mãe ou ao responsável pela guarda da criança em seu próprio domicílio. O primeiro deles buscava informações sobre características demográficas e reprodutivas maternas, nível socioeconômico e condições de moradia da família; o segundo investigava aspectos relativos à assistência recebida durante a gestação e o parto, características demográficas da criança, bem como padrão de amamentação, dieta e utilização de serviços de saúde. Além disso, no momento da entrevista, a criança era medida para peso e estatura, ou comprimento se menor de dois anos de idade. O peso foi obtido por meio de balança portátil com precisão de 100 g fornecidas pelo UNICEF e instaladas no próprio domicílio da criança. Para o comprimento, foi utilizado infantômetro Harpenden com precisão de 1 mm (Holtain, Crymych, UK) e técnica padronizada, enquanto a altura foi medida com estadiômetros de alumínio com precisão de 1 mm2020 . Barros FC, Victora CG. Epidemiologia da Saúde Infantil: um manual para diagnósticos comunitários São Paulo: Unicef/Hucitec; 1991. .

Para a realização desta pesquisa, 14 candidatos foram previamente selecionados. Esse grupo foi treinado durante cinco dias consecutivos. O treinamento consistiu na leitura do questionário e manual de instruções, simulação de entrevistas e padronização de técnicas antropométricas. O estudo piloto foi conduzido em município vizinho na mesma região, mas não incluído no estudo. Dentre os pré-selecionados, oito foram contratados para atuar como entrevistadores, enquanto os demais permaneceram como suplentes. Os dois supervisores foram previamente definidos em virtude de possuírem ampla experiência nesse tipo de trabalho.

Cada equipe, formada por um supervisor e quatro entrevistadores, ficou responsável pela coleta de dados em um dos municípios. Inicialmente, os supervisores mapearam e numeraram as quadras das áreas urbanas e os povoados da área rural. As duplas de entrevistadores percorreram todos os domicílios, em sentido horário. Havendo no domicílio crianças menores de cinco anos, os questionários eram então aplicados à mãe ou ao responsável pela sua guarda. Ao final de cada dia de trabalho, esses questionários eram codificados pelos próprios entrevistadores e entregues no dia seguinte ao seu respectivo supervisor, o qual enviava à sede do projeto, onde eram revisados e duplamente digitados em ordem inversa, por diferentes bolsistas. Após a digitação de cada bloco de 100 questionários, os bancos eram comparados e, se necessário, corrigidos. Todas essas etapas foram realizadas com o programa Epi-Info 6.041919 . Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burton AH, et al. Epi-Info, Version 6: A Word Processing, Database, and Statistics Program for Epidemiology on Microcomputers. Atlanta: Centers of Disease Control and Prevention; 2002. .

Em relação às variáveis utilizadas neste estudo, algumas necessitam de esclarecimentos adicionais: excesso de peso foi classificado a partir do índice de massa corpórea (IMC) obtido pelo indicador peso/altura por meio do programa Anthro2121 . World Health Organization. WHO Anthro for personal computers: software for assessing growth and development of the world's children (version 3.2.2). Geneva, Switzerland: 2009. Available from: http://www.who.int/childgrowth/software/en/. (acessado em 29 de março de 2012).
http://www.who.int/childgrowth/software/...
. Os valores obtidos nesse cálculo foram convertidos em escore Z de acordo com as Curvas de Crescimento da Organização Mundial de Saúde (OMS)1. WHO Multicentre Growth Reference Study Group. WHO child growth standards based on length/height, weight and age. Acta Paediatr Suppl 2006; 450: 76-85.. Considerou-se como portadora de excesso de peso a criança que apresentou escore Z para IMC >+1 em relação à mediana da população de referência. Assim, nessa categoria foram, então, incluídas todas as crianças com risco de sobrepeso (>+1 a +2), sobrepeso (>+2 a +3) e obesidade (>+3).

A análise descritiva constou das medidas de prevalência, enquanto as análises bruta e ajustada avaliaram o desfecho (ocorrência de excesso de peso) em relação às variáveis independentes. Para variáveis categóricas ordinais (idade da criança, renda familiar, escolaridade, aglomeração, paridade, idade da mãe e peso ao nascer), foi reportado o valor p do teste de tendência linear, enquanto para as demais variáveis usou-se o teste de heterogeneidade de Wald2222 . Kirkwood BR, Sterne JAC. Essentials of medical statistics.2 ed. London: Blackwell Science Ltd; 2003.. Para a análise ajustada dos fatores associados ao excesso de peso, empregou-se modelo conceitual constituído de três níveis2323 . Victora CG, Huttly SR, Fuchs SC, Olinto MT. The role of conceptual frameworks in epidemiological analysis: a hierarchical approach. Int J Epidemiol 1997; 26(1): 224-7. No primeiro nível foram incluídas as variáveis demográficas (sexo, cor da pele da mãe e idade da criança) e socioeconômicas (escolaridade materna e renda familiar), enquanto no segundo nível foram incluídas as variáveis relativas ao ambiente (recebimento de Bolsa Família, área de residência e número de moradores no domicílio); no terceiro e último nível foram adicionadas as variáveis reprodutivas maternas (paridade e idade) e nutricionais (peso ao nascer). O desfecho, por sua vez, foi constituído pela ocorrência de excesso de peso1. WHO Multicentre Growth Reference Study Group. WHO child growth standards based on length/height, weight and age. Acta Paediatr Suppl 2006; 450: 76-85. , 2121 . World Health Organization. WHO Anthro for personal computers: software for assessing growth and development of the world's children (version 3.2.2). Geneva, Switzerland: 2009. Available from: http://www.who.int/childgrowth/software/en/. (acessado em 29 de março de 2012).
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Nesse modelo de regressão, as variáveis eram controladas para aquelas situadas no mesmo nível ou em níveis anteriores. Para manutenção no modelo, o valor p da associação entre a variável independente e o desfecho deveria ser ≤ 0,20. A medida de efeito utilizada foi razão de prevalências (RP) obtida por meio de regressão de Poisson com ajuste robusto da variância. O nível de significância estatística adotado foi 95%2222 . Kirkwood BR, Sterne JAC. Essentials of medical statistics.2 ed. London: Blackwell Science Ltd; 2003.. Todas essas análises foram realizadas utilizando-se o programa Stata versão 11.22424 . StataCorp. Stata statistical software: release 11.2. College Station: Stata Corporation; 2011..

Para o controle de qualidade, utilizou-se o questionário padrão resumido, sendo refeitas 5% das entrevistas junto às mães no próprio domicílio. O principal objetivo dessa prática foi confirmar a realização das entrevistas e comparar as respostas obtidas no questionário com aquelas obtidas pelo entrevistador.

Este projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Pelotas (CEPAS/UFPel). Os princípios éticos foram assegurados aos entrevistados e o termo de consentimento livre e esclarecido foi assinado.

RESULTADOS

Este estudo identificou 1.663 crianças menores de cinco anos nos dois municípios. Desse total, foram obtidas informações sobre 99% delas em Caracol e 98% em Anísio de Abreu. A taxa global de não respondentes foi de 1,4% (23 em 1.663).

A Tabela 1 mostra que as crianças de Caracol constituíam maioria da amostra (56%) e eram mais pobres que as de Anísio de Abreu. Considerando todas as crianças estudadas, a distribuição conforme o sexo foi muito semelhante; 73% eram de pele parda; 10% de suas mães ainda eram adolescentes; 37% de suas mães e famílias possuíam, no máximo, quatro anos de escolaridade e pertenciam ao menor quartil de renda, respectivamente; 43% estavam inscritas no Programa Bolsa Família e 56% residiam em área rural. O número médio de moradores nos domicílios dessas crianças era 4,6; 28% das mães possuíam três ou mais filhos; 5% deles nasceram com baixo peso (< 2.500 g) e a mediana de amamentação total foi de 12,2 meses; 12% haviam sido hospitalizadas nos últimos 12 meses, 45% tinham consultado médico nos últimos três meses e 21% tinham estado doentes nos últimos 15 dias segundo suas mães. O excesso de peso foi encontrado em 30,2% (IC95% 27,9 - 32,4) das crianças estudadas. Dessas, 22% possuíam risco de sobrepeso, 6,4% tinham sobrepeso e 1,8% eram obesas (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das principais variáveis estudadas para crianças menores de cinco anos e mães nos municípios de Caracol (n = 928) e Anísio de Abreu (n = 712), PI, 2008.

A Tabela 2 apresenta a prevalência de excesso de peso conforme categorias das variáveis incluídas no modelo e os resultados das análises bruta e ajustada. A prevalência de excesso de peso variou de 13% entre crianças nascidas com peso inferior a 2.500 g a 43% entre aquelas com idade entre 12 e 23 meses. Após ajuste conforme modelo previamente proposto, verificou-se que quanto maior a idade da criança, a idade materna, o quartil de renda familiar e o peso ao nascer, maior o risco para excesso de peso até os cinco anos de idade nas localidades estudadas. A razão de prevalências (RP) para excesso de peso foi pelo menos 10% maior para crianças com um ano ou mais de idade em relação àquelas de menor idade; filhos cujas mães possuíam 30 anos ou mais de idade mostraram RP = 1,41 (1,10 - 1,82) para excesso de peso em relação aos filhos de mães adolescentes, enquanto crianças pertencentes ao maior quartil de renda apresentaram RP = 1,44 (1,17 - 1,76) para excesso de peso em relação às do menor quartil. Por fim, nascer com peso superior a 3.500 g implicou RP = 2,32 (1,33 - 4,05) para excesso de peso em relação aos nascidos com baixo peso (< 2.500 g).

Tabela 2
Prevalência conforme a categoria da variável e análises bruta e ajustada para excesso de peso entre menores de cinco anos nos municípios de Caracol e Anísio de Abreu, PI, 2008.

DISCUSSÃO

Este estudo mostrou que três em cada dez crianças estudadas apresentavam excesso de peso para a altura segundo escore Z do IMC. Mostrou, ainda, que os principais fatores associados a essa condição foram idade da criança, idade da mãe por ocasião da entrevista, renda familiar e peso ao nascer.

Ao interpretar os resultados aqui apresentados, há que se lembrar que esses dados referem-se a meados de 2008, foram obtidos por meio de um estudo transversal e dizem respeito a uma população muito específica do semiárido nordestino. Logo, é preciso ter cuidado quanto à validação externa dos resultados.

Estudos que incluem risco de sobrepeso (>+1 a +2 escore Z) como excesso de peso são raros no Brasil2525 . Nascimento VG, Schoeps DO, Souza SB, Souza JMP, Leone C. Risco de sobrepeso e excesso de peso em crianças de pré-escolas privadas e filantrópicas. Rev Assoc Med Bras 2011; 57: 657-61.. Isto pode ocorrer em virtude de o termo "risco" indicar apenas uma probabilidade e de, além disso, a obesidade, sua principal manifestação, requerer um tempo relativamente longo para se manifestar e, portanto, diferentes oportunidades para intervenção. No entanto, as doenças cardiovasculares e as endocrinopatias estão aparecendo em idade cada vez mais precoce2. Dietz WH. Health consequences of obesity in youth: childhood predictors of adult disease. Pediatrics 1998; 101(3 pt 2): 518-25. , 3. Berenson GS, Srinivasan SR, Wattigney WA, Harsha DW. Obesity and cardiovascular risk in children. Ann N Y Acad Sci 1993; 699: 93-103., o que é preocupante. Neste estudo, por exemplo, para cada criança obesa há três com sobrepeso e 11 em risco de sobrepeso. O potencial de carga da doença se instalar é expressivo. Considerando ainda que a intervenção precoce tem menor custo e melhor prognóstico, o risco de sobrepeso, o sobrepeso e a obesidade foram tratados em igualdade de importância.

No Brasil, entre 1974-75 e 2006, a prevalência de déficit altura/idade (-2 escores Z) caiu de 37% para 7%, enquanto o déficit de peso para idade (-2 escores Z) reduziu de 6% em 1989 para 2% em 2006. Isso, segundo Monteiro, foi resultado de melhora na educação materna, aumento do poder aquisitivo da população pobre, ampliação expressiva dos cuidados em saúde materno-infantil e, em menor grau, da expansão da rede de abastecimento de água e saneamento básico2626 . Monteiro CA, Benício MH, Konno SC, Silva AC, Lima AL, Conde WL. Causes for the decline in child under-nutrition in Brazil, 1996-2007. Rev Saúde Pública 2009; 43(1): 35-43.. Também entre 1974-75 e 2006, a obesidade infantil (peso/altura >+2 escores Z) se estabilizou em 6 - 7%2626 . Monteiro CA, Benício MH, Konno SC, Silva AC, Lima AL, Conde WL. Causes for the decline in child under-nutrition in Brazil, 1996-2007. Rev Saúde Pública 2009; 43(1): 35-43., ao contrário da obesidade entre adolescentes e adultos, que aumentou no período, assim como as doenças não transmissíveis que constituem a principal fonte de carga de doenças no País2727 . Schmidt MI, Duncan BB, Silva GA, Menezes AMB, Monteiro CA, Barreto SM, Chor D, Menezes PR. Chronic non-communicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet 2011; 377(9781): 1949-61..

Apesar dessa aparente estagnação, há estudos bem delineados em áreas urbanas de diferentes localidades mostrando aumento do sobrepeso/obesidade entre pré-escolares8. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26. , 2828 . Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade da infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000: 34(Suppl): 52-61.. Em Pelotas (RS), a prevalência de sobrepeso/obesidade passou de 6,5% em 1982 para 8,2% em 20048. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26., enquanto na cidade de São Paulo aumentou de 3,2% em 1974-75 para 3,8% em 19962828 . Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade da infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000: 34(Suppl): 52-61.. Ainda em relação ao estudo de Pelotas, em 2004, a prevalência de risco de sobrepeso foi de 19,8% aos 12 meses, 19,7% aos 24 e 17,9% aos 48 meses8. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26.. Em outro estudo com crianças matriculadas em pré-escolas privadas e filantrópicas na região metropolitana de São Paulo, a prevalência de risco de sobrepeso foi de 21,9%2525 . Nascimento VG, Schoeps DO, Souza SB, Souza JMP, Leone C. Risco de sobrepeso e excesso de peso em crianças de pré-escolas privadas e filantrópicas. Rev Assoc Med Bras 2011; 57: 657-61.. Neste estudo, essa prevalência foi de 22,0%. No entanto, a comparação fica prejudicada em virtude da diferença no perfil socioeconômico das crianças incluídas nesses estudos e pelo fato de serem institucionalizadas.

Crianças com menor idade apresentaram maior risco de ocorrência de excesso de peso. Esse risco foi cerca de duas vezes maior entre aquelas com idade entre 12 e 23 meses comparadas a crianças de maior idade (48 a 59 meses). Em Porto Alegre, estudando crianças com idade entre 12 e 59 meses, verificou-se menor risco para sobrepeso com o avançar da idade7. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81.. Em Florianópolis (SC), a prevalência de sobrepeso foi de 5,0% entre crianças menores de dois anos e de 6,5% entre aqueles com dois anos ou mais de idade2929 . Corso ACT, Botelho LJ, Zeni LAZR, Moreira EAM. Sobrepeso em crianças menores de 6 anos de idade em Florianópolis, SC. Rev Nutr 2003; 16(1): 21-8.. O fato é que essa associação está diretamente relacionada ao padrão de amamentação e dieta da criança. Numerosos estudos epidemiológicos e metanálises sugerem associação entre amamentação e risco diminuído de obesidade infantil3030 . Sichieri R, Souza RA. Estratégias para prevenção da obesidade em crianças e adolescentes. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 2): S209-34., embora se reitere a necessidade de investigação mais aprofundada sobre o assunto3131 . Balaban G, Silva GAP. Efeito protetor do aleitamento materno contra a obesidade infantil. J Pediatr 2004; 80(1): 7-16.. Há ainda a constatação de que a introdução precoce de alimentos de alto valor calórico seja responsável pelo excessivo ganho de peso em tenra idade31. Mas, neste estudo, não houve associação importante entre estado nutricional e amamentação exclusiva ou prolongada, assim como não houve associação de excesso de peso com a introdução precoce de outros alimentos. Evidencia-se, portanto, a necessidade de investigações mais detalhadas sobre o tema com delineamentos mais apropriados.

A idade materna por ocasião do parto mostrou-se diretamente associada à prevalência de excesso de peso neste estudo. Filhos de mães com 30 anos ou mais apresentaram RP = 1,41 (1,10 - 1,82) em relação às mães adolescentes. Poucos estudos investigaram esse aspecto, e nenhum encontrou associação significativa após ajuste7. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81. , 9. Jesus GM, Vieira GO, Martins CC, Mendes CMC, Castelão ES. Determinants of overweight in children under 4 years of age. J Pediatr 2010; 86(4): 311-6.. Há, portanto, necessidade de esse achado ser investigado de forma mais detalhada, já que, via de regra, ser mãe na adolescência tem implicado maior risco à saúde infantil.

O risco para excesso de peso foi 35% maior entre crianças pertencentes ao maior quartil de renda do que ao menor quartil, as mais pobres. Vários estudos mostram que a prevalência de sobrepeso/obesidade é maior entre crianças pertencentes a famílias de maior renda. Em Pelotas, na coorte de 2004, essa prevalência foi de 60% entre famílias com renda superior a dez salários mínimos (SM) em relação àquelas que recebiam até 1 SM8. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26. em Porto Alegre, o risco para sobrepeso para crianças com renda familiar ≥ 2 SM foi 1,86 vezes (1,13 - 3,08) maior em relação àqueles com renda inferior a 1 SM;7. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81. no Estado de Pernambuco, enquanto a prevalência de sobrepeso foi de 6,6% entre crianças pertencentes a famílias com renda per capita de até 0,25 SM, entre aquelas com renda ≥ 0,50 SM, a prevalência foi de 11,9%1111 . Menezes RCE, Lira PIC, Oliveira JS, Santana SCS, Andrade SLLS, Batista-Filho M. Prevalence and determinants of overweight in preschool children. J Pediatr 2011; 87(3): 231-7.. Por fim, na cidade de São Paulo, a prevalência de sobrepeso foi de 1,9% entre aqueles com renda de até 0,5 SM contra 5,1% para aqueles com renda familiar ≥ 2 SM2828 . Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade da infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública 2000: 34(Suppl): 52-61.. Na última década, o expressivo aumento do poder aquisitivo, sobretudo das famílias, provocou mudanças importantes no perfil nutricional dos pré-escolares brasileiros5. Monteiro CA, Conde WL, Konno SC, Lima ALL, Silca ACF, Benício MHD. Avaliação antropométrica do estado nutricional de mulheres em idade fértil e crianças menores de cinco anos. In: Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS 2006. Dimensões do Processo Reprodutivo e da Saúde da Criança. Série G. Estatística e Informação em Saúde. Ministério da Saúde/Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. Brasília, DF; 2009. p. 213-29..

O peso ao nascer foi o mais robusto fator associado à ocorrência de excesso de peso entre as crianças estudadas. Nascer com peso superior a 2.500 g implicou risco pelo menos duas vezes maior para a ocorrência de excesso de peso no período pré-escolar. A prevalência de sobrepeso/obesidade aos 12 meses de idade nas coortes de Pelotas foi cerca de 4 a 5 vezes maior entre crianças nascidas com 3.000 g ou mais em relação àquelas nascidas com baixo peso8. Barros AJD, Victora CG, Santos I, Matijasevich A, Araújo CL, Barros FC. Infant malnutrition and obesity in three population-based birth cohort studies in Southern Brazil: trends and differences. Cad Saúde Pública 2008; 24(Suppl 3): 417-26.. Em Feira de Santana (BA)9. Jesus GM, Vieira GO, Martins CC, Mendes CMC, Castelão ES. Determinants of overweight in children under 4 years of age. J Pediatr 2010; 86(4): 311-6., a RP foi de 2,75 (1,50 - 5,05) para nascidos com peso adequado em relação aos nascidos com baixo peso (< 2.500 g), enquanto em Porto Alegre, crianças com peso ao nascer alto para a idade gestacional mostraram RP = 2,29 (1,36 - 3,85) em comparação àquelas nascidas com peso adequado para a idade gestacional7. Drachler ML, Macluf SPZ, Leite JCC, Aerts DRCC, Giugliani ERJ, Horta BL. Fatores de risco para sobrepeso em crianças no Sul do Brasil. Cad Saúde Pública 2003; 19(4); 1073-81.. Esses achados confirmam que a ocorrência de sobrepeso é maior à medida que aumenta o peso de nascimento3232 . Gigante DP, Victora CG, Araújo CLP Barros FC. Tendências no perfil nutricional das crianças nascidas em 1983 em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil: análises longitudinais. Cad Saúde Pública 2003; 19(Suppl 1): S141-7..

CONCLUSÃO

Este estudo mostrou que a maioria dos fatores associados à ocorrência de excesso de peso entre as crianças estudadas são semelhantes àqueles de áreas urbanas desenvolvidas no País. É possível que, pelo fato de essas famílias do semiárido serem muito pobres e muito semelhantes entre si, o diferencial de exposição entre um e outro grupo de crianças não tenha sido suficiente para mostrar efeito independente de uma determinada variável sobre o desfecho. Ou seja, a quase homogeneidade de exposição para algumas variáveis pode estar fazendo com que o efeito de muitas delas sobre o excesso de peso não tenha alcançado significância estatística na análise ajustada.

As repetitivas denúncias de que o excessivo ganho de peso infantil é um dos mais importantes problemas de saúde pública deste início de século carece de eco nos estudos epidemiológicos e nas metas dos governos e instituições. Há poucos estudos de base populacional sobre o tema e, neles, o risco de sobrepeso raramente tem sido mencionado, além de a obesidade e o sobrepeso terem sido abordados em conjunto. Se isso não impede, pelo menos dificulta a adoção de medidas porque essas condições requerem diferentes abordagens e manejos. Além disso, o excesso de peso, em qualquer das suas formas, não tem sido tratado com uma prioridade na agenda de saúde e/ou de educação de qualquer governo, seja ele municipal, estadual ou federal. Sem isso, ficará difícil evitar que essa condição venha se tornar uma epidemia em todos os municípios brasileiros, inclusive em áreas pobres como a aqui estudada e, consequentemente, reverter essa tendência crescente apontada há pelo menos uma década pela OMS. Essa ação de combate ao excesso de peso deveria começar no domicílio, continuar no período escolar e se consolidar na juventude a fim de evitar ou pelo menos diminuir a ocorrência de doenças crônico-degenerativas já no início da vida adulta.

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  • Fonte de financiamento: Estudo financiado pelo MCT/CNPq/MS-SCTIE-DECIT/CT-SAUDE, Edital 022/2007.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2014

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2012
  • Revisado
    29 Mar 2013
  • Aceito
    05 Jun 2013
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br